Versão Inglês

Ano:  1999  Vol. 65   Ed. 5  - Setembro - Outubro - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 385 a 388

 

Relação Anatômica do Nervo Corda do Tímpano com a Articulação Temporomandibular.

Anatomical Relationship Between the Chorda Tympani Nerve and the Temporomandibular Joint.

Autor(es): João A. C. Navarro ;
Érlka A. Q. Oliveira* ;
Jesus C. Andreo**,
Ricardo L. Navarro****.

Palavras-chave: articulação temporomandibular; nervo corda do tímpano; nervo facial

Keywords: temporomandibular joint; chorda tympani nerve; facial nerve

Resumo:
Introdução: O nervo corda do tímpano (NCT) origina-se do VII par craniano, no interior da mastóide, atravessa a orelha média entre o martelo e a membrana do tímpano, e continua, no interior da porção petrosa do osso temporal, numa trajetória póstero-anterior e látero-medial. Próximo à artéria meníngea média, inclina-se para baixo e torna-se exocranial, junto à espinha do esfenóide. A literatura é controvertida quanto à relação NCT/ATM na trajetória cranial desse nervo. Objetivo: O objetivo deste trabalho foi contribuir para o conhecimento desta importante relação anatômica. Material e Método: Utilizaram-se 20 hemi-cabeças de indivíduos adultos, de ambos os sexos, formolizadas a 10% e desmineralizadas em ácido nítrico a 5%. Ao microscópio cirúrgico DF Vasconcelos, com objetiva 200 mm e ocular 12,5 mm, foram realizadas dissecções da ATM, orelha média e NCT, com acesso pela fossa média do crânio. O disco da ATM foi exposto por superior e medial, estendendo-se à orelha média, onde o NTC foi abordado em seu trajeto intrapetroso. A parte óssea entre a orelha média e a região medial do disco foi removida, expondo-se o ligamento anterior do martelo, desde o processo anterior do martelo até à região da cápsula articular. Conclusão: Observou-se que o NCT apresentou trajetória intrapetrosa retilínea, póstero-anterior e látero-medial, emergindo na face exocranial do temporal, posterior à artéria meníngea média. Quanto à distância NCT/ATM, obtiveram-se: maior distância, 4,0 mm; e menor, 1,0 mm, com média de 3,0 mm. Em nove (45%) casos a distância foi de 3,0 mm; em sete (35%), de 4,0 mm; e nos dois casos restantes (10%), 1,0 mm. Observou-se que a trajetória do NTC em sua proximidade à ATM foi sempre intraóssea, ou seja, na porção petrosa do temporal, portanto, inviabilizando sua provável compressão pelas estruturas moles periarticulares.

Abstract:
Introduction: After to leave the facial nerve into the mastoid, the chorda tympani nerve (CTN) reachs the middle ear. It crosses between the tympanic membrane and the manubrium of the malleus and pierces finto the tympanic canal, just lateral of the auditive tube. Near to the spinous foramen and to the middle meningeal artery, this nerve leaves the cranial base. There is controversy about the cranial trajectory of the CTN. Purpose: The aim of this search is contribute to this anatomical aspect. Material and Methods: Twenty hemi-heads from adult individuals were fixed in 10% formaline and decalcified in 5% nitric acid. Using a surgical microscope (DF Vasconcellos), microdissections were realized by endocranial acesses, and the anatomical relationships among the temporomandibular joint (TMJ), middle ear and chorda tympani nerve were observed. The bony structures between the middle ear, medial region of the articular disc were removed to observe the anterior malleus ligament, until its capsular connection. Conclusion: The intrapetrous trajectory of the CTN was retilineous, posteroanterior and lateromedial. The CTN/TMJ major distance was 4.0mm; and the minor distance was 1.0mm, being 3.0mm in average. The CTN traumatic compression is impossible in its intrapetrous trajectory.

