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Artigo publicado no Caderno de Debates da RBORL:
Vol.66 ed.6 de Novembro-Dezembro em 2000 (da página 10 à 38)
Autor:
Consenso
São Paulo - SP - 1999
1. DEFINIÇÃO
A vertigem pode ser definida como uma sensação de movimento giratório, que pode ser objetivo ou subjetivo.
2. CONCEITO
Na vertigem objetiva, o paciente tem uma ilusão de que os objetos estão girando em torno de si e na subjetiva, tem a sensação de ele próprio estar girando em torno dos objetos (do meio). Em ambas as situações, a vertigem pode vir acompanhada de sintomas neurovegetativos e cocleares. Muitas vezes, os sintomas neurovegetativos levam a erros diagnósticos. Náuseas, vômitos, por exemplo, induzem a pensar primeiramente em distúrbios gástricos. Palidez, suclorese e extremidades frias já chamam a atenção do médico para o aparelho cardiovascular.
O nistagmo é o sinal físico fundamental no diagnóstico diferen
al da vertigem. Deve ser pesquisado com muito critério, já que está sempre presente nas crises de vertigens e, eventualmente, fora delas. Não ocorre nos transtornos gástricos e nem nas afecções cardiovasculares.
Hipoacusia e acúfenos também podem vir associados à vertigem, quase sempre expressando uma doença periférica no nível dos órgãos sensoriais cocleares, sensoriais vestibulares e/ou VIII par craniano.
Além do sintoma vertigem (sensação rotatória), alguns pacientes experimentam a sensação de movimento, como ondulatório, oscilação, balanço, flutuação, sem, no entanto, apresentarem desorientação espacial. Um fato interessante é que o termo "tontura" é o mais usado por eles para exprimir tanto a vertigem como outros sintomas que não guardam nenhuma relação com a verdadeira vertigem. Não é infreqüente ouvirmos queixas vagas, como: falta de firmeza na marcha, confusão mental, fraqueza, instabilidade, turvação de vista, etc. Já o termo "tontura rotatória" tem o mesmo significado de vertigem.
3. FISIOLOGIA DO SISTEMA VESTIBULAR
O sistema vestibular que faz parte da orelha interna ou labirinto é um dos elementos do sistema plurimodal de estabilização estática e dinâmica do equilíbrio corporal. Os três sistemas que captam as informações do meio externo para manutenção do equilíbrio são: a visão, a propriocepção e o sistema vestibular. As informações destes três sistemas são enviadas a centros situados no sistema nervoso central, que analisam, comparam e integram as informações sensoriais.
Após a integração central dessas informações, os centros nervosos controlam quase instantaneamente dois sistemas efetivos: o da oculomotricidade e o da motricidade somática, permitindo respostas reflexas quase instantâneas dos olhos e do corpo para manutenção do equilíbrio. Os três sistemas sensoriais referidos informam aos centros nervosos a posição exata ela cabeça no espaço e seu deslocamento. Portanto, o sistema vestibular participa das reações de adaptações ocular e postural que mantêm o equilíbrio do corpo e uma visão nítida.
Quando existe uma alteração qualquer num ponto do sistema vestibular, ou do nervo vestibular, ou dos centros de integração e de tratamento do sinal, esta alteração provoca envio, aos centros de coordenação do equilíbrio de informações errôneas, necessitando uma estimulação que não existe em contradição com as informações proprioceptivas e visuais. Assim, ocorre um conflito sensorial, nascendo a sensação vertiginosa e o desequilíbrio.
O labirinto vestibular compreende dois tipos de estruturas:
Os órgãos otolíticos, que são em número de quatro: de cada lado, um utrículo e um sáculo.
Os canais semicirculares, que são em número de seis. De cada lado existe um canal semicircular horizontal e dois canais semicirculares verticais, o anterior e o posterior.
Os órgãos otoliticos são importantes na percepção de posição da cabeça em relação à gravidade e na orientação dos deslocamentos lineares; detectam acelerações lineares. Os canais semicirculares são importantes na percepção dos movimentos da cabeça nos três planos do espaço; eles detectam acelerações angulares.
