Versão Inglês

Ano:  1993  Vol. 59   Ed. 3  - Julho - Setembro - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 176 a 180

 

INFECÇÃO FOCAL. EVOLUÇÃO DO CONCEITO. A BACTERIDE.

Focal infection. Evolution of concept. The bacteride.

Autor(es): Hélio Hungria*

Palavras-chave: infecções, imunologia

Keywords: infections, immunology

Resumo:
O autor relata o prestígio do conceito de Infecção Focal, tido como responsável por quase todas as entidades patológicas até a década de 40. Desta época em diante, diversas doenças foram sendo devidamente avaliadas como decorrentes de outros fatores etiológicos. O conceito de Infecção Focal chegou a ser totalmente negado. No entanto, em determinadas eventualidades clínicas de origem obscura, alguns autores na atualidade ainda pesquisam a possível etiologia infecciosa em acordância à "conceituação de bacteride", baseados em comprovações imunológicas do mais elevado teor científico da moderna Imunologia, como descrito neste trabalho.

Abstract:
The author relates the prestige of the concept of Focal Infection as being responsible for almost all the deseases up to the forties. From then on, several deseases have been found as coming from other etiologic factors. the concept of focal infection was at certain period totally denied. However, in some clinical eventualities of obscure etiology, some authors still research a possible infections etiology, according to the "concept of bacteride", based on proved immunologie researches of the highest cientific quality of modern Immunology, as is described in this article.

CONSIDERAÇÕES GERAIS

Contestado atualmente pela quase totalidade dos autores, o conceito de infecção focal, em algumas eventualidades clínicas, ainda não pode ser relegado em caráter definitivo. O antigo prestígio, contudo, praticamente desapareceu, como demonstra as precárias publicações científicas sobre o tema nestas últimas quatro décadas. Nos raros casos clínicos em que persistem discussões sobre possibilidade de infecção focal, a patogênese é, entretanto, interpretada sob novos pontos de vista, de caráter imunológico, como veremos no final deste trabalho.

O conceito clássico sobre infecção focal é de que os germes, ao nível dos focos, vivem em estado de relativa "latência", produzindo sintomatologia local discreta ou mesmo não a produzindo, mas invadindo o organismo intermitentemente, de modo quase imperceptível, através de pequenos surtos de bacteremia ou de toxemia, acarretando, em conseqüência, quadro sintomático infeccioso sistêmico, traduzido por astenia, adinamia, febricula vesperal, com freqüente dores musculares esparsas, por vezes metástases infecciosas em determinados departamentos orgânicos. As principais causas de infecção focal seriam oriundas de focos fechados (Vogel, 1942): granulomas de ápices dentários e criptas amidalinas infectadas e isoladas da cavidade faríngea em conseqüência de aderências ou sinéquias decorrentes de amidalites agudas prévias.

Infecção focal e amigdalectomia é tema antigo e controverso, persistindo ainda, por vezes, motivo de discussões entre clínicos, pediatras e otorrinolaringologistas; nas décadas de 40 e 50 chegou a extrapolar do âmbito científico para a imprensa leiga, visando a esclarecimentos ao público.

Após conferência de Hunter sobre oral sepse, nos Estados Unidos, em 1910, em que este autor criticava veementemente o tratamento conservador de focos dentários, aconselhando sempre sua remoção cirúrgica, cresceu progressivamente o entusiasmo pela teoria da infecção focal. Algum tempo após, Billings veio a relacionar os focos de infecção crônica, amigdalianos e dentários, com a nefrite e a artrite.

Nos vinte e poucos anos que se seguiram, descambou-se para exagero incontrolado, de sorte que um sem número de dentaduras e amídalas palatinas foram inutilmente sacrificadas.

Quaisquer órgãos ou tecidos que contivessem germes eram considerados como foco de infecção. Chegou-se, assim, ao absurdo de se conferir aos focos de infecção um papel etiológico em quase todos os estados patológicos apresentados pelos pacientes. Comprovada a existência de um foco, era ele sumariamente removido, apesar de o indivíduo não apresentar nenhuma manifestação mórbida.

