ABORLccfRevista Brasileira de Otorrinolaringologia

Relato de Caso

Histiocitose de células de langerhans de osso temporal: relato de caso
Langerhans cell histiocytosis of the temporal bone: case report

Autores:

Humberto de Barros Fernandes (Médico) Residente do 3º ano de Otorrinolaringologia do Hospital de Base do Distrito Federal

Jacinto de Negreiros Júnior (Mestre em Otorrinolaringologia) Preceptor do Programa de Residência Médica de Otorrinolaringologia do Hospital de Base do Distrito Federal

Ana Maria F. M. Braga (Médica) Otorrinolaringologista do Hospital de Base do Distrito Federal

Gabriel Bezerra Rêgo (Médico) Residente do 2° ano de Otorrinolaringologia do Hospital de Base do Distrito Federal

Adra Brasil Batista Leitão (Médica) Ex-residente de Otorrinolaringologia do Hospital de Base do Distrito Federal

Rodrigo Bretas Abreu (Médico) Residente do 3° ano de Anatomia Patológica do Hospital de Base do Distrito Federal

Palavras-Chave
histiocitose, osso temporal

Resumo

Keywords
histiocytosis, temporal bone

Abstract

 

Instituição:

Suporte Financeiro:

INTRODUÇÃO:

A histiocitose de células de Langerhans é um distúrbio proliferativo de etiologia desconhecida destas células e pode apresentar-se sob três formas: uma limitada ao sistema esquelético, focal ou múltipla, também chamada granuloma eosinofílico; uma mista, envolvendo tecidos moles e ossos, denominada doença de Hand-Schüller-Christian; e outra forma visceral, a mais grave, designada de Letter-Siwe1,6. Embora haja casos na literatura descritos em adultos2,3, é doença rara da faixa pediátrica. Estima-se sua incidência em torno de 1 a 5 casos por 1 milhão de crianças ao ano. As manifestações em cabeça e pescoço são as mais freqüentes, em torno de 60% dos casos, e seu diagnóstico torna-se difícil uma vez que mimetiza outras doenças mais comuns vistas pelo otorrinolaringologista, como otite externa, mastoidite aguda e gengivite4. O estudo tomográfico mostra lesões ósseas líticas, enquanto a ressonância magnética é mais sensível para medula óssea e partes moles; a cintilografia óssea mostra os locais de doença ativa, podendo ser usada no seguimento5. O diagnóstico definitivo é feito por biópsia através dos achados histopatológicos e detecção pela imunohistoquímica dos antígenos S-100 e CD1. O tratamento é cirúrgico, quimioterápico ou radioterápico, isolados ou combinados, a depender do caso1,6. Descrevemos o caso de uma criança com acometimento unilateral do osso temporal pela doença.

 
DESCRIÇÃO DO CASO:

G.C.G., masculino, 1 ano e 7 meses, dá entrada na urgência com relato de secreção amarelada em orelha e inchaço retroauricular direitos. Negou febre ou quadro de infecção respiratória prévia. À otoscopia: secreção purulenta em conduto auditivo externo (CAE) direito e abaulamento retroauricular com sinais flogísticos e flutuação. Orelha esquerda de aspecto normal. A orofaringorinoscopia e o exame do pescoço não evidenciaram alterações. Com a hipótese de otomastoidite aguda, a criança foi internada, realizando tomografia computadorizada (TC) de mastóides e instituída antibioticoterapia venosa. A TC mostrou velamento da mastóide direita com erosão da cortical externa, sugestivo de mastoidite coalescente. Diante do quadro, foi realizada drenagem da mastóide com saída de secreção purulenta. Dois dias após houve redução da otorréia e dos sinais inflamatórios e a criança teve alta hospitalar com antibiótico oral por 14 dias. Nas próximas cinco semanas, a criança é reinternada duas vezes com otorréia e tecido de granulação em mastóide direita. A biópsia nessas internações mostrou apenas processo inflamatório crônico. Uma nova TC mostra velamento da mastóide direita por material com densidade de partes moles e invasão da pele adjacente; tegmen timpani aparentemente íntegro. É realizada mastoidectomia e enviado material para biópsia. No pós-operatório a criança apresentou estrabismo convergente à esquerda. O laudo, após imunohistoquímica positiva para os marcadores S-100 e CD1, veio diagnóstico de histiocitose de células de Langerhans (Fig.01). Após avaliação da oncologia clínica, que incluiu raios-x de esqueleto e ultrassonografia abdominal - ambos normais - foi instituído quimioterapia com prednisona e vimblastina. A criança encontra-se em seguimento, sem sinais de recidiva.

 
DISCUSSÃO:

O acometimento do osso temporal pela histiocitose varia de 15 a 60% dos casos, sendo ainda maior se inclusos achados radiológicos em pacientes assintomáticos; sua ocorrência bilateral é descrita em até 30% dos casos3,4. O caso descrito está de acordo com a literatura, uma vez que a região da cabeça e pescoço é a mais freqüente (Embora seja sítio único de doença em apenas 34 a 48% dos casos6), assim como o sexo masculino e a idade do paciente. O achado histopatológico é diagnóstico, mas os marcadores imunohistoquímicos permitem diferenciar a histiocitose da osteomielite granulomatosa e do linfoma maligno7. Diagnosticada a doença, a pesquisa de focos viscerais e esqueléticos é fundamental em crianças abaixo de três anos de idade, pois o comprometimento do osso temporal é mais comum na doença multissistêmica e,segundo a literatura, pacientes menores de três anos são os com pior prognóstico e os mais acometidos pelas formas viscerais3,4,6. O tratamento cirúrgico foi factível neste caso pela sua localização e a quimioterapia adjuvante foi realizada pela presença de doença residual. Esta modalidade terapêutica deve ser considerada em crianças jovens, pela sua maior chance de desenvolver doença disseminada e pelas conseqüências a longo prazo da radioterapia7. Na presença de otomastoidites de repetição com lesões polipóides em ouvido médio refratárias à antibioticoterapia, em crianças sem relato prévio de infecções de vias aéreas superiores, a histiocitose deve entrar no diagnóstico diferencial.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

1. Bayazit et al. - Eosinophilic granuloma of the temporal bone. Auris Nasus Larynx. 28 (1): 99-102, 2001.

2. Fuertes Cabero S et al. - Usefullnes of bone scintigraphy for staging in a case of histiocytosis of the temporal bone. Rev Esp Med Nucl. 24(1): 45-7, 2005.

3. Cajade Frías JM et al. - Unifocal eosinophilic granuloma of the temporal bone (Langerhans cell histiocytosis). Acta Otorrinolaringol Esp. 51(6): 525-9, 2000.

4. Cochrane LA et al. - Langerhans' cell histiocytosis in the pediatric population: presentation and treatment of head and neck manifestations. J Otolaryngol. 32(1): 33-7, 2003.

5. Azouz EM et al. - Langerhans' cell histiocytosis: pathology, imaging and treatment of skeletal involvement. Pediatr Radiol. 35(2): 103-15, 2005.

6.  Martini A et al.  - Langerhans' cell histiocytosis: report of a case with temporal localization. Int J Pediatr Otorrhynolaryngol. 55: 51-56, 2000.

7. Kleinjung T et al. - Langerhans' cell histiocytosis with bilateral temporal bone involvement. Am J Otolaryngol. 24,4: 265-270, 2003.

Figura 01

Reação imunohistoquímica, apresentando positividade para S100 (à esquerda) e CD1a (à direita), em histiócitos proliferados.

Suplemento
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