Os receptores vestibulares são ativados ao máximo quando a cabeça está no plano de cada um deles. Como exemplo, os receptores do canal horizontal são ativados por uma rotação cefálica no plano horizontal. Não respondem, entretanto, quando ocorrem movimentos de cabeça perpendiculares ao plano dos canais semicirculares. Como existem três canais de cada lado em três pianos perpendiculares, podemos detectar rotações angulares de cabeça em qualquer direção. O receptor utricular detecta as acelerações lineares no plano horizontal e o secular no plano vertical.
Quando nos referimos a receptores vestibulares, notamos a presença de um neuroepitélio sensorial vestibular constituído de células ciliadas e células suporte, sendo que as primeiras mantêm conexões sinópticas com fibras nervosas aferentes e eferentes do nervo vestibular. Estes receptores estão situados nas cristas empolares dos canais semicirculares e no nível das máculas sacolares e utriculares nos órgãos otolíticos. Tais receptores são células especializadas que se caracterizam principalmente pela presença de estereocílios no pólo apical em número de 40 por célula, aproximadamente, e 1 kinocílio único. Essa diferenciação ciliar em estereocílio e kinocílio dota o neuroepitélio vestibular do que se chama um "eixo de polaridade morfológica", o qual orienta o sistema nervoso central sobre o sentido da rotação da cabeça no espaço (rotação da cabeça para a direita e para a esquerda no caso do sistema dos canais horizontais).
Considerando os canais semicirculares durante os movimentos da cabeça, o líquido endolinfático, onde os estereocílios das células ciliadas ampolares são banhados, desloca-se em sentido contrário aos movimentos da cabeça. Esse deslocamento provoca deslocamento lateral dos estereocílios em direção ao kinocílio. As células despolarizara-se, sendo ativadas; desse modo, as fibras do nervo vestibular aumentam suas freqüências de descargas. Ao contrário, se os cílios se inclinarem do lado oposto, as células se repolarizarão e serão inibidas e o nervo vestibular voltará à sua freqüência de descarga de repouso.
O sentido do movimento se traduz por um aumento ou diminuição da freqüência de descarga das fibras do nervo vestibular. Sempre que as fibras vestibulares aferentes de um lado são ativadas, as fibras homólogas situadas do outro lado são inibidas, dando então a noção exata do sentido da rotação. No caso dos sistemas otolíticos, as extremidades dos estereocílios das células ciliadas das máculas sacular e utricular estão mergulhadas num gel de mucopolissacarídeos, onde estão incrustados cristais de carbonato de cálcio denominados de otoconias. Um pequeno deslocamento da cabeça no espaço provoca uma força tangencial de cisalhamento nos cílios responsável pela ativação das células sensoriais. O sistema otolítico tem propriedades de um receptor inercial.
Todos esses diferentes tipos de informações geradas pelas células ciliadas são transmitidas pelos nervos vestibulares aos núcleos vestibulares pelos neurônios vestibulares aferentes primários. Os núcleos vestibulares estão situados no tronco cerebral.
Outras aferências vestibulares chegam aos núcleos vestibulares. São elas: aferências dos núcleos vestibulares contralaterais, aferências visuais, proprioceptivas espinais, proprioceptivas oculares, cerebelares e corticaís. Elas recebem também uma cópia da ordem motora enviada aos músculos extraoculares. Tais informações plurimodais do sistema nervoso central permitem a este reconstituir a posição, a velocidade e a aceleração da cabeça nas três dimensões do espaço. Desse modo, os neurônios vestibulares centrais não são simples ligações entre os receptores sensoriais e os motoneurônios oculomotores e espinais, constituindo verdadeiros centros de integração sensoriomotora.