Da fase de verdadeiro delírio das remoções sistemáticas dos focos de infecção, passou-se, de 1940 em diante, a um período de descrédito quase absoluto por parte de grande número de autores sobre o valor dos focos de infecção, para se chegar a um conceito de mais bom senso e equilíbrio, com a limitação das fronteiras da infecção focal. Diversas manifestações mórbidas, atribuídas até então à infecção focal, foram sendo devidamente avaliadas como decorrentes de outros fatores etiológicos, como veremos a seguir.

CONCEITUAÇÃO CLÍNICA ATUAL

A favor do conceito de infecção focal era clássico apontar-se a endocardite infecciosa como relacionada à infecção estreptocócica amigdaliana ou dentária, indicando-se, desde logo, a extração cirúrgica do foco. Outrora, a maioria das endocardites infecciosas era assinalada em coração portador de doenças valvulares ou congênitas, que constituíam assim causas predisponentes importantes. A partir da década passada, a fisionomia clínica da endocardite infecciosa se modificou por influência de vários fatores e hoje considera-se que cerca da metade dos casos incide em coração previamente normal.

Atualmente, os cardiologistas não mais indicam extração de focos infecciosos como intuito de profilaxia de endocardite, como chegou a ser norma de conduta do passado. Contudo, se paciente com endocardite tiver necessidade, por motivo odontológico, de extrair um dente infectado, os cardiologistas ainda prescrevem antibioticoterapia no pré, per e pós-operatórios, preocupados com o risco de surtos de bacteremia decorrente do ato operatório e conseqüente agravamento da cardiopatia, embora esta conduta tenha sido contestada como desnecessária em extenso estudo comunitário realizado na Holanda (Vander Meer e cols., 1992).

Os focos de infecção, dentários ou amigdalianos, eram sumariamente removidos em diversas oftalmopatias (irites, iridociclites, uveites, coreorretinites), o que não mais ocorre, pois outros fatores etiológicos vêm sendo definidos, como por exemplo a toxoplasmose, responsável por significativa percentagem de casos de uveite em várias partes do mundo, sendo que no Brasil é a causa mais freqüente, encontrada em aproximadamente 50% dos casos (Nóbrega e Belfort, 1987). Outras oftalmopatias: irites, iridociclites e coreorretinites estão relacionadas à sarcoidose, tuberculose, sífilis, hanseníase, doente de Behçet (Oreice e Belfort,1987); esta última parece ser de caráter imunológico e compromete todo o organismo: aftas na boca e no prepúcio, vasculites (Wolf e Winkelmann, 1980), eritema nodoso, panuveite, etc.

No âmbito da dermatologia, no entanto, alguns autores ainda referem a responsabilidade de focos infecciosos amigdalianos pela bacteride pustulosa, que é uma desidrose infectada das regiões palmares e plantares. Em estudos recentes, Uehara (1991) pondera que os linfócitos das amídalas palatinas seriam sensibilizados por antígeno epitelial modificado pela infecção bacteriana e atuariam como auto-antígenos, responsáveis por reação tipo fenômeno de Arthus ao nível das regiões palmares e plantares. Segundo o autor a amidalectomia proporcionaria bons resultados nestes casos. A maioria dos dermatologistas, no entanto, atualmente relacionam a bacteride pustulosa como fase evolutiva da psortase, que se caracteriza por lesões eritêmato-escamosas da pele e configuram variadas formas clínicas, de causa indeterminada (Fitzpatrick, 1987).

Alguns casos de psoríase guttata (em forma de gotas), principalmente em jovens, respondem bem à terapêutica contra infecção estreptocócica, de presumível origem rinofaríngea.

Rabelo (1980) assinala que Norlind "em sucessivas publicações procurava mostrar as conexões entre infecções agudas da psoríase, especialmente do tipo guttata, com infecções estreptocócicas das vias superiores".

