Versão Inglês

Ano:  1994  Vol. 60   Ed. 2  - Abril - Junho - (10º)

Seção: Artigos Originais

Páginas: 149 a 152

 

Complicações Periorbitárias das Sinusites

Orbital Complications of Sinusitis

Autor(es): Richard Louis Voegels*,
Rogério Leão Bensadon*,
Roberto Zanovello Ognibene*,
Ossamu Butugan**,
Aroldo Minití***.

Palavras-chave: Sinusite, órbita

Keywords: Sinusitis, orbit

Resumo:
Entre 1982 e 1992, 63 pacientes foram internados no nosso serviço com complicações orbitarias de sinusites agudas. No estudo retrospectivo destes pacientes foi dada ênfase na apresentação clínica, achados radiológicos e tratamento. Houve uma maior incidência destas complicações na segunda décadade vida (49,2%), sendo que 87,3% dos pacientes tinham menos que 30 anos de idade. Os principais achados clínicos foram: edema periorbitário (96,8%), hiperemia periorbitária (74,6%) e rinorréia (69,8%). Os achados radiológicos mais freqüentes (RX, TC e RNM) foram: pansinusite (42, 8%), sinusite maxila - etmoidal (28, 6%) e sinusite maxilar(15, 9%). Os pacientes foram classificados segundo os critérios de Chandlere todos receberam antibioticoterapia via endovenosa. Cerca de 33, 4% destes pacientes necessitaram também de intervenção cirúrgica. As complicações orbitárias das sinusites agudas podem implicar morte do paciente, requerendo pronta intervenção do médico. A tomografia computadorizada e a ressonância magnética nuclear são de grande auxílio no diagnóstico destas complicações.

Abstract:
From 1982 to 1992, 63 patients presented to our service with orbital complications of sinusitis. In this report we will analyze our clinical material with emphasis on the type of orbital complication, clinical presentations and radiographic fèndings. There was a higher incidence of complications in the second decade of life (49,2%) and 87,3% of the cases occurred until the third decade of life. The main complains wexe orbital swelling (96,8%), orbital erythema (74,6%), and rhinorrhea (69,8%). The most frequent radiographic ftndings (x-ray, CT MRI) were pansinusitis (42,8%), maxila - ethmoidal sinusitis (28,6%) and maxillaty sinusitis (15,9%). All patients were treated with intravenous antibiotics, and surgety was performed in 33,4% of the patients. Almost all patients (98,4%) had a good out comeand one patient died (cavernous sinus thrombosis). Orbital complications of sinusitis can bea life threatening condition. CT and MRI are a great aid in the diagnosis of these complications.

INTRODUÇÃO

Desde o advento dos antibióticos as complicações das sinusites tornaram-se pouco freqüentes 1,2. Todavia estas complicações ainda ocorrem, sendo que um diagnóstico precoce e a instalação de uma terapêutica adequada são fatores fundamentais na determinação do prognóstico do paciente.

As principais complicações das sinusites são as orbitárias 3,4 Isto pode ser explicado pela íntima relação anatômica entre a órbita e os seios paranasais. Outro fator importante são as veias oftálmicas, que, por não possuírem válvulas, permitem a disseminação da infecção para dentro da órbita 3,5.

O principal grupo etário acometido é o pediátrico. Schrammb descreveu 134 pacientes com complicações orbitárias das sinusites. Três quartos destes pacientes tinham menos de 16 anos de idade.

No quadro I encontramos a classificação proposta por Chandler7 e por Smith e Spencer 8, em que são descritas as manifestações clínicas de cada estágio da infecção orbitária.
A tomografia computadorizada (TC) é de grande valor no diagnóstico e no acompanhamento das sinusites complicadas, com uma precisão de 50 a 100% nos pacientes portadores de abscessos 2,9-10,11.12.

A primeira linha de tratamento sugerida para todos os tipos de complicações orbitárias são os antibióticos de uso endovenoso 1,4,6,9,10. A maioria dos pacientes, grupo 1 e 2 de Chandler, melhoram apenas com antibióticos.

Nos pacientes dos grupos 3, 4 e 5 a intervenção cirúrgica pode se fazer necessária 6,13.

O objetivo deste trabalho é determinar as principais manifestações clínicas, achados radiológicos e terapêutica instituída nos diversos tipos de infecção orbitária por sinusites.

MATERIAL E MÉTODO

Foram incluídos neste trabalho 63 pacientes internados no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, no período entre janeiro de 1982 e dezembro de 1992, todos com complicações orbitárias de sinusites.

No estudo retrospectivo destes pacientes foi dada ênfase para: idade, sexo, tipo de complicação, apresentação clínica, achados radiológicos, tratamento e evolução.

