ABORLccfRevista Brasileira de Otorrinolaringologia

Relato de Caso

Sinusite e infecção cutânea por fusarium
sinusitis and keratitis by fusarium.

Autores:

Marcos José Araújo de Castro (Graduação) Residente

Nelson Caldas (Livre doscente) Professor emérito da UFPE

Breno Jackson Carvalho de Lima (Graduação no curso médico) Residente HCPE

Juliana Gusmão de Araújo (Graduação) Residente HCPE

Maria Dantas Costa Lima (Graduação) Residente HCPE

Débora Lopes Bunzen (Otorrinolaringologista) Médica voluntária do HCPE

Juliana Fontan (Médica especialista em medicina interna) Residente HCPE

Palavras-Chave
Fusarium, Sinusite, hialohifomicoses, fungos.

Resumo
Espécies de Fusarium são fungos oportunistas agentes das hialohifomicoses que apenas raramente causam infecção em hospedeiros imunocompetentes, mas podem causar infecções disseminadas e graves em pacientes com imunossupressão grave. Entre pacientes imunocompetentes quebra da barreira tissular é o fator de risco para fusariose. Infecções incluem ceratites, onicomicoses, celulites e ocasionalmente infecções de seios da face. O tratamento geralmente é bem sucedido e requer remoção de corpos estranhos e terapia antifúngica. Entre pacientes imunocomprometidos, principalmente pacientes com malignidades hematológicas, Fusarium é o segundo fungo patogênico mais comum. O fator de risco para fusariose disseminada é a imunossupressão severa (neutropenia, linfopenia, corticosteróides, reação enxerto-versos-hospedeiro). A apresentação clínica inclui febre refratária, lesões cutâneas e infecções sino-pulmonares. Em contraste com a aspergilose disseminada, fusariose disseminada pode ser diagnosticada por hemocultura em 40% dos casos. O estudo histopatológico revela hifas hialinas septadas. A mortalidade em imunocomprometidos varia de 50-80%. O tratamento ideal ainda não foi estabelecido. Tratamento eficaz tem sido reportado com vários agentes (altas doses de Anfotericina B, Anfotericina Lipossomal, Voriconazol) e com infusão de granulócitos ou fatores de crescimento de neutrófilos.

Keywords
Fusarium, Sinusitis, hyalohyfhomycosis, fungi.

Abstract
Fusarium spp. are agents of hyalohyfhomycosis that cause infections only rarely in immunologically competent host, but disseminated infection may occur in severely immunocompromised patients. Among immunocompetent patients, tissue breakdown (as caused by trauma, severe burns or foreign body) is the risk factor for fusariosis. Infections include keratitis, onychomycosis, cellulitis and occasionally sinusitis. Treatment is usually successful and requires removal of the foreign body as well as antifungal therapy. Among immunocompromised patients, mainly patients with haematological malignancies, Fusarium spp. are the second most common pathogenic mould. Risk factors for disseminated fusariosis include severe immunosuppression (neutropenia, lymphopenia, graft-versus-host disease, corticosteroids). Clinical presentation includes refractory fever, skin lesions and sino-pulmonary infections. In contrast to disseminated aspergillosis, disseminated fusariosis can be diagnosed by blood cultures in 40% of patients. Histopathology reveals hyaline acute-branching septate hyphae. Mortality from fusarial infections in immunocompromised patients ranges from 50% to 80%. Host immune status is the single most important factor predicting outcome. Optimal treatment has not been established. Anecdotal successes have been reported with various agents (high-dose amphotericin B, lipid-based amphotericin B formulations, voriconazole) and with cytokine-stimulated granulocyte transfusions.

 

Instituição: Universidade Federal de Pernambuco Hospital das Clínicas Serviço de Otorrinolaringologia

Suporte Financeiro:

1. Introdução

    Fusarium spp. são fungos filamentosos oportunistas, saprófitos do solo e patógenos comuns de plantas.

      De acordo com a literatura, Fusarium solani é a espécie mais isolada nas infecções de seres humanos, seguido pelo F.moniliforme, F.oxysporum e F.proliferatum (4,5,7). As infecções pelo gênero Fusarium se incluem dentro das hialohifomicoses, junto com outros fungos como Penicillium spp., Scedosporium spp., Aspergillus spp. entre outros. Hialohifomicose é um termo que descreve infecções causadas por fungos cuja forma tecidual básica na natureza é hialina, cores claras, hifas ramificadas ou não-ramificadas, sem pigmento em suas paredes.