Kiyonori e Tabata (1983) especulam também que a infecção focal amigdaliana (antígenos bacterianos) seria responsável por esta pustulose palmoplantar e, segundo outros autores, também pela glomerulonefrite.

O eritema nodoso seria outro exemplo de infecção focal. Na atualidade, entretanto, considera-se o eritema nodoso (vasculanite septal do tecido adiposo), como decorrente de hipersensibilidade medicamentosa, principalmente pelas sulfas, bem como de estreptococcia faríngea (mesmo em paciente já submetido à amidalectomia), de lepra, tuberculose, viroses, etc.

A respeito destas breves considerações sobre a conceituação clinica atual do tema, desejamos assinalar alguns casos particulares de relevância, como focos de infecção e febre reumática, glomerulonefrite aguda, bronquiectasia e asma, sobre os quais ainda persistem mal-entendidos e controvérsias na prática médica.

Foco de Infecção e Febre Reumática

Devido a razões que em seguida vamos expor, não se deve indicar a remoção de focos amigdalianos, como ainda se verifica na prática, principalmente por parte do otorrinolaringologista, com a finalidade de prevenir a febre reumática. Esta ocorre, como se sabe, após infecção aguda da faringe, desencadeada pelo estreptococo beta-hemolítico tipo A de Lancefield. A cápsula deste estreptococo possui constituição bioquímica antigênica semelhante à das miofibrilas cardíacas. Em vista disto, este estreptococo pode gerar anticorpos órgão-específico de músculo cardíaco, que reagem com o sarcolema destas miofibrilas, numa reação cruzada. É um mecanismo imunológico de auto-agressão por meio de imuno complexos Ag-Ac que iriam determinar as diferentes lesões poliarticulares e cardíacas da febre reumática após fixação com o complemento (proteína sangüínea).

Em cada 100 casos de infecção estreptocócica aguda faríngea, febre reumática incide apenas em 3% dos pacientes. Parece haver, portanto, um fator genético de predisposição para produzir anticorpos e, logicamente, imuno complexos Ag-Ac que vão participar deste mecanismo de auto-agressão. Portanto, só faz uma reação desta natureza "quem pode e não quem quer" (Gurka, Ohman e Rossernwasser, 1989).

Estudos estatísticos demonstram que a cardite reumática pode instalar-se, em proporções semelhantes, tanto em pacientes já operados de amidalectomia como naqueles não operados. A amidalectomia, portanto, não impede a eclosão de surtos, recorrentes posteriores de febre reumática, daí o absurdo da indicação cirúrgica. Por isso mesmo, atualmente é uso corrente, em cardiologia, a administração periódica de penicilina benzatina (1.200.000 unidades), de 3/3 ou de 4/4 semanas, durante anos, até a idade adulta, nas crianças vítimas de febre reumática, mesmo já submetidas à amigdalectomia, como medida preventiva de surtos de estreptococcia faríngea aguda.

Foco de Infecção e Glomerulonefrite

A glomerulonefrite aguda pode ser desencadeada por certas cepas de estreptococos que invadem o tecido renal e, em conseqüência, gerariam antígenos estranhos, not-self, responsáveis por reação antígeno-anticorpo do tipo auto-agressão. Poder-se-ia também justificar a glomexulonefrite aguda pelo mecanismo de reação cruzada, como se propõe para a febre reumática, isto é, os estreptococos nefritogênicos, dos tipos 4 e 12, teriam antígenos de superfície de constituição bioquímica semelhante à dos glomérulos, o que daria ensejo à formação de anticorpos antiglomérulo e subseqüentes imunocomplexos tóxicos antígeno-anticorpo. Uma vez instalada a glomerulonefrite, já não há mais indicação para amigdalectomia, pois as lesões renais são irreversíveis; a própria antibioticoterapia não beneficia o curso evolutivo da glomérulo nefrite aguda. Entretanto, ainda se depara, erroneamente segundo a moderna Nefrologia, com indicações de amigdalectomia e até vacinação autógena pós-operatória nestes casos, como já se usou no passado.

