Versão Inglês

Ano:  1999  Vol. 65   Ed. 6  - Novembro - Dezembro - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 472 a 481

 

Estudo Morfofuncional Estrutural e Ultra-Estrutural da Mucosa das Regiões Anteriores do Septo e da Concha Inferior.

Structural and Ultrastructural Study of the Nasal Septum and the Inferior Turbinate.

Autor(es): Arthur G. L. B. S. Augusto*;
Ivo Bussolotti Filho**;
José E. L. Dolci***;
Bruno König Júnior****.

Palavras-chave: mucosa nasal, histologia, septo, concha inferior

Keywords: nasal mucosa, histology, septum, inferior turbinate

Resumo:
Procedeu-se a uma avaliação da histologia da mucosa humana considerada normal das regiões anteriores do septo e da concha inferior, por meio das microscopias de luz e eletrônica de varredura, com um estudo comparativo dos tipos de epitélio, aspecto da membrana basal, tipo de infiltrado inflamatório do córion e distribuição de glândulas.

Abstract:
A study of the histologic aspects of the human mucosa of the anterior portions of the septum and the inferior turbinate by means of the light microscopy and the scanning electron microscopy is done. We compared the types of epithelium, the thickness of the basement membrane, the inflammatory process of the corion and the quantity of the glands.

INTRODUÇÃO

A maior parte dos estudos histológicos realizados com a mucosa nasal foi feita levando-se em consideração as características encontradas apenas numa determinada região anatômica - septo ou concha -, não correlacionando os achados entre essas duas regiões.

Mesmo os tratados de histologia19, 12, 18 ou de otorrinolaringologia20, ao descreverem a mucosa nasal, consideraram a cavidade do nariz como um todo, não fazendo distinção entre septo e concha, considerando as suas mucosas semelhantes. No entanto, já se sabia, desde 189530, que o epitélio da mucosa nasal variava de acordo com a região analisada, sendo do tipo estratificado pavimentoso na região mais anterior da cavidade do nariz e do tipo cilíndrico, com cílios vibráteis, na região mais posterior.

Posteriormente, observou-se que os diferentes tipos de epitélio que poderiam ser encontrados na mucosa nasal não são fixos14, mas variáveis, de acordo com a exposição a uma série de fatores externos (fluxo de ar inspirado, umidade e temperatura desse ar, inalação de partículas de poeira ou de produtos químicos e trauma).

Alguns trabalhos mostraram que o epitélio da cavidade do nariz não seria apenas do tipo respiratório (pseudo-estratificado cilíndrico ciliado, com células caliciformes), mas também estratificado cubóide ou pavimentoso27.

Em face dessa diversidade histológica, foi proposto, já há sessenta anos, redefinir-se o conceito de epitélio nasal considerado como normal15.

Estudos realizados com a mucosa nasal de indivíduos portadores de rinopatia alérgica mostraram que eles apresentavam maior quantidade de epitélio respiratório em comparação com os indivíduos considerados normais, provavelmente devido aos maiores períodos de obstrução nasal que os alérgicos apresentam, o que levaria a uma menor exposição aos fatores externos26.

Existem trabalhos mostrando que a metaplasia da mucosa nasal começaria na infância, aumentando com o passar dos anos5, e que ela apresentaria grande prevalência nos indivíduos portadores de rinopatia alérgica9.

Todas essas alterações estruturais, que podem ser observadas no epitélio em indivíduos distintos, também podem ser observadas no mesmo indivíduo, como mostraram alguns estudos1, 6.

Já em relação à membrana basal, sabia-se, desde 1927, que a sua espessura variava de acordo com a região estudada e que poderia estar relacionada com o tipo de epitélio de revestimento10, 28, sendo, então, aventada a hipótese de que ela poderia também funcionar com uma verdadeira barreira de proteção da mucosa8, 24.

Há autores que relataram ser a presença de células inflamatórias na mucosa nasal um achado absolutamente normal, como decorrência da exposição aos fatores externos, e que a sua ausência é que poderia ser considerada uma alteração7.

