ABORLccfRevista Brasileira de Otorrinolaringologia

Trabalho Clínico

Influência da rinoplastia na permeabilidade nasal avaliada por rinometria acústica
Influence of the rhinoplasty in the nasal permeability evaluated by rinometria acoustics

Autores:

Andréia Alessandra Bisanha (Médico) Residente

Daniela Oliveira Rodrigues (Médica) Residente

Fabiana Cardoso Pereira Valera (Doutorada em Otorrinolaringologia pelo Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP) Médico Assistente do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP

Ricardo Cassiano DeMarco (Médico Otorrinolaringologista Doutorando pelo Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP) Médico Assistente do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP

Roberto de Mattos Coelho (Médico) Residente

Wilma T. Anselmo-Lima (Professor livre-docente do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP) Chefe da Divisão de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP

Palavras-Chave
Rinoplastia, Avaliação da patência nasal, Rinometria acústica, Obstrução nasal pós-rinoplastia.

Resumo
RESUMO:Embora exista uma suposição de que a rinoplastia estética não cause prejuízo a patência nasal, pouco se sabe sobre esse assunto. Objetivo:Com a finalidade de contribuir para o esclarecimento dessa controvérsia, decidimos estudar a patência nasal através da Rinometria Acústica (RMA) em pacientes que foram submetidos à rinoplastia. Pacientes e Métodos: A RMA foi realizada em quinze pacientes através do aparelho Rhinometrics SRE 2000 e os valores da área de secção transversal e volume pós-vasoconstrição nasal foram mensurados antes e três meses após a cirurgia. Resultados: Apenas um paciente queixou-se de obstrução nasal. Observou-se uma redução da área da válvula nasal (MCA1), com preservação de sua distância e uma manutenção da área correspondente à concha inferior (MCA2) mas com redução da sua distância. Houve também redução do volume nasal entre 0-30 mm de distância da ponta nasal.Conclusões: A partir dos resultados do presente estudo concluímos que a rinoplastia promove uma redução da área de secção transversal ao nível da válvula nasal, sem no entanto implicar em obstrução nasal ao paciente, já que apenas um deles queixou-se de obstrução nasal após a cirurgia.

Keywords
Rhinoplasty, Evaluation of the nasal patency, Acoustic rhinometry , Nasal obstruction after rhinoplasty.

Abstract
ABSTRACT: Although a supposition exists that aesthetic rhinoplasty does not cause damage on the nasal patency, little is known about this. Subject: To contribute for the elucidation of this controversy, we analyzed the nasal patency through acoustic rhinometry (RMA) in patients who underwent rhinoplasty. Patients and Methods: The RMA was performed in fifteen patients using the equipment Rhinometrics SRE 2000 and the values of the minimal cross-sectional area and volume nasal were measured before and three months after the surgery. Results: Only one patient complained of nasal obstruction. A reduction of the nasal valve (MCA1) area was observed, with preservation of its distance, maintenance of the area corresponding to inferior turbinate (MCA2) but with reduction of its distance. There was also a reduction of the nasal volume between 0-30 mm of distance from the nasal tip. Conclusions: We concluded that rhinoplasty promotes a reduction of the cross-sectional area in the region of the nasal valve. However, this alteration did not lead to nasal obstruction on the patients, once only one of them complained of nasal obstruction after the surgery.

 

Instituição: Disciplina de Otorrinolaringologia do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP

Suporte Financeiro:

INTRODUÇÃO

 

Prejuízo da patência nasal após rinoplastia estética tem sido uma preocupação constante entre os cirurgiões por razões que incluem considerações funcionais e também legais(1). As osteotomias laterais ao término da cirurgia são utilizadas para recompor a pirâmide nasal após retirada das gibas osteocartilaginosas, com ou sem correção de assimetrias da ponta nasal. Por razões estéticas, a osteotomia lateral baixa na abertura piriforme é recomendada por autores para evitar a formação de degraus na parede lateral do nariz (2,3). Funcionalmente, a abertura piriforme é considerada parte da válvula nasal e mudanças nas suas dimensões podem causar problemas de patência nasal após rinoplastia.