Foco de Infecção, Bronquite e Bronquiectasia

No tocante a focos de infecção sinusal e bronquiectasia, já se deu mais ênfase à associação sinusite e bronquiectasia. Na prática clínica, no entanto, ainda poderíamos estabelecer como regra que bronquite crônica rebelde aos tratamentos usuais, bem como bronquiectasias, em principio seriam conseqüência de focos sinusais crônicos, que podem passar desapercebidos e só serem identificados pela requisição de estudo radiológico dos seios paranasais. Identificada e devidamente tratada a sinusite infecciosa, a experiência clinica mostra que as infecções secundárias das vias respiratórias inferiores cedem mais ou menos rapidamente, a não ser que já tenham acarretado alterações estruturais irreversíveis nos tecidos brônquicos.

Foco de Infecção e Asma

É preciso muito cuidado ao se responsabilizar focos de infecção como causa de asma brônquica. Em geral, a asma e os possíveis focos de infecção amidalianos são entidades mórbidas independentes. Se, no entanto, há uma evidente relação de causa e efeito, isto é, crise de asma sempre repetida no decurso de amidalite aguda, teríamos o direito de pensar em possível associação de alergia bacteriana e, neste caso, a amidalectomia poderá realmente beneficiar o paciente no sentido de diminuir a freqüência e a intensidade dos surtos de broncopatia alérgica, mas não de curar a asma. A prática mostra, no entanto, que a bactéria é raramente asmogânica. Os vírus são os grandes mecanismos de "gatilho" das crises de asma tipo infeccioso.

Após estas rápidas considerações sobre os conceitos clássico e atual de infecção focal, nunca é demais insistir em que, no que diz respeito às amigdalas palatinas, urge uma reação no sentido de pôr um termo ao abuso, que ainda persiste na prática médica, quanto às indicações de amigdalectomia. O otorrinolaringologista da atualidade, melhor esclarecido sobre a fisiopatologia do anel linfático de Waldeyer, deve ponderar sobre cada caso em particular antes de indicar a exérese das amídalas palatinas, preocupado em não interferir desnecessariamente na função defensiva do tecido linfóide da faringe como órgão formador de imunoglobulinas e também como reservatório de linfócitos T.

CONCEITUAÇÃO DE BACTERIDE

Apesar desse progresso na identificação etiológica de inúmeras manifestações mórbidas tidas até então como decorrentes de foco infeccioso amigdaliano, dentário ou outros, é interessante considerar que por vezes deparamos na prática clínica pacientes que referem, durante anamnese, o fato de que determinadas dores musculares, ósseas, articulares ou outras manifestações sintomáticas, rebeldes através dos anos e sem causa definida, desaparecem, por exemplo, após casual extração de um dente ou terapêutica antibiótica prescrita para outras finalidades. Além disto, ainda se defronta com certas entidades patológicas, de etiologia obscura, mas que eventualmente são identificadas, em pesquisas imunológicas com antígenos microbianos, pela eclosão de fenômenos de hipersensibilidade, caracterizados através de reação cutânea positiva de maior ou menor intensidade no ponto de inoculação da substância antigênica, por exacerbação mais ou menos acentuada do quadro sintomático clínico e por manifestações sistêmicas traduzidas por elevação de temperatura, astemia, mal-estar geral, etc.

Para compreensão destes fenômenos, vejamos o que se entende por "ide", termo introduzido por Sulzberger, em 1940, para definir manifestações secundárias, à distância, de determinadas doenças infecciosas: tuberculose-tuberculide, sífilis-sifílide, lepra-lepride, toxoplasmose-toxoplasmide, etc., que na atualidade são interpretadas através de mecanismos imunológicos complexos que tentaremos expor, embora resumidamente, como remate deste trabalho.