Alguns trabalhos mostraram que a quantidade de glândulas serosas na mucosa nasal seria maior que a das glândulas mucosas3 e que haveria um predomínio das glândulas serosas nos indivíduos idosos23.

Com todos esses dados, resolvemos fazer um estudo histológico comparativo da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior, por meio da microscopia de luz e eletrônica de varredura, avaliando os tipos de epitélio encontrados, aspectos da membrana basal, tipo de infiltrado inflamatório do córion e distribuição de glândulas nessas duas regiões.

MATERIAL E MÉTODO

Foram colhidas 20 amostras da mucosa da região anterior do septo nasal e 20 da região anterior da concha inferior (40 amostras no total), obtidas de dez adultos sadios submetidos à rinoplastia estética e de dez cadáveres, cuja causa do -óbito não estava relacionada e nem afetava a cavidade do nariz ou os seios paranasais, sendo 11 do sexo masculino e nove do sexo feminino, com idade entre 18 e 76 anos (média de 45,3 anos).

Entre os adultos sadios, a idade variou de 18 a 46 anos (média de 28 anos); e, entre os cadáveres, de 54 a 76 anos (média de 65,5 anos).

Considerou-se região anterior do septo a área que estivesse no nível correspondente à extremidade anterior da concha inferior, e região anterior da concha inferior à área situada a 10 mm de distância da sua extremidade anterior.

Metade de cada amostra foi fixada em formol tamponado a 10% e incluída em parafina para o estudo à microscopia de luz; a outra metade foi fixada em solução de Karnovsky, para o estudo à microscopia eletrônica de varredura.

Todo o material foi examinado à microscopia de luz, classificando-se o tipo de epitélio, aspecto quanto à espessura da membrana basal, tipo de infiltrado inflamatório, quantidade relativa de glândulas (serosas, mucosas ou mistas), vascularização e espessura do córion. Da mesma forma, todo o material foi examinado à microscopia eletrônica de varredura, objetivando correlacionar o tipo de epitélio encontrado com o obtido à microscopia de luz.

RESULTADOS

Os achados dos tipos de epitélio encontrados nas regiões anteriores da mucosa do septo e da concha inferior estão relacionados no Gráfico 1.

O Gráfico 2 apresenta os tipos de epitélio de acordo com a metaplasia sofrida, encontrados nas regiões anteriores da mucosa do septo e da concha inferior.



Gráfico 1- Distribuição dos tipos de epitélio encontrados em 20 amostras da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior.



Gráfico 2- Distribuição dos tipos de epitélio, de acordo com a metaplasia observada, encontrados em 20 amostras da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior.



Gráfico 3. Aspecto da membrana basal em 20 amostras da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior.



Gráfico 4. Tipo de infiltrado inflamatório encontrado no córion em 20 amostras da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior.



O aspecto da membrana basal, quanto à sua espessura, encontrado nas regiões anteriores da mucosa do septo e da concha inferior é mostrado no Gráfico 3.

O Gráfico 4 apresenta o tipo de infiltrado inflamatório encontrado no córion das regiões anteriores da mucosa nasal do septo e da concha inferior.

No Gráfico 5 está relacionado o tipo e predomínio de glândulas encontrados no córion das regiões anteriores da mucosa do septo e da concha inferior.

DISCUSSÃO

O que motivou à realização deste trabalho foi o fato de serem poucos os artigos publicados na literatura médica que fazem estudo comparativo de regiões distintas da cavidade do nariz. Na verdade, não encontramos na literatura pesquisada qualquer trabalho que fizesse uma comparação efetiva e aprofundada dos diversos elementos da mucosa do septo e da concha - no caso, a inferior, procurando indicar, e explicar, as principais diferenças ou semelhanças dessas duas regiões tão expostas ao fluxo de ar inspirado, o qual, por sua vez, sofre constantes variações, que, de uma forma ou outra, acabam por interferir com o estado de toda a mucosa respiratória, particularmente com a da região anterior da cavidade do nariz.



Gráfico 5. Tipo e predomínio de glândulas encontradas no córion em 20 amostras da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior.