A válvula nasal pode ser dividida em componentes proximais e distais. Assim que a corrente de ar ultrapassa o vestíbulo, ocorre a primeira constrição e aceleração do fluxo no estreito lúmen proximal, o componente estrutural da válvula nasal. Este estreitamento se situa entre o septo e a extremidade proximal da cartilagem alar superior. O componente distal da válvula, constituído de tecidos eréteis, situa-se na lateral da parede septal, formando o componente funcional.

Estudos com rinomanometria têm resultados controversos e não esclarecem se a rinoplastia prejudica o fluxo aéreo nasal. Enquanto Beekhuis (1973)(4) e Courtiss & Goldwyn (1983)(5) demonstraram diminuição do fluxo aéreo nasal, Adamson et al (1990)(6) não observou os mesmos achados.

Tendo em vista que possíveis alterações de fluxo nasal ocorreriam principalmente em regiões anteriores das fossas nasais, decidimos estudar a influência da rinoplastia na patência nasal através da rinometria acústica (RMA). Este exame permite captar por reflexões sonoras áreas de constrição nasal, além da distância dessas à ponta nasal. São padronizados e reconhecidos em literatura: MCA1 (primeira constrição nasal, correspondente à válvula nasal) e MCA2 (segunda constrição nasal, correspondente à concha inferior).

Assim, este estudo tem como objetivos avaliar através da RMA alterações em áreas de constrição, em suas distâncias à ponta nasal e em volume nasal três meses após rinoplastia.

 

 

 PACIENTES E MÉTODOS

 

Foram avaliados quinze pacientes na faixa etária entre 18 e 60 anos, no período de agosto de 2004 até outubro de 2005. Apenas fizeram parte do estudo os pacientes com desejo de correção estética, e que não apresentavam qualquer sintomatologia nasal no momento da avaliação. Pacientes que apresentavam patologias concomitantes tais como deformidade septal obstrutiva, hipertrofia obstrutiva de conchas nasais inferiores e hipertrofia de tonsila faríngea foram excluídos do trabalho.

Esses pacientes foram submetidos à RMA previamente e três meses após a rinoplastia estética. Utilizamos o equipamento SR2000 da Rhinometrics, Denmark, e adaptadores nasais de tamanhos variados de acordo com o tamanho da narina do paciente (7,8). As medidas realizadas em cada avaliação foram: MCA1 (área de secção transversal mínima entre 0 a 22 mm da narina, correspondente à área da válvula nasal); Dist 1 (distância da ponta nasal até o MCA1); MCA2 (área de secção transversal mínima entre 22 mm e 54 mm da narina, correspondente à área da concha nasal inferior na região da abertura piriforme); Dist 2 (distância da ponta nasal ao MCA2); Vol 1 (volume do espaço nasal entre 0 e 30 mm da narina); Vol 2 (volume do espaço nasal entre 0 e 60 mm da narina).

Todos os exames foram realizados quinze minutos após a aplicação de dois jatos de efedrina 0,5% em cada narina, em ambiente acusticamente tratado e a 25ºC, observando-se todos os fatores que visam a garantir a acurácia do teste, segundo a padronização do Comitê Internacional para RMA.

Todos os pacientes foram submetidos à rinoplastia, na qual foi realizada incisão intercaltilaginosa bilateralmente para acessar o dorso nasal seguindo-se pelo seu descolamento, sendo escopado e removido o seu excesso. Segui-se pela incisão marginal bilateralmente para exposição das cartilagens laterais inferiores, sendo removido seu excesso cranial de cada lado medialmente (deixado com 5 mm) e lateralmente (deixado com 7 mm), e a seguir realizado sutura interdomal. Por fim, foi realizada a osteotomia lateral superior a inserção anterior da concha nasal inferior bilateralmente para fechamento do dorso nasal, seguido por microporagem.

