Ano: 2004 Vol. 70 Ed. 2 - Março - Abril - (18º)
Seção: Relato de Caso
Páginas: 265 a 267
Flebectasia jugular em crianças: relato de caso
Jugular phlebectasia in children: a case report
Autor(es):
Raquel C. de Oliveira 1,
Claudiane M. Assis 2,
Alexandre R. Coraçari 3,
Fernando D. Molina 4,
José Victor Maniglia 5
Palavras-chave: flebectasia, crianças, veia jugular
Keywords: phlebectasia, children, jugular vein.
Resumo:
Massas cervicais na infância que aparecem apenas ao esforço físico são raras, tendo como principais diagnósticos diferenciais laringocele, cisto ou tumor do mediastino superior e flebectasia jugular. A flebectasia jugular é uma dilatação sacular ou fusiforme anormal da veia jugular. Relatamos um caso de flebectasia de veia jugular externa em uma criança saudável. Várias hipóteses têm sido propostas para explicar a etiologia da flebectasia jugular, dentre elas, a anormalidade anatômica de sua parede, compressão mecânica da veia braquiocefálica, lesões adquiridas da veia e idiopática. Geralmente, é uma condição assintomática, cujo diagnóstico pode ser estabelecido a partir de uma forte suspeita clínica, sendo comprovado por exames complementares. O tratamento pode ser conservador ou cirúrgico dependendo da sintomatologia.
Abstract:
Neck masses that appear only on straining are rare in children and should be differentiated between laryngoceles, superior mediastinal tumors or cysts and jugular phlebectasia. The latter being an abnormal fusiform or saccular dilatation of the jugular vein. We report a case of external jugular phlebectasia in a healthy child. A variety of ethiological hypotheses have been proposed: anatomic abnormality of the vein, mechanical compression of the brachiocephalic vein, acquired lesion of the vein and idiopathic. Most patients are asymptomatic, the diagnosis can be established clinically and confirmed by imaging studies. Conservative or surgery management will be chosen according to the symptoms.
INTRODUÇÃO
Massas cervicais na infância que aparecem apenas ao esforço físico são raras, tendo como principais diagnósticos diferenciais laringocele, cisto ou tumor do mediastino superior e flebectasia jugular1,2. A flebectasia jugular é uma dilatação sacular ou fusiforme anormal da veia jugular descrita pela primeira vez em 1875 por Harris3, segundo a literatura britânica. Após os anos 70, com o advento de métodos diagnósticos não-invasivos e o maior número de cirurgias cervicais e laríngeas, essa entidade tem sido mais freqüentemente reconhecida. Mais de 100 casos de flebectasia envolvendo veias cervicais, incluindo veia jugular interna, externa e anterior, têm sido descritos na literatura mundial, e apesar de vários nomes terem sido propostos, o termo mais comumente aceito é flebectasia4, que indica uma dilatação sem tortuosidades, diferenciando-a da varicose. Relatamos a seguir um caso de flebectasia de veia jugular externa em uma criança saudável.
APRESENTAÇÃO DE CASO
T.H.T., 10 anos, masculino, branco, com queixa de massa cervical à direita há um ano, visível apenas durante esforço, sem história de febre, trauma cervical, perda de peso, anorexia ou outras queixas no período. Ao exame físico apresentava massa cervical em terço médio de borda anterior do músculo esternocleidomastóideo à esquerda, de 3x2 cm, visível com manobra de Valsalva, de consistência elástica, móvel, indolor, sem sinais flogísticos locais ou pulsação (Foto 1). A tomografia computadorizada cervical revelou dilatação de veia jugular interna à direita sem compressão de estruturas adjacentes (Foto 2). Paciente permaneceu assintomático e sem aumento da massa durante seguimento clínico por seis meses, não sendo proposto, portanto, nenhum tratamento invasivo.
Foto 1. Paciente em perfil D
Foto 2. Corte tomográfico axial de região cervical
DISCUSSÃO
Várias hipóteses têm sido propostas para explicar a etiologia da flebectasia jugular, dentre elas, a anormalidade anatômica da veia por defeito estrutural congênito de sua parede, compressão mecânica da veia braquiocefálica entre a cabeça da clavícula e ápice pulmonar direito, lesões adquiridas da veia e idiopática2. O estudo histopatológico da parede das veias jugulares indica claramente diminuição da elasticidade da parede venosa causada por perda do tecido elástico e hipertrofia do tecido conectivo, estreitamento da parede venosa, fibrose e ausência ou diminuição da camada muscular lisa. O aumento intermitente da pressão intratóracica associado a alterações descritas acima desempenha um importante fator causal, apesar de não haver relatos na literatura de nenhuma obstrução do fluxo venoso4.
A flebectasia jugular é mais comum do lado direito, provavelmente, devido à localização mais lateral da veia braquiocefálica direita e sua relação com as outras veias na junção esternoclavicular e pelo seu contato direto com a pleura pulmonar à direita. Portanto, a insuflação do ápice pulmonar direito leva ao aumento suficiente da pressão na veia braquiocefálica para produzir obstrução e distensão temporária da veia jugular5. Existem casos mais raros de flebectasia jugular bilateral e à esquerda.
Geralmente, é uma condição assintomática, mas alguns pacientes podem se queixar de sensação de aperto, sufocamento e vertigem, desconforto durante atividade física, deglutição e com a tosse, dor lingual e afonia ao falar alto2.
O diagnóstico pode ser estabelecido a partir de uma forte suspeita clínica, sendo comprovado pela ultra-sonografia com Doppler6,7, tomografia computadorizada8,9, venografia10 ou arteriografia11.
Pacientes assintomáticos devem ser seguidos clinicamente já que complicações como trombose12 e Síndrome de Horner13 são raras, e a ruptura não tem sido relatada, enquanto os sintomáticos devem ser submetidos à excisão cirúrgica. Os casos sintomáticos com comprometimento bilateral se tornam um verdadeiro desafio para o cirurgião na escolha por qual dos lados intervir. Alguns autores defendem a cirurgia para casos assintomáticos pela tendência de crescimento da lesão e deformidade estética1,2,4,5.
COMENTÁRIOS FINAIS
Apesar de rara, a flebectasia jugular deve ser incluída no diagnóstico diferencial de massas cervicais na infância, principalmente relacionadas à manobra de Valsalva. Por ser uma condição benigna, onde a sintomatologia é escassa e as complicações são raras, defendemos o manejo conservador, reservando a cirurgia para casos específicos.
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1 Residente do 3º ano do Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da FAMERP.
2 Residente do 3º ano do Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Clínica Maniglia.
3 Residente do 2º ano do Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da FAMERP.
4 Médico Responsável pelo Serviço de Otorrinopediatria do Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da FAMERP.
5 Diretor geral da FAMERP e Chefe da Disciplina de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da FAMERP.
Endereço para Correspondência: Claudiane Mozer de Assis, Rua Ondina nº 45 Redentora São José do Rio Preto SP 15015-200
E-mail: clauorl@yahoo.com.br
Apresentado no 36º Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia, 19 a 23 de novembro, Florianopolis, SC.
Artigo recebido em 18 de dezembro de 2002. Artigo aceito em 07 de março de 2003.