Os achados foram divididos de acordo com cada região estudada.

I. Epitélio

Em quase todo o material estudado, foram encontrados mais de um tipo de epitélio. Porém, apenas um predominava - e este foi considerado como o padrão desta área.

O Gráfico 1 mostra que são de diferentes tipos os epitélios encontrados na mucosa das regiões anteriores, tanto do septo quanto da concha inferior. Além do epitélio pseudoestratificado cilíndrico ciliado, com células caliciformes, que só é encontrado na mucosa respiratória e por isso é- também chamado de epitélio respiratório (Figuras 1 e 2), foram encontrados também epitélios do tipo pseudo-estratificado cilíndrico não ciliado, estratificado pavimentoso (Figuras 3 e 4), tanto queratinizado quanto não queratinizado e epitélio estratificado cubóide (Figuras 5 e 6).

Estes resultados, por si só, já contrariam a clássica descrição encontrada nos tratados de histologia, que definem o epitélio da cavidade do nariz como sendo unicamente do tipo respiratório19, 12, 18; e, em alguns trabalhos publicados na literatura13, 17, 16.

Foi notado ainda que o epitélio do tipo estratificado pavimentoso apareceu com maior freqüência no septo nasal, em 55% das amostras, contra apenas 5% na concha inferior diferença estatisticamente significativa -, e o epitélio estratificado pavimentoso queratinizado só foi encontrado na mucosa do septo. Além disso, o epitélio respiratório foi encontrado em metade das amostras obtidas da concha inferior e em somente 20% das obtidas do septo.



Figura 1. Mucosa de septo, com epitélio respiratório e célula caliciforme indicada pela seta; MB® membrana basal - Verhoeff 400 x.



Figura 2. Microscopia eletrônica de varredura da mucosa de concha, com numerosos cílios e células cilíndricas não ciliadas (seta) - 3.000 x.



Vários autores afirmaram que a mucosa nasal sofria alterações frente aos fatores externos14, 15, 26, 5, 1, 3, 17, observação esta que se aplica com muita propriedade para explicar os achados dos autores, porque a mucosa da região anterior do septo é mais exposta a agentes externos, como traumas digitais ou o uso de lenços, por exemplo, o que também explicaria o encontro da grande quantidade de epitélio do tipo estratificado pavimentoso queratinizado - 25% das amostras dessa região -, cujas características histológicas são absolutamente semelhantes às da pele, não fosse a ausência de glândulas sudoríparas, pêlos e músculos eretores do pêlo (Figura 7) e a presença de glândulas serosas.



Figura 3. Mucosa de septo, com epitélio estratificado pavimentoso queratinizado - Tricromo de Masson - 100 x.



A presença de outros tipos de epitélio que não o respiratório na mucosa do septo e da concha inferior também foi observada por outros autores30, 27, 26, 5, 9, 1, 6, 8, 24, 3, 29 e demonstra um fenômeno de adaptação desta mucosa à exposição aos diversos fatores ambientais e ao fluxo de ar inspirado, entre outros, que constantemente exerceriam influência sobre ela, e que se traduziria ao exame histológico pela metaplasia ou pela alteração na distribuição e quantidade das células ciliadas11, 22 com a substituição de um determinado tipo de epitélio por um outro mais adaptado a determinadas circunstâncias e que existiria enquanto aquelas perdurassem, podendo voltar à sua estrutura primitiva ou alterar-se para uma outra diferente, de acordo com as exigências da nova situação.

Há trabalhos demonstrando que esse fenômeno adaptativo ocorreria em um período curto de tempo25, e que a mudança para um novo padrão estrutural se completar em meses ou anos4.



Figura 4. Microscopia eletrônica de varreduara da mucosa de septo, com epitélio pavimentoso - 2.360 x.



Figura 5. Mucosa de concha, com epitélio estratificado cubóide e glândulas serosas (GS) e seromucosas (GSM) no córion - Tricromo de Masson - 200 x.