 

 

RESULTADOS

 

Apenas um dos pacientes estudados queixou-se de obstrução nasal após a cirurgia, tendo desenvolvido insuficiência de válvula nasal à esquerda e foi submetido à cirurgia para correção. Todos ficaram satisfeitos com resultado estético.

Verificou-se que em ambas as fossas nasais dos pacientes houve redução significativa do MCA1 no pós-operatório (média de 0,67-0,69 no pré-operatório para 0,53-0,54 no pós-operatório, p≤0,05), de cerca de 20%. Já a Dist. 1 não apresentou diferença significativa entre o pré e pós-operatório (tabela 1).

Por outro lado, o MCA2 não apresentou diferença significativa entre o pré e pós-operatório (média de 0,46-0,48 no pré-operatório e 0,42-0,46 no pós-operatório); p não significativo. Já a Dist. 2 diminuiu significativamente  no pós operatório, variando de 2,13-2,14 cm no pré operatório para 1,92-1,93 cm, com p=0,02.

Houve redução significativa do Vol. 1 (medido entre 0 e 30 mm) para a fossa nasal direita (2,37 para 1,95, p< 0,05) e forte tendência a redução para a fossa nasal esquerda (2,35 para 2,09, p=0,06). Já o Vol. 2 (medido entre 0-60 mm) não apresentou diferença significativa em nenhuma fossa nasal (tabela 2).

                   Os dados foram analisados através do teste t de Student para amostras dependentes. Foi adotado como nível de significância p≤0,05.

 

 

DISCUSSÃO

 
             Embora exista uma suposição de que a rinoplastia estética não leve a sintomas nasais obstrutivos, pouco se sabe sobre esse assunto, principalmente a longo prazo. Para Webster et al. (1977)(9), a localização mais apropriada do nível da osteotomia lateral seria na abertura piriforme e acima do nível de  da concha inferior.  Grymer et al. em 1999(1) demonstraram através de estudos com rinometria acústica que não houve alteração na dimensão anterior do nariz quando comparados os níveis da osteotomia lateral realizada, se acima ou abaixo da abertura piriforme. Nos pacientes deste estudo realizamos a osteotomia lateral acima da inserção da concha inferior.
     Adamsom et al. (1990)(6) utilizaram a rinomanometria antes e após a rinoplastia e concluíram que não houve danos à patência nasal. Entretanto, fica difícil definir essas conclusões, uma vez que eles misturaram casos submetidos à rinoseptoplastia com e sem turbinectomia. 
              Dos resultados obtidos pelo nosso estudo, pode-se observar que a redução do MCA1 traduz uma redução da área da válvula nasal em cerca de 20%. Porém, a distância do MCA1 em relação à ponta nasal não foi alterada. Conclui-se que a ressecção do domus na rinoplastia causou diminuição da área da válvula nasal sem anteriorizá-la. 

Por outro lado, o MCA2 não foi alterado, porém sua distância em relação à ponta nasal reduziu de forma significante. Em outras palavras, não houve redução significante da área da concha inferior mas ocorreu diminuição da distância da ponta nasal à concha inferior, provavelmente por causa da ressecção da borda caudal do septo em forma triangular com base superior para elevação da ponta nasal.

Também se pode observar que houve diminuição do volume nasal de 0-30 mm mas não de 0-60mm.

Nossos resultados são concordantes com os de Beekhuis (1976)(4) e Courtiss & Goldwyn (1983)(5) que concluíram que 10% das rinoplastias  estão associadas a defeitos na via aérea no pós-operatório. Grymer em 1995(10) também demonstrou através da rinometria acústica em pacientes submetidos apenas a rinoplastia uma redução crítica da parte anterior da cavidade nasal. Roithmann et al (1997)(11) demonstraram por Rinometria Acústica que a área da válvula nasal em um grupo de pacientes pós rinoplastia com queixa de obstrução nasal é geometricamente anormal e menor que a válvula nasal transeccional de cavidades nasais saudáveis.

