Má-formação arterio- venosa causando sangramento intenso pós- amigdalectomia
Resumo
Os autores apresentam um caso de hemorragia pós-amigdalectomia direita de difícil controle, causado por um aumento no shunt arterial. Após 2 tentativas locais do controle hemorrágico foi feita arteriografia que evidenciou um shunt e fez-se necessário cervicotomia exploradora e ligadura dos ramos da artéria carótida externa.
Introdução
A adenoidectomia e amigdalectomia são historicamente os procedimentos cirúrgicos otorrinolaringológicos mais realizados1 tendo incidência principalmente em crianças.
As principais indicações adenoidectomia e amigdalectomia são obstrução das vias aéreas acompanhadas de ronco e/ou apnéia e as infecções recorrentes2. No entanto estes procedimentos não são isentos de complicações2;3;4. A principal complicação é a hemorragia pós-operatória, sendo esta a mais freqüente e a mais grave, podendo tornar-se fatal em alguns casos1;2;3;4. Este relato de caso mostra um shunt arterio-venoso como causa de sangramento pós- amigdalectomia, de difícil controle, sendo necessário a realização de angioressonância cervical para o diagnóstico desta complicação, cujo tratamento foi cervicotomia exploradora e ligadura dos ramos da artéria carótida externa.
Relato de caso
Paciente, 8 anos, feminina, história de respiradora bucal, roncos intensos por hipertrofia de adenóides e amígdalas, queixas de epistaxes freqüentes e amigdalites de repetição.
Indicado adenoamigadalectomia, ocorreu sem intercorrências e recebeu alta hospitalar.
No 7º DPO apresentou vômito sanguinolento.Foi internada, sem evidências de sangramento ao exame de fibronasofaringoscopia.
No 21º e 22º DPO apresentou vômitos sanguinolentos, que a fibronasofaringoscopia não identificou ponto sangrante. Evoluiu com anemia aguda sendo necessário concentrado de hemácias. Foi realizada revisão cirúrgica no bloco cirúrgico sob anestesia geral para "fechamento" das lojas amigdalianas, recebendo alta.
A partir do 36º DPO teve novos episódios de hematêmese que evoluíram para choque hipovolêmico sendo 3 internações no CTI para receber cristalóides e aminas vasoativas. Foram realizados 3 coagulogramas com resultados normais.
Durante a 3ª internação no CTI foi evidenciado discreto ponto sangrante na loja amigdaliana direita. Foi solicitada angioressonância cervical que evidenciou dobradura bilateral na artéria carótida interna, aparentando aumento no shunt arterial.
Foi indicada cervicotomia, identificada dobradura arterial, sem sangramento no momento. Optado por fazer um reforço da loja amigdaliana utilizando músculo digástrico que foi interposto entre a loja e a dobradura arterial. A dobradura arterial foi desfeita e ligados todos os ramos da artéria carótida externa para reduzir o shunt.
Com doze meses de evolução pós-operatória, a paciente passa bem, sem outros episódios de sangramento orofaríngeo.
Discussão
As crianças que têm indicação de amigdalectomia devem ser cuidadosamente avaliadas no pré-operatório, considerando sua história clínica, doenças associadas, exame físico e exames complementares. É importante também a avaliação do pediatra para realização do risco cirúrgico, que poderá solicitar outros exames ou avaliação de outros especialistas.
A artéria carótida externa, logo após sua bifurcação, dá origem a três ramos: artéria tireóidea superior, artéria lingual e artéria facial.
A artéria lingual dá origem as artérias tonsilares que irrigam os pilares anteriores do véu palatino.
A artéria facial origina a artéria palatina inferior que irriga as amígdalas, pilares posteriores e véu palatino.
Para Tarantino et al5. as crianças de 6 - 8 anos e 13 - 14 anos de idade tem incidências distintas de sangramento pós-amigdalectomia, respectivamente 8,1 % e 0,3 %. Esta maior incidência no grupo de 6 - 8 anos ocorre por um processo de esclerose tonsilar decorrente das infecções locais repetitivas causando hipoelasticidade vascular5.
Comentários finais
A principal complicação da amigdalectomia é hemorragia pós-operatória. A hemostasia da loja amigdaliana pode ser feita através de cauterização ou aplicação de pontos hemostáticos, com ou sem anestesia geral, dependendo do estado clínico e da cooperação do paciente.
No entanto, há casos de sangramentos persistentes mesmo após as medidas de hemostasia que necessitam de provas de coagulação específicas, exames de imagem e estudos vasculares. Neste caso a angioressonância foi muito importante para a detecção do shunt vascular e indicação da cervicotomia.
Referências bibliográficas
1. Vieira, FMJ; Diniz, FL; Figueiredo, CR; Weckx, LLM. Hemorragia na adenoidectomia e/ou amigdalectomia: revisão de 359 casos. RBORL, 2003, 69,ed.3, 338-341.
2. Otacilio e Campos. Tratado de Otorrinolaringologia. Editora Roca; 1994.
3. Peeters A, Katz S. Tonsillectomy and adenotomy as a one day procedure? Acta Otorhinolaryng Belg 1999;53.
4. Peeters A, Saldien V. Lethal complications after tonsillectomy. Acta Otorhinolaryng Belg 2001;55.
5. Tarantino, V.; Stura, M.; Vallarino, R.; Ivani, G. and Fortini, P.: Le complicanze post-operatorie dell adenoidotonsilectomia Minerva Pediatrica. 40 (1988): 279-252.
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