Ano: 2000 Vol. 66 Ed. 6 - Novembro - Dezembro - (13º)
Seção: Artigos Originais
Páginas: 660 a 664
ESTUDO ABERTO MULTICÊNTRICO DO USO DE BRONCHO-VAXOM® NO AUXÍLIO DO TRATAMENTO E PREVENÇÃO DE INFECÇÕES COMUNITÁRIAS DO TRATO RESPIRATÓRIO EM CRIANÇAS.
An Open Multicenter Study Using Broncho-Vaxom® as an Adjunt Therapy for the Treatment a Prevention of Respiratory Community Aquired Infections in Children.
Autor(es):
Shirley S. N. Pignatari*,
Luc L. M. Weckx**,
Aldo C. Stamm***.
Palavras-chave: Broncho-Vaxom®, imunoestimulante
Keywords: Broncho-Vaxom®, imimostimulant
Resumo:
Introdução Vários estudos controlados na Europa têm mostrado a eficácia do Broncho-Vaxom® (imunoestimulante oral contendo frações bacterianas) no auxílio ao tratamento e prevenção de infecções respiratórias em crianças. Entretanto, até o momento, não é do nosso conhecimento nenhuma publicação referente à sua utilização no tratamento destas afecções na população infantil em nosso meio. Objetivo: No presente estudo, os autores avaliam a eficácia e segurança do Broncho-Vaxom® no tratamento e prevenção de doenças respiratórias de 792 crianças com idade entre 6 meses e 12 anos, atendidas em vários centros médicos do Brasil com diagnóstico de otite média, sinusite, bronquite/pneumonia e faringotonsilites recorrentes. Material e método: Os pacientes foram avaliados através de critérios objetivos e subjetivos. O diagnóstico foi baseado em critérios pré-estabelecidos da história clínica e exame físico, e radiografia simples. Broncho-Vaxom® foi prescrito por 10 dias (3,5 mg/dia em uma tomada), e os pacientes foram reavaliados no 30°, 60° e 90° dias após o primeiro dia de medicação. Resultados: De forma geral, na maioria os pacientes apresentaram uma melhora acentuada dos quadros de infecção, com ausência de infecção neste período, e/ou aumentando o intervalo entre as infecções e/ou com diminuição da gravidade dos sintomas e/ou com redução do período de sintomatologia. Conclusão: Os efeitos adversos observados foram leves, na maioria relacionados com o sistema gastrointestinal (vômitos, náusea e diarréia) em 6% das crianças, sendo que em nenhuma uma delas o tratamento foi interrompido.
Abstract:
Introduction: Controlled clinical studies in Europe have already shown-the efficacy of Broncho-Vaxom® (an oral immunomodulating Material lysate) for the treatment and prevention of bronchitis, sinusitis, pharyngitis and otitis media in children. However, it is not of our knowledge any studies of Broncho-Vaxom® in children with respiratory infections in our population. Aim: In order to validate, the efficacy and safety of Broncho-Vaxom® the authors evaluated the treatment of 792 children assisted in several medical centers in Brasil, ages 6 months to 12 years, referred for recurrent otitis media, recurrent sinusitis, recurrent bronchitis/pneumonia and recurrent pharyngitis/tonsilitis. Material and methods: The patients were evaluated both by subjetive and objective criteria. The diagnosis was based on a standardized history and physical examination and roentgenograms. Broncho-Vaxom® was prescribed for 10 days (3,5 mg/day once a day), for 3 consecutive months. They were reevaluated at 30, 60 and 90 days after the first day of medication. Results: Overall, most of the patients presented excellent and good results, with absence of infections in 90 days, and/or increasing the period between infections and/or reducing the gravity or the time lasting of infections. Conclusion: Overall, minor adverse reactions were observed in 6% dos patients (vomit, diarrhea, nausea). There was no report of interruption of the treatment.
INTRODUÇÃO
As infecções respiratórias, consideradas moléstias extremamente freqüentes na infância, são sabidamente a causa mais comum de administração de antibióticos nesta população. Os agentes etiológicos bacterianos da otite média aguda e rinossinusite são bem estabelecidos, e entre os microorganismos mais importantes estão o Pneumococo, Haemophilus influenzae, e, por último, a Moraxella catarrhalis3, 13.