Os neurônios vestibulares centrais projetam-se sobre os motoneurônios espinais em diferentes alturas da medula espinal sobre os motoneurônios oculomotores e várias áreas do córtex cerebral. Essas conexões constituem o sistema vestíbuloespinal, que participa das relações de equilíbrio da cabeça e do corpo no espaço, e o sistema vestíbulo-oculomotor, que permite a estabilização da imagem visual sobre a retina durante os movimentos da cabeça graça às fases lentas do reflexo vestíbulo-ocular (VOR). O sistema permite também orientação do olhar via fases rápidas desse reflexo. Os motoneurônios dos núcleos extra-oculomotores inervam os diferentes músculos extra-oculomotores.
Os neurônios do núcleo abducente (VI) inervam os músculos retos externos, sendo então relacionados aos movimentos horizontais do olho. Os motoneurônios dos núcleos oculomotores (III) inervam os músculos pequenos oblíquos, reto inferior e reto interno. Os motoneurônios dos núcleos trocleares (TV) inervam os músculos grandes oblíquos, determinando movimentos verticais e oblíquos do olho.
Todo esse funcionamento permite ao sistema vestibular um papel fundamental na estabilização do olhar e da postura com manutenção do equilíbrio.
O reflexo vestíbulo-ocular horizontal induzido por uma rotação horizontal da cabeça apresenta uma fase lenta orientada do lado contralateral à estimulação e uma fase rápida dirigida para o lado ipsilateral à rotação. A fase lenta permite estabilizar a imagem do mundo visual sobre a retina durante as rotações da cabeça no espaço, a face rápida reorienta periodicamente o olho na órbita. É a amplitude ou a velocidade da fase lenta que é medida em clínica pela eletronistagmografia ou videonistagmografia e que permite medir o ganho do reflexo vestíbulo-ocular, comparando a amplitude do movimento lento do olho em relação à amplitude do movimento da cadeira durante a estimulação rotatória. No indivíduo normal, a relação entre as duas amplitudes é 1.
Assim, a compreensão neuroanatômica e neurofisiológica dos dois reflexos citados - vestíbulo-ocular e vestíbulo-espinal - permite o entendimento do funcionamento normal e patológico do sistema vestibular, Os métodos de avaliação deste sistema e os mecanismos fisiopatológicos das diferentes doenças vestibulares.
4. CLASSIFICAÇÃO
De acordo com a topografia da lesão vertiginogênica, podemos classificar a vertigem em:
Periférica sensorial: Quando a lesão ocorre no órgão sensorial do aparelho vestibular (cristas ampulares e/ou máculas utrículares e saculares), como é o caso da doença de Menière, a labirintite por drogas ototóxicas, etc.
Periférica neural: Quando a lesão ocorre nos nervos vestibulares, como, por exemplo, na neuronite vestibular e no schwanoma vestibular.
Central: Quando a lesão atinge o SNC por doenças focais ou por doenças gerais. Ex: epilepsia, esclerose múltipla, tumores da fossa posterior, etc.
Mista: Embora rara, quando ocorrem lesões periféricas e centrais ao mesmo tempo. Ex: insuficiência circulatória vértebrobasilar (especialmente em idosos), herpes-zoster oticus, doenças metabólicas, etc.
Indeterminada: Quando não se evidencia lesão orgânica periférica nem central. Ex: vertigem psicogênica, de origem oftálmica, coluna cervical, etc.
É importante ressaltar que as vertigens periféricas são as mais freqüentes e apresentam como característica o processo de compensação.
5. ABORDAGEM CLÍNICA
5.1 História
A história clínica é a parte central do exame otoneurológico, pois pode nos fornecer pistas tanto para a provável etiologia, como também para nos informar a localização do comprometimento. Para obtermos uma boa história, devemos seguir a técnica que utilizamos em clínica, isto é, a identificação do paciente, como: idade, sexo, a queixa principal, duração e os dados da história da moléstia atual.
o Idade: Na infância, são mais comuns as labirintopatías de origem infecciosa, como as otites, viroses, a vertigem paroxística benigna, traumas, ototóxicos, etc.; após a segunda década, as neirronites, as labirintopatias hormonais e metabólicas e a moléstia de Menière; a partir da quinta década, as vasculares e algumas das síndromes cervicais, como o Barre-Liéou.
