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Artigo publicado no Caderno de Debates da RBORL:

Vol.64 ed.6 de Novembro-Dezembro em 1998 (da página 22 à 30)

Autor: Aldo C. Stamm Karen Borne Teufert** Lurz An tonio S. Freire***.

Artigo

 Epistaxe Severa - Cirurgia Micro-Endoscópica

Epistaxe severa cirurgia micro-endoscópica

A epistaxe é uma emergência freqüente na prática médica. Aproximadamente, 10% da população normal já tiveram pelo menos um episódio de sangramento nasal importantes. Na maioria dos casos, o sangramento é anterior (90%), tendo sua origem na porção anterior do septo do nariz (principalmente a área de Littlle ou plexo de Kisselbach). O diagnóstico é feito pela rinoscopia anterior.

Na maioria dos casos, o tratamento para a epistaxe anterior (cauterização química, eletrocauterização e tamponamento anterior com gaze, entre outros) não requer hospitalização.

Diferentes métodos de tratamento têm sido utilizados para a epistaxe severa. O tratamento clássico é o tamponeamento nasal ântero-posterior, usando-se diferentes materiais, tais como gaze, sonda de Foley, tampões nasais insufláveis, esponja, Aviteneâ, Merocelâ, entre outros.

Medidas alternativas de tratamento são: injeção de vasoconstritor na fossa pterigopalatina, septoplastia, cauterização endoscópica posterior, ligadura de vasos e angiogratia com embolização seletiva.

Em nosso Serviço, a cirurgia é indicada para os casos que não respondem ao tratamento conservador, incluindo tamponamento adequado. Para ser efetivo, o tratamento cirúrgico da epistaxe requer uma identificação precisa do local de sangramento, e um conhecimento adequado da anatomia da vascularização do nariz.

Considerações anatômicas sobre as artérias da cavidade do nariz

O suprimento sangüíneo da cavidade do nariz origina-se do sistema das artérias carótida interna e externa. As artérias etmoidais anterior e posterior - ambas, ramos da artéria oftálmica do sistema da carótida interna - fornecem sangue para os ossos nasais, cartilagem septal, teto do nariz e áreas nasais relacionadas com a região pituitária, e, superiormente, à mucosa nasal lateral e medial. O suprimento sangüíneo nasal do sistema da artéria carótida externa é fornecido por dois ramos terminais da artéria maxilar: a artéria nasal lateral posterior e a artéria septal21, 23.

A artéria etmoidal anterior deixa a órbita passando através do canal etmoidal anterior, para alcançar a área ao lado da lâmina cribiforme17, próximo da crista galli, onde ela se volta em direção inferior, para suprir as células etmoidais anteriores e médias, o infundíbulo do seio frontal, a cavidade nasal anterior (septo e paredes laterais) e a pele sobre a parte cartilaginosa do nariz. A artéria etmoidal posterior passa através do canal etmoidal posterior para a região da lâmina cribiforme, e manda ramos, que descem para suprir a porção superior e posterior da cavidade nasal. Existem anastomoses entre as artérias etmoidais e as artérias nasal lateral posterior e septal, e também entre ambas as artérias etmoidais. A artéria etmoidal posterior está 4 a 7 mm distante do nervo óptico18. A artéria maxilar é um dos ramos terminais da artéria carótida externa. Ela surge atrás do colo da mandíbula e é dividida em três segmentos: o mandibular (entre o colo da mandíbula e ligamento esfenomandibular), o pterigóideo (em direção anterior e superior, superficial ou profundo em relação ao músculo pterigoideo lateral), e pterigopalatino (no interior da fossa homônima) 23. Os ramos da primeira divisão suprem a membrana timpânica, a orelha, a articulação temporomandibular, a mandíbula, os dentes e a dura-máter. Os ramos da segunda divisão suprem os músculos mastigatórios e, próximo à tuberosidade da maxila, a artéria dá origem aos ramos alveolares superior e inferior, ao infraorbital e aos ramos palatinos descendentes. Após um trajeto medial curto, a artéria maxilar entra na fossa pterigopalatina, onde está localizada a sua terceira divisão. A terceira divisão da artéria maxilar dá origem a ramos orbitais, e a ramos para o forame redondo e pterigopalatino (canal de Boech). Passando medialmente através da fossa, a terceira divisão se separa em artéria nasal lateral posterior e artéria septal, ambas entrando na cavidade nasal através do forame esfenopalatino, logo acima do término da cauda óssea da concha média. Navarro e colaboradores21 descreveram, em 6,6% dos casos, um £arame acessório, localizado um pouco inferiormente ao esfenopalatino, através do qual um ramo da artéria nasal lateral posterior entra na cavidade do nariz. A artéria septal passa através do forame esfenopalatino e segue pelo teto da cavidade do nariz em direção ao rostro do esfenóide e se divide em vários vasos para o septo e para as paredes nasais superiores, enquanto que a artéria nasal lateral posterior se separa na parede lateral da cavidade nasal, provendo desta forma o suprimento arterial para as conchas e espaços meatais, principalmente o inferior e o médio.