INTRODUÇÃO

Embora a descrição anatômica do nervo corda do tímpano remonte a séculos16, a literatura sobre algumas de suas relações anatômicas, como à articulação temporomandibular (ATM), ainda é controvertida. O nervo corda tímpano origina-se do nervo intermédio (do VII par craniano), no interior da mastóide e, por canal próprio, alcança a orelha média. Em trajetória póstero-anterior, entre a face medial da membrana do tímpano e o processo longo do martelo, segue diretamente para o interior (ta porção petrosa do osso temporal, onde apresenta trajetória póstero-anterior e látero-medial, tornando-se exocranial próximo à artéria meníngea média, no nível do forame espinhoso. Supõe-se que a proximidade desse nervo por medial da ATM poderia ser uma das causas de dor por compressão, quando da ocorrência de hipertrofias e/ou patologias articulares1, 6, 15.

O presente trabalho busca contribuir para o conhecimento da relação anatômica elo nervo corda do tímpano (NCT) com a articulação temporomandibular (ATM).

MATERIAL E MÉTODO

Utilizaram-se 20 hemi-cabeças de indivíduos adultos, de ambos os sexos, previamente formolizadas a 5% e desmineralizadas em ácido nítrico a 5%. As dissecções foram realizadas ao microscópio cirúrgico D. F. Vasconcelos, com objetiva de 200 mm e ocular de 12,5 mm, através da fossa cranial média, abrindo-se uma janela sobre o disco articular da ATM; e outra, superior e medial, sobre a orelha média, observando-se por superior o seu conteúdo. O NCT foi abordado em seu trajeto intrapetroso.

Para expor o ligamento anterior do martelo, desde o processo anterior do mesmo até à região póstero-medial da cápsula da ATM, removeu-se a parte óssea presente entre o orelha média e a região medial do disco.

RESULTADOS

A dissecção microscópica da região zigomática, via fossa média do crânio, utilizando-se o microscópio cirúrgico, oferece uma visão ampla de todos os seus elementos anatômicos, desde medial até lateral (Figura 1). A maioria dos componentes anatômicos intratemporais pode ser dissecada por essa via, expondo-se a orelha externa, a orelha média, com seu conteúdo, e, entre eles, a membrana do tímpano. A orelha interna, desde o meato acústico interno e seus elementos, acompanha as trajetórias dos nervos vestibular, coclear e facial. Deste, evidenciam-se as relações anatômicas, seu gânglio geniculado e seus ramos petrosos (Figuras 2, 3 e 4).

O nervo corda do tímpano, principal enfoque desse trabalho, apresenta longa trajetória intracranial, desde a sua origem mastóidea, a sua entrada na orelha média (caixa do tímpano) e suas importantes relações nesse percurso, até sua trajetória intrapetrosa, num canalículo próprio à medial e superior à tuba auditiva, deixando esse percurso somente para afastar-se da base do crânio, muito próximo ao forame espinhoso, por onde transita a artéria meníngea média (Figura 4).



Figura 1. Desenho esquemático da fossa média do crânio, lado direito, com elementos anatômicos dissecados: 1. disco da ATM; 2. orelha externa; 3. orelha média; 4. martelo; 5. bigorna; 6. nervo facial; 7. nervo corda do tímpano; 8. nervo petroso maior; 9. gânglio geniculado; 10. gânglio trigeminal; 11. artéria meníngea média; 12. músculo pterigóideo lateral.



Em sua discutida relação coma ATM, o nervo corda do tímpano pode ser localizado, exposto na sua trajetória intrapetrosa, obtendo-se medidas do conjunto cápsula /disco articular, cujo valor mínimo foi de 1,0 mm; e máximo, de 4,0 mm, com média de 3,0 mm. Em 1 caso o NCT apresentou curvatura lateral, no nível do teto e lateral da tuba auditiva (Figura 4).

Retirando-se o componente ósseo entre o nervo corda do tímpano e a ATM, observou-se uma ponte conjuntivo fibrosa ligando o processo anterior do martelo e margem anterior da membrana do tímpano ao limite póstero-medial da cápsula /disco articular (Figuras 2 e 4).

