Artigo publicado no Caderno de Debates da RBORL:
Vol.64 ed.4 de Julho-Agosto em 1998 (da página 05 à 15)
Autor: Karen Borne Teufert* Fabíano Sbicigo Aita**; Shírley S. Nagata Pignatari***
Artigo
Sinusite, Rinite e Doenças Sistêmica
Introdução

A sinusite é uma doença comum tanto na infância quanto na população adulta, e cada vez mais pediatras, alergistas e otorrinolaringologistas se conscientizam da magnitude deste problema. A sua origem é multifatorial e, entre os fatores predisponentes, a alergia respiratória é considerada um dos mais freqüentes e importantes, principalmente no desenvolvimento da sinusite crônica e recorrente na criança. As crianças alérgicas com sintomas de rinite e/ou asma habituamente apresentam maior incidência de sinusite; e, por outro lado, a sinusite é reconhecidamente um fator agravante da asma, tanto nos indivíduos atópicos quanto nos não atópicos (28).

Além da asma, outras doenças sistêmicas estão relacionadas com quadros freqüentes de sinusite crônica ou recorrente; e, entre elas, as mais importantes são as imunodeficiências, as desordens da motilidade ciliar e a fibrose cística(27). Embora, na avaliação de um paciente portador de rinossinusite, estas moléstias sejam habitualmente diagnósticos de exclusão, é importante lembrar que o processo nasossinusal pode ser a primeira ou sua manifestação mais importante. O conhecimento da relação existente entre rinossinusite e essas doenças sistêmicas é de grande importância, à medida que facilita o diagnóstico precoce, permitindo a instituição do tratamento adequado e, conseqüentemente, diminuindo o índice de morbidade.

Sinusite e imunodeficiência

Estudos recentes revelam que a incidência de imunodeficiência na população em geral é menor que 0,5%(32). Os sintomas de sinusite na criança com imunodeficiência são os mesmos que aparecem na criança imunologicamente normal ou alérgica: obstrução nasal, rinorréia e tosse noturna e diurna. Odinofagia, rinorréia posterior, halitose, mal-estar, fadiga e irritabilidade ocorrem freqüentemente, enquanto que dor de cabeça e febre são raras.

A ocorrência de infecções bacterianas freqüentes associadas à infecção do trato respiratório deve alertar o médico para a possibilidade de imunodeficiência. A criança que apresenta uma imunodeficiência está constantemente em uso de antibióticos; e, em curto período de tempo, torna-se novamente doente, após a suspensão dos mesmos(27).

Algumas características na história podem auxiliar a diferenciar os pacientes alérgicos dos portadores de imunodeficiências. O indivíduo com atopia geralmente apresenta história familiar, padrão sazonal de sintomas respiratórios e boa resposta a anti-histamínicos: Da mesma forma, uma história familiar de imunodeficiência, associada a infecções recorrentes, lembra um paciente imunodeficiente(9).

O reconhecimento de pacientes imunodeficientes dentro do grupo de crianças predipostas à sinusite é baseado primariamente na história e com ênfase no exame físico. Estudos laboratoriais devem ser considerados confirmatórios e não devem ser usados como screening(9).

Crianças imunodeficientes que chegam ao consultório médico por sinusite crônica ou recorrente geralmente apresentam imunodeficiência humoral primária. Estas incluem deficiências em imunoglobulinas, deficiência seletiva de subclasse IgG, deficiência seletiva de anticorpos e deficiência de componentes do complemento.

Embora a sinusite seja uma manifestação comum nos pacientes HIV positivos, raramente é o motivo para procurarem ajuda médica(21).

Produção deficiente de imunoglobulinas e/ou anticorpos é o defeito imune mais comum e também compreende a maioria dos pacientes imunodeficientes que são predipostos à sinusite(9).

As imunodeficiências mais observadas em pacientes predispostos à sinusite são, pela ordem: imunodeficiência variável comum, deficiência de subclasses de IgG, deficiência de IgA, deficiência de C4, agama-globulinemia ligada ao cromossomo X, ataxia-telangiectasia e imunodeficiência hiper-IgM(9).

