Versão Inglês

Ano:  1999  Vol. 65   Ed. 3  - Maio - Junho - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 222 a 226

 

Casuística do Pronto Socorro de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da UNIFESP-EPM

Casuistry of the Emergency Room of Otorhinolaryngology and Head and Neck Surgery of UNIFESP-EPM.

Autor(es): José E. S. Pedroso*;
Yotaka Fukuda** ,
Silvia Karita***,
Douglas Salmazzo****

Palavras-chave: serviços médicos de emergência, otorrinolaringopatias, estatística

Keywords: emergency medical services, otorhinolaryngologic diseases, statistics

Resumo:
Foi realizado levantamento no pronto socorro de otorrinolaringologia da UNIFESP-EPM, entre os meses de dezembro de 1995 e março de 1998. Foram atendidos no período 41.285 pacientes, sendo 42,27% do sexo masculino e 57,73% do sexo feminino. As doenças mais comuns foram: OMA-12,51%, sinusite - 10,23%, OEA - 9,38%, cerume - 7,92%, epistaxe - 6,79%, OMC - 5,42%, amigdalite - 4,38% e faringite - 4,0%. O levantamento foi feito através do livro de controle de pacientes do pronto-socorro de ORL. Analisando a amostra, podemos fazer uma distribuição de acordo com as subdivisões da otorrinolaringologia: otologia - 46,64%, rinologia - 24,36%, CCP - laringologia - 5,97%, faringologia -12,17%, estomatologia - 0,73%, outras -10,13%. Outras patologias, até de mais gravidade mas de menor freqüência, também foram registradas, tais como: neoplasias, traumas e complicações dos processos infecciosos.

Abstract:
It was achieved a survey in the emergency room of otorrinolaringology of UNIFESP-EPM, between the months of december of 1995 and march of 1998. They were attented, at the period, 41.285 patients, being 42,27% of the masculine sex and 57,73% of the feminine sex, the most common diseases were: acute medium otitis (AMO) -12,51%, sinusitis -10,23%, acute external otitis (AEO) - 9,38%, cerumen - 7,92%, epistaxis - 6,79%, chronicle medium otitis (CMO) - 5,42%, amygalitis - 4,38%, pharyngitis - 4,0%. The survey was done through the patíents control book of the emergency room of otorhinolaryngology. Analysing the sample, we can do a distribution according to the subdivisions of the otorhinolaryngology: otology, - 46,64%, rhinology - 24,36%, HNS - laryngology - 5,97%, pharyngology - 12,17%, stomalogy - 0,73%, others - 10,13%. Other pathologies, even more severe, but less frequent, were also registered, such as: neoplasies, traumas and complications of the infectious processes.

INTRODUÇÃO

Normalmente, quando procuramos um trabalho cientifico com estatística sobre as urgências em otorrinolaringologia, conseguimos encontrar levantamentos sobre uma determinada doença ou de países cuja realidade não se enquadra na nossa realidade econômica, social e cultural. Na nossa procura por esses trabalhos, constatamos que existem poucos, na nossa área, talvez devido ao fato de existirem raros serviços públicos de otorrinolaringologia que ofereçam serviço de PS com plantonistas em 24 horas. Não conseguimos encontrar qualquer trabalho brasileiro similar ao nosso, ficando muito difícil a comparação dos resultados obtidos.

O objetivo deste trabalho é fazer um levantamento, e conhecermos o número, sexo, idade e as doenças mais comuns, nos pacientes que procuram nosso PS em caso de emergência. Com esses resultados, podemos nos aparelhar de maneira adequada para prestar um melhor atendimento ao paciente, e também conhecer, em termos acadêmicos, o contato que os nossos residentes estão tendo com as diversas doenças na nossa área.

MATERIAL E MÉTODO

O presente trabalho foi realizado no Pronto-Socorro de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital São Paulo, na UNIFESP-EPM. No local de atendimento temos um livro de registro dos pacientes que são atendidos. O levantamento foi feito através deste livro, levando-se em conta o sexo, a idade e as patologias que os mesmos apresentavam. Estamos informatizando nosso Serviço, para que no futuro esse levantamento seja feito de maneira mais rápida e eficiente .

O nosso material constou de 41.285 pacientes atendidos no período de dezembro de 1995 a março de 1998.