Sexo: As disfunções hormonais e metabólicas das mulheres.
Vertigens: É o que mais comumente leva o paciente ao otoneurologísta. As características das vertigens podem nos dar um diagnóstico etiológico e também, da localização. Assim, quando rotatórias, acompanhadas de hipoacusia e zumbidos, nos orientam para o labirinto periférico. Quando em crises com flutuação da audição, nos fazem lembrar da moléstia de Menière. As do tipo instabilidade, com alterações visuais, quedas repentinas nos induzem a pensar em moléstia vascular, como acontece com a insuficiência vértebro-basilar. As instabilidades com quedas e perda da consciência sugerem possível afecção central.
As causas que antecedem as crises, como: viroses, ototóxicos e traumas craniencefálicos (whiplasb) devem sempre ser perguntadas ao paciente. Outros fatores desencadeantes, como mudanças posturas, podem esclarecer a vertigem postural paroxística benigna.
Hipoacusia: Esta, quando isolada e repentina, pode ser início de uma surdez súbita ou de um neuroma do acústico.
Zumbidos: Quando isolados, também podem ser início de uma surdez súbita ou de um neuroma.
Antecedentes pessoais: Lues, diabetes, alergias, afecções cardíacas e hormonais podem ser causas de distúrbios do equilíbrio.
Hábitos: Álcool, tabaco, café, drogas, chá, chocolate e medicamentos são hábitos freqüentemente encontrados em labirintopatias.
Antecedentes hereditários: O diabetes, a S. de Alport e outras patologias hereditárias devem ser lembrados.
5.2 Exame Físico
a. Exame ORL:
Otoscopia: Cerúmen e otites supuradas (fístulas) podem ser causa de tonturas, hipoacusias e zumbidos.
Avaliação da AM Disfunção da articulação têmporomandibular (Síndrome de Costen).
b. Avaliação dos pares cranianos - Alterações de outros pares, além do VIII, como o do VII e o V podem ser causados pelo neuroma do acústico.
c. Ausculta- Sopros nas regiões supraclavicular e cervical nos levam a pensar em 1 insuficiência vértebro-basilar.
d. Exame do equilíbrio - Podemos pesquisar os equilíbrios estático e dinâmico:
Equilíbrio estático: Testes de Romberg e Romberg sensibilizado.
Equilíbrio dinâmico: Prova de marcha ou de Babinsky-Weill, Testes de Fukuda e de Unterberger, os duais, segundo assuas características, já nos permitem dizer se a patologia é periférica ou central.
e. Coordenação - Fazemos os testes do index-index, index-nariz, index-joelho e a diadococinesia. Estes também nos permitem distinguir um envolvimento periférico de um central.
f. Pesquisa do nistagmo de fixação, de direção ou semi-espontâneo - Este é um teste simples que podemos fazer sem auxílio da eletronistagmografia e nos da com muita probabilidade a localização.
- Quando Pensar em Patologia Labiríntica?
Na criança, os pediatras devem pensar da patologias labirínticas quando diante de: atraso na deambulação, no aproveitamento escolar, em distúrbios gastrintestinais inexplicáveis, torcicolos freqüentes (torcicolo paroxístico benigno), terror e enurese noturnos, presença de nistagmos ocasionais e cinetose. Estes casos merecem uma avaliação otoneurológica.
Em adultos, os clínicos devem se lembrar que as vertigens não são causadas só pela Moléstia de Menière e também que a maioria das patologias labirínticas neto são benignas, merecendo, portanto, um diagnóstico correto. Assim sendo, todo o doente com vertigens, zumbidos e hipoacusia deve ser encaminhado para uma avaliação otoneurológica.
5.3 Propedêutica Audiológica
A propedêutica audiológica em paciente vertiginoso inicia-se, como toda avaliação clínica, por uma anamnese cuidadosa, normalmente dirigida, onde sito grlestionados os seguintes itens:
Tempo de início dos sintomas.
Evolução da sintomatologia: súbita, rápida e lenta.