Imunodeficiência variável comum Imunodeficiência variável comum (CVID) é uma desordem em que há diminuição dos níveis de imunoglobulinas (usualmente IgG e IgA) e incapacidade de síntese de anticorpos a antígenos não expostos previamente. Quadros infecciosos iniciam-se ao redor dos dois anos de idade e estendem-se até a idade adulta. Na maioria, os pacientes são portadores de sinusite crônica e/ou recorrente, podendo também apresentar pneumonias, assim coma otites médias e bronquites recorrentes(9).

Deficiência de subclasses IgG

A IgG compreende quatro subclasses: IgGl, IgG2, IgG3 e IgG4. A deficiência mais comum na infância ocorre na subclasse IgG2; e, nos adultos, na IgG3. É comum nestes pacientes o aparecimento de sinusite crônica e/ou recorrente, otite média, bronquite e pneumonias.

Segundo Shackelford, em algumas crianças a imunodeficiência de IgG pode constituir-se em um distúrbio transitório, desaparecendo com o crescimento do paciente(9).

Deficiência de anticorpos seletivos

A deficiência de anticorpos seletivos engloba um grupo de pacientes que pode ser suscetível a infecções recorrentes, por causa de uma inabilidade de produzir anticorpos contra um determinado número de antígenos, mais comumente polissacárides pneumocócicos. Esse distúrbio pode ocorrer concomitantemente a deficiência seletiva de IgG, mas com o nível sérico total de imunoglobulinas normal(35).

Deficiência de IgA

A deficiência seletiva de IgA ocorre em até 0,2% da população. Nas crianças, os níveis de IgA elevam-se lentamente, sendo que o diagnóstico de deficiência de IgA deve ser feito apenas após os dois anos de idade. Somente em alguns pacientes com essa alteração ocorre um aumento da suscetibilidade a infecções do trato respiratório e sinusites recorrentes(9). Nos indivíduos em que a deficiência de IgA está associada à deficiência de IgG2 ou IgG2/IgG4 ocorre um aumento na predisposição a infecções do trato respiratório, em relação aos pacientes que só possuem deficiência de IgA(19). Esse distúrbio pode ser transitório em crianças com até seis anos de idade.

Agamaglobulinemia ligada ao cromossomo X Pacientes com agamaglobulinemia ligada ao cromossomo X (XLA) apresentam uma deficiência severa nas subclasses IgG, IgA e IgE e são incapazes de sintetizar anticorpos para qualquer tipo de antígeno. Estes indivíduos apresentam grande suscetibilidade a infecções e experimentam infecções bacterianas sistêmicas severas, como pneumonias, sepsis, meningites e celulites, desde os seis e até os doze meses de idade(9).

Otites médias e sinusites recorrentes também ocorrem; e os pacientes, nestes casos, necessitam de reposição intravenosa de imunoglobulina.

Deficiência de componentes do complemento Deficiência de componentes do complemento é um distúrbio relativamente raro como causa de sinusite recorrente e/ou crônica, e engloba somente 2% de todas as imunodeficiências.

Nas crianças é mais comum a deficiência do componente C4 do complemento(24).

Hipogamaglobulinemia transitória da infância Pacientes com hipogamaglobulinemia transitória da infância (THI) apresentam infecções recorrentes do trato respiratório superior quando se encontram por volta de seis a doze meses de idade. Em geral, estes indivíduos sofrem resolução espontânea da THI em torno dos dois anos de idade, podendo, em alguns casos, persistir níveis séricos de IgA diminuídos até os cinco a seis anos(9).

Se o paciente é propenso à sinusite, isto é, apresenta três ou mais episódios de sinusite em um ano, ou necessitar de antibioticoterapia para controle da sinusite por três meses ou mais durante um ano, níveis de imunoglobulina sérica (IgA, IgM e IgE), assim como subclasses de IgG, devem ser dosados. Se a história do paciente sugere alergia respiratória, testes alérgicos apropriados ou teste RAST devem ser realizados. A combinação destes testes vai detectar cerca de 75% dos pacientes.

Tratamento

O tratamento medicamentoso dos episódios de sinusite no paciente imunodeprimido é o mesmo no paciente não imunodeprimido, mas os indivíduos que recebem terapia medicamentosa e/ou cirúrgica, sem tratamento simultâneo da imunodeficiência; apresentam falha na terapia(21). Tratamento com reposição de imunoglobulinas é indicado nos pacientes com deficiências de imunoglobulinas e anticorpos, tais como: imunodeficiência variável comum, XLA e agamaglobulinemia, e pode ser dispensada na THI. O tratamento de escolha para reposição de imunoglobulina E é a infusão intravenosa de imunoglobulina (MG). A IVIG é administrada em intervalos de quatro semanas na dose de 400 mg/kg de peso. Os níveis séricos de imunoglobulinas devem ser dosados após as infusões, durante os primeiros três meses, seguidos de intervalos de três meses(8, 29).

Medidas tópicas, como irrigação nasal 2xx/dia com solução salina, seguidas de corticóide nasal tópico, ajudam na limpeza do muco e diminuem o edema e a inflamação. A escolha do antibiótico para o tratamento da infecção é baseada no nosso conhecimento da bacteriologia das infecções sinusais. Culturas de secreções dos seios paranasais de pacientes imunodeficientes têm revelado as seguintes bactérias: Moraxella catharralis, Haemophilus influen a, Streptococospneumoniae, Staphilococos coagulase negativo, espécies de Neisseria e anaeróbios(10, 37).

A antibioticoterapia na exarcebação de doenças sinusais incluem amoxacilina/clavulanato, axetil cefuroxima, sulfa-trimexasol, cefaclor e cefixime. Os pacientes são tratados por quatro semanas e avaliados clínica/radiologicamente. No paciente assintomático e sem sinais radiológicos a terapia pode ser encerrada. Se a resposta é inadequada, a terapia deve prosseguir com um antibiótico diferente e reavaliada após quatro semanas com CT de seios paranasais(10, 37).

Os procedimentos cirúrgicos (endoscópicos ou convencionais) são também uma forma de terapia usada nos pacientes com imunodeficiências. Estudos recentes têm mostrado que indivíduos com distúrbios transitórios apresentam melhores resultados pós-cirúrgicos, e os pacientes com imunodeficiências persistentes revelam melhora dos sintomas mas continuam necessitando de antibioticoterapia e IVIG(15). Embora o tratamento cirúrgico pareça promissor, ainda há necessidade de mais estudos para se estabelecer o real benefício da cirurgia endoscópica/ convencional em indivíduos com imunodeficiências, principalmente na população infantil.

Sinusite e fibrose cística

A fibrose cística é uma doença autossômica recessiva, transmitida geneticamente, que se caracteriza pelo envolvimento difuso das glândulas exócrinas. Aproximadamente, 5 % da população caucasiana são portadores do gene recessivo, e 1:2.000 recém-nascidos é afetado(20). A obstrução dos duetos excretórios das glândulas exócrinas é o fator marcante da fibrose cística, sendo o pâncreas e os órgãos respiratórios os mais seriamente acometidos por estas alterações(1).

Na população caucasiana a fibrose cística é a maior causa de doença pulmonar crônica severa na infância.

No sistema respiratório; ocorre uma diminuição do batimento ciliar, com retardo do transporte mucociliar, embora histologicamente os cílios apareçam normais(18). Isto ocorre devido ao aumento da viscosidade do muco, que pode chegar a ser 30 a 60 vezes mais viscoso em pacientes com fibrose cística do que em pacientes normais(13). No nível dos seios paranasais, o muco acaba obstruindo os óstios de drenagem, levando à hipóxia e retenção de dióxido de carbono, dano ciliar, edema de mucosa, inflamação e, por fim, colonização bacteriana(1).

As principais manifestações da fibrose cística em otorrinolaringologia são o desenvolvimento de sinusite crônica e a formação de pólipos nasais(1). A incidência relatada de pólipos nasais em pacientes com fibrose cística é altamente variável e oscila entre 6 e 48%(3, ,4, 6, 7, 12, 13, 18, 23, 31, 36) na literatura geral; entretanto, Cuyler e Monagham(6), analisando pacientes com fibrose cística enviados ao otorrinolaringologista por sintomas de sinusite crônica, notaram que 100% deles apresentavam pólipos nasais. Acredita-se que a presença de pólipos nasais em pacientes com fibrose cística possa estar intimamente relacionada com a sinusite(20), e que a mucosa nasal de alguns pacientes portadores de fibrose cística pode estar tão hiperplásica, com conchas proeminentes ocultando muitas vezes os pólipos nasais(14). O estreitamento da cavidade nasal e dos óstios de drenagem dos seios paranasais secundários à hipertrofia mucosa colabora para uma drenagem sinusal inadequada(20).

Diagnóstico

A suspeita diagnóstica de fibrose cística é realizada inicialmente pela história clinica e familiar, confirmada pelo teste de cloro e sódio no suor (maior que 80 mmol/l). Embora os testes genéticos detectem 90% dos genes responsáveis pela doença, isoladamente não confirmam o diagnóstico, pois nem sempre as manifestações clinicas são aparentes.

O diagnóstico clínico da sinusite é feito basicamente através de uma história detalhada. A idade de início da manifestação dos primeiros sintomas sinusais tem sido descrita ao redor dos cinco anos de idade(5, 16). Segundo Neeley e colaboradores(18), crianças entre dois e quatro anos tendem a apresentar nariz congestionado e fungam muito, mas estes sintomas geralmente melhoram depois dos quatro anos. O exame físico não tem se mostrado um fator efetivo na determinação da presença ou ausência de doença ativa.

Wald e colaboradores, em 1981(37), descreveram uma tríade de sintomas freqüentemente observada em crianças portadoras de sinusite: rinorréia purulenta com obstrução, tosse, que pode ser diurna mas é tipicamente pior à noite ou pela manhã, e mais hálito. A cefaléia foi outro sintoma freqüente observado em crianças com sinusite crônica e com mais de 18 meses de idade. Na criança com fibrose cística os sintomas sinusais não são diferentes, e alguns sintomas adicionais podem aparecer com menos freqüencia: desordens do ouvido médio, dor de garganta, rouquidão, febre e dor dentária, assim como gosto ruim na boca e dor facial severa com movimentos de abaixar e levantar o corpo(3).

Em relação ao exame físico, adenopatia bilateral é freqüente em função da alta incidência de infecção de vias aéreas superiores. A otoscopia das crianças com fibrose cística usualmente é normal, pois a incidência de otite média costuma ser baixa, e o restante do exame de cabeça e pescoço tende a ser normal, com exceção do nariz. Normalmente, estas crianças apresentam rinorréia purulenta com mucosa nasal edemaciada, com ou sem a presença de pólipos nasais(20). Crianças com manifestações nasais crônicas freqüentemente apresentam a porção anterior da concha inferior edemaciada e "colada" junto ao septo, tornando a visualização do restante da cavidade nasal extremamente difícil. Por esta razão, o uso de microscópios e telescópios é recomendado como exames complementares.

A ocorrência de anormalidades radiográficas é considerada bastante expressiva. Em uma revisão realizada por Parsons, oito estudos mostraram que 100% de todos os pacientes com fibrose cística tiveram um raio-x simples de seios da face positivo, e mais quatro demonstraram anormalidades em 90 a 96%(20). Segundo estes autores, a probabilidade de uma série de raio-x numa criança com fibrose cística ser positiva é de aproximadamente 98%. Uma vez feito o diagnóstico de fibrose cística, é de pouco valor a repetição do raio-x simples de seios da face, à que as séries radiológicas subseqüentes têm grandes chances de serem positivas. O único benefício para se repetir um raio-x simples seria, por exemplo, no acompanhamento de um nível hidro-aéreo existente.

Há poucos estudos publicados sobre a tomografia computadorizada dos seios paranasais em fibrose cística. Em um estudo realizado por Cuyler e Monagham(6), todas as crianças encaminhadas ao otorrinolaringologista para avaliação de sinusite tiveram exames tomográficos positivos.

O principal organismo causador de sinusite em pacientes com fibrose cística é a Pseudomonas aeruginosa(4, 5, 16, 27, 36) , e o segundo patógeno mais comum é o Staphilococcus aureus(4,16,36). Shapiro e colaboradores(17) referem-se ao Haemophilus influenzae como um freqüente causador de sinusite na fibrose cística, e Marks e colaboradores(17) descrevem a Burkholdia cegada como um organismo multi-resistente, causador de infecção.

Tratamento

O tratamento médico da sinusite consiste no uso de corticóides nasais, mucoliticos e antibióticos adequados. A intervenção cirúrgica deve ser evitada até que exista um complexo bem definido de sintomas indicando a sua necessidade, devendo se ter sempre m mente que a cirurgia sinusal na fibrose cística não curativa.

No Wilford Hall USAF Medical Center, apenas o consideradas candidatas à cirurgia sinusal as crianças com fibrose cística que tenham obstrução nasal sintomática significante, patologia dos seios paranasais importante que não responda ao tratamento clínico e rinorréia posterior, exacerbando a doença pulmonar. Se necessária, a cirurgia indicada é a polipectomia isolada ou FESS (Functional Endoscopic Sinus Surgery), fazendo-se a esfenoetmoidectomia total, indo os óstios naturais do seio frontal e maxilar(20).

Embora uma cirurgia revisional seja geralmente necessária em menos de três anos de acompanhamento pós-cirúrgico, em aproximadamente 50% dos pacientes a melhora depois do primeiro procedimento é relatada em quase todos os casos(20).

Segundo Marks e colaboradores(17), a cirurgia em adultos com fibrose cística deve ser evitada até que a severidade dos sintomas indique a intervenção; e, neste caso, uma esfenoetmoidectomia com antrostomia é realizada. Se o paciente necessitar de revisão cirúrgica, procedimentos abertos são considerados.

Embora a fibrose cística ainda seja considerada uma doença grave e muitas vezes fatal durante a infância, os modernos tratamentos médicos e cirúrgicos têm sido fundamentais para que cada vez mais pacientes atinjam a vida adulta.

Sinusite e asma

O trato respiratório no homem tem sido dividido em segmentos superior e inferior, com diferenças estruturais e funcionais distintas; entretanto, doenças do trato respiratório superior e inferior podem coexistir, sendo a rinite e asma brônquica um bom exemplo. Aproximadamente 80% dos pacientes com asma apresentam sintomas de rinite, enquanto que de 5 a 15% dos pacientes com rinite perene têm asma. No entanto, pouca atenção vinha sendo dada até recentemente à possibilidade de a via aérea superior desempenhar um papel importante na patogenese da bronquite asmática(28). Segundo Slavin(28), existem correlações importantes entre doenças da via aérea superior e inferior, entre as quais podem ser citadas: melhora de sintomas pulmonares com o tratamento de sintomas nasais, aumento da sensibilidade da via aérea inferior em doenças nasais, hiper-reatividade pulmonar durante infecções virais do trato respiratório superior e reflexo nasossinusal-bronquial.

A associação entre doença sinusal e doença obstrutiva pulmonar tem sido estudada e observada por muitos anos; entretanto, ainda não existem dados objetivos mostrando que a sinusite exacerbe ou desencadeie o processo asmático. Existem estudos mostrando que pacientes asmáticos de difícil controle tendem a melhorar quando uma sinusite coexistente é resolvida com tratamento médico ou cirúrgico. Isto pode ser considerado como uma forte evidência de que a sinusite desempenha um papel etiológico importante na doença da via aérea inferior(28).

Diagnóstico

O diagnóstico de sinusite no paciente asmático deve se basear em uma boa história e exame físico que inclua uma endoscopia nasal. A associação de tomografia computadorizada dos seios da face aumenta a sensibilidade do diagnóstico(25).

A sinusite aguda, definida como uma inflamação sintomática dos seios paranasais com duração de até seis semanas com freqüência menor que quatro vezes por ano, é facilmente diagnosticada no paciente asmático que surge com sintomas de dor facial, febre e rinorréia.

Mais desafiante é o diagnóstico do paciente com sinusite crônica cujos sintomas sejam mais vagos e sutis, que persistem por mais de seis semanas, ou que ocorrem mais do que quatro vezes em um ano. Devido à evidente importância do adequado manejo da sinusite crônica no paciente asmático, o empenho no diagnóstico acurado é fundamental(25).

Em uma pesquisa realizada por Gwaltney e colaboradores(11), o Streptococcus pneumoniae e o Haemophilus Influenzae, juntos, foram responsáveis por 76% das culturas positivas em rinite aguda, seguidos pelos anaeróbios, outros estreptococos, Moraxella catarrhalis e Staphilococcus aureus. Atualmente, tem se observado uma resistência do H. influenzae à amoxacilina em torno de 20 a 25% e um aumento na resistência do S. pneumoniae à penicilina A bacteriologia da sinusite crônica não é tão bem definida e apenas recentemente começou a ser melhor entendida. Em um estudo realizado por Bolger(2), utilizaram-se técnicas de cultura guiadas endoscopicamente, em pacientes com sinusite crônica, e houve um predomínio de enterecocos gram negativos, seguidos pelo Staphylococcus coagulase negativo, Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influenzae, Klebsiella pneumoniae e Enterococors.

Tratamento

Em relação ao tratamento, existem evidências de que a sinusite possa desempenhar um papel importante na etiologia da asma, ao se examinar os efeitos do tratamento médico ou cirúrgico adequado da sinusite nas manifestações asmáticas(28).

Estudos realizados por Rachelefsky e colaboradores(22) demonstraram que crianças com associação de sinusite e hiper-reatividade pulmonar apresentam melhora significativa do estado asmático após receberem tratamento clinico apropriado para suas sinusites. Deve se enfatizar que o tratamento clínico incluindo antibióticos adequados e descongestionantes (orais ou tópicos) geralmente se mostra efetivo em crianças que apresentam sinusite e asma, e a intervenção cirúrgica é raramente necessária nestes casos(28). Segundo a Conferência Internacional de Doenças Sinusais(25), entre as opções terapêuticas para o tratamento da sinusite aguda e recorrente incluem-se a sulfametoxazol - trimetoprim, amoxacilina + ácido clavulânico e cefuróxime acetíl. A duração do tratamento é controversa e pode variar de 10 a 14 dias. Nos pacientes crônicos, o tratamento pode se estender por mais tempo, para até 21 dias.

No paciente que apresenta alergia, além da sinusite e asma, o manejo adequado da alergia pode auxiliar no controle da inflamação da mucosa sinusal. Anti-histamínicos, estabilizadores de mast cells e imunoterapia podem ser úteis tanto no paciente com sinusite quanto no paciente com rinite. Outro adjuvante no controle da inflamação da mucosa nasal no paciente asmático com sinusite crônica é o corticóide tópico intranasal. O seu uso prolongado resulta em diminuição do edema e congestão da mucosa nasal e também diminui a hiper-reatividade local no nariz e seios paranasais. Entre os corticóides de uso tópico incluem-se o dipropionato de beclometasona, a flunisolida, o propionato de fluticasona e a acetonida triancinolona. O uso de corticóides orais também é de extrema valia, devido ao seu potente efeito antiinflamatório e capacidade de estabilizar a hiper-reatividade da mucosa nasala(25).

O tratamento cirúrgico é reservado apenas àqueles casos em que houver falha, após várias tentativas, do tratamento médico, incluindo antibioticoterapia direcionada por cultura, mucoliticos e descongestionantes, corticóides tópicos nasais e corticóides orais. A cirurgia permite que o paciente conviva melhor com a sua doença, mas, na maioria dos casos, não a erradica. O objetivo da cirurgia é diminuir o uso de medicamentos pelo paciente, transformando-o de esteróide-dependente em não esteróide-dependente, assim como reduzir o número de axacerbações da asma que ocorrem freqüentemente junto às exacerbações do quadro sinusal(25). Técnicas cirúrgicas tradicionais, tais como esfenoetmoidectomia intranasal, esfenoetmoidectomia externa e Caldwell Luc, têm mostrado diminuição da necessidade de medicamentos e de dependência a corticóides, assim como redução dos episódios de asma e sinusite. Nos últimos anos, a cirurgia endoscópica funcional dos seios paranasais (FESS) tem sido empregada nos pacientes asmáticos com sinusite crônica, e os resultados estão apenas começando a ser conhecidos. Estudos iniciais mostram taxas de sucesso equivalentes às dos procedimentos antigos, com expectativas de que os resultados a longo prazo venham a superar aqueles previamente observados(25). Stammberger estudou 54 pacientes com asma e sinusite que foram submetidos à FESS, observando uma melhora subjetiva em 83%, com resultados confirmados através de prova de função pulmonar(30). É importante lembrar que o tratamento adequado da sinusite, médico ou cirúrgico, freqüentemente resulta em uma melhora significativa da sintomatologia da asma(28).

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* Médica Residente no Centro de Otorrinolaringologia e Fonoaudiologia de São Paulo, do Hospital Professor Edmundo Vasconcelos.
** Médico Residente no Centro de Otorrinolaringologia e Fonoaudiologia de São Paulo, do Hospital Professor Edmundo Vasconcelos.
*** Mestre e Doutora pela UNIFESP (EPM); Coordenadora Científica do Departamento de Otorrinolaringologia Pediátrica da SBORL; Responsável pelo Setor de Otorrinolaringologia Pediátrica do Hospital Professor Edmundo Vasconcelos.

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