A artéria palatina descendente, como um ramo bucal e terminal da artéria maxilar, segue entre as paredes medial, anterior e posterior da fossa, divide-se em ramos maior e menor, entrando nos seus respectivos canais, e chegam na cavidade oral através do forame homônimo.

A artéria palatina maior segue pelo palato em direção ao forame incisivo, onde ela se junta à artéria nasopalatina, que vem do septo. Anastomoses entre o ramo contralateral destas artérias existem.

O septo anterior e inferior é suprido pelo ramo labial superior da artéria facíal. Uma área de múltiplas anastomoses das três fontes de suprimento vascular do nariz é achada superficialmente no septo nasal anterior (plexo de Kisselbach ou área de Littlle). Esta área é responsável pela maioria dos sangramentos nasais anteriores.

Classificação das epistaxes

As epistaxes podem ser classificadas de acordo com sua localização ou conforme a sua etiologia.

Segundo Montgomery18, a epistaxe é melhor classificada de acordo com sua localização: anterior, superior ou posterior. O sangramento anterior ocorre no plexo de Kisselbach ou área de Littlle, podendo ser proveniente de um ramo da artéria etmoidal anterior, ramo septal da artéria labial superior, ramo septal da artéria maxilar e/ ou ramo nasal da artéria palatina maior. O sangramento superior ocorre tanto das artérias etmoidais anterior e/ ou posterior quanto da artéria septal, um ramo da artéria maxilar. O sangramento posterior ocorre tanto da artéria nasal lateral posterior, quanto da artéria septal, ambas ramos da artéria maxilar.

Existem muitas causas diferentes para a epistaxe e elas podem ser divididas em quatro grupos, de acordo com Younkers e colaboradores 39: a.) causas locais; b.) causas associadas com desordens neoplásicas; c.) causas associadas com desordens hematológicas; e d.) outras causas. As causas locais incluem: alergia nasal, trauma, infecção, úlceras, cirurgia nasal, medicações intranasais, trauma por manipulação digital e reações à presença de corpo estranho. Nas epistaxes associadas com neoplasia destacam-se o angiofibroma e tumores malignos. Epistaxes associadas com desordens hematológicas incluem leucemia, anemia, púrpura, policitemia, hemofilia, linfoma e doença de Hodgkin. Como outras causas, incluem-se hipertensão, tabagismo, telangiectasia familiar, desordens hepáticas, nefrite crônica, pressões atmosféricas súbitas, psicopatias e medicações.

Tratamento da epistaxe severa

Diversas modalidades de tratamento têm sido propostas com o objetivo de controlar a epistaxe, com base principalmente na localização e na etiologia do sangramento, assim como na experiência do médico assistente.

Durante a avaliação inicial, uma breve história deve ser feita, enquanto as primeiras medidas para o controle do sangramento são tomadas. O exame da cavidade do nariz requer uma boa fonte de iluminação (luz frontal ou telescópios), espéculo nasal apropriado e aspiração potente. O exame deve ser realizado sob anestesia tópica e com o uso de vasoconstritores. Este exame é de extrema importância, no sentido de localizar o local do sangramento e escolher o tratamento mais apropriado. Em caso de um sangramento anterior, cauterização química ou eletrocauterização direta do local de sangramento e/ou tamponamento nasal anterior são os procedimentos usuais. Sangramentos nasais severos de origem posterior, póstero-superior ou superior requerem tamponamento nasal posterior (gaze, tampões nasais insufláveis, esponja ou outros). O uso de antibióticos é aconselhado, devido à diminuição da drenagem sinusal causada pelo tamponamento, a qual pode levar à sinusite secundária. O tamponamento permanece de 48 a 72 horas. Muitos pacientes com um tamponamento ântero-posterior podem necessitar de hospitalização, acompanhamento médico e avaliação hematológica. Devido ao risco de sedação com tamponamento posterior, apenas o uso cauteloso de sedativos e analgésicos é aconselhado.

O tamponamento nasal pode produzir complicações locais, regionais e sistêmicas. A complicação sistêmica mais comum é a modificação dos níveis arteriais de p02 e pC02, levando à hipoxemia séria e alterações hemodinâmicas em pacientes com reserva cardiopulmonar diminuída4, 8, 22, 35. A apnéia pode ocorrer como uma complicação do tamponamento nasal36.

Uma das principais complicações loco-regionais é a sinusite, ocorrendo devido à diminuição da drenagem dos seios paranasais16. Problemas de deglutição, aspiração, perfuração septal, obstrução tubária, necrose alar, septicemia e otite média secretora têm sido descritos8, 16, 35, 37.

Os tampões nasais insufláveis são fáceis de serem introduzidos, quando comparados aos tampões posteriores convencionais.