Caracterização das vertigens: o paciente sente como se as coisas girassem ao seu redor, ou como se ele girasse em volta das coisas? Tem a sensação de queda no vazio, ou como se estivesse usando óculos bifocais, não estando de habituado? Ou sente apenas tontura, como se fosse desmaiar? Ou, em vez de tontura, tem desequilíbrio na marcha? Neste caso, tem sempre a sensação de se desviar para um determinado lado?
Os sintomas se acompanham ou são precedidos de tinidos?
Sente o paciente que a audição também diminuiu? Em que grau? Essa audição flutua de acordo com o aparecimento das crises vertiginosas? Os sons, co lado afetado, parecem diferentes, ou seja, distorcidos, em relação ao lado oposto?
Consegue compreender bem o que lhe falam ao telefone?
Os sons altos incomodam?
Os tinidos são constantes, ocasionais, fortes ou fracos e variam de intensidade? Estão presentes em apenas um ouvido ou em ambos, parecendo que estão "na cabeça"? Se colocar fones de walkman, conseguirá mascarar esses tinidos?
lá fez alguma operação de ouvido? Essas tonturas aparecem após a cirurgia? Foi submetido a uma estapedectomia com bom resultado e, tempos após, a audição diminuiu e surgiram tinidos e vertigens?
Se houve vertigem e surdez súbitas, havia feito algum esforço físico?
É ou foi paciente portador de otorréia crônica?
No caso de crianças, a audição vem diminuindo? Apresenta desequilíbrio na marcha?
Como se pode ver, há de se fazer um interrogatório minucioso antes de se proceder aos exames audiológicos a seguir, precedidos, evidentemente, de otoscopia e testes com diapasões (Rinne e Weber):
a. Audiometria tonal.
b. Audiometria vocal: estudo da função PI-PB (também conhecida como pesquisa da discriminação ou índice de reconhecimento da fala).
c. Audioimpedanciometria (ou audioimitanciometria) através de vários parâmetros: Timpanometría, Pesquisa dos Limiares do Reflexo Estapédico, Pesquisa do Fenômeno de Tulio, Pesquisa de Efeito On-Off Pesquisa de Recrutamento de Metz, Decay do Reflexo Estapédico.
d. Pesquisa de Potenciais Auditivos do Tronco Cerebral (BERA ou ABR).
A audiometria tonal pode apresentar vários tipos de perfis: ascendentes, planos e descendentes. Desde que se trate de um processo sensorioneural, os dois primeiras podem levar à suspeita de Doença de Menière. Os processos retrococleares geralmente apresentam perfis descendentes, mas nem sempre. Temos casos de pacientes com processos retrococleares com perfil audiométrico discretamente ascendente ou mesmo com perfis compatíveis com audição dentro dos limites da normalidade.
A- audiometria vocal geralmente mostra índices proporcionais à perda auditiva. No entanto, podem estar piores em casos de perfis ascendentes e em pacientes com processo no nível do ângulo pontocerebelar.
Na audioimpedanciometria, em pacientes vertiginosos, os dados mais importantes são: a presença de Recrutamento de Metz (diferencial entre o limiar de audibilidade mínima e o limiar do reflexo estapédico inferior a 60 dB), o Decay Patológico do Reflexo Estapédico (fadiga superior a 50% em 5 segundos) e a presença de Fenômenos de Tulio (nistagmo e/ou vertigem com a apresentação de estímulos de alta intensidade, principalmente nas freqüências de 500 e 1 000 Hz).
Teoricamente, o Recrutamento de Metz está presente nas cocleopatias (como, por exemplo, na Doença de Menière) e o Decay Patológico nas lesões do ângulo pontocerebelar.
Nem sempre, entretanto, isso ocorre. O Fenômeno de Tulio pode sugerir a presença de fístula perilinfática.
