Versão Inglês

Ano:  1992  Vol. 58   Ed. 3  - Julho - Setembro - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 205 a 207

 

Anomalias anatômicas do bulbo da jugular: Relato de 1 caso.

Anatomic anomalies of jugular bulb: One case report.

Autor(es): Lifian Konno Ishida*,
Yen Min Ming*,
Priscila Bogar*,
Yang Tsou Chan**,
Soinia Chung***,
Ossamu Butugan****,
Aroldo Miniti*****,
Ricardo Ferreira Bento****

Palavras-chave: osso temporal, anormalidades, veia jugular

Keywords: temporal bone, abnormalities, jugular vein

Resumo:
Os autores apresentam um caso de anomalia do bulbo jugular, cuja hipótese diagnóstica primária foi de tumor glômico, relatando sua freqüência relativamente alta (3,5-7%), porém não detectada na rotina diária. Apresentam uma revisão anatômica da região e discutem aspectos relevantes a serem considerados na abordagem de patologias que acometem o osso temporal.

Abstract:
The authors present a case of anomalous jugular bulb, that tire first diagnosis was glomic tumor is related their frequency, about 3,5-7%, but frequently not detected on daily routine. It is presented a anatomic review of this region and they discuss important aspects that should be considerated on management of the pathologies of the temporal bone.

INTRODUÇÃO

O bulbo jugular é a região anatômica correspondente a origem da veia jugular interna, que, por ser algo dilatado, recebeu este nome. Localiza-se no forame jugular que é uma ampla abertura formada pela porção petrosa do osso temporal em sua face inferior e pela incisura jugular do osso occipital; é dividido em 3 compartimentos: o anterior, que dá passagem ao seio petroso inferior; o intermediário, que dá passagem aos nervos glossofaríngeo, vago e acessório e o posterior, que dá passagem aos seio transverso e alguns ramos meníngeos das artérias occipital e faríngea ascendente (Fig. 1).

O forame jugular situa-se posteriormente ao canal carótico, entre o aqueduto da cóclea e o processo estilóide. Na crista óssea entre o canal carótico e a fossa jugular encontra-se o canalículo timpânico inferior para a passagem do ramo timpânico do nervo glossofaríngeo1 (Fig. 2).



FIGURA 1



O bulbo jugular faz relação direta com o hemotímpano, onde existe uma fina lâmina óssea que separa a caixa timpânica da fossa jugular, o qual, muitas vezes, pode se apresentar deiscente1,2,3,4 (Fig. 3).

OVERTON3 realizou estudo histológico em 257 ossos temporais, dos quais 13 (6%) apresentaram-se com o bulbo jugular dentro do ouvido médio, acima do limite inferior do ânulus timpânico. Apenas um desses casos apresentavam deiscência de parede óssea, sendo de ocorrência bilateral em um paciente, dos 189 estudados.



FIGURA 2



SUBOTIC10 realizou estudo em 815 ossos temporais encontrando bulbo jugular elevado em 3,5% deles.

ORR4 estudou n posição e a forma do bulbo jugular, comparando com a pneumatização da mastóide, mas não conseguir estabelecer relação entre elas.

O bulbo jugular anômalo é mais comum a direita 1,9, com incidência de 3,5-7% 3,9,10 e pode ser bilateral em 16,9%9,10.

O objetivo deste trabalho foi demonstrar que existem anomalias anatômicas não patológicas do bulbo jugular que muitas vezes podem sugerir um diagnóstico de patologias de abordagem cirúrgica como no caso do glomus jugular, a fim de se firmar sempre, um diagnóstico prévio preciso, diante de sintomatologias que surgiram determinada patologia.

CASUÍSTICA

AJRP, 32 anos, feminino, procedente de Dourados, MS. Procurou o serviço de otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, em fevereiro de 1991, com história de zumbido, tipo chiado, em ouvido direito, há 7 anos, com caráter progressivo, que ultimamente se apresentava como pulsátil, sincrônico com os batimentos cardíacos, e melhorava a dígito pressão de região carotídea direita. Nega história de otorragia, hipoacusia, otite, trauma ou vertigem. A otoscopia se revelou de aspecto normal. A audiometria tonal era normal. Foi realizada tomografia computadorizada (Fig. 4) de osso temporal que mostrou alargamento de fossa jugular à direita, porém sem sinais de erosão óssea associada. Foi feita a hipótese diagnóstica de tumor glômico, sendo indicada a realização de carótido-angiografïa, a qual revelou ausência de "blush" tumoral ou anomalia vascular visível, ressaltando a ampla predominância da drenagem venosa através do seio lateral e da veia jugular à direita.