Esta transformação metaplásica, portanto, será mais observada nas regiões da cavidade do nariz mais expostas aos fatores externos, como trauma digital, por exemplo, ou seja, a região anterior do septo, como mostra o Gráfico 2. Apenas 20% de sua mucosa estava revestida por epitélio respiratório, contra 50% da mucosa da região anterior da concha inferior (diferença estatisticamente significativa). Também apresentava maior quantidade de epitélio com metaplasia matura; em outras palavras, com células mais adaptadas às influências externas, em 55% dos casos, contra apenas 5% observados na região anterior da concha inferior (resultado também estatisticamente significativo).



Figura 6. Microscopia eletrônica de varredura da mucosa de septo, com epitélio cubóide - 7.500 x.



Pode se dizer que a metaplasia é parte integrante de qualquer mucosa nasal considerada normal e não deve ser, portanto, julgada como doença. A clássica descrição de que o epitélio da mucosa nasal seria apenas do tipo respiratório é, no nosso ver, inadequada, exceto se se considerar a mucosa nasal de embriões ou fetos 27; e, talvez, de recém-nascidos, devendo ser substituída pela idéia de que ela pode apresentar áreas de epitélio pavimentoso ou cubóide, de maneira absolutamente normal. Como fenômeno adaptativo, a metaplasia da mucosa nasal ocorreria já na infância, como mostraram os trabalhos em decorrência da sua exposição ao fluxo de ar inspirado e, por conseguinte, às circunstâncias ambientais, desenvolvendo-se com maior ou menor intensidade de acordo tanto com a influência desses fatores21 quanto do tempo de sua duração.

Em outras palavras, os aspectos estruturais do epitélio da mucosa nasal não são estáticos, mas dinâmicos, variando de indivíduo para indivíduo e, inclusive, no mesmo indivíduo, em função das influências ambientais a que ele estiver exposto.

2. Membrana Basal

Nas amostras obtidas, procuramos analisar o aspecto da membrana basal apenas quanto à sua espessura, ou seja, com a finalidade de observar se ela se apresentava pouco espessada ou espessada, levando-se em consideração apenas o padrão de espessura que preponderava, pois, em um mesmo corte, era freqüente serem encontradas áreas com variações de espessura (Figura 8), e ser comparado este achado entre as regiões anteriores da mucosa do septo e da concha inferior.



Figura 7. Mucosa de septo, com epitélio estratificado pavimentoso queratinizado, membrana basal pouco espessada e ausência de infiltrado inflamatório no córion - Tricromo de Masson - 200x.



Observou-se que apenas 5% das amostras da mucosa do septo apresentavam membrana basal espessada, enquanto que a da concha inferior mostrava-se espessada em 65% delas, como está representado no Gráfico 3 (diferença estatisticamente significativa).

Este espessamento da membrana basal observado nos casos em estudo (Figura 9) não deve ser considerado como uma alteração patológica, já que ela pode apresentar-se espessada mesmo em indivíduos considerados normais. Há autores que mencionaram ser esta estrutura habitualmente espessada na mucosa nasal10 e outros que consideravam este espessamento como uma das características histológicas mais marcantes do trato respiratório28, além de afirmarem que a membrana basal do epitélio respiratório era mais espessada do que a da maioria dos outros epitélios12.

Acredita-se, portanto, na idéia de que o espessamento da membrana basal não seria um bom parâmetro para considerar-se uma mucosa nasal como doente, com base também em trabalhos que classificavam a membrana basal como tendo espessura dentro a normalidade em pacientes com doenças nasais².



Figura 8. Mucosa de concha, com epitélio estratificado cubóide e membrana basal (seta) com espessura variável - Verhoeff - 100 x.



Figura 9. Mucosa de septo, com epitélio respiratório e membrana basal espessada (seta) - Tricromo de Masson - 200 x.



Figura 10. Mucosa de concha, com epitélio respiratório e membrana basal (seta) espessada - Tricromo de Masson - 200 x.



Os achados mostraram ainda que a espessura da membrana basal poderia variar de acordo com a região estudada, uma vez que ela é mais espessada na região anterior da concha inferior (Figura 10) do que na região anterior do septo (Figura 7).

