Versão Inglês

Ano:  1994  Vol. 60   Ed. 3  - Julho - Setembro - (10º)

Seção: Relato de Casos

Páginas: 224 a 226

 

Mixoma da Maxila: Relato de Dois Casos.

Myxoma of the Maxilla: Study of Two Cases.

Autor(es): Myxoma of the Maxilla: Study of Two Cases.
Richard Louis Voegels*,
Mônica Gondim*,
Antônio Carlos Campos**,
Ossamu Butugan***`,
Aroldo Miniti****.

Palavras-chave: Seio maxilar, mixoma, neoplasmas

Keywords: Maxillary sinus, myxoma, neoplasms

Resumo:
O mixoma ósseo é uma neoplasia benigna rara, geralmente limitada à região maxilofacial, de origem odontogênica. Apresenta, caracteristicamente, crescimento lento, agressividade local e tendência à recorrência após excisão cirúrgica. Neste estudo apresentamos dois casos do tumor, localizados na maxila, tratados cirurgicamente, por via Caldwell - Luc. Esta abordagem permitiu uma boa visualização do tumor e sua ressecção completa, sem deixar seqüelas. 0 acompanhamento clínico e radiológico dos pacientes, l e 4 anos após a cirurgia, não mostra sinais de recidiva do tumor.

Abstract:
The myxoma of the bone is an uncommon benign neoplasm that is generally timited to the maxillofacial region. It is usually regarded as beingof odontogenic origin. The tumoris characterized by slow growth, invasiveness, no metastasis and tendency to recur after surgical excision. We present two cases of the disease treated by surgical removal via Caldwell -Luc approach, which allowed an adequate surgical access and a conservative but complete resection. Clinical and radiographic examination 1 and 3 years aftersurgery show no evidence of recurrence of the lesions.

INTRODUÇÃO

O mixoma é uma neoplasia benigna, que pode ser encontrada no coração, pele, tecido subcutâneo e em alguns ossos 1,2 O mixoma ósseo, na maioria dos casos, está limitado à região maxilofacial, envolvendo geralmente a maxila e a mandíbula com a mesma freqüência 1,3.

Esta neoplasia foi primeiramente descrita por Thoma e Goldman em 1947, quando propuseram a origem de células da porção mesenquimal do germe dentária4.

O mixoma maxilofacial é raro, cerca de 4 vezes menos freqüente que o ameloblastoma 3,4,5.

Geralmente é diagnosticado na 2° e 3o décadas de vida, sem predileção por sexo ou raça 7,8,9,10.

Apresenta-se na maioria dos casos como um abaulamento na face, de crescimento lento e indolor, localmente destrutivo, porém sem metástases 2,7,9 e o tratamento indicado é cirúrgico 6,10.

Neste estudo descrevemos dois casos de mixoma localizados na maxila, que foram submetidos a exérese cirúrgica por via Caldwell-Luc ampliado.

DESCRIÇÃO DE CASOS

CASO 1

Paciente de 13 anos, sexo feminino, branca. Referia história de abaulamento de face, de crescimento lento e indolor por 6 meses. Ao exame físico apresentava uma tumoração na região maxilar direita de cerca de 8 centímetros de diâmetro, de consistência endurecida e indolor à palpação e abaulamento do sulco gengivolabial do mesmo lado, que se estendia do 2°molar ao incisivo lateral (Figura 1). A mucosa da região apresentava aspecto e coloração normais.

O exame radiológico de seios paranasais em posição de Waters revelou velamento do seio maxilar direito e a radiografia panorâmica de mandíbula mostrou a presença de um dente incluso no assoalho do seio maxilar e uma área translúcida adjacente, desviando as raízes dentárias.

A tomografia, computadorizada dos seios paranasais mostrou um tecido denso ocupando o interior do seio maxilar direito, adelgaçando a parede ântero - lateral do seio e se estendendo para baixo na região maxilar, próximo às raízes dentárias (Figura 2).

Foi realizada uma biópsia incisional que revelou mixoma. A paciente foi submetida a cirurgia por via Caldwell-Luc ampliado, tendo sido realizada exérese completa do tumor, da raiz dentária encontrada no assoalho do seio maxilar e do pré molar envolvido pelo tumor (Figura 3). O pós-operatório transcorreu sem complicações.

O exame anatomopatológico revelou tecido mixomatoso rico em células estreladas e poliédricas, com processos citoplásticos longos e afilados. A substância intercelular exibia fibrilas delicadas e material mucóide (Figura 4).

Em 4 anos de acompanhamento, a paciente não apresenta sinais de recidiva do tumor.

Caso 2

Paciente de 41 anos, sexo masculino, negro. Referia abaulamento de hemiface esquerda há 3 anos, de aumento lento e progressivo, após uma extração dentária. Queixava-se de discreta dor local há 1 mês.

Ao exame físico apresentava uma tumoração na região maxilar esquerda de aproximadamente 5 centímetros de diâmetro, de consistência endurecida e indolor à palpação.