Sabemos que os prolinfócitos e o promonócitos são produzidos na medula óssea e em seguida lançados na corrente circulatória. Os linfócitos logo se distinguem em duas modalidades (Laccourege, H., 1973 e Negreiros, Almeida e Ungier, 1977): linfócitos T ou timo-dependentes e linfócitos B ou timo- independentes. Os promonócitos se transformam em monócitos ao atingirem o sangue circulante e estes por sua vez se convertem em macrófagos quando se localizam na intimidade dos tecidos, onde adquirem designações próprias: células de Kupfer no fígado, células de Langerhan na pele, histiócitos nos tecidos conjuntivos, microglia no sistema nervoso.

O macrófago é o elemento absolutamente indispensável no mecanismo da "resposta imune", cuja explicação pode ser extraída do esquema da Figura 1

O eixo vertical do esquema ou sistema indutor pode ser comparado a um homem em pé: o macrófago ocuparia a cabeça, os linfócitos T "helper" representariam o tronco e os linfócitos "supressores" estariam localizados nos membros inferiores. O eixo horizontal do esquema seria desempenhado pelos braços abertas em cruz, constituindo o sistema efetor, em que o braço esquerdo responderia pela imunidade humoral: linfócitos B, plasmócitos e Ac ou imunoglobulinas, enquanto o braço direito seria responsável pela imunidade celular: linfócitos T citotóxicos (TC) e linfócitos T " natural Killer" (NK).



FIGURA 1 - Ma = macrófago; THt = linfócito T "helper"; TS = linfócito T supressor; B = linfócito B; P = plasmócito; Ac = anticorpos (imunoglobulinas); TC = linfócito T citotóxico; NK = linfócito T "natural killer".



FIGURA 2 - Vide explicação do texto.



Bacterides

Um determinado agente: bacterids, vírus, protozoários, helmintos, fungo patogênico, células neoplásicas, enxertos alogênicos, etc. pode ocasionar agressão ao organismo por meio de 2 mecanismos básicos:

1) Agressão primária aos tecidos por meio de endo ou exotoxinas, provocando processo inflamatório no local: tuberculose, brucelose, toxoplasmose etc., cujo quadro clínico e evolução dependem essencialmente da "quantidade numérica e virulência do agente invasor, além da resistência oferecida pelo organismo".

A este quadro poder-se-ia dar a denominação de "ose" , em que os fenômenos imunológicos não tomam parte muito ativa.

2) Se acaso " a resistência orgânica for elevada e reduzidos forem o número e a virulência dos germes", poderá haver uma resposta diferente por parte do organismo, na qual predominam os fenômenos imunitários ("ides"), como mostra o esquema da Figura 2.

Mecanismo de Formação das "Ides"

Os agentes invasores, quando em quantidade numérica e resistência pequenas, podem invadir os tecidos e serem fagocitados por macrófagos, onde são possíveis de permanecerem vivos, aprisionados em linfodonodos, por tempo indeterminado através da vida, mas capazes de exercer atividades imunogênicas. Nestas condições, os antígenos circulantes elaborados por esses germes contidos no interior dos macrófagos, com o decorrer do tempo poderão despertar respostas imunes, do tipo tumoral ou celular, e com isto desencadear processos inflamatórios de hipersensibilidade à distância, denominados "ide": tuberculides, brucelides, toxoplasmides, leproside, sifílide, histoplasmide, candidide, estreptococcide, estafrilococcide, etc.

Mecanismos Atuais da "Resposta Imune"

Em face da liberação de imunógenos ou antígenos na corrente sangüínea, o sistema imune entrará em atividade, visando à destruição ou eliminação destes antígenos. Cabe aos macrófagos, nesta resposta imune, exercer as seguintes etapas: 1) endocitose ou fagocitose do agente invasor, 2) processamento de sua fragmentação enzimática; 3) expulsão ou exocitose destes fragmentos antigênicos e sua apresentação nas estruturas especiais MHC ("major histocompatibility complex") existentes na superfície dos próprios macrófagos, onde serão reconhecidos pelos receptores dos linfócitos TH1.

Em conseqüência deste reconhecimento e da elaboração, pelo macrófago, de "interleucina 1", que é uma linfocina, os linfócitos T "helper" (TH1) saem do estado de repouso imunológico (GO) e se ativam em células grandes e jovens (" blastos" G1-S), que vão dar origem às diferentes "linfocinas" (cerca de 12, entre elas os interferons), capazes de ativarem e proliferarem as células do braço esquerdo (imunidade humoral) ou do braço direito (imunidade celular), ou de ambos, fechando o ciclo da"resposta imune", de que depende a formação das "ides".

Na imunidade humoral, há 4 mecanismos básicos de agressão: 1) associação do anticorpo com a ajuda do "complemento" (proteína sangüínea), de modo que AC+C provocam a lise do germe invasor;

2) ADCC, sigla saxônica que significa, ação citotóxica dependente de anticorpo + célula; do mesmo modo, provoca lise do agente invasor;

3) opsonisação: é o mecanismo pelo qual o agente invasor é fagocitado pelo macrófago ajudado pelo anticorpo;

4) imunocomplexo Ag-Ac (por vezes adicionado ao complemento), que exerce ação citotóxica direta sobre o agente invasor. A agressão da imunidade celular exerce-se através de intermediação por células:

1) linfócito T " natural killer" (NK), que entra em contacto com a célula e provoca sua lise através de "perforinas" (Ogcius e Young, 1990).

2) do mesmo modo atuam os linfócitos T citotóxicos (TC); 3) o macrófago ativado também age diretamente sobre o agente invasor, destruindo-o.

Ao finalizar estas considerações imunológicas, juntamente com o conceito de "bacterides" , desejamos chamar a atenção para o fato de que, na atualidade, vários autores vêm pesquisando imunologicamente a possibilidade da existência de uma bacteride toda a vez que se depara qualquer manifestação mórbida de origem "obscura", além de artrites, dores musculares, articulares e ósseas, vasculites (Wolff e Winkelmann, 1980), etc., como já assinalamos no início deste sub capítulo sobre "Conceituações de bacteride".

O diagnóstico imunológico de uma bacteride é pesquisado através de 3 respostas, a que também já nos referimos:

1) sinais de hiperreatividade no ponto de inoculação cutânea da substância antigênica, traduzidos por congestão e edema de maior ou menor extensão;

2) reação focal, isto é, surgimento do quadro sintomático clínico da doença pesquisada, em maior ou menor grau de exacerbação;

3) reação sistêmica, isto é, mal-estar geral, elevação de temperatura, astenia, etc.

O tratamento é indicado quando o paciente é hiper-reator ao antígeno pesquisado, o que se revela pela positividade das provas diagnósticas acima referidas, demonstrando ser portador de uma bacteride. Consiste em proceder-se à dessensibilização específica e ministrar-se também, simultaneamente, se houver, quimio ou antibioticoterapia específica, com resultados geralmente surpreendentes (Oliveira Lima).

Ao concluirmos, vem a propósito considerar que o antigo e clássico conceito de "infecção focal" é na atualidade admitido, por alguns autores, pela "conceituação de bacteride", ligados em princípios clínicos e comprovações imunológicas do mais elevado teor científico da moderna Imunologia, que merecem ponderação por parte de clínicos e especialistas em geral.

AGRADECIMENTO

Desejo deixar aqui expresso meus mais aprofundados agradecimentos ao eminente imunologista e pesquisador da "Fundação Ataulfo de Paiva", Prof. Antonio Oliveira Lima, particular amigo pelo entusiasmo e boa vontade com que me transmitiu atualizados conceitos sobre Imunologia, de inestimável valia na composição desta última parte do presente trabalho.

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* Membro Titular da Academia Nacional de Medicina. Ex-Professor Titular de Otorrinolaringologia da UFRJ e da UERJ.

Endereço do autor: Av. Nilo Peçanha, 50 - grupo 208 - Rio de Janeiro - CEP 20020-000 - Centro - RJ.

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