Os Potenciais Auditivos do Tronco Cerebral (BERA) podem nos fornecer vários parâmetros:
a. Nos casos de cocleopatiás, o diferencial entre o limiar para clics observado através da onda V e o nível de estímulos onde aparecem todas as ondas, de 1 a V, pode estar muito diminuído, sugerindo a presença de processo recrutaste. Assim, podemos ter todas as ondas com 65dB HL e o limiar eletrofisiológico estar, por exemplo, em 45dB. O diferencial, nesse caso, é de apenas 20dB, quando, geralmente, está na faixa de 50-60dB. Não é apenas o pequeno diferencial entre um traçado com todas as ondas e aquele em que aparece apenas a onda V, que traduz um processo recrutaste. Assim também, numa determinada intensidade em que estão presentes todas as ondas do lado afetado, as latências absolutas podem estar diminuídas em relação ao lado normal. Também o diferencial interaural do intervalo I-V costuma ser negativo, ou seja, o intervalo I-V do lado afetado é menor que o do lado são.
b. Nos processos retrococleares, costumamos seguir a classificação de Maurer, com os padrões B1, B2, Cl, C2, D, E e F.
c. Em pacientes com processos centrais, como, por exemplo, a esclerose múltipla, esse tipo de procedimento costuma mostrar traçados anárquicos, em função do fenômeno de dessincronização das respostas.
No caso de crianças, é importante observarmos os casos de perda auditiva progressiva, que podem levar ao diagnóstico de processos genéticos recessivos ou alterações do desenvolvimento coclear, como no caso da displasia de Mondini.
5.4 Eletrococleografia
A eletrococleografia (EcoChGo) consiste no registro dos potenciais elétricos cocleares por intermédio de eletrodos, sendo o positivo colocado ou no promontório, através do tímpano, por meio de uma agulha muito fina, ou sobre o tímpano, usando um eletrodo pequeno, apoiado sobre um algodão (mínimo) embebido em solução salina ou, ainda, na parte posterior do conduto auditivo externo próximo à membrana timpânica. Apesar de ser mais trabalhosa, a colocação do eletrodo transtimpânico é a que oferece os melhores resultados.
O exame deve ser realizado em uma sala silenciosa e de preferência farádica. Devem-se evitar locais onde existam motores ou fiação de alta voltagem que, por produzirem campos magnéticos, podem afetar a resposta obtida do paciente, uma vez que ela é muito fraca e necessita de grande ampliação. Para as crianças, utiliza-se algum tipo de sedação, enquanto que para os adultos só é usada a anestesia local quando se coloca o eletrodo transtimpânico.
O equipamento utilizado é composto de um gerador de estímulos auditivos e de um receptor dos potenciais elétricos, obtidos através de eletrodos. Atualmente, este aparelho é ligado a um computador por meio de uma interface, com a finalidade de medir as respostas de maneira automática. Deve-se usar um estímulo sonoro específico, denominado clic, a fim de se obter uma resposta clara, que é então captada pelo aparelho, onde será amplificada, filtrada e, por fim, registrada. Três tipos de respostas podem ser obtidas:
a. Potencial microfônico coclear - Gerado petas ululas ciliadas externas e que tem características semelhantes ao estímulo, não apresentando latência.
b. Potencial de somação - Originado pela polarização do órgão de Corri e que não aparece nos indivíduos, normais, mas que pode aparecer em alguns casos de lesão coclear, sobretudo na Doença de Menière.
c. Potencial do nervo auditivo - É um potencial gerado na saída das fibras nervosas da cóclea e se apresenta como uma onda negativa.
Para se obter cada um desses potenciais, necessita-se de microeletrodos e é bastante trabalhoso. Dessa maneira, utilizam-se eletrodos tradicionais e se obtém uma resposta que reflete a situação global das estruturas cocleares, chamada de potencial de ação global. O teste geralmente se inicia com estímulos de 100dB, que vão diminuindo de 10dB cada, até atingir o limiar das respostas.
São avaliados três parâmetros:
a. Latência - É o tempo para o aparecimento da resposta. No início, a latência é pequena e vai aumentando à medida que os estímulos diminuem.
b. Amplitude - É o tamanho clã resposta (em %). Ela diminui à medida que a intensidade dos estímulos se reduz.
c. Tipo de resposta - Num indivíduo normal, as respostas às grandes estimulações são bifásicas e se tornam monofásicas à medida que os estímulos diminuem.