    Em hospedeiros imunocompetentes as lesões são tipicamente localizadas e precedidas por quebra na barreira cutânea (como trauma, corpo estranho, queimaduras, onicomicose pré-existente, ferida cirúrgica), causando infecções cutâneas, ceratite após trauma ou entre usuários de lentes de contato contaminadas, onicomicoses entre indivíduos que andam descalços.

    Biópsia cutânea é um meio prático e útil para confirmação da suspeita clínica de infecção por Fusarium; lesões cutâneas são a única fonte para o diagnóstico em 55% dos pacientes.

Fusariose em pacientes não-neutropênicos e imunocompetentes, com poucas exceções, representam infecções benignas. Entretanto taxas de mortalidade de 50-80% têm sido reportadas para pacientes com fusariose disseminada. O tratamento ideal para fusariose disseminada permanece incerto. Essas infecções normalmente são refratárias aos antifúngicos padrões (5,13). A Anfotericina B, apesar de sua nefrotoxicidade e sua baixa eficácia in vitro, ainda é a droga mais utilizada para o tratamento clínico da fusariose (13).

 

2. Objetivos

O objetivo deste trabalho é realizar um levantamento bibliográfico do espectro clínico, diagnóstico e tratamento das infecções humanas por espécies de Fusarium e relatar um caso desta entidade acompanhado em um hospital público do Recife-PE.

 

3. Relato de caso

Paciente E.X.S., sexo masculino, 61 anos, casado, motorista, natural de Nazaré da Mata, procedente de Campina Grande, admitido no Hospital das Clínicas da UFPE em novembro de 2005, apresentando lesão cutânea eritêmato-infiltrada em região infra-orbitária direita, estendendo-se para região nasal e infra-orbitária esquerda (ver imagem 1), associada à obstrução nasal bilateral, cefaléia, com início há nove meses. Refere ter sido submetido à cirurgia devido complicação de sinusite, três meses antes do surgimento da lesão. Paciente previamente hígido.

Realizada biópsia da lesão e o material foi encaminhado para o Laboratório de Micologia da UFPE. Exame direto foi realizado após clarear a amostra em solução de hidróxido de potássio a 20%. Os fragmentos foram inoculados em Agar Sabouraud e incubados por 7 dias. O exame direto revelou hifas hialinas septadas. A rara presença de delicadas macronídias e abundantes micronídias em cadeia possibilitou a identificação do F. moniliforme.

    Investigação radiológica foi realizada com tomografia computadorizada com contraste para avaliar a extensão da doença. As imagens evidenciaram lesão expansiva com atenuação de partes moles envolvendo os seios maxilares e etmoides.

    No terceiro dia do internamento foi iniciado Anfotericina B (0,7mg/kg/dia), durante 40 dias, com dose cumulativa de 2g. Observou-se uma melhora clínica expressiva já no segundo dia do antifúngico e ao final do tratamento houve regressão completa da lesão facial.

      Paciente evolui em acompanhamento há cerca de 1ano e 5 meses no Serviço de Otorrinolaringologia não apresentando recidiva de doença até o momento.

 

4. Discussão

Descrevemos um caso de infecção cutânea e de seios da face por Fusarium moniliforme em paciente imunocompetente tratado eficazmente com anfotericina B, numa dose cumulativa de 2g.

     Os primeiros casos de infecções de seios da face por F. solani ocorreram em dois hospedeiros imunocompetentes (18); entretanto esta é a primeira vez que o F. moniliforme é reportado como agente de rinossinusite crônica.

     A infecção de seios da face por Fusarium se manifesta com quadro insidioso de uma rinossinusite crônica que não responde ao tratamento clínico usual sendo necessário frequentemente tratamento cirúrgico. Os sintomas incluem cefaléia, dor retro-orbitária e raramente diplopia e exoftalmo. O paciente pode apresentar celulite facial ou periorbitária como extensão do acometimento dos seios da face pelo Fusarium.  Devido ao seu início insidioso o diagnóstico é frequentemente retardado ou equivocado. O tratamento envolve ressecções cirúrgicas e terapia antifúngica. O prognóstico é benigno e a cura é comum em hospedeiros imunocompetentes.

    Devido a sua gravidade e importância crescente, deve-se estar atento para a possibilidade de infecção por Fusarium tanto entre imunocompetentes como entre imunocomprometidos.

Suplemento
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