O equipamento que utilizamos no Pronto-Socorro é o básico para diagnóstico e para pequenos procedimentos. O espaço físico é de mais ou menos 20 m2, divididos em três boxes, sendo dois para atendimento dos pacientes e um para lavagem do material e estocagem de remédios em armários, um freezer, uma geladeira.

Muitas vezes, recebemos pacientes de outras especialidades com intercorrências na nossa área. Este atendimento é prestado no nosso Pronto-Socorro ou mesmo no local onde se encontra o paciente.

A equipe de profissionais que permanece no Pronto Socorro durante o dia é composta por um chefe de plantão, um R2, um R3 e dois alunos do 4° ano de graduação; à noite, ficam dois médicos, um R2 ou R3 e um chefe de plantão. Dos 9 chefes de plantão, todos fizeram pós-graduação na UNIFESP, sendo que seis têm o titulo de mestre e três o de doutor.

A quantidade de pacientes que o nosso hospital recebe é bem grande, pois a nossa área de referência engloba uma população de aproximadamente 5 milhões de pessoas Com uma população tão extensa, a variedade de doenças que nos chegam é muito grande e com isso conseguimos oferecera nossos residentes e alunos uma amostra muito significativa das doenças otorrinolaringológicas.
Quando nos chegam casos mais graves, temos à nossa disposição um centro cirúrgico, onde podemos realizar desde pequenos procedimentos até os mais complexos. Quando o procedimento exige uma grande quantidade de profissionais, temos equipes de plantão à distância nos diversos setores da Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O intervalo de tempo foi de novembro de 1995 até março de 1998 (29 meses); foram atendidos 41.285, sendo 17.541 (42,27%) do sexo masculino e 23.834 (57,73%) do feminino (Figura 1). Provavelmente, as mulheres procuram mais o serviço do PS porque têm uma maior preocupação com sua saúde, além do fato de os homens terem maior receio de perder emprego, pois teriam que faltar para fazer a consulta.

As doenças mais comumente encontradas foram OMA - 5.165 (12,51%), sinusite-4.223 (10,23%), OEA-3.872 (9,38%), cerume - 3270 (7,92%), epistaxe - 2.803 (6,79%), OMC - 2.238 (5,42%), amigdalite -1.808 (4.38%) e faringite -1.688 (4.09%). As oito principais doenças somam 25.068 (60.72%).

Podemos observar, neste caso, que as doenças mais comuns são de etiologia infecciosa e de diagnóstico relativamente fácil, sem a necessidade de equipamento mais sofisticado.

Analisando a amostra, podemos dividir as doenças nos diversos setores da otorrinolaringologia e teremos então o seguinte resultado: otologia - 19.255 (46,64%), rinologia - 10.057 (24,36%), faringologia-4.785 (11,59%), laringologia+CCP - 2.712 (6,57%), estomalogia - 301 (0,73%), outras - 4.175 (10,11%)

Observamos que, na maior parte, os pacientes são portadores de problemas otológicos, seguidos pelos rinológicos. As doenças que foram classificadas como outras são distúrbios de ATM, pós-operatórios e odontopatias, em sua grande maioria. A seguir, uma analise das patologias mais comuns dentro de cada setor.

OTOLOGLA

Neste setor, as doenças mais comuns são: OMA - 5.164, OEA - 3.874, cerume - 3.269, OMC - 2.240, PFP -1.723, CE - 935, labirintite - 786 (Figura 4). Ainda no setor de otologia, temos atendido outras doenças em menor freqüência, como trauma de ouvido(569), disfunção tubãria (458), mastoidite (74), tumor de ouvido (64), surdez súbita (37), neurinoma do acústico (20).




Figura 1. Proporção entre o sexo masculino e o feminino em 41.285 pacientes atendidos no PS-ORL UNIFESP-EPM.


Figura 2. Doenças mais freqüentes encontradas em 41.285 pacientes atendidos no pronto-socorro de Otorrinolaringologia do Hospital São Paulo da UNIFESP-EPM.



Figura 3. Proporção de casos do PS-ORL da UNIFESP-EPM nos setores.



Figura 4. Causas mais freqüentes em otologia no PS-ORL da UNIFESP-EPM.



A OMA é uma moléstia muito freqüente na infância. Estima-se que cerca de 70% das crianças apresentem pelo menos um episódio de OMA até os três anos de idade. O diagnóstico é feito pela história e exame físico; em alguns casos pode haver necessidade de se realizar paracentese no CC ou algum exame mais sofisticado como uma TC.

