Relato de Caso
Perda auditiva neurossensorial na doença de Paget
Sensorineural hearing loss in Paget´s disease
Autores:
Christiano de Assis Buarque Perlingeiro (Médico ) Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Geral de Bonsucesso
Alexandra Torres Cordeiro Lopes de Souza (Mestre em Otorrinolaringologia pela UFRJ) Médica Otorrinolaringolosta do Hospital geral de Bonsucesso
Krishnamurti Matos de Araujo Sarmento Jr (Médico Otorrinolaringologista) Médico Otorrinolaringologista do Hospital Geral de Bonsucesso
Aline Acocella (Médica) Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Geral de Bonsucesso
Paula Magalhães Leite Jesus (Médica) Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Geral de Bonsucesso
Palavras-Chave
Doença de Paget, Osteite deformante, Perda auditiva neurossensorial
Resumo
Keywords
Paget´s disease, Osteitis deformans, Sensorineural hearing loss
Abstract
Instituição: Hospital Geral de Bonsucesso
Suporte Financeiro:
Introdução
A doença de Paget é uma desordem óssea descrita pela primeira vez por Sir James Paget em 1877, caracterizada por aumento do remodelamento ósseo com reabsorção, formação e mineralização excessiva, seguida por sua substituição por tecido fibroso, resultando em um osso trabecular grosseiro com arquitetura alterada, podendo acometer tanto ossos longos quanto chatos. Sua prevalência varia geograficamente, mas estima-se que esteja em torno de 3% da população acima dos 40 anos.
O acometimento auditivo está presente em aproximadamente 50% dos casos com envolvimento do osso temporal, podendo ser condutivo, neurossensorial ou misto. Apresentamos aqui um caso de perda auditiva neurossensorial pela Doença de Paget e discorremos sobre seus mecanismos fisiopatogênicos.
Relato de caso
Paciente de 69 anos, do sexo feminino, com diagnóstico firmado de doença de Paget há 20 anos, foi referida ao ambulatório de otorrinolaringologia por apresentar queixa de perda auditiva progressiva associada a zumbido de caráter não pulsátil em ambos ouvidos.
A ectoscopia revelou sinais clássicos da doença como macrocefalia com achatamento da calota craniana e arqueamento do fêmur. O exame otoscópico revelou um conduto auditivo externo sem alterações anatômicas e uma membrana timpânica de aspecto normal. O restante do exame otorrinolaringológico se mostrou dentro dos padrões de normalidade.
O exame audiométrico solicitado demonstrou uma perda auditiva neurossensorial de grau moderado a severo em ambos ouvidos com recrutamento e discriminação de 56% no ouvido esquerdo e 70% no direito.
A paciente foi tratada com bifosfonato e antiinflamatórios não esteroidais para alivio da dor e sendo então encaminhada para teste de prótese de amplificação sonora na orelha direita.
Discussão
Apesar da origem da perda auditiva neurossensorial na doença de Paget não ser claramente conhecida, numerosos mecanismos foram propostos por diversos autores, dentre eles a relação com a perda da densidade mineral óssea na cóclea, degeneração do ligamento espiral, hidropisia endolinfática e compressão do nervo auditivo.
Monsell et cols. avaliou através da tomografia computadorizada convencional e quantitativa a relação entre o diâmetro do conduto auditivo interno e da densidade da cápsula coclear com a perda auditiva. O resultado não revelou uma relação estatística significativa entre a perda auditiva e o diâmetro do conduto auditivo interno, todavia, apontou uma forte relação entre a densidade da cápsula ótica com a hipoacusia. No mesmo estudo ainda foi analisado a resposta à audiometria de tronco cerebral, que se mostrou normal em 56 dos 64 ouvidos avaliados e ausente em 8, apontando para uma integridade do nervo auditivo corroborando ainda mais para um mecanismo coclear 1,2
Em um estudo realizado no departamento de histopatologia da House Ear Institute foi avaliado dois pares de ossos temporais, post mortem, de pacientes acometidos pela doença e com perda auditiva documentada, acompanhados previamente pela instituição em questão. Uma degeneração cística do ligamento espiral da cóclea foi encontrada em ambos os casos. Foi evidenciada ainda hidropisia endolinfática em um dos casos associado a calcificações perisaculares, sugerindo que o componente sensorioneural poderia ser explicado por anomalias na estria vascular e no ligamento espiral que causariam alterações no transporte iônico e modificações na concentração de sódio e potássio na endolinfa 3.
O tratamento é preferencialmente clínico conservador. Os bifosfonatos são potentes inibidores da reabsorção óssea e são atualmente os fármacos de escolha por apresentarem melhor eficácia aliada a menor taxa de efeitos colaterais. A calcitonina, devido à sua propriedade de inativar os osteoclastos, também pode ser utilizada em pacientes em que o uso de bifosfonato esteja contra indicado. Ambos provocam diminuição nos níveis séricos de fosfatase alcalina e da cintigrafia óssea quantitativa, sendo esses úteis na monitoração do tratamento. Apesar de proporcionar melhora dos sintomas como dor óssea e cefaléia, seu efeito na melhora auditiva não está bem estabelecido. Donáth et cols. não evidenciaram melhora nos níveis auditivos de 25 pacientes acompanhados por um ano de tratamento com bifosfonato 4.
Os modernos aparelhos de amplificação sonora são capazes de providenciar uma excelente amplificação sonora e conseqüentemente uma boa reabilitação, apesar de possuir limitações quanto à severidade da perda, conforto e adaptabilidade, principalmente em pacientes em que o conduto auditivo externo esteja com sua anatomia comprometida. Uppal et cols. relataram um caso de reabilitação auditiva bem sucedida através da prótese auditiva ósseo integrada (BAHA) em uma paciente que apresentava uma má adaptação aos aparelhos convencionais 5. Bacciu et cols. descreveram um caso de uma paciente com doença e Paget e surdez profunda em que o implante coclear foi realizado apresentando bom resultado após 10 meses, com notável melhora na percepção da fala 6.
Comentários finais
A doença de Paget é a segunda doença óssea mais comum e freqüentemente acomete o osso temporal, provocando perda auditiva por um mecanismo multifatorial ainda não totalmente estabelecido. O tratamento clínico, apesar de provocar alívio nos sintomas álgicos, é incapaz de provocar melhora nos níveis audiométricos, podendo contudo retardar a evolução da doença.
Raio X de crânio
Lesões líticas e blásticas com aumento da calota craniana