Há estudos mostrando que haveria uma correlação entre a espessura da membrana basal e o epitélio de revestimento da mucosa nasal28, 8, 24. Ela seria mais espessada no epitélio respiratório (Figura 9), apresentando a menor espessura no epitélio estratificado pavimentoso queratinizado (Figura 7). Os resultados do trabalho estão de acordo com essas observações, pois na região anterior do septo foi encontrada a maior quantidade de membrana basal pouco espessada (95% cios casos - Gráfico 3), que é também mais ou menos proporcional à quantidade de metaplasia observada nessa região (80% dos casos - Gráfico 2). já na região anterior da concha inferior, foi encontrada maior quantidade de membrana basal espessada (65% dos casos - Gráfico 3), sendo também mais ou menos igual à quantidade de epitélio respiratório encontrado nessa região (50% dos casos - Gráfico 2).

Estes dados também falam a favor da idéia de que a membrana basal funcionaria como uma barreira de proteção da mucosa nasal24, 17, uma vez que na região anterior da concha inferior, que apresenta maior quantidade de epitélio respiratório, menos adaptado aos fatores externos, ela se apresentava espessada e na região anterior do septo, que apresenta maior quantidade de epitélio metaplásico; mais adaptado àqueles fatores, ela se apresentava menos espessada.

Dessa forma, pode se afirmar que não existiria um padrão de normalidade para a espessura da membrana basal da mucosa nasal. Seria mais correto dizer-se que ela se apresenta pouco espessada ou espessada e que este espessamento variaria de acordo com a região estudada e estaria em relação com o tipo de epitélio de revestimento.

3. Córion

Foi estudado no córion o tipo de infiltrado inflamatório, tipo de glândulas aí presentes e vascularização, correlacionando os resultados obtidos nas regiões anteriores da mucosa do septo e da concha inferior.

3.1-Infiltrado Infamatório

Em todas as amostras estudadas, encontramos infiltrado inflamatório crônico, em sua grande maioria discreto (Figura 11), com exceção de uma única amostra, obtida do septo de um adulto sadio, que não apresentava infiltrado inflamatório (Figura 7), o que está de acordo com alguns trabalhos, que consideravam o infiltrado inflamatório crônico discreto como normal, mesmo em indivíduos sem doença nasal6, 10.



Figura 11. Mucosa de septo, com epitélio respiratório e infiltrado crônico discreto no córion - Verhoeff - 200 x.



Figura 12. Mucosa de concha, com epitélio respiratório e infiltrado crônico moderado no córion - Tricomo de Masson - 200 x.



Podemos notar que houve uma relação entre o tipo de infiltrado inflamatório encontrado no córion e o tipo de epitélio. Na região anterior da concha inferior, que apresentava maior quantidade de epitélio respiratório - menos adaptado aos fatores ambientais - do que a região anterior do septo (Gráfico 2); foi encontrada também maior quantidade de infiltrado inflamatório crônico moderado (Figura 12), sete vezes mais que o observado na região anterior do septo, onde predominavam os epitélios metaplásicos e o infiltrado inflamatório crônico era do tipo discreto (Figura 11) em 90% dos casos (diferenças estatisticamente significativas).

Porém, não foi encontrada relação entre o espessamento da membrana basal e o tipo de infiltrado inflamatório encontrado no córion. A mucosa da região anterior da concha inferior apresentou maior quantidade de membrana basal espessada do que a da região anterior do septo (Gráfico 3); todavia, o infiltrado inflamatório crônico moderado foi mais observado na mucosa da região anterior da concha inferior que na do septo, levando à conclusão de que é o tipo de epitélio e não o espessamento da membrana basal que tem mais importância na defesa da mucosa nasal.

Em face desses achados, podemos dizer que a presença de infiltrado inflamatório crônico seria uma característica comum da mucosa nasal considerada normal, como observaram alguns autores7, a qual, pela alta freqüência encontrada, remontaria à idéia de "inflamação fisiológica" da cavidade do nariz10, e possivelmente estaria intimamente relacionada com a exposição ao fluxo de ar inspirado e a fatores ambientais, entre outros, que continuamente exercem influência sobre a mesma, refletindo também, de certa forma, o processo adaptativo desta mucosa frente às circunstâncias do meio ambiente.



Figura 13. Mucosa de septo, com epitélio estratificado cubóide e predomínio de glândulas serosas (GS) - Tricromo de Masson -100x.


3.2 - Glândulas

Ao analisar a distribuição das glândulas do córion da mucosa nasal (Gráfico 5), observou-se que havia uma grande quantidade das mesmas em ambas as regiões estudadas; porém, a da região anterior do septo apresentou um predomínio de glândulas serosas (Figura 13), numa quantidade duas vezes maior que a da região anterior da concha inferior, enquanto que o predomínio das glândulas mucosas foi observado numa quantidade cinco vezes maior na mucosa da região anterior da concha inferior do que na mucosa da região anterior do septo (diferença estatisticamente significativa).



Figura 14. Mucosa de concha, com epitélio estratificado pavimentoso e predomínio de glândulas mucosas (GM) Tricromo de Masson - 100 x.



A presença de um predomínio de glândulas serosas na mucosa da região anterior do septo está de acordo com estudos realizados6,3,23 . Existem em estudos que mostraram que as primeiras glândulas a sofrerem um processo degenerativo em face de uma inflamação eram as glândulas mucosas7. Isto talvez explique porque, com o passar dos anos, haveria um predomínio de glândulas serosas, uma vez que as glândulas mucosas sofreriam um processo de atrofia, de degeneração, mais precocemente.

Se seguirmos o raciocínio de que as glândulas mucosas são as primeiras a sofrerem um processo degenerativo, temos a idéia de que, na mucosa da região anterior do septo, por ser mais exposta aos fatores externos, haveria, então, um predomínio de glândulas serosas. De maneira inversa, na mucosa da região anterior da concha inferior, por ser menos exposta àqueles fatores, não notamos um predomínio absoluto de qualquer tipo glandular (Gráfico 5).

33 - Vascularização

Em todas as amostras estudadas, tanto na mucosa das regiões anteriores do septo quanto na da concha inferior, encontramos rica vascularização no córion, com predomínio de circulação venosa.

CONCLUSÕES

A comparação dos resultados obtidos no estudo estrutural e ultra-estrutural da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior permitiu concluir que:

1) A maior parte dos tipos de epitélio encontrados é a mesma nas duas regiões: epitélio pseudo-estratificado cilíndrico ciliado, com células caliciformes, epitélio estratificado cubóide e epitélio estratificado pavimentoso não queratinizado.

1a) A região anterior da concha inferior apresenta maior quantidade de epitélio respiratório.

1b) A região anterior do septo apresenta maior quantidade de epitélio pavimentoso.

2) A membrana basal da concha inferior tende a ser mais espessada que a do septo.

3) O córion da região anterior da concha inferior apresenta maior quantidade de infiltrado inflamatório crônico do tipo moderado que a do septo.

4) A região anterior da concha inferior apresenta maior quantidade de glândulas mucosas, enquanto que a região anterior do septo apresenta maior quantidade de glândulas serosas.

5) A vascularização do córion é rica, com predomínio de circulação venosa em ambas as regiões.

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* Doutorando do Curso de Pós-Graduação do Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de São Paulo.
** Professor Adjunto da Disciplina de Otorrinolaringologia do Departamento de Otorrinolaringologia e Oftalmologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
*** Professor Adjunto da Disciplina de Otorrinolaringologia do Departamento de Otorrinolaringologia e Oftalmologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
****Professor Titular do Departamento de Anatomia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo.

Trabalho realizado no Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de São Paulo. Fonte de suporte: CAPES.

Endereço para correspondência: Departamento de Otorrinolaringologia - Rua Dr. Cesário Mota Júnior, 112 - 01277-900 - São Paulo /SP.

Artigo recebido em 4 de janeiro de 1999. Artigo aceito em 23 de setembro de 1999.

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