A pneumonia (PN) - embora seja uma infecção de vias respiratórias inferiores, que pode atingir brônquios, bronquíolos, alvéolos, interstício pulmonar e, eventualmente, o revestimento pleural - apresenta também como agentes etiológicos bacterianos mais comuns na infância o Pneumococo e o Haemophilus influenzae4.
Em relação às faringoamigdalites, o agente bacteriano mais importante continua sendo o Streptococo Beta Hemolítico 1o Grupo A, responsável no nosso meio por pelo menos 30% dos casos6.
Apesar de serem clinicamente distintas, as infecções respiratórias freqüentemente apresentam fatores desencadeantes comuns, principalmente os quadros de resfriados e infecções virais (IVAS); e apresentam etiologia bacteriana semelhante e não infrequentemente concomitantes. Atualmente, existe uma grande preocupação em relação ao aumento de microorganismos resistentes, já tendo sido observada em vários estudos uma grande porcentagem de Haemopliluse Moraxella catarrhalis produtoras de B lactamase; e ainda uma pequena percentagem, porém emergente, de Pneumococo penicilino-resistentes, representando um grande problema na seleção apropriada da terapêutica antimicrobiana2, 3, 11. Acredita-se que a utilização empírica exagerada de antimicrobianos no tratamento dessas afecções seja um dos fatores que vem contribuindo para estas mudanças na flora bacteriana11.
Os extratos bacterianos têm sido propostos há muitos anos para estimular a resposta do sistema imune, aumentando a proteção contra infecções. O Broncho-Vaxom® é um lisado bacteriano composto por frações das seguintes bactérias: Haemophilus influenzae, Streptococcus pneumoniae, Klebsiella pneumoniae e ozaenae, Sthaphilococcus aureus, Streptococcus pyogenes e viridans, Moraxella catarrhalis, e atua estimulando as defesas naturais do organismo; e vários estudos têm demonstrado que o Broncho-Vaxom® diminui a freqüência e a duração das infecções respiratórias em crianças, reduz a intensidade dos sintomas, permitindo a redução do tempo e utilização de antibioticoterapia1, 2, 15. As pesquisas científicas têm também demonstrado que o Broncho-Vaxom® atua como fator significante à melhora dos parâmetros imunológicos, que envolvem o sistema imune não específico. Tem sido demonstrado que estes extratos levam à estimulação de NADPH, a expressão de moléculas de adesão, assim como a síntese de citoquinas, como por exemplo o TNF-alfa-e o li.-2, além de estimular a produção de IgA na secreção pulmonar5, 6, 9, 12, 15.
No presente estudo, os autores fazem uma avaliação da eficácia e tolerância do Broncho-Vaxom® no tratamento auxiliar e prevenção de infeções respiratórias recorrentes em crianças da nossa população.
CASUÍSTICA E MÉTODO
Foram avaliadas 792 crianças, com idade entre 6 meses e 12 anos, com diagnóstico de otite média recorrente (49 pacientes), sinusite recorrente (62 pacientes), bronquite/ pneumonia recorrente (42 pacientes) e faringoamigalite recorrente (159 pacientes). Crianças em número de 480 apresentavam infecções recorrentes associadas.
Foram incluídas neste estudo crianças com história clínica consistente de infecções recorrentes do trato respiratório - pelo menos três episódios nos últimos seis meses ou quatro ou mais no último ano. Foram excluídos os pacientes com idade inferior a seis meses, portadores de doenças imunodebilitantes, malformação cranio-facial ou que tivessem utilizado terapia imunoestimulante nos últimos seis meses. O diagnóstico de otite média foi baseado no quadro clínico, tendo sido considerados critérios mínimos obrigatórios a presença de otalgia acompanhada de mais dois sinais ou sintomas: irritabilidade/ febre, otorréia e otoscopia característica; redução de mobilidade dá membrana timpânica, hiperemia/ opacificação. O diagnóstico de sinusite baseou-se no quadro clínico, que incluiu; obstrução nasal acompanhada de dois ou mais parâmetros: rinorréia mucopurulenta, tosse e febre, acompanhadas de edema periorbitário e/ou cefaléia e exame radiológico compatível; opacificação difusa ou nível líquido ou espessamento mucoso maior que 4 mm; e/ou exame endoscópico nasal visualizando secreção purulenta em meato médio.