Nas patologias, como o eletrocodeograma, que permite avaliar a audição de uma pessoa de maneira objetiva, este teste está indicado quando há suspeita de uma hipoacusia em crianças de qualquer idade e no caso de simuladores. Mas tem também grande utilidade na avaliação global do estado da cóclea, sendo, por isso, muito utilizado no diagnóstico de lesões cocleares, como na Doença de Menière.
Na avaliação da audição, avalia-se o limiar do nível de pressão sonora (dBSPL), que geralmente coincide com o limiar de audição (dBHL), podendo haver uma variação máxima de 10dB, portanto insignificante. Nesses casos, denominada recrutante, a curva das amplitudes assume uma posição próxima da vertical, a das latências, uma forma quase horizontal e as respostas se apresentam como bifásicas, mesmo a pequenos estímulos. Os resultados podem, em alguns casos, se apresentar bem mais largos que o habitual, caracterizando a presença de hidropsia labiríntica.
Alguns autores interpretam a presença do microfonismo coclear como sinônimo de integridade coclear. Sua presença diante de uma hipoacusia intensa seria indicativa de lesão retrococlear. Outros autores têm também usado o teste do glicerol no eletrococleograma de maneira análoga ao da audiometria. Ê feito um teste inicial e pede-se ao paciente para ingerir o glicerol em jejum e se repete o exame algumas horas depois. Nos casos de hidropsia labiríntica, as respostas ficam melhores e o limiar se reduz tini teste negativo, entretanto, não afasta a possibilidade da Doença de Menière.
5.5 Potenciais Evocados Auditivos de Tronco Cerebral
Definem-se os potenciais evocados auditivos de tronco cerebral (BERA) como sendo o registro da atividade elétrica da cóclea, nervo auditivo e conexões auditivas no tronco cerebral, captadas por eletrodos de superfície quando este sistema é estimulado por um som especial, repetitivo e de curta duração, denominado clic. Tal estímulo deve ser obrigatoriamente intenso, superior a 2 000, a fim de tornar os potenciais elétricos auditivos suficientemente satisfatórios e, assim, sobrepor aos potenciais elétricos cerebrais que são filtrados pelo equipamento de teste.
O equipamento utilizado é composto por um gerador de estímulos auditivos e um receptor dos potenciais elétricos. Estes potenciais são obtidos através de eletrodos de superfície, com posicionamento variando segundo o serviço, que os filtra, amplifica e registra, medindo também o tempo de duração. Atualmente, na era da informática, este aparelho é conectado através de uma interface a um computador.
O exame deve ser realizado em um ambiente silencioso, com o paciente deitado e imóvel, pois o menor movimento pode produzir cargas elétricas que irão interferir no resultado. Para crianças, pode-se usar a "anestesia da mamadeira, ou mesmo alguns medicamentos para sedá-la. Era adultos, não há necessidade de se utilizar qualquer tipo de anestesia, uma vez que o exame é indolor e dura somente alguns minutos.
Dois tipos de respostas são obtidas: os potenciais de curta (ABR) e os de média latência cru semiprecoces. O primeiro, composto principalmente por 5 ondas para a maioria dos autores e 7 para outros, aparece numa latência de até 10 mseg e o outro de 10 a 36 inseg - também composto por 5 ondas, irias ainda de pouca utilização. A ainda 1 é originada na cóclea e nervo auditivo, a 2 no nervo e núcleo auditivo, a 3 na oliva superior, a 4 no lemnisco lateral, a 5 no colículo inferior, a 6 no geniculado medial e a 7 na radiação auditiva. Entretanto, as ondas 6 e 7 muitas vezes não são obtidas e, por isso. não têm ainda aplicação clínica.
A grande importância desse exame consiste na fidedignidade das respostas, isto é, elas aparecem sempre dentro de um pequeno espaço de tempo. Assim, em um indivíduo jovem e normal, utilizando-se um estímulo de 100 dB, a onda 1 aparece ao redor de 1,3 mseg, a 2 em 2,5 mseg, a 3 em 3,5 mseg, a 4 em 4,6 mseg e a 5 em 5,3 mseg. À medida que se aproximam do limiar auditivo, as latências vão gradativamente aumentando e algumas ondas vão desaparecendo por serem de menor intensidade na seguinte ordem 4, 2, 3 e 1. A 5ª onda é a última a desaparecer, servindo, portanto, para determinar o limiar dos potenciais elétricos de tronco cerebral.
Nas patologias, a audiometria de tronco cerebral é usada para se avaliar a audição de maneira objetiva, sendo de grande utilidade no diagnóstico de hipoacusias de crianças e de simuladores. Todavia, deve-se lembrar que ele indica o limiar de pressão sonora (dBSPL), que corresponde de 25 a 30 dB equivalente a um limiar audiométrico próximo de 20 dB. Assim, uma limiar de ABR em 45 dB equivale a um limiar audiométrico próximo de 20 dB.
O clic utilizado no ABR é uma mistura de várias freqüências, como o ruído branco das audiometrias tradicionais; porém, em casos especiais, podem-se usar clics filtrados, isto é, sons em uma determinada freqüência. Neste caso, deve-se ter cuidado ao examinar crianças pequenas, pois existe uma diferença muito grande entre os limiares eletrofisiológicos e os auditivos quando se testam as baixas freqüências 125, 250 e mesmo 500 Hz. Isto ocorre porque os aparelhos são calibrados em adultos ou crianças maiores, que possuem um conduto auditivo externo grande. No caso de crianças pequenas, o conduto tem um volume menor, o que acarreta uma pressão sonora menor e, conseqüentemente, um limiar eletrofisiológico (dBSPL) elevado.
Nas labiríntopatías periféricas, os potenciais evocados de tronco cerebral tem um papel extremamente importante no diagnóstico diferencial entre uma lesão coclear e tinia neural. Neste caso, mede-se a diferença entre as latências das ondas 5 e 1. Nos indivíduos normais e nas patologias cocleares, ela esta entre 3,8 a 4,2 mseg. Nas lesões retrococleares, ela aumenta muito, sendo o limite indicativo de lesão neural acima de 4,4 mseg., segundo a maioria dos autores. Devem-se também comparar as respostas do lado patológico com o normal, a fim de eliminar possíveis erros de interpretação. Clinicamente, a exatidão desse teste já foi confirmada e se estima que sua confiabilidade esteja em torno de 92% nos casos de nuerinomas do acústico.
Outra indicação importante achas-se nas labirintopatias centrais. A ausência de uma das ondas ou um aumento de sua latência, com exceção da 1, que é coclear, indica nana patologia na região onde ela é gerada. Por isso, ele é utilizado como importante auxiliar diagnóstico na esclerose múltipla, insuficiência vértebra-basilar, tumores ou processos degenerativos do tronco cerebral.
Outro tipo de alteração são as repostas desorganizadas que aparecem em lesões expansivas de porte avantajado no tronco cerebral, sobretudo nos neurinomas extracanaliculares.
Contudo, apesar de a maioria dos autores confirmar um alto grau de credibilidade do ABR, ele pode apresentar um ressaltado falso-positivo, isto é, acusar uma lesão retrococlear não confirmada por outros exames. Igualmente, pode aparecer como falso-negativo, isto é, quando apresenta respostas dentro da normalidade, mas o paciente é portador de uma lesão neural, até mesmo um neurinoma do acústico. Segundo os autores, os testes dúbios podem aparecer em 15% dos casos. Por isso, o ABR não afasta a possibilidade de também se realizar um eletrococleograma, pois, enquanto o primeiro é indicado para diagnóstico de lesões retrococleares, o segundo tem sua indicação para lesões cocleares; portanto, um teste não elimina o outro, unas o complementa. Assim, um paciente com EcoChG normal, mas sem resposta ao ABR, deve suspeitar de uma lesão retrococlear.