A partir dos resultados do presente estudo concluímos que a rinoplastia promove uma redução da área de secção transversal ao nível da válvula nasal e aproximação da concha inferior para a ponta nasal, com conseqüente redução do volume anterior da fossa nasal. No entanto, essa alteração não implicou em obstrução nasal sintomática ao paciente, já que apenas um deles queixou-se de obstrução nasal após a cirurgia. Este dado, associado ao fato de não ter havido diminuição da área transeccional correspondente à concha inferior, nos faz inferir que provavelmente ocorra adaptação da mucosa da concha nasal inferior na tentativa de preservar a patência nasal nesta área.

     
 

CONCLUSÕES

 

A partir dos resultados do presente estudo concluímos que a rinoplastia promove uma redução da área de secção transversal ao nível da válvula nasal. No entanto, essa alteração não implicou em obstrução nasal ao paciente, já que apenas um deles queixou-se de obstrução nasal após a cirurgia.

         

Tabela1: Comparações de MCAs e distâncias entre pré e pós operatório, e nível de significância em cada fossa nasal

 

Pré op.

Pós op.

P

MCA 1

D

0,69

0,53

0,002

E

0,67

0,54

0,007

Dist 1

D

0,71

0,72

0,88

E

0,70

0,71

0,84

MCA 2

D

0,46

0,42

0,17

E

0,48

0,46

0,69

Dist 2

D

2,14

1,92

0,02

E

2,13

1,93

0,02




         

Tabela 2:Comparações de volumes nasais entre pré e pós operatório, e nível de significância em cada fossa nasal

 

Pré op.

Pós op.

P

Vol 1

0-30mm

D

2,37

1,95

< 0,001

E

2,35

2,09

0,06

Vol 2

0-60mm

D

7,55

7,47

0,91

E

7,20

8,50

0,10



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

1 - GRYMER, L. F., GREGERS-PEDERSEN, C., PEDERSEN, H. B.: Influence of Lateral Osteotomies in the Dimensions of the Nasal Cavity. Laringoscope, 1999;109: 936-938.

2 - REES, T D : Aesthetic Plastic Surgery, vol.1. Philadelphia: W B Saunders Co; 1980:345.

3 - SHEEN, J H, SHEEN, A P: Aesthetic Rhinoplasty, vol.1, St. Louis, MO: C V Mosby Co; 1987:216-218.

4 - BEEKHUIS, G. J.: Nasal Obstruction Afther Rhinoplasty: Etiology and Techniques for Correction. Laryngoscope, 1976; 86:540-548.

5 - COUTISS, E. and GOLDWYN, R.: The Effects of Nasal Surgery on Air Flow. Plas Reconstr Surg,  1983; 7:18-19.

6 - ADAMSON P., SMITH, O. and COLE, P.: The Effect of Cosmectic Rhinoplasty on Nasal Patency. Laryngoscope, 1990;100:357- 359.

7 - ZANCANELLA, E; ANSELMO-LIMA, W T :   Uso da rinometria acústica como método diagnóstico.  Rev  Bras ORL, 2004; 70(4):100-104.

8 - MARQUES, V C; ALSELMO-LIMA, W T:  Pré-and postoperative evaluation by acoustic rhinometry of children submitted to adenoidectomy or adenotonsillectomy. Int J of Pediatric Otorhinolaryngol, 2004; 68(3):311-16.

9 - WEBSTER, R; DAVIDSON, T M ; SMITH, R C : Curved lateral osteotomy for airway protection in rhinoplasty. Arch Otolaryngol,  1977; 103:454-57.

10- GRYMER, L.F. - Reduction rhinoplasty and nasal patency: Change in the cross-sectional area of the nose evaluated by Acoustic Rhinometry. Laryngoscope, 1995; 105: 429-431.

11 - ROITHMANN, R.; CHAPNIK, M.D.; ZAMEL, N.; BARRETO, M.S.; COLE, P. - Acoustic rhinometry assessment of nasal valve. Am. J. Rhinol., 1997; 11: 379-385.



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