Em relação ao diagnóstico de pneumonia/ bronquite, considerou-se tosse acompanhada de dois ou mais sinais ou sintomas: febre, ausculta compatível, irritabilidade, diminuição do apetite, expectoração mucopurulenta e radiografia simples de tórax compatíveis com infecção bacteriana.
Para o diagnóstico de faringoamigdalite, considerou-se dor de garganta associada a pelo menos mais dois parâmetros: edema, híperemia, exsudato, febre, gânglios cervicais, irritabilidade e diminuição do apetite.
Após obtenção do consentimento informado pelos responsáveis, as crianças foram medicadas com Broncho-Vaxom® na dose de 3,5 mg/dia, em uma tomada por um período de 10 dias, em três meses consecutivos.
A eficácia do tratamento foi verificada pela presença ou ausência de infecções, pelo aumento dos intervalos entre as infecções e pela diminuição do tempo de doença, assim como da intensidade dos sintomas verificdos nas visistas dos dias 30, 60 e 90 após o inicio do tratamento.TABELA 1 - Características demográficas das crianças estudadas.
Considerou-se como objetivo atingido o relato de qualquer uma das ocorrências acima; e objetivo não atendido, a manutenção ou piora dos parâmetros avaliados. A avaliação do tratamento foi também realizado subjetivamente pelo responsável e pelo médico investigador, em excelente, bom, regular e insatisfatório.
A aderência ao tratamento foi avaliado pela utilização ou não da medicação, controlada pela devolução da embalagem. A tolerância á medicação foi verificada pela informação espontânea de possíveis eventos adversos nas três visitas posteriores ao início da medicação.
RESULTADOS
Foram incluídas 792 crianças neste estudo multicêntrico, portadores de infecções respiratórias recorrentes: 49 com história de otite média, 62 com sinusite, 159 com faringoamigdalites, 42 com bronquite/ pneumonia; 480 com infeções associadas.
Características demográficas das crianças estudadas
A idade das crianças variou de 6 meses a 12 anos, com média de 5,1 anos, sendo 437 pacientes (55,2%) do sexo masculino e 355 (44,8%) do sexo feminino (Tabela 1).
Avaliação de eficácia do tratamento
a) Número de infeções durante -o período de avaliação.
A avaliação objetiva dos quadros infecciosos mostrou que a porcentagem de pacientes que apresentaram infecções no período de avaliação diminuiu significantemente a partir do 30° dia de estudo (Figura 1).
b) Objetivos atingidos.
Os objetivos foram atingidos em 97,9% dos casos (ausência de infecções nos 3 meses de estudo e/ou aumento dos intervalos entre infecções, e/ou diminuição do tempo de duração de cada quadro, e/ou diminuição da gravidade dos - sinais e sintomas) (Tabela 2 e Figura 2).
Figura 1. Diagnóstico de infecção nos intervalos e no momento das avaliações*.
*Teste de Friedman: significante a partir do dia 30.
TABELA 2 - Porcentagem de crianças que apresentaram ausência de infecções, aumento do intervalo entre as infecções, diminuição da duração e diminuição dos sinais e sintomas nos quadros infecciosos.
Figura 2. Porcentagem de pacientes que atingiram os objetivos do estudo. Aderência ao tratamento
Figura 3. Porcentagem de pacientes que aderiram ao tratamento proposto.
Aderência ao tratamento
A aderência ao tratamento foi de 98,9% dos casos, isto é, 780 pacientes utilizaram a medicação conforme a orientação recebida (Figura 3).
Avaliação do tratamento segundo o responsável pelo paciente.
Na avaliação subjetiva feita pelo responsável, o tratamento foi considerado excelente ou bom em 93,6% dos casos, regular em 4,7% e insatisfatório em 1,7% (Figura 4).
Avaliação do tratamento segundo o médico investigador
O pesquisador classificou subjetivamente o tratamento com Broncho-Vaxom® como excelente ou bom em 95,2% dos casos, regular em 3,3% e insatisfatório em 1,5% (Figura 5).