FIGURA 3



Definiu-se, portanto, uma anomalia anatômica do bulbo jugular, adotando-se medidas gerais sintomáticas para alívio do zumbido.

DISCUSSÃO

O glomus jugular é um derivado de paraganglios formado por capilares e pré-capilares, interpostos por células epidermóides localizadas na adventícia do bulbo jugular5. É o tumor benigno mais comum do ouvido6.

Em geral, se apresenta cota zumbido pulsátil, perda auditiva c massa avermelhada atrás da membrana timpânica, vista por transparência à otoscopia. Pode apresentar sinais e sintonias de extensão intracraniana e envolvimento de pares cranianos, quando são de maior tamanho5,6.

Tradicionalmente, o diagnóstico é confirmado através de tomografia, arteriografia e jugulografia retrógrada, sendo que a tomografia computadorizada de alta resolução é o exame de eleição5.



FIGURA 4



No caso apresentado, a história clínica e a tomografia sugeriram a hipótese de glomus jugular. O fato de que a paciente não apresentava hipoacusia, nem otoscopia sugestiva, não descartavam essa hipótese.

Ao se realizar a arteriografia, constatou-se a não formação do "blush"capilar, o que afastou definitivamente o diagnóstico de glomus jugular.

Deve-se ressaltar aqui, que, apesar de ser um exame invasivo, muitas vezes se faz notória a importância ela arteriografìa no diagnóstico de determinadas patologias.

Verificamos que a anomalia constatada foi à direita, que segundo a literatura, é o lado mais freqüentemente acometido.

Resta-nos ainda a dúvida do motivo pelo qual a paciente apresentava um zumbido de caráter progressivo, iniciando-se como chiado e após 7 anos se tomou pulsátil e sincrônico com os batimentos cardíacos.

A abordagem deste tema se deve a observação de que é tendência geral do médico, diagnosticara patologia, seja ela de ocorrência comum ora rara; porém, cabe lembrar que a constatação da não patologia, também é um diagnóstico importante.

Infelizmente no caso dessa paciente, o diagnóstico de anomalia anatômica do bulbo jugular não foi passível de terapêutica específica, fazendo-a persistir com a sintomatologia que motivou sua procura ao serviço médico.

Outro fator importante a ser salientado é que, quando o bulbo jugular se apresenta elevado e ocupando o ouvido médio, podem ocorrer acidentes hemorragicos, seja em cirurgias otológicas ou até mesmo em miringotomias3.

Deve o otologista, sempre ter em mente a possibilidade deste tipo de anomalia para a realização de procedimentos intervencionistas, visto que a incidência de anomalias do bulbo jugular, segundo a literatura, nos pareceu mais alta do clinicamente constatamos em nossa rotina diária.

CONCLUSÃO

A anomalia do bulbo jugular é considerada um diagnóstico diferencial para o glomus jugular.

Sua incidência revelou-se 3,5-7% segundo revisão de literatura, sendo mais frequente à direita.

A história clínica e a tomografia computadorizada, nem sempre, são suficientes para definir o diagnóstico de anormalidades ao nível do bulbo jugular, sendo necessária a realização da arteriografia, pois a conduta diante de cada caso é diferente. Se para o glomus jugular faz-se necessária uma intervenção cirúrgica, para a anomalia anatômica deve-se evitá-la.

A possibilidade de ter anomalia anatômica do bulbo jugular deve estar sempre presente na mente do otologista, visto que complicações graves (como por exemplo a hemorragia) podem advir mesmo após intervenção simples como a miringotomia.

BIBLIOGRAFIA

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10. SUBOTIC, R.: the high position of the jugular bulb. Acta Otolaryngol (Stockholm), 87: 340-344, 1979.




*Médicos Residentes da Clinica de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
**Médico Preceptor da Clínica de Otorrinolaringologia do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da USP.
****Professores Associadas da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da USP.
***** Professor Titular da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da USP.

Trabalho realizado na Disciplina de Clínica Otorrinolaringológica da Faculdade de Medicina da USP e LIM-32

Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 - 6° andar - CEP 05403 - São Paulo - SP.

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