RESULTADOS

A idade dos pacientes variou de 10 a 60 anos, com uma idade média de 18 anos. A maior parte dos pacientes (87,3%) possuíam menos que 30 anos, sendo que 49,2% do total de pacientes encontravam-se na segunda década de vida.
Houve um predomínio do sexo masculino (68,2%), com uma relação homem/mulher de 2, 15:1.


Os pacientes foram classificados segundo a classificação de Chandler (tabela II). Dos 63 pacientes estudados, 09 (14,3%) pertenciam ao grupo I, 31 (49,1%) ao grupo II, 19(30,2%) ao grupo III, 03 (4,8%) ao grupo IV e 01(1,6%) ao grupo V (quadro 11).

Na figura 1 nota-se a presença de intensa celulite em região palpebral superior direita em um menino de 14 anos. A TC em corte axial deste mesmo paciente demonstra o acometimento das células etmoidais anteriores também do lado direito (figura 2). No corte coronal percebe-se a presença de abscesso subperiostal, acometendo o globo ocular direito (figura 3).

Os principais sinais e sintomas foram: edema periorbitário, rinorréia, abaulamento frontal, proptose e cefaléia (quadro III).

O estudo radiológico demonstrou a presença de pansinusite em 27 pacientes (42,8%), sinusite maxilo - etmoidal em 19 (28,6%), sinusite maxilar em 10 (15,9%), sinusite fronto - etmoidal em 8 (12,7%) e sinusite esfenoidal em 01 (1,6%). Estes dados estão representados no gráfico I.

Dos 63 pacientes com patologias orbitárias decorrentes de sinusite, 6 (9,5%) evoluíram com complicação intracraniana concomitante. As infecções intracranianas observadas foram: meningite (1), abscesso subdural (1), abscesso extradural (2) e abscesso de lobo frontal (2).

O tratamento utilizado em todos os pacientes foi a antibioticoterapia endovenosa. O esquema preconizado de antibióticos foi a associação de penicilina cristalina com aminoglicosídio ou cefalosporina de terceira geração. Em média os pacientes ficaram internados 5,2 dias, depois do que passaram a fazer uso de antibióticos pela via oral. Em 21 pacientes (33%) foi necessário o procedimento cirúrgico.

Os pacientes foram acompanhados por pelo menos OS meses, sendo que 59 pacientes (93,7%) evoluíram bem. Em 3 pacientes (4,8%) foi necessária uma segunda intervenção cirúrgica, após a qual também tiveram boa evolução. Uma paciente (1,6%), portadora de sinusite esfenoidal, evoluiu com trombose de seio cavernoso e ao óbito, antes que se pudesse instituir qualquer terapia cirúrgica.


QUADRO I - Classificação das complicações orbitárias



QUADRO II - Classificação dos pacientes



QUADRO III - Principais sinais e sintomas





Gráfico I - Achados Radiológicos



FIGURA 1 - Face de um jovem com celulite periorbitária



FIGURA 2 - TC axial demonstrando velamento das células etmoidais anteriores (lado direito)



FIGURA 3 - TC coronal mostrando presença de abscesso subperiostal (lado direito)



DISCUSSÃO

As complicações orbitárias das sinusites são as mais freqüentes 1,4 Os principais fatores que contribuem para a infecção da órbita são7:

- proximidade anatômica da órbita com os seios paranasais;
- presença da lâmina papirácea na parede medial da órbita. Por tratar-se de estrutura óssea extremamente fina, oferece pouca resistência à disseminação local da infecção entre o seio etmoidal e a órbita.
- presença das veias oftálmicas comunicando os seios com a órbita. Por serem desprovidas de válvulas, facilitam a disseminação da infecção pela via hematogênica.

Na nossa série de pacientes, a grande maioria (73%) possuía menos que 20 anos, o que está de acordo com a literatura 1,3,6 .

Os achados radiológicos (RX e TC) demonstraram a presença de etmoidite em 53 pacientes (84,1%), sugerindo que a mesma desempenha um papel importante na disseminação da infecção para a órbita.

O tratamento empregado em todos os pacientes foi o uso de antibióticos via endovenosa. O uso da associação de penicilina cristalina com aminoglicosídio ou cefalosporina de terceira geração mostrou-se eficaz, não sendo encontrado patógeno resistente às três drogas. A intervenção cirúrgica foi realizada quando

1 - Havia evidência de abscesso no ultra-som ou na TC.

2 - A celulite periorbitária não evoluiu bem, mesmo após 24 a 48 horas de antibioticoterapia endovenosa I adequada.

3 - Havia alterações da acuidade visual.

Todos os pacientes dos grupos 1 e II (quadro II) responderam bem ao tratamento com antibióticos, não necessitando de intervenção cirúrgica. O mesmo não ocorreu nos grupos Me IV, onde 21 pacientes (95,5%) foram submetidos a cirurgia. As principais cirurgias realizadas foram: etmoidectomia, sinusectomia frontal, Caldwell Luc, punção maxilar e drenagem de abscesso orbitário.