Tolerabilidade ao Broncho-Vaxom®
Foram observados eventos adversos em 6,3% dos pacientes. As queixas mais freqüentes foram diarréia, vômitos, epigastralgia e náuseas.
DISCUSSÃO
As infecções respiratórias comunitárias são freqüentemente diagnosticadas na população infantil, motivo de muitas consultas médicas e importante razão para a prescrição de antibióticos; costumam apresentar o pico de incidência na época do inverno, geralmente precedidas por um quadro de IVAS. Embora representem um problema de saúde importante na criança, o seu diagnóstico correto e o tratamento ideal são ainda motivo de dúvida e discussão4, 10, 11.
Os agentes etiológicos considerados mais freqüentes nas otites, rinossinusites e bronquites/ pneumonias comunitárias são o Pneumococo e Haemophilus influenzae, responsáveis pela grande maioria dos casos, enquanto que nas faringoamigdalites, o Streptococcus pyogenes continua sendo o mais importante.
Figura 4. Avaliação final do tratamento segundo o responsável pelo paciente.
Figura 5. Avaliação final do tratamento segundo o médico investigador.
Vários esquemas terapêuticos têm sido utilizados ao longo dos anos para o tratamento destas afecções, principalmente às custas da utilização empírica de antibióticos3, 4, 11, 13.
No presente estudo, procuramos avaliar a eficácia clínica no tratamento da OMA, SA e PN comunitária em crianças, utilizando o Broncho-Vaxom® (3,5 mg/dia em uma tomada por 10 dias, em três meses consecutivos). Embora se trate de um estudo aberto não controlado, estudos prévios com grupo controle/ placebo têm sido consistentes em demonstrar a melhora clínica significativa quando o Broncho-Vaxom® é utilizado1, 15.
Dos 792 pacientes que iniciaram esquema terapêutico com Broncho-Vaxom®, 780 terminaram o tratamento segundo a orientação médica, demonstrando um alto índice de aderência ao tratamento instituído.
A grande maioria das crianças incluídas neste projeto, independentemente do tipo de doença respiratória, nitidamente apresentaram redução do número de infecções, além de outros paranietros de melhora, corno por exemplo o aumento do intervalo entre as infecções e redução no tempo e gravidade dos quadros infecciosos.
A avaliação subjetiva da eficácia, tanto dos responsáveis quanto pelo paciente, foi considerada excelente ou boa em mais que 90% dos casos.
O Broncho-Vaxom® mostrou-se também uma droga segura, apresentando poucos efeitos adversos, a maioria de pequena intensidade, relacionada a sintomas gastrointestinais (diarréia, náusea, vômito), não levando nenhum paciente a interromper o estudo.
Os dados apresentados mostram que o Broncho-Vaxom® pode ser um excelente auxílio, e uma arma valiosa entre o arsenal terapêutico e preventivo das infecções respiratórias comunitárias na população infantil, pois a porcentagem de pacientes com melhora clínica observada é de quase 100%. Novos estudos com grupo controle duplo-cegos, multicêntricos com período mais longo de seguimento, seriam importantes para complementar este projeto inicial.
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* Professora Colaboradora, Disciplina de Otorrinolaringologia Pediátrica da UNIFESP-EPM. Responsável pelo Setor de Otorrinolaringologia Pediátrica do COF - Hospital Professor Edmundo Vasconcelos.
** Professor Livre-Docente e Chefe da Disciplina de Otorrinolaringologia Pediátrica da UNIFESP-EPM.
*** Professor Colaborador, Disciplina de Otorrinolaringologia Pediátrica da UNIFESP-EM. Diretor do Centro de Otorrinolaringologia e Fonoaudiologia de São Paulo - Hospital Professor Edmundo Vasconcelos.
Endereço para correspondência: Dra. Shirley S. N. Pignatari - Rua Vergueiro 3645 - Apto. 808 - Vila Mariana - 04101-300 São Paulo/ SP - Telefone: (0xx11) 5579-4502 - Celular: (0xx11) 9905-6653 - E-mail: pigna@terra.com.br
Artigo recebido em 28 de setembro de 2000. Artigo aceito em 6 de outubro de 2000.