A OEA, em geral, acontece nos meses mais quentes do ano, sendo que em alguns casos mais graves, em que fazemos uso de antibioticoterapia, pesquisamos imunodeficiência (DM, HIV).

A perda auditiva é o sintoma mais freqüente de quem tem o diagnóstico de cerume, o de mais fácil resolução.

Na OMC, observamos que os pacientes nos procuram devido a uma agudização do quadro ou então uma complicação. As complicações geralmente ocorrem por esses pacientes ficarem muito tempo na fila à espera de uma cirurgia, podendo evoluir com meningite, abscesso cerebral e outras complicações.

No Serviço de paralisia facial periférica recebemos um paciente muito tenso, que quase sempre foi atendido em neurologia ou clinica geral. No nosso PS, fazemos o exame de Hilger e Schirmer, para poder estabelecer um prognóstico e topografia da lesão; e, se necessário, até indicamos cirurgia.

As doenças do setor de otología em geral necessitam de acompanhamento, que será realizado no ambulatório de Otorrinolaringologia e não no Pronto-Socorro.


RINOLOGIA

No setor de rinologia, as patologias mais encontradas foram: sinusite - 4.225, epistaxe - 2.805, rinite - 1.551, trauma nasal - 633, corpo estranho nasal - 546 (Figura 5).

A sinusite é muito comum em nossa cidade é provavelmente por fatores ambientais. A cefaléia, tosse, rinorréia purulenta e obstrução nasal são os sinais e sintomas mais comumente encontrados. Geralmente, não fazemos o estudo radiológico, só o fazendo em caso de dúvida. Não é incomum recebermos pacientes com complicações devidas a sinusites, como abscessos, celulites e outras. Nestes casos, são necessárias uma conduta ativa e a realização de estudo tomográfico.

Talvez o quadro mais característico da emergência na especialidade seja a epistaxe: no verão, é muito comum em crianças ou adultos jovens; e, no inverno, a observamos em pacientes mais idosos. Quase sempre resolvemos o caso com uma cauterização, que pode ser química ou elétrica; se não obtivermos êxito, então colocamos um tampão que pode ser anterior ou posterior. Dependendo da gravidade do caso, temos que realizar o procedimento no centro cirúrgico. Se o resultado não for satisfatório, podemos até realizar a ligadura de vasos.



Figura 5. Causas mais freqüentes em rinologia no PS-ORL da UNIFESP-EPM.



Figura 6. Causas mais freqüentes em faringologia no PS-ORL da UNIFESP-EPM.



A rinite é muito comum nos meses de inverno, quando a variação de temperatura e a poluição podem desencadear crises bem intensas.

O trauma nasal, em geral com fratura, é resolvido por nossa especialidade na maioria dos casos. Em paciente adulto, reduzimos a fratura com anestesia local no próprio PS; em crianças, conduzimos o paciente ao centro cirúrgico e realizamos a redução de fratura com anestesia geral.

É muito comum recebermos pacientes com CE de nariz, nos hospitais gerais; apesar da boa vontade, não se consegue a retirada do CE, ou por não haver material para o procedimento em razão de o profissional não ter experiência suficiente.

FARINGOLOGIA

No setor de faringologia, as doenças mais encontradas foram amigdalite (1.809), faringite (1.691), IVAS (1.025), laringite (238) e CE de orofaringe (Figura 6).

A amigdalite e a faringite agudas são doenças que quase sempre vêm com a mesma queixa, ou seja, dor de garganta e febre; e o tratamento quase sempre é o mesmo. O importante
é diferenciarmos a necessidade ou não do uso de antibiótico e da indicação cirúrgica.

No caso da IVAS, é uma doença geralmente tratada por outras especialidades; e, quando os pacientes procuram o nosso PS, já fizeram uso de inúmeras medicações e tratamentos.

O abscesso periamigdaliano é de tratamento clinico ou cirúrgico. Nos casos cirúrgicos, é feita a drenagem do abscesso; e, dependendo da idade do paciente, será realiazada no centro cirúrgico ou no próprio PS.

É muito comum recebermos pacientes com CE de orofarimge. O mais comum é espinha de peixe, seguido de osso de galinha. A retirada quase sempre é simples, mas em alguns casos é necessário levar o paciente ao centro cirúrgico, principalmente quando se trata de crianças.