DISCUSSÃO

O nervo corda do tímpano recebe descrição bastante uniforme na literatura, quanto ã sua origem do nervo facial, no interior da mastóide4, 7, 10, 12, 15. Ao deixar esse nervo por anterior em ângulo agudo, em canalículo próprio, o NCT sobe e curvase para anterior, até alcançara caixa do tímpano (orelha média), ande se continua para anterior, acolado à face medial da membrana do tímpano, tendo o processo longo do martelo por medial; e a membrana, por lateral4, 8, 10, 11. Após cruzar toda a orelha média, deixa-a por sua parede anterior e adentra o canalículo timpânico, na porção petrosa do temporal. Sua trajetória nesse osso é longa, medialmente à tuba auditiva óssea. Continua seguindo pela fissura petrotimpânica, até chegar á face medial da espinha do esfenóide2, 7, 10, 11, 12, 14. A partir desse nível, o nervo corda do tímpano desce para anterior e alcança o nervo lingual, em ângulo agudo, por posterior, pouco abaixo da origem desse ramo4, 7, 9, 10.



Figura 2. Fossa cranial média, com osteotomia, mostrando os elementos anatômicos dissecados: 1. disco da ATM; 2. músculo pterigóideo lateral; 3. orelha externa; 4. orelha média; 5. martelo; 6. bigorna; 7. tuba auditiva; 8. nervo facial; 9. gânglio geniculado; 10. nervo vestibular; 11. canal semicircular superior seccionado; 12. nervo corda do tímpano; 13. nervos petrosos.



Figura 3. Fossa cranial média, cone osteotomia mostrando os elementos anatômicos dissecados: 1. disco da ATM; 2. orelha média; 3. martelo; 4. bigorna; 5. tuba auditiva; 6. nervo corda do tímpano; 7. nervo facial; 8. gânglio geniculado; 9. cóclea seccionada; 10. nervos petrosos.



Embora a proximidade do nervo corda do tímpano à ATM tenha chegado a 1 mm, ele sempre se apresentou no interior ele um canal ósseo petroso.

Retirada toda a estrutura óssea temporal que separava o nervo corda do tímpano da ATM, verificou-se que os elementos conjuntivos mantinham uma continuidade, desde à borda anterior da membrana do tímpano até por medial da cápsula articular, sugerindo a existência de remanescentes conjuntivos, provavelmente ligados à origem do músculo pterigóideo lateral.
Terminações sensitivas comuns e proprocetivas, encontradas nessas áreas, poderiam ativar todo o complexo ATM e estruturas anatômicas adjacentes.

CONCLUSÃO

O disco da ATM, observado por superior, apresentou-se à lateral e anterior à orelha média.

Encontrado sempre no interior da porção petrosa do osso temporal, o nervo corda do tímpano (NCT) apresentou-se retílineo, com trajetória ântero-posterior e látero-medial, à lateral da tuba auditiva, tornando-se exocranial próximo à artéria meníngea média, em seu trânsito pelo forame espinhoso.



Figura 4. Fossa cranial média, com osteotomia, mostrando os elementos anatômicos dissecados: 1. disco da ATM; 2. final da porção endocranial do NCT; 3. orelha média; 4. martelo; 5. bigorna; 6. músculo tensor do tímpano; 7. nervo corda do tímpano; 8. osso petroso ao redor do NCT foi removido, evidenciando o ligamento anterior do martelo, que alcança a face póstero-medial da cápsula da ATM (9); 10. nervo facial; 11. nervo vestíbulo-coclear; 12. gânglio geniculado; 13- nervos petrosos; 14. artéria meníngea média.



A menor distância observada entre o NCT e a ATM foi de 1 mm, e a maior, de 4 mm, com média de 3 mm.

Sob a porção óssea petrosa que envolve o NCT encontrou-se uma estrutura conjuntivo-fibrosa, ligando o processo anterior do martelo à região póstero-medial da cápsula da ATM.

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*Professor Titular da Disciplina de Anatomia da Faculdade de Odontologia de Bauru, da Universidade de São Paulo.
** Bióloga Estagiária da Disciplina de Anatomia da FOB/USP.
*** Professor Doutor da Disciplina de Anatomia da FOB/LISP.
**** Acadêmico da FOB/USP.

Endereço para correspondência: Prof. Dr. João A. C. Navarro - Disciplina de Anatomia -Faculdade de Odontologia de Bauru - Universidade de São Paulo - Alameda Dr. Octávio

P. Brisola, 9-75 - 17043-101 Bauru /SP - Telefone: (0xx14) 235-8226 - E-mail: jnavarro@usp.br

Artigo recebido em 1°- de junho de 1999. Artigo aceito em 6 de julho de 1999.

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