O único paciente do grupo V veio ao pronto-socorro com quadro de celulite periorbitária e alterações da acuidade visual (figura 4). Os exames radiográficos demonstraram sinusite esfenoidal e trombose de seio cavernoso (figuras 5 e 6). Foi indicada intervenção cirúrgica imediata 14, porém o paciente evoluiu rapidamente para óbito.

CONCLUSÕES

As complicações orbitárias das sinusites são graves e podem evoluir para o óbito do paciente. O uso da TC e do ultra-som são de grande auxílio no diagnóstico e no acompanhamento destas patologias e devem ser utilizados sempre que possível. O diagnóstico precoce e a introdução de terapêutica efetiva são fundamentais na determinação do prognóstico destes pacientes.



FIGURA 4 - Paciente portadora de trombose de seio cavernoso esquerdo. A figura mostra a proptose do mesmo lado.



FIGURA 5 - RNM em corte axial, mostrando sinusite esfenoidal esquerda.



FIGURA 6 - RNM com contraste (Tl) em corte axial, mostrando sinusite bilateral.




REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA

1 - PAPARELLA, M. M., SHUMRICK, D. A., Otolaryngology, vol. 3 Head and Neck. WB Saunders, Philadelphia, 1991, Chapter 4.
2 - SKEDROS, D. G., HADDAD, J., BLUESTONE, C., et al. Subperiosteal Orbital Abscess in Children: Diagnosis, Microbiology and Management. Laryngoscope, 103: 28 - 32, 1993.
3 - HARRINGTON, P. C., Complications of Sinusitis. Ear, Nose and ThroatJournal, 63: 163 - 171, 1984.
4 - ELANGO S., KRISHNA REDDY TN. Orbital Complications of Acute Sinusitis. Singapore Med. J., 31: 341 - 344, 1990.
5 - SANBORN, G. E., KIVLIN, J. D., and STEVEN M. Optic Neuritis due to Sinus Surgery. Arch Otolaryngol, 110: 816 - 819, 1984.
6-SCHRÁMM, V. L., MYERS, E. N., KENNERDELL, J. S., Orbital Complications of Acute Sinusitis: Evaluation, Management and Outcome. Traus. Am. Acad. Ophthalmol. Otolasyngol., p. 221, 1978.
7 - CHANDLER, J. R., LANGENBRUNNER, D. J., STEVENS, E. R., The Patogenesisof the Orbital Complications in Acute Sinusitis. Laryngoscope, 80: 1414 - 1418, 1970.
8 - SMITH, A. F., SPENCER, J. F. Orbital Complications resulting from Lesions of the Sinuses. Ann OtolMnolUryngol, 57: 5 - 27, 1948.
9 - GOODWIN, W. J., WEINSHALL, M. and CHANDLER, J.: The Role of High Resolution Computerized Tomography and standardized Ultrasound in the Evaluation of Orbital Cellulitis. Latyngoscope, 92: 728 - 731, 1982.
10 - GOLDBERG, F., BERNE, A. S. and OSKI, F. A. Diferentiation of Orbital Cellulitis From Preseptal Cellulitis by Computed Tomography. Pediatrics, 62: 1000 - 1005, 1978.
11 - ZIMMERMAN, R. A. and BILANIUK, L. T. CT of Orbital infection and Its Complications. AJR,134: 45 -50,1980.
12 -GUTOWSKI, W. M., MULBURY, P. E., HENGERER, A. S., et al. Role of CTScans in Managing the Orbital Complications of Ethmoiditis. Int. J. Pediam. Otorhinolaryngol, 15: 117 - 128, 1988.
13 - GANS, H., SEKULA, J., WLODYKA J. Treatment of Acute Orbital Complications. Arch Otorhinolaryngol, 100: 329 - 332, 1974.
14-MANIGLIA, A. J., KRONBERG, F. G., CULBERTSON, W. Visual Loss Associated with Orbital and Sinus Diseases. Latyngoscope, 94: 1050 -1059, 1984.




* Médicos pós - graduandos da Disciplina de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.

** Professor Associado da Disciplina de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clinicas da Universidade de São Paulo.

*** Professor Titular da Disciplina de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.

Trabalho realizado na Disciplina de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clinicas da Universidade de São Paulo, e LIM 32.

Av. Dr. Eneas de Carvalho Aguiar, 255 - 6° andar - sl 6021. São Paulo - SP - Brasil. CEP 05403-000.
Artigo recebido em 28/10/93. Artigo aceito em 30/11/93.

Imprimir:

BJORL

 

 

 

 

Voltar Voltar      Topo Topo

 

GN1
All rights reserved - 1933 / 2024 © - Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial