Trabalho Clínico
ANALISE DO TRATO VOCAL EM PACIENTES COM NÓDULOS, FENDAS E CISTO.
ANALYSES OF VOCAL TRAT IN PATIENTS WITH NODULES, CHINCKS AND CISTS.
Autores:
ANDREA MOREIRA VEIGA DE SOUZA (MESTRANDA EM OTORRINOLARINGOLOGIA PELA FACULDADE DE CIENCIAS MÉDICAS DA SANTA CASA DE SÃO PAULO. ) OTORRINOLARINGOLOGISTA
RAQUEL BUZELIN NUNES (MESTRADO EM FONOAUDIOLOGIA PELA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO) FONOAUDIOLOGA
ANDRE DE CAMPOS DUPRAT (PROFESSOR DA FACULDADE DE CIENCIAS MEDICAS DE SAO PAULO-SANTA CASA DE SÃO PAULO) PROFESSOR- OTORRINOLARINGOLOGISTA
MARTA ASSUMPÇÃO DE ANDRADE E SILVA (PROFESSORA DA PUC SÃO PAULO) FONOAUDIOLOGA- PROFESSORA
JULIANA GOMES PAULINO (OTORRINOLARINGOLOGISTA DO INSTITUTO DE OTORRINOLARINGOLOGIA DE MINAS GERAIS) OTORRINOLARINGOLOGISTA
REJANE CARDOSO COSTA (MEDICA OTORRINOLARINGOLOGISTADA AUDIOMIG-MG) OTORRINOLARINGOLOGISTA
Palavras-Chave
Trato vocal, Disfonia, Nasofibrofaringoscopia
Resumo
tract
RESUMO
Introdução: o plano supraglótico representa uma importante dimensão na produção vocal, sendo de grande relevância sua caracterização na avaliação e conduta terapêutica de indivíduos disfônicos. Objetivo: verificar se determinadas configurações glóticas se relacionam com ajustes específicos de trato vocal. Avaliar por meio da nasofibrolaringoscopia a freqüência dos ajustes do trato vocal supraglótico em mulheres disfônicas com nódulos, fendas e cistos. Método: Estudou-se 31 mulheres disfônicas, faixa etária entre 18 e 45 anos, com alteração vocal e diagnóstico de nódulos, fenda médio-posterior e cisto. Realizou-se avaliação resumida do sistema sensório-motor-oral, exames de videolaringoestroboscopia e nasofibrolaringoscopia. Foram selecionados três grupos distintos: nódulos bilaterais, fenda e cisto com configurações glóticas semelhantes. Foi realizada, por fonoaudiólogas e otorrinolaringologistas, a análise visual do trato vocal dos exames de nasofibrolaringoscopia, verificando os parâmetros de: constrição supraglótica, mobilidade vertical da laringe, constrição faríngea e mobilidade de língua. Os dados foram descritos e tratados estatisticamente. Resultados: na análise visual não foi encontrada diferença estatística significante que separasse os grupos das alterações glóticas. Conclusão: Não houve correlação dos ajustes do trato supraglótico a determinado tipo de alteração glótica. São comportamentos individuais que geram os ajustes e justificam as diferentes qualidades vocais em pacientes com mesmo tipo de alteração laríngea.
Keywords
Vocal tract, Disphonia, nasopharyngoscopy
Abstract
Abstract
The analysis of supraglotic vocal tract is very important in characterization of vocal quality and treatment of dysphonic subjects.Objective:to analyse the vocal tract in dysphonic women with different glottic configurations by nasofibrolaryngoscopy. Method:The studied sample comprised 31 wonen ,aged 20 to 45 years, with vocal complaints and affections.The otorrinolaryngologist reviewed the medical results and select exams that presented similar laryngeal affections, forming three distinct groups : bilateral nodules, chinks and cists.A VHS tape was edited with nasolaryngoscopic exams for visual analysis of the vocal tract .Visual analysis was jointly carried out by three speech therapists and three otorrinolaryngologists that checked the following parameters: supraglottic constriction, vertical laryngeal mobility, pharyngeal constriction and tongue mobility.Data from visual, perceptual and acoustic analyses were statistically analyzed. Results: The results of the visual analysis did not show statistically significant differences that could distinguish the groups. Conclusion:vocal tract parameters analysed is not exclusively related with specific glottic affection , its differ in different dysphonic subjects, evidencing the need to consider individual supraglottic adjustments in the characterization of dysphonic subjects.
Instituição: PontifÍcia Universidade Católica de São PAULO
Suporte Financeiro: CAPES
Introdução:
O plano supraglótico representa uma importante dimensão na produção vocal, sendo de grande relevância sua caracterização na avaliação e conduta terapêutica de indivíduos disfônicos, uma vez que estes utilizam estratégias compensatórias para suprir alterações anatômicas e/ou funcionais para produzir a voz (CAMARGO 2002). Apesar disso, percebe-se que as pesquisas médicas e fonoaudiológicas tem seu olhar voltados principalmente para imagem laríngea e geralmente não consideraram o plano supraglótico.
Muitas vezes o paciente com uma determinada lesão nas pregas vocais beneficia-se com a possibilidade da plasticidade do trato vocal modificando as características acústicas da voz. Isto também é percebido quando o paciente apresenta uma grande melhora na qualidade vocal após tratamento fonoterápico e não apresenta mudanças na imagem da glote.
Diante da constatação de que configurações glóticas parecidas, em pacientes disfônicos, podem gerar qualidades vocais diferentes começamos a refletir sobre a ação do trato supraglótico como responsável pela diferenciação das vozes. Como seria possível que imagens glóticas semelhantes gerassem vozes tão distintas?
A partir dessa percepção, surge o interesse em estudar o comportamento do trato vocal em mulheres disfônicas com nódulos, cistos e fendas semelhantes.
Objetivo
Verificar a freqüência e analisar comparativamente, por meio da nasofibrolaringoscopia os ajustes do trato vocal supraglótico em três grupos de pacientes do sexo feminino, disfônicos, portadores de nódulos, fendas e cistos, com configurações glóticas semelhantes.
Método
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo n° 0164/2003
Foram estudados 31 indivíduos do sexo feminino, faixa etária entre 20 e 45 anos por ser esta faixa considerada a de maior eficiência vocal (BEHLAU et.al 2001), que freqüentaram uma clínica particular de otorrinolaringologia da cidade de Belo Horizonte, com queixa de alteração na voz e diagnóstico videolaringoestroboscópico de nódulos, fenda médio-posterior e cistos durante os meses de outubro e novembro de 2004.
Foi considerado para este estudo a nomeclatura referente às alterações laríngeas definindo nódulos como lesões de massa benigna geralmente bilaterais, de ocorrência na porção anterior das pregas vocais. Fenda médio-posterior como a imagem geométrica do espaço remanescente da rima glótica durante a fonação, quando o vértice oposto a base atinge geralmente o terço médio das pregas vocais e cisto como cavidade fechada localizada no interior da prega vocal. (BELHAU, MADAZIO E PONTES 2001)
Critérios de inclusão: Paciente do sexo feminino, com queixas de alteração na voz há mais de três meses, que não estivesse em terapia fonoaudiológica, e nunca tivesse sido submetido a microcirurgia laríngea ou qualquer tipo de tratamento anterior com relação à voz para não influenciar na avaliação de maneira geral.
Critérios de exclusão, os indivíduos não poderiam apresentar alterações mentais ou do sistema-sensório-motor oral que pudessem interferir na avaliação, tais como: alterações severas de tônus e mobilidade de lábios, bochechas e língua, alterações de oclusão tipo classe dois ou três, falhas na arcada dentária, alterações de vias aéreas superiores e inferiores no dia do exame, uso de aparelho fixo ou prótese dentária que, segundo OLIVEIRA e PINHO (2001), interfere de modo significativo nos ajustes presentes na fala. Para tanto foi elaborado pela pesquisadora um protocolo de identificação do indivíduo e seleção da amostra. Nesse protocolo havia dados da idade, queixa do paciente, hábitos, ingestão de água, uso de voz, profissão e uma avaliação resumida dos aspectos do sistema sensório-motor-oral: lábios, língua e bochechas (tônus e mobilidade), alteração de oclusão dentária, uso de prótese dentária ou aparelho ortodôntico, articulação (ampla, fechada, travada, "em sorriso", verticalizada) e face (longa, curta, média, simétrica ou assimétrica).
Todos os sujeitos foram informados e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecidos.
A laringoscopia direta foi realizada por otorrinolaringologista, com telescópio rígido Marca Mashida 30º ou Explorent 70º, acoplado a uma micro-câmera marca Toshiba, fonte de luz estroboscópica stroboview marca Bruel & Kjaer, gravada em fita VHS em videocassete marca JVC super VHS e televisor LG 20'' para o diagnóstico das lesões. O médico introduziu o laringoscópio pela boca e solicitou ao paciente a emissão de uma vogal /ê/, /i/ prolongada e fonação inspiratória. Quando o paciente referiu desconforto foi aplicada uma anestesia local (Neotocaína 10%).
Logo após a avaliação foi realizada a nasofibrolaringoscopia com fibroscópico Mashida ENT 30 P III acoplado a micro câmera Toshiba, fonte de luz Alphatron, que foi introduzido pela narina, posicionado logo abaixo do palato mole para verificação dos ajustes do trato vocal. O paciente foi instruído a fazer uma vogal prolongada /a/ e fala espontânea. Os exames foram gravados em fita VHS, videocassete modelo JVC super VHS.
Os exames (laringoscopia direta) foram apresentados em um outro momento a mais dois otorrinolaringologistas, separadamente. Os laudos foram comparados e permaneceram na pesquisa os laudos coincidentes . Foram excluídos da amostra 20 exames por: dúvidas no diagnóstico, imagem não conclusivas ou laudos não coincidentes. Dos 40 exames que tiveram os laudos coincidentes, foram selecionados, pelos otorrinolaringologistas, os que possuíam aspectos glóticos semelhantes, ou seja, mesmo tipo de fenda de tamanho proporcional, mesmo tipo de lesão com mesmo tipo de fenda associada, tamanho e forma semelhantes e mesma localização na prega vocal. Assim, nove exames foram excluídos da amostra permanecendo na pesquisa um total de 31 exames que foram divididos em três grupos dentro dessas semelhanças. O primeiro grupo continha os exames que apresentaram nódulos bilaterais (grupo 1); o segundo, cisto (grupo 2) e o terceiro, fenda (grupo 3). A questão das semelhanças dos exames é de extrema importância neste trabalho; por isso a escolha foi realizada deste modo e não pela incidência na clínica.
Os exames de nasofibrolaringoscopia correspondente aos grupos citados acima foram analisados por três otorrinolaringologistas e três fonoaudiólogas, com experiência superior a cinco anos na área de voz, em consenso, para garantir maior fidedignidade do julgamento.
Foi utilizado o protocolo desenvolvido na Santa Casa de São Paulo, adaptado para este estudo que analisou as seguintes estruturas: presença ou não de constrição supraglótica; mobilidade vertical de laringe; presença ou não de constrição faríngea e posicionamento de língua.
Foi realizada uma análise descritiva dos resultados da análise visual e a seguir a análise estatística dos dados apresentados. Foi feita análise comparativa por meio do teste estatístico KrusKal - Wallis, a fim de verificar se havia diferenças entre os grupos estudados. Foi adotado como significância o valor de 5% (p= 0,050).
Resultados
Foram analisados 31 pacientes do sexo feminino divididos em três grupos sendo: 10 pacientes com diagnóstico de nódulos, 10 fendas e 11 cistos.O resultado da análise visual dos 3 grupos está representada na tabela 1.
Tabela 1: Descrição da análise visual, por meio de nasofibrolaringoscopia, da freqüência dos ajustes do trato vocal supraglótico, nos três grupos (nódulos, fendas, cistos)
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Nódulos |
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fendas |
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cistos |
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N |
% |
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N |
% |
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N |
% |
constrição supraglótica |
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|
sem constrição |
3 |
30 |
|
4 |
40 |
|
3 |
27,3 |
constrição mediana |
0 |
0 |
|
1 |
10 |
|
2 |
18,2 |
Constrição antero-posterior |
6 |
60 |
|
5 |
50 |
|
4 |
36,3 |
Constrição Antero-posterior e mediana |
1 |
10 |
|
0 |
0 |
|
2 |
18,2 |
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|
Mobilidade vertical laringea |
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|
ampla |
2 |
20 |
|
1 |
10 |
|
0 |
0 |
média |
3 |
30 |
|
6 |
60 |
|
3 |
27,3 |
restrita |
5 |
50 |
|
3 |
30 |
|
8 |
72,7 |
|
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|
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|
|
|
|
Faringe |
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sem constrição |
4 |
40 |
|
6 |
60 |
|
5 |
45,5 |
ampliada |
0 |
0 |
|
0 |
0 |
|
0 |
0 |
constrição circular |
3 |
30 |
|
2 |
20 |
|
4 |
36,3 |
constrição lateral |
3 |
30 |
|
2 |
20 |
|
2 |
18,2 |
|
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Língua |
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anteriorizada |
1 |
10 |
|
3 |
30 |
|
0 |
0 |
neutra |
9 |
90 |
|
7 |
70 |
|
11 |
100 |
com dorso elevado |
0 |
0 |
|
0 |
0 |
|
0 |
0 |
Em relação ao ajuste de constrição supraglótica 3 pacientes do grupo de nódulos, 4 (4 do grupo de fenda e 3 do grupo de cisto não apresentaram constrição. 1 paciente do grupo de fenda e 2 do grupo de cisto apresentaram constrição mediana. 6 pacientes do grupo de nódulos, 5 do grupo de fenda e 4 do grupo de cisto apresentaram constrição antero-posterior e 1 paciente do grupo de nódulos e 2 pacientes com grupo de cisto apresentaram constrição antero-posterior e mediana.
Em relação a mobilidade laríngea 2 pacientes com nódulos,1 com fenda apresentaram mobilidade ampla. 3 pacientes com nódulo, 6 com fenda, e 3 com cisto apresentaram mobilidade média e 5 pacientes com nódulos, 3 com fenda e 8 com cisto apresentaram mobilidade restrita.
Em relação a faringe 4 pacientes com nódulos, 6 com fenda e 5 com cisto não apresentaram constrição faríngea. Nenhum paciente apresentou faringe ampliada. 3 pacientes com nódulos, 2 com fenda e 4 com cisto apresentaram constrição circular. 3 pacientes com nódulo, 2 com fenda e 2 com cisto apresentaram constrição lateral.
A postura de língua neutra foi mais freqüente nos três grupos (9 nódulos, 7 fenda, 11 cisto). Língua anteriorizada foi observada em 1 paciente com nódulo e 3 com fenda. Nenhum paciente apresentou língua posteriorizada.
Posteriormente foi realizada uma análise comparativa, por meio do teste estatístico de KrusKal - Wallis, dos ajustes presentes nos grupos e não foi observada diferença estatisticamente significante entre os grupos. A seguir serão demonstrados os ajustes observados nos indivíduos durante a emissão da fonação sustentada e fala encadeada (tabela 2).
Tabela 2: Descrição da comparação dos grupos em relação ao ajuste durante a emissão da fonação sustentada e fala encadeada com sua significância (p < 0,050)
AJUSTE |
Significância (p) |
Sem constrição supraglótica |
0,815 |
Supraglote costrição mediana |
0,619 |
Supraglote constrição ântero-posterior |
0,644 |
Mobilidade de laringe ampla |
0,313 |
Mobilidade de laringe média |
0,573 |
Mobilidade de laringe restrita |
0,229 |
Faringe sem constrição |
0,660 |
Faringe ampliada |
1,000 |
Faringe constrição circular |
0,988 |
Faringe constrição lateral |
0,518 |
Língua ampla |
0,125 |
Língua neutra |
0,125 |
Língua com dorso elevado |
1,000 |
teste KrusKal - Wallis
Discussão:
A partir da observação clínica diária de pacientes disfônicos, com diagnósticos semelhantes apresentando, qualidades vocais distintas, despertou-nos o interesse em verificar o que ocorria no plano supraglótico. Sabendo-se que o indivíduo atua em diferentes profissões e têm comportamentos individuais e características anatômicas próprias de sua constituição, tivemos como primeiro desafio selecionar indivíduos que apresentassem configurações glóticas parecidas. Por esta dificuldade, fizeram parte dessa amostra um número restrito de trinta e um indivíduos, que foram posteriormente divididos em três grupos, de acordo com a configuração glótica apresentada. A questão do grupo foi pensada, a princípio, com o objetivo de verificar se os indivíduos apresentavam comportamentos no plano supraglótico distintos ou semelhantes.
Ressaltamos que a amostra foi composta apenas por indivíduos do sexo feminino pelo alto índice de disfonia neste sexo. Não foram selecionados ambos os sexos pela diferença existente na proporção glótica e no comprimento e formato do trato supraglótico.
A análise visual do trato supraglótico foi realizada por três otorrinolaringologistas e três fonoaudiólogas experientes na área de voz. Optou-se por fazer a avaliação em consenso para garantir maior fidedignidade dos dados. Notou-se que durante a análise visual houve uma dificuldade por parte dos juízes em avaliar o tipo de constrição faríngea e, principalmente, o posicionamento de língua. Enfatizamos que a avaliação em conjunto foi de extrema importância, mostrando a relevância do trabalho multidiciplinar, em que a troca de conhecimentos e reflexões pode levar a nova condutas e a um crescimento profissional em ambas as áreas.
A faixa etária deste estudo variou entre 20 e 45 anos, correspondendo com a faixa etária encontrada nos estudos de CASPER et.al (1987); CAMPIOTTO (1998); BEHLAU et. al (2001); CAMARGO (2002); CAMPOS (2002); BEZERRA (2003); HARA e VELOSO (2003); MAGRI (2003); VILARIM (2003).
Outros estudos (CAMPIOTTO 1998; STORY et.al 1998; HARA e VELOSO 2003; MAGRI 2003; VILARIM 2003) também continham em sua amostra apenas indivíduos do sexo feminino, provavelmente porque a prevalência de disfonia é mais freqüente neste sexo.
Nos estudos de TITZE et.al (1997); CAMPIOTTO (1998); CAMPOS (2002); BEZERRA (2003), os indivíduos eram profissionais da voz. No nosso estudo, das 31 mulheres, 23 eram profissionais da voz, sendo que 11 eram professoras e as demais eram secretárias, comerciantes, advogada, operadora de telemarketing, atrizes e cantoras. Acreditamos que os ajustes no trato supraglótico ocorram com mais freqüência nestes profissionais por conseguirem, algumas vezes, benefícios no uso da voz. É comum observarmos que professores podem se utilizar de constrição faríngea para auxiliar na projeção da voz. Cantores normalmente realizam ajustes de constrição faríngea, constrição supraglótica ântero-posterior e a mobilidade vertical ampla de laringe, com a intenção de aumentar o volume da voz, ganhar projeção ou realizar determinado gênero musical, e atores podem realizar várias mobilizações de língua para produzir diferentes tipos de vozes. Recursos esses, não observados nos indivíduos que não são profissionais da voz falada ou cantada.
Inúmeros trabalhos (CASPER et.al 1987; BEHLAU et.al. 1988; TITZE et.al 1997; AZEVEDO et.al. 1998; CAMPIOTTO 1998; STORY et.al 1998; FITCH e GIEDD 1999; FANT et.al 2000; TOM et.al. 2001; CAMPOS 2002; BEZERRA 2003; HANAYAMA 2004) foram realizados visando o plano supraglótico, porém com indivíduos normais. Poucos (DEJONCKERE et.al 1996; CAMARGO 2002; HARA e VELOSO 2003; MAGRI 2003, JORGE et.al 2004) abordaram os indivíduos disfônicos.
Em relação à análise visual do trato vocal supraglótico, foram avaliados os parâmetros constrição supraglótica, mobilidade laríngea, constrição faríngea e posicionamento de língua. Outros estudos que também avaliaram estes aspectos foram os de CAMPIOTTO (1998), realizados com cantores, CAMPOS (2002) e BEZERRA (2003), com atores; DENUNCI (2003), com crianças, quando comparou a qualidade vocal pré e pós adenoidectomia e tonsilectomia.
Durante a analise visual observamos grande variedade na freqüência dos ajustes nos três diferentes grupos (Tabela 1). Verificamos que os ajustes de trato não foram específicos para determinada configuração glótica, não podendo assim correlacionar as características do trato supraglótico a cada tipo de alteração glótica estudada.
Neste estudo tentamos observar se determinadas configurações glóticas se relacionavam com ajustes específicos do trato supraglótico. Todavia, ao comparar os ajustes encontrados nos três grupos, não foi observada nenhuma diferença estatisticamente significante entre eles (Tabela 2). São comportamentos individuais que geram os ajustes o que justifica as diferentes qualidades vocais observadas em pacientes com mesmo tipo de alteração laríngea. Isto pode ser reforçado pelos estudos de HARA e VELOSO (2003).
Vale ressaltar que, durante a análise visual dos ajustes supraglóticos, os pesquisadores perceberam a importância da realização do exame de nasofibrolaringoscopia no diagnóstico e tratamento de indivíduos disfônicos, além do exame de videolaringoestroboscopia. Infelizmente, a avaliação das estruturas supraglóticas é um recurso pouco utilizado na clínica médica; contudo, o diagnóstico dos ajustes supraglóticos são importantes para o trabalho com os indivíduos disfônicos e essencial principalmente nos profissionais da voz.
Procuramos, por meio deste estudo, desviar o olhar da glote e suas alterações, e valorizar o trato, tão pouco considerado . Tentamos mostrar que a voz é produto de uma ligação entre fonte (glote) e filtro (trato vocal) e que qualidade vocal não pode ser relacionada apenas às alterações glóticas.
A partir desse estudo, percebe-se uma deficiência na utilização dos métodos de avaliação disponíveis e enfatiza-se a necessidade de se criar novos protocolos que contemplem todos os aspectos envolvidos na produção vocal.
Conclusão
Da análise visual do comportamento do trato supraglótico, em mulheres disfônicas com diferentes configurações glóticas verificou-se que:
Os ajustes de trato não foram específicos para determinada configuração glótica, não podendo assim correlacionar as características do trato supraglótico a cada tipo de alteração glótica estudada.
Ao comparar os ajustes encontrados nos três grupos, não foi observada nenhuma diferença estatisticamente significante entre eles. São comportamentos individuais que geram os ajustes o que justifica as diferentes qualidades vocais observadas em pacientes com mesmo tipo de alteração laríngea e a necessidade de tratamentos específicos individualizados.
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