O exame radiológico de seios paranasais em posição de Waters revelou velamento total do seio maxilar esquerdo. A tomografia computadorizada mostrou uma formação hipoatenuante preenchendo o antro maxilar esquerdo com realce heterogêneo, se estendendo para a região malar e infiltrando as partes moles, com erosão das paredes ósseas do antro maxilar (Figura 5).

Foi feita suspeita diagnóstica de mucocele maxilar e o paciente foi submetido a cirurgia por via Caldwell-Luc ampliado. Durante o ato cirúrgico foi realizada biópsia de congelação, que revelou tratar-se de processo benigno, e o tipo de abordagem permitiu a exérese completa do tumor.

O exame anatomopatológico revelou fibromixoma, com características semelhantes ao caso anterior.

O paciente teve um pós-operatório sem complicações e não apresenta sinais de recidiva do tumor após 1 ano de acompanhamento (Figura 6).



Figura 1 - Abaulamento do sulco gengivo - labial do lado direito.



Figura 2 - TC em corte coronal, mostrando velamento do seio maxilar direito e adelgaçamento da parede ântero - lateral do mesmo.



Figura 3 - Exérese do tumor por via Caldwell-Luc.



Figura 4 - Exame anatomopatológico, mostrando células estreladas c poliédricas.



DISCUSSÃO

O mixoma é um tumor raro, que representa 1% dos tumores ósseos e cerca de 0,1 a 3% dos tumores odontogênicos 5,6

Sua embriogênese é controversa 9,11. Alguns autores o consideram uma degeneração mixóide de fibromas, porém a maioria acredita que sua origem seja de focos residuais de células embriogênicas 1,2,9 A origem odontogênica é presumida pela localização do tumor, freqüentemente próxima a raízes dentárias, e pela associação com anormalidades e história de manipulação dentárias 7,10,11,12,13,14, apesar do exame histológico mostrar restos epiteliais em apenas 20% dos casos 5,6.

Nos dois casos descritos, apesar do exame anatomopatológico não ter revelado tecido epitelial, o primeiro caso tinha um dente incluso no local do tumor e o segundo, história de manipulação dentária coincidente com o início do crescimento tumoral.

A microscopia eletrônica mostra um tumor composto predominantemente por matrix intercelular e as células mostram grande variedade ultra - estrutural, geralmente assemelhando-se a fibroblastos 9,14,15. O núcleo é irregular, algumas vezes lobulado e o citoplasma apresenta exuberância de retículo endoplasmático, sugerindo uma função secretora, possivelmente responsável pelos elementos de características mixóides da lesão14,15 Em alguns tumores são encontradas ilhas de epitélio odontogênico 9,14..

O tumor geralmente apresenta-se de forma assintomática, sendo a procura ao hospital, muitas vezes, motivada pela deformidade da face 7,8,13,17



Figura 5 - TC em corte axial, mostrando velamento do seio maxilar esquerdo e erosão das paredes ósseas, com infiltração de partes moles.



Figura 6 - TC feita uma ano após cirurgia, sem sinais de recidiva.



Os exames radiológicos de seios paranasais geralmente mostram velamento do seio maxilar acometido, enquanto a radiografia panorâmica de mandíbula revela lesões radioluscentes, pouco definidas e geralmente multiloculares. Este aspecto faz necessária a diferenciação com o ameloblastoma, displasia fibrosa, tumor de células gigantes central e o condromal 2,7,13,14,18

O tratamento indicado é cirúrgico, porém o tipo de abordagem é ainda controverso 3,6,8. Na literatura são descritas desde curetagens até resseeções amplas, como hemimaxilectomia, dependendo da localização e tamanho do tumor3,6,7,10,11,12,13.

O alto índice de recidiva do tumor, cerca de 25% após tratamento por curetagem 7,9,14,19,20 , vem levando os autores à escolha de abordagens mais amplas, porém o grande desafio é realizar procedimentos que permitam a exérese completa do tumor sem levar a deformidades estéticas 3,17,21,22.

Nos nossos pacientes, optamos pelo acesso cirúrgico por via Caldwell-Luc ampliado, que nos possibilitou a ressecção completa do tumor, sem deixar seqüelas.

CONCLUSÃO

Apesar de se tratar de uma afecção benigna rara, o mixoma deve ser considerado no diagnóstico diferencial dos tumores da região maxilo - facial 5, especialmente quando há história de dente incluso ou manipulação dentária.

A curetagem não deve ser o procedimento de escolha, pois apresenta altos índices de recidiva do tumor. Por outro lado, o tratamento deve, sempre que possível, evitar seqüelas estéticas. A utilização da via de Caldwell-Luc ampliada permitiu resultados satisfatórios sem levar a seqüelas. Estes pacientes devem ter um acompanhamento longo e criterioso.

REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA

1. HARRIS, R. J.; GARROW, E.; SPINNATO, G. - Myxoma of the maxilla: report of case. J. Oral. Surgeryy 35 (1): 70 -. 73, 1977.
2. STEWARD, S. S.; BAUM, S. M.; ARLEN, M.; ELGUEZABAL, A. - Myxoma of the lower jaw. Oral Surg. Oral Med &Oral Path 36 (6):800 - 806, 1973.
3. KELLER, E. E. - Resection of a Myxoma of the Maxilla Via LeFortIOsteotomy.J.OralMaxillofacSurg46(7):609-613,1988.
4. THOMA, K. H.; GOLDMAN, H. M. - Central myxoma of the jaw. Am J. Orthod Oral Sutg 33:532 - 540, 1947.
5. REGESI, J. A.; KE RR, D. A.; COURTNEY, R. M. -Odontogenic tumor': analysis of 706 cases.). OraISutgety36(10):771-778,1978.
6. SLOOTWEG, P. J.; WITTKAMPF, A. R. M. - Myxoma of the Jaws: An Analysis of 15 Cases.). Max-FacSurg14 (1):46 -52,1986.
7. ZIMME RMAN, D. C.; DAHLIN, D. C. -MyxomatousTumors of the jaws. Oral Sutg. Oral Med & Oral Path 11(10): 1069 - 1080.
8. BOJRAB, D. G.; TOPAZIAN, R. G. - Large myxoma of the mandible. J. Oral Sutgety 29:371 - 376, 1971.
9. WESTWOOD, R. M.; ALEXANDER, R. W.; BENNETT, D. E. - Giant odontogenic myxofibroma. Oral Sutg, Oral Med &Oral Path 37 (1): 83 - 92, 1974.
10. BARROS, R. E.; DOMINGUEZ, F. V.; CABRINI, R. L. - Myxoma of the jaws. Oral Surg, Oral Med Oral Path 27 (1):225 - 236, 1969.
11. GHOSH, B. C.; HUVOS, A. G.; GEROLD, F. P.; MILLER, T. R. - Myxoma of the jaw bones. Cancer31(1):237 - 240.
12. ARCHER, W. H. - Myxoma of the left maxilla: report of a case. Oral Sutg, Oral Med & Oral Path 13 (1):139 -141, 1960.
13. ABAZA, N. A.; EL-KHÁSHAB, M.; KREUTNER; A. - Central myxoma of the mandible. Oral Surg, Oral Med ft30ral Path 31(4):465 -471,1971.
14. HENDLER, B. H.; ABAZA, N. A.; QUINN, P. -Odontogenic myxoma. Oral Sutg Oral Med & Oral Path 47 (3):203 -217,1979.
15. HASLETON, P. S.; SIMPSON, P. W.; CRAIG, R. D. P. - Myxoma of the mandible - A frbroblastie tumor. Oral Suig, Oral Med & Oral Path 46 (3):396 - 406, 1978.
16. WHITE, D. K.; CHEN, S.; MOHNAC, A. M.; MILLER, A. S. - Odontogenic myxoma: A clinical and ultrastructural study. Oral SuM Oral Med & Oral Path 39 (6):901 - 917, 1975.
17. COHEN, P. B.; GÀMBLE, J. W. - Maxillary resection for odontogenic myxoma: report of a case. J. Oral Sutgety 35 (7): 573 -577,1972.
18. BAILEY, B. J. - Head and Neck Surgery - Otolaryngology, Philadelphia, J. B. Lippincott Company, 1993. 1183 - 1184.
19. PANELLA, J.; FREITAS, A.; COSTA, C. - Mixoma Odontogênico: Aspectos clínico-radiográficos (Apresentação de um caso). Rev. Ass. Paul. Cirurg. Dent. 41(6): 305 - 307, 1987. 20. CHINELLATO, L. E. M.; DAMANTE, J. H.; ALVARES, L. C. - Mixoma Odontogênico (fibromixoma). Rev. PaulOdont9 (2): 2-8,1987.
Z1. REGUERA, J. h. C. -Mixoma osteógeno. Presentación de dos casos. Rev. Cub Est 22 (2): 97 - 104, 1985.
22. ARIENZA, B.; ARIENZA, F.; GARZÓN, J. C.; HÁSS, E.; ARAMA, G. - Mixoma de maxilar superior: caso clínico. Rev. Asoc. Odont Atgent 74(2):46 - 50, 1986.




* Pós-graduandos na área de Otorrinolaringologia de FMUSP.

** Professor Associado da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.

*** Professor Associado da Disciplina de Otorrinolaringologia da FMUSP.

**** Professor Titular da Disciplina de Otorrinolaringologia da FMUSP.

***** Trabalho desenvolvido na Divisão de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e LIM 32, apresentado no V Congresso Brasileiro e Latino - Americano de Rinologia, realizado em São Paulo, Setembro de 1993.

Endereço para correspondência: Hospital das Clínicas da FMUSP - Divisão de Otorrinolaringologia - A/C - Richard L. Voegels - Rua Prof. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 - CEP 05403 - São Paulo - SP.

Artigo recebido em 24 de janeiro de 1994. Artigo aceito em 24 de fevereiro de 1994.

Imprimir:

BJORL

 

 

 

 

Voltar Voltar      Topo Topo

 

GN1
All rights reserved - 1933 / 2024 © - Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial