Artigo publicado no Caderno de Debates da RBORL: Vol.71 ed.4 de Julho - Agosto em 2005 (da página 32 à 35) |
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Autor: Nilvano A. Andrade1, Tâmara Ferraro A. P. Aguiar2, José Estelita P. Aguiar2, Anderson C. Branco2, José Rodrigo L. Mattos2, Ériko S. A. Vinhaes2 |
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Relato de Caso |
Osteoma e mucocele: revisão de literatura e relato de caso |
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INTRODUÇÃO E REVISÃO DE LITERATURA
Denomina-se mucocele o acúmulo e retenção de material mucóide, claro, grosso, estéril ou contaminado (mucopiocele), dentro de um seio paranasal, como resultado de uma contínua ou transitória obstrução dos óstios1. As mucoceles se apresentam como lesões crônicas dos seios paranasais benignas, encapsuladas, císticas, limitadas por epitélio pseudoestratificado, cubóide ou escamoso, muco-secretante, contendo ocasionalmente células caliciformes em 67% e hiperplasia em 50% dos casos2. Onodi foi o primeiro a descrever essas características histológicas enquanto Schucknecht e Lindsay descreviam a expansão e a erosão devido à compressão das estruturas ósseas adjacentes, caracterizada por remodelamento progressivo e aumento da pressão intraluminal. A distensão do seio e a compressão de estruturas vizinhas são os responsáveis pelos sintomas e sinais dessa lesão. As mucoceles podem evoluir e levar à deformidade facial significante, distúrbio visual e, em pior instância, à complicação como a extensão para o espaço intradural, extensão intracraniana na fossa anterior ou média, abscessos cerebrais, meningite, abscesso subdural, celulite orbital, pneumoencéfalo ou fístula liquórica3. Esta entidade tem como característica o crescimento lento, podendo levar anos para sua manifestação. Acomete pessoas adultas em sua maioria, sendo raro em crianças4,5. Não há diferença entre os sexos. Sua freqüência é maior no seio frontal, seguida pelo seio etmoidal4-6. São causadas de uma forma geral por problemas de drenagem do muco, seja por fatores alérgicos, traumáticos, pós-operatórios, infecciosos, genéticos, tumorais ou congênitos3,4. O tratamento é essencialmente cirúrgico, sendo a abordagem endoscópica nasal assistida por vídeo a de menor morbidade7,8.
Os osteomas são neoplasias ósseas, sésseis ou pediculadas, geralmente únicas de crescimento lento e contínuo. É a neoplasia benigna mais freqüente dos seios paranasais9,10. Sob o ponto de vista anatomopatológico os osteomas podem ser compostos ou ebúrneos, esponjosos ou mistos. A localização no seio frontal é superior a 50% em relação aos demais seios paranasais9,10. Em geral evoluem muito lentamente, assintomáticos, por vezes visualizados por acaso em exame radiológico. Com o evoluir do tempo podem se apresentar por tumefação frontal, geralmente no ângulo súpero-interno da órbita, por vezes surgindo diplopia e exoftalmia. O diagnóstico é confirmado pelo exame radiológico. O tratamento, quando indicado, é essencialmente cirúrgico, sendo as técnicas mais utilizadas o retalho osteoplástico e a incisão de Lynch-Howarth9,10.
RELATO DE CASO
E.M.S., 54 anos, sexo masculino, natural e procedente de Jequié, Bahia, pastor evangélico. O paciente apareceu em nosso ambulatório com história de obstrução nasal contínua e progressiva à esquerda, diplopia e lateralização do globo ocular esquerdo. Apresentava ainda proptose lenta e progressiva há dois anos. Negava perda ponderal, cefaléia, dor ou perda de equilíbrio no período. Paciente sem história de doenças crônicas, etilismo ou tabagismo. Ao exame apresentava uma deformidade importante da face à custa de proptose e lateralização do globo ocular esquerdo e tumefação de consistência endurecida em região frontal. Otoscopia e orofaringoscopia sem alterações. Ao exame endoscópico nasal verificou-se massa ocupando os meatos médio e superior esquerdo de consistência pétrea e esporão septal condrovomeriano. Mucosa normocrômica, cornetos inferiores eutróficos.
A tomografia computadorizada contrastada apresentava formação expansiva óssea ocupando a região frontal em continuidade com os seios etmoidais. Notava-se ainda formação no etmóide posterior compatível com mucocele etmoidal. A órbita esquerda estava rebatida lateralmente por duas formações arredondadas coladas à lâmina papirácea. (Figura 1)
Em Junho de 2001 o paciente foi submetido à cirurgia com acesso de Lynch-Howarth. Foi retirado osteoma intraorbitário com drenagem aberta de mucocele do seio frontal esquerdo. Evoluiu no pós-operatório sem intercorrências com redução importante da proptose ocular. Apresentou diplopia transitória. Após um período de seis meses foi indicado o segundo tempo do procedimento cirúrgico. O paciente queixava-se ainda de obstrução nasal importante, mais acentuada à esquerda e obstrução parcial à direita. O segundo procedimento foi realizado através de acesso coronal com retirada do osteoma da região frontal e da lâmina crivosa (Figura 2). O acesso endonasal assistido por vídeo complementou o tratamento, retirando osteoma dos cornetos médio e superior esquerdos (Figuras 3 e 4) e de mucocele de etmóide posterior esquerdo (Figura 5). O paciente evoluiu no pós-operatório com melhora da obstrução nasal e sem comprometimento visual. No momento, encontra-se no 24º mês pós-operatório, livre dos sintomas.
Figura 1. Aspecto do paciente e da tomografia computadorizada evidenciando mucocele etmoidal e osteoma frontal e etmoidal esquerdo com proptose ocular esquerda. Figura 2. Acesso coronal para remoção de osteoma frontal. Figura 3. Acesso endoscópico para remoção de osteomas dos cornetos médio e superior esquerdos. Figura 4. Osteoma retirado via endoscópica. Figura 5. Acesso endoscópico para drenagem de mucocele de etmóide posterior esquerdo.
DISCUSSÃO
O tratamento cirúrgico dos osteomas continua um tema controverso na literatura, tanto por suas indicações, quanto pela abordagem a ser escolhida9,10. Os critérios para sua indicação cirúrgica foram revisados por Savic e Djeric11 em 1990 que sugeriram que todos os osteomas deveriam ser operados quando ultrapassassem os limites do seio frontal, quando estivessem próximos ao recesso nasofrontal, na presença de qualquer sinal de infecção concomitante e em todos os casos de osteomas etmoidais, independente do seu tamanho. Mansur et al.12 acrescentou que todos os casos de osteomas esfenoidais devem ser operados pelo risco de crescimento da lesão e compressão do nervo óptico e artéria carótida interna.
O tratamento das mucoceles é essencialmente cirúrgico, desbloqueando a cavidade e restabelecendo a comunicação com a fossa nasal, sendo a abordagem endoscópica nasal assistida por vídeo a de menor morbidade quando comparada aos acessos externos (Lynch-Howarth e Cadwell-Luc)7,8.
A associação entre mucocele e osteoma é pouco freqüente na literatura pesquisada1-6,13,14. Este caso em particular tornou-se importante por vários aspectos. Em primeiro lugar, a sintomatologia foi semelhante à complicação orbitária pela presença de mucocele fronto-etmoidal. No entanto, o exame tomográfico demonstrou que a proptose foi causada principalmente pelos dois osteomas intra-orbitários. Logo, o acesso de Lynch-Howarth teve como principal objetivo descomprimir a órbita.
Um segundo aspecto a ser considerado foi a continuidade da massa frontal com o etmóide, incluindo a lâmina cribiforme. Devido à possibilidade de formação de fistula liqüórica com a retirada do tumor frontal e etmoidal, optamos em realizar um acesso coronal para retirar a lesão frontal e um acesso endonasal assistido por vídeo, quando foram retirados o osteoma e a mucocele etmoidais preservando a região da lâmina cribiforme.
CONCLUSÃO
A associação entre mucocele e osteoma é rara. O diagnóstico precoce dessas doenças é essencial para evitar sua expansão e conseqüente complicações, principalmente orbitárias e intracranianas. Há várias opções de acesso cirúrgico para tratamento, tanto por via externa como por via endonasal assistida por vídeo, porém não existe uma abordagem ideal, sendo a localização, o tamanho e a extensão da lesão, a associação com alguma complicação e a experiência da equipe cirúrgica os principais fatores a serem considerados na escolha da abordagem.
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1 Doutor em Otorrinolaringologia pela FMUSP. Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço e da Residência de Otorrinolaringologia da Santa Casa de Misericórdia da Bahia - Hospital Santa Izabel. Professor Adjunto da Disciplina de Otorrinolaringologia da Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública. 2 Médico (a) Otorrinolaringologista do Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Santa Casa de Misericórdia da Bahia - Hospital Santa Izabel, Salvador, Bahia, Brasil. Trabalho realizado pelo Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Santa Casa de Misericórdia da Bahia - Hospital Santa Izabel, Salvador, Bahia, Brasil. Apresentado no 36º Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia realizado de 18 a 23 de novembro de 2002 em Florianópolis - SC. Endereço para correspondência: Hospital Santa Izabel - Unidade de Otorrinolaringologia - Praça Conselheiro Almeida Couto, 500 Nazaré 40050-410 Salvador BA. Tel (0xx71) 326-8303 - E-mail: jose.estelita@ig.com.br; nilvano@terra.com.br Artigo recebido em 05 de dezembro de 2003. Artigo aceito em 05 de maio de 2005.
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