Relato de Caso
Policondrite Recidivante com manifestação auditiva unilateral
Relapsing polichondritis with unilateral auditory manifestation
Autores:
Gustavo Vasconcelos Nery (Médico) Residente R2 em Otorrinolaringologia HC-UFG
Cintia Silvério de Faria (Médica) Residente R3 em Otorrinolaringologia HC-UFG
Tiago Fernando Aires Correa (Médico) Residente R1 em Otorrinolaringologia HC-UFG
Valeriana de Castro Guimarães (Fonoaudióloga) Responsável pelo serviço de Audiologia da Clínica de Otorrinolaringologia HC-UFG
João Batista Ferreira (Doutor em Otorrinolaringologia -) Chefe do Clínica de Otorrinolaringologia do HC - UFG
Palavras-Chave
Esclerite, Perda auditiva mista, Poliartrite, Policondrite recidivante
Resumo
A policondrite recidivante é uma doença sistêmica incomum, de causa desconhecida, não hereditária e provavelmente de natureza imunológica. Trata-se de um processo inflamatório que acomete estruturas cartilaginosas nasais e auriculares em 80% dos casos, vias aéreas superiores e articulações periféricas. O objetivo deste artigo é relatar um caso de policondrite recidivante com manifestações otorrinolaringológicas.
Keywords
Mixed hearing loss, Polyarthritis, Relapsing polichondritis, Scleritis
Abstract
Instituição: Hospital das Clínicas; Serviço de Otorrinolaringologia
Suporte Financeiro:
Introdução
A policondrite recidivante é uma doença sistêmica incomum, de causa desconhecida, não hereditária e provavelmente de natureza imunológica.1,2,3 Trata-se de um processo inflamatório que acomete estruturas cartilaginosas nasais e auriculares em 80% dos casos, vias aéreas superiores e articulações periféricas.4
O diagnóstico é clínico, podendo evoluir com deformidades nasais e de pavilhão auricular, colapso cartilaginoso laringotraqueal, aneurismas de grandes vasos, hipoacusia, déficit visual e doença valvular cardíaca.5 Antinflamatórios não hormonais, corticosteróides e imunossupressores são utilizados no tratamento.4
O objetivo deste artigo é relatar um caso de policondrite recidivante com manifestações otorrinolaringológicas.
Apresentação do Caso Clínico
Paciente JMA, 19 anos, cor negra, estudante, solteira, natural de Aruanã - Go. Procurou PS de Otorrinolaringologia do HC-UFG em agosto de 2006, com a seguinte sintomatologia em orelha esquerda há uma semana: dor, vermelhidão, inchaço, hipoacusia e zumbido, sem vertigem. Relatava ainda ardor e vermelhidão nos olhos, dores em articulação costocondral durante a inspiração, astenia e inapetência.
Nos últimos 6 meses manifestou 2 episódios de inflamação no pavilhão esquerdo, com melhora após uma semana.
Exame ORL: regular estado geral, normocorada, afebril, eupneica, PA: 125 x 80 mmHg e pulso: 86 bpm. Orofaringoscopia e Rinoscopia anterior sem alterações. Otoscopia: orelha direita normal; orelha esquerda com sinais de reação inflamatória em toda a área condral do pavilhão auricular e na área condral do conduto auditivo, sem características de infecção bacteriana. Membrana timpânica íntegra. Presença de hiperemia conjuntival e dor moderada à palpação nas articulações costocondrais.
Exames complementares: nasofaringolaringoscopia normal; TC de ossos temporais normal; audiometria com perda mista de grau severo à esquerda e limiares normais à direita; VHS - 71 mm; eletroforese de proteínas, FAN, C-ANCA, Células LE, Fator Reumatóide, VDRL e hemograma normais.
Realizado o diagnóstico clínico de Policondrite, iniciou-se tratamento com 60mg/dia de prednisona e 100mg/dia de azatioprina, resultando melhora acentuada dos sinais e sintomas apresentados.
No 11º dia a paciente recusou-se a permanecer internada, retornando à cidade de origem com prescrição de 60mg/dia de Prednisona e 100mg/dia de Azatioprina, não continuando o tratamento. Em contato recente do Serviço Social com os familiares no interior, visando seu retorno, fomos informados do óbito da paciente por prováveis complicações respiratórias.
Discussão
A policondrite recidivante acomete população entre 20 e 40 anos com pico de incidência na 4ª década e está associada à reação inflamatória de cartilagens com alteração das mesmas.
O diagnóstico da doença é predominantemente clínico, baseado nos critérios de McAdam6, que estabelece presença de três ou mais dos seguintes sintomas: condrite auricular bilateral; poliartrite inflamatória não erosiva soronegativo; condrite nasal; inflamação ocular; condrite do trato respiratório; disfunção coclear e/ou vestibular e confirmação de quadro histológico por biópsia de cartilagem. A paciente apresentou condrite auricular, episclerite e esclerite, surdez mista unilateral, zumbido e artrite costocondral, sugerindo clinicamente o diagnóstico, não sendo realizado biópsia de cartilagem.
A presença de edema no conduto auditivo externo justifica o componente condutivo da perda auditiva do tipo mista.1 Contrariando os critérios de McAdam a paciente manifestou apenas condrite unilateral, o que não impossibilitou o diagnóstico clínico.
Apesar de a paciente não ter prosseguido no tratamento, sabemos que a sobrevida da doença em 5 anos é de 74% e que o óbito ocorre principalmente por complicações respiratórias (laríngea ou traqueal) e valvular cardíaca.7 Embora sem comprovações de autópsia, a paciente faleceu por provável complicação respiratória, segundo informes da família, o que está de acordo com relatos da literatura.
Comentários Finais
O otorrinolaringologista deve estar atento frente a suspeita clínica de Policondrite Recidivante visando o seu diagnóstico precoce e tratamento, com apoio clínico e reumatológico, face as suas características complexas tais como autoimunidade e o curso com graves complicações.
Policondrite recidivante com perda auditiva unilateral
Inflamação da parte condral do pavilhão auricular