LARINGOLOGIA E CCP

No setor de laringologia e cirurgia de cabeça e pescoço, os achados foram os seguintes, de acordo com o número de pacientes: abscesso cervical (603), TU cervical (474), parotidite (250), disfonia (250), laringite (238), CE cie laringe (228) e TU glótico (Figura 7).

No nosso PS, foram realizadas, no período do levantamento deste trabalho, 51 traqueotomias, a maioria devida à insuficiência respiratória aguda, causada quase sempre por processos obstrutivos, como tumores, estenoses ou infecções. Nesse total não foram incluídas as traqueostomias, que foram realizadas em pacientes das UTIs e aumentariam muito nossa casuística.

As doenças do setor de laringologia e cirurgia de cabeça e pescoço exigem muita atenção e cuidados no diagnóstico. Geralmente, temos que nos valer de exames subsidiários, como US e nasofibrolaringoscopia.

O abscesso e tumor cervicais apresentam quadro similar, e o diagnóstico diferencial é feito através da história, exame físico e, normalmente, de ultra-sonografia; algumas vezes, recorremos à punção, tanto para estabelecer diagnóstico de abscesso, quanto para a colheita de material para cultura e antibiograma. Quando o paciente tem um tumor cervical, o exame das vias aéreas tem que ser muito minucioso, pois precisamos saber se o tumor é uma metãstase ou um tumor primário de pescoço.

O aparelho de nasofibrolaringoscopia é fundamental para podermos estabelecer diagnóstico de inúmeras doenças, a fim de tomar no próprio PS a conduta ou encaminhar o paciente para o ambulatório.



Figura 7. Causas mais freqüentes em laringologia e CCP no PS-ORL da UNIFESP-EPM.



Figura 8. Freqüencia de outras causas no PS-ORL da UNIFESPEPM,



Figura 9. Incidência por faixa etária dos pacientes com doença no PS-ORL da UNIFESPEPM.



OUTRAS DOENÇAS

É comum recebermos no PS-ORL casos de outros Serviços ou de especialidades afins, como intercorrências e complicações de pós-operatórios (1.168), doenças da ATM (1.078) e odontopatias (133) e também pacientes sem qualquer patologia (428) (Figura 8).

IDADE

Em relação à idade, podemos observar nitidamente que existe um menor número de pacientes entre 0 e 15 anos; e, a partir daí, aumenta até atingir o pico entre 21 e 25 anos, baixando gradativamente a seguir (Figura 9). Essa queda inicial pode dar-se provavelmente pelo fato de os pacientes nessa faixa etária procurarem o pediatra; e este fazer o diagnóstico e estabelecer a conduta, não procurando o Serviço de Otorrinolaringologia. Se fizermos uma projeção no gráfico da idade, no período dos 0 aos 15 anos, iremos observar que o número de pacientes que os pediatras atendem com doenças da nossa área é de 25.000 a 30.000. Em relação à diminuição gradual do número de pacientes com o aumento da idade, ela acompanha a proporção de indivíduos de acordo com a população em geral.


CONCLUSÃO

O levantamento dos casos atendidos em nosso ProntoSocorro é fundamental, pois com os dados coletados podemoa:

1- Quantificar e identificar as doenças mais comuns em nosso Serviço.

2 - Ter uma idéia dos casos vistos pelos nossos residentes, graduandos.

3 - Estruturar o Serviço quanto ao número de médicos, enfermeiros e atendentes necessários, assim como a área física, quantidade e variedade de materiais.





*Mestre em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da UNIFESP-EPM.
**Livre Docente e Chefe do Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da UNIFESP-EPM.
***Mestre em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da UNIFESP-EPM.
***Pós-graduando em nível de Mestrado do Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da UNIFESP-EPM.
Instituição: Este trabalho foi realizado no Pronto-Socorro de Otorrinolaringologia da UNIFESP-EPM. Trabalho apresentado no 344 Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia em novembro de 1998, na forma de pôster, realizado em Porto Alegre /RS. Endereço para correspondência: José Eduardo de Sã Pedroso - Avenida Vereador José Diniz 2472 - o46o4-oo4 São Paulo /SP - Telefone/Fax: (411) 24II-5845. Artigo recebido em 16 de dezembro de 1998. Artigo aceito em 6 de abril de 1999.

Imprimir:

BJORL

 

 

 

 

Voltar Voltar      Topo Topo

 

GN1
All rights reserved - 1933 / 2024 © - Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial