Ano: 1999 Vol. 65 Ed. 2 - Março - Abril - (11º)
Seção: Relato de Casos
Páginas: 181 a 184
Flebectasia da Jugular interna em Criança. Relato de Caso e Revisão da Literatura.
Jugular Venous Ectasia in Child. Case Report and Review of the Literature.
Autor(es):
Jorge Roig Ocampos*,
Lidio Granato**,
Flávio Padula***.
Palavras-chave: dilatação, veia jugular
Keywords: dilatation, jugular veins
Resumo:
Os autores apresentam um caso de ectasia fusiforme da veia jugular interna em uma criança, que se avolumava ao esforço e a manobras de Valsalva. O diagnóstico ficou evidenciado pelo estudo do ultra-som (o melhor método de avaliação) e pela radioimagem: tomografia computadorizada e ressonância magnética. O paciente não foi submetido a cirurgia e está sendo acompanhado há cinco anos, sem apresentar queixas.
Abstract:
The autoors present an uncommum case of fusiforin ectasia of internal jugular vero in a 8 year-old child. The clinical findings were enlargement of the right side neck during straining and V alsalva rnanoever. The patient was evaluated by ultrasonograpic image and by computer tomography scanning and magnetic resonance imaging. The patient was followed for 5 years with no further complains.
INTRODUÇÃO
Foi descrito pela primeira vez por Harris3, em 1928. Adota diferentes denominações; varicocele, ectasia venosa congênita, cisto venoso, pseudoaneurisma venoso, sendo flebectasia o termo atualmente mais aceito. É mais encontrado em crianças, de causa ainda não esclarecida, existindo vários fatores predisponentes. Sendo a laringocele a causa mais comum de massa no pescoço, que aparece durante o esforço e/ou com a manobra ele Valsalva, a flebectasia da jugular, entidade rara, deveria entrar no diagnóstico diferencial 7.
APRESENTAÇÃO DE CASO CLÍNICO
L. S. M., com oito anos de idade, do sexo masculino, cor branca, natural de São Paulo-Capital. Deu entrada no Serviço no (lia 19 de outubro de 1993, com historia de seis meses de abaulamento no pescoço. A mãe notou que durante os esforços (espirros, tosse etc.) apresentava aumento do volume no pescoço sem se acompanhar de sintomas ou sinais inflamatórios, e negando outras alterações otorrinolaringológicas. Ao exame físico, constatou-se durante a manobra de Valsalva aumento de volume no terço inferior do pescoço, à direita, às custas ele uma massa anterior de mais ou menos 7 em de altura e 3 de largura, de limites pouco precisos, próximo da margem anterior do músculo esternocleidomastõideo e sendo o pescoço completamente normal durante o repouso (Figuras 1 e 2). Na palpação, a massa era de consistência mole, de bordos não precisos, que desaparecia no repouso. O resto de exame físico, dentro da normalidade. Foram levantadas as hipóteses diagnosticas de laringocele ou flebectasia jugular. A tomografia comuputadorizada realizada em corte axial, com contraste, revelou uma grande dilatação da veia jugular interna na manobra de Valsalva (Figuras 3 e 4).
O exame por ultra-sonografia mostrou o trajeto do vaso anômalo, e o estudo angiogrãfico venoso por ressonância nuclear magnética demostrou o aumento difuso do calibre da veia jugular interna direita (Figura 5). Esta dilatação fica particularmente acentuada na manobra de Valsalva entre C2 e a base do crânio nos achados tornográficos.
REVISÃO DA LITERATURA
A primeira descrição foi feita em 1928 por Harris3, que descreveu como anomalia venosa que envolvia a veia jugular direita, veia inominada e a tireóide inferior. Existem poucos descritos na literatura mundial: aproximadamente 32 casos sendo acrescidos de mais 13 na literatura japonesa; porém, podem passar freqüentemente despercebidos na prática clínica 12. Adotou muitas denominações, sendo flebectasia a mais aceita atualmente e que representa uma dilatação coca várias formas, tais como: sacular, diverticular e fusiforme, sendo esta última a mais freqüente, quer seja em adulto ou em criança 6.
Figura 1. Paciente em repouso mostra a região cervical normal.
Figura 2. Flebectasia jugular interna na nianobra de Valsava.
Ainda de causa não esclarecida, é mais comumente encontrada em crianças. Existe só um caso de ocorrência familiar descrito na literatura12, e isto nos leva a pensar fortemente em que uma subjacente predisposição_ desta lesão seja genética. No entanto, outros fatores predisponentes têm sido sugeridos: compressão do bulbo inferior da veia jugular interna entre a extremidade esternal da clavícula e a cúpula do pulmão do lado direito, mecanismo de compressão da veia inominada esquerda pela aorta alta e tortuosa, nos casos de hipertensão, ou pelo pectus excavatum comprimindo do esterno às estruturas venosas3. Ainda, duplicação anômala da veia jugular interna e a persistência do saco endolinfático jugular². Outras, como aumento do tônus do escaleno anterior, irradiação mediastinal superior, trauma, inflamações e fenômenos degenerativos, também têm sido descritas como etiologia².
Figura 3. Tomografia axial computadorizada com contraste da região cervical, com o paciente em repouso.
Figura 4. Tomografia axial computadorizada com contraste, durante manobra de Valsalva, mostrando dilatação da veia jugular interna.
É uma entidade incomum; a maioria dos casos relatados são em crianças, com prevalência do sexo masculino; é mais freqüente nó lado direito², existindo também na literatura casos bilaterais11.
O diagnóstico não é difícil para o médico que conhece esta entidade, considerando que são poucas as causas de abaulamento cervical que se evidenciam ou aumentam com a manobra de Valsalva ou outros tipos de esforços como o choro, o riso etc. As causas mais comuns são: a laringocele, os cistos mediastinais e flebectasias8. Não devemos esquecer a existência de outras entidades apresentando malformações anteriovenosas, cistos parafaríngeos, cistos branquiais, faringocele, higromas císticos, cistos de retenção e tumores mediastinais9.
Como métodos auxiliares de diagnóstico, depois do exame físico completo, a ultra-sonografia seria o método cie eleição, como o mais inofensivo, de fácil acesso e permitindo relacionar com outras estruturas da região10. Ainda poderiam ser de grande ajuda a venografia, Tmografia computadorizada com contraste e a ressonância nuclear magnética6.
Geralmente a jugular interna é a mais afetada, mas existem casos publicados que referem a jugular externa em crianças 9; e, em adultos, onde a veia afetada foi a jugular anterior7. Teclas as flebectasias são de etiologia incerta.
O exame microscópico das peças cirúrgica mostrou grandes alterações da arquitetura da veia normal, com características de flebectasia12: parede delgada3,8, diminuição ou ausência de camada elástica12 e camada muscular afinadas8. Danis¹, em estudo microscópico da parede do aneurisma da veia jugular interna de três pacientes, mostrou espessamento focal da íntima, aumento da quantidade de tecido conetivo e aumento do número de células endoteliais. A parede mostrou proeminência de células de músculo liso com colágeno, mais elementos elásticos que pareciam desorganizados (displasia)¹.
Figura 5. Ressonância nuclear magnética no plano axial mostra aumento do calibre da jugular interna durante manobra de Valsalva.
Com relação ao tratamento6, na maior parte dos trabalhos publicados, foi realizada cirurgia; porém, tendo-se em conta que a ressecção da jugular interna flebectasiada não esta isenta de tnorbidade. As principais complicações são: lesão do nervo vago, nervo frênico e plexo braquial, embolia, trombose e injuria de carótida. Os autores recomendam abordagem individual em lugar de uma indicação cirúrgica de rotina.
Os motivos mais freqüentes de indicação de cirurgia foram por estética, já que não há trabalhos mostrando ruptura de ectasia venosa no pescoço ³ e/ou por aumento de tamanho nos últimos meses, com risco de trombose e formação de êmbolos e até mesmo com fins diagnósticos 6.
O nosso paciente não apresentava queixas, havendo apenas a preocupação da mãe pelo aumento de volume no pescoço aos maiores esforços. Após vários anos de acompanhamento do paciente, optou-se por continuar com uma conduta expectante, já que o quadro continua estável e a criança sem queixas.
COMENTÁRIOS FINAIS
Todo paciente que se apresenta com aumento de volume no pescoço aos esforços e a manobra de Valsalva deve ser considerado como suspeito de ser portador de flebectasia de jugular. A flebectasia jugular é uma condição benigna e nenhum tratamento está indicado. A indicação em caso puramente estético, para remoção da veia jugular externa ou interna, não provoca qualquer comprometimento maior para o paciente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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*Médico Pós-Graduando em Mestrado do Curso de Pós-Graduando da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
**Professor Chefe de Clínica do Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de São Paulo.
***Médico Radiologista do Hospital Santa Catarina-São Paulo.
Trabalho realizado no Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Endereço para correspondência: Jorge Luis Roig Ocampos- Rua Major Sertório, 523 - apto. 22 - Vila Buarque - São Paulo /SP- Telefone: 256-8142. Artigo recebido em 22 de maio de 1998. Artigo aceito em 7 de janeiro de 1999.