O tampão insuflável consiste de dois balões, de diferentes tamanhos. O menor deles, com um volume de 10 ml, é colocado no nível da coaria. O segundo, maior e de forma alongada, com um volume de 30 ml, é colocado dentro da cavidade do nariz. Uma vez posicionados dentro da cavidade do nariz, os balões são preenchidos com líquido (solução salina, água destilada). A insuflação dos balões com ar deve ser evitada, pois o tampão pode perder volume em 24 a 48 horas, tornando-se deste modo ineficaz2. Estes cateteres são usualmente melhor tolerados que o tampão convencional. As desvantagens do tampão nasal insuflável são: a.) pressão constante no mesmo local, resultando em necrose local; b.) possível ruptura do balão devido à pressão mantida, e aspiração do liquido; e c.) perda de pressão do balão e persistência do sangramento2.

O Merocelâ, também usado para o tamponamento nasal, é um tipo de material leve e poroso, lembrando uma esponja prensada que se expande na presença de líquidos. As vantagens do seu uso são a introdução e a emoção fáceis. Entretanto, ele nem sempre controla sangramentos abundantes, e pode ser difícil de ser colocado em presença de desvio septal.

O tamponamento clássico às vezes falha no controle e sangramentos nasais intensos e persistentes. Montgomery19 relatou uma taxa de falha de 25% com tamponamento posteriores; Stamm e colaboradores32, 33, 20%; e Procino25, 14%. Marks16 tratou 103 pacientes com tampomento posterior, e 55% deles necessitaram de ligadura arterial seletiva adicional.

Angiografia arterial com subtração é indicada para o agnóstico, em pacientes tratados repetidamente sem sucesso, e quando um procedimento de embolização é evisto. A embolização pode ser usada em pacientes com condição clínica ruim, ou naqueles que não toleram o tamponamento posterior ou tratamento cirúrgico6, 8, 15. Como complicações da embolização, áreas dolorosas no crânio podem ocorrer em relação com a oclusão da artéria temporal superficial15, 16; outro ponto é a recorrência do sangramento. Younkers e colaboradores39 descreveram a possibilidade da migração retrógrada do êmbolo para o sistema da artéria carótida interna, produzindo deste modo, às vezes, isquemia em qualquer área do cérebro. De acordo com Golding-Woodx, paralisia facial, trismo, e dor facial podem ocorrer, assim como eventuais lesões de extensão diversa do sistema nervoso central.

Myssiorek e Lodesposto20 realizaram embolização seletiva da artéria maxilar como uma segunda opção de tratamento, em caso de falha da ligadura arterial (14 casos) e falha do tamponamento posterior (dois casos). Duas complicações menores e transitórias (diplopia e distúrbios sensitivos da face) foram descritas nesta série20. Para estes autores, as vantagens desta modalidade de tratamento incluem remoção precoce do tamponamento nasal e menor tempo de hospitalização20.

No caso de sangramento da artéria etmoidal, a angiografia deve ser usada apenas para fins diagnósticos, por causa do alto risco de complicações oftálmicas da embolização1, 20.

Injeção da fossa pterigopalatina com substâncias vasoconstritoras, através do forame palatino maior, também tem sido defendida como um método para o tratamento da epistaxe15. Esta injeção pode levar à anestesia infra-orbital, perda visual de extensão variável, e sangramento recorrente depois da dissipação do vaso-constritor. O uso da criocirurgia no local de sangramento deve ser deixado como uma segunda opção, porque, apesar de ter sido relatado como um procedimento efetivo em mãos experientes, ele pode levar à formação de crostas e rinite atrófica15. A septoplastia pode ser usada no controle do sangramento recorrente do septo nasal. A dermoplastia septal deve ser considerada no tratamento da telangiectasia familiar15, 27.

A ligadura arterial é indicada quando métodos não-cirúrgicos de tratamento falham32, 33, 34, 37, ou seja, quando o sangramento nasal persiste ou recorre sem responder ao tamponamento nasal devidamente posicionado. Montgomery18 preconizou a intervenção cirúrgica precoce para a epistaxe26. Maris e Werth15 propuseram alguns princípios gerais para o tratamento cirúrgico da epistaxe: 1.) Pacientes em condições clinicas ruins, na presença de problemas pulmonares ou cardiovasculares, ou com desordens do sistema nervoso central, não devem ser tratados com tamponamento nasal. A ligadura precoce dos vasos é indicada nestes casos. 2.) Pacientes jovens devem ser tratados com medidas conservadoras, com ligadura dos vasos indicada no caso de falência. 3.) O tamponamento é preferível em crianças, devido ao tamanho das cavidades nasais e do seio maxilar. De acordo com Small e Maran29, o tratamento cirúrgico não deve ser adiado por muito tempo. A morbidade da ligadura de vasos não é muito maior quando comparada à do tamponamento posterior, com mais conforto para os pacientes.

A ligadura da artéria carótida externa foi usada por Hide12 no tratamento da epistaxe, mas agora o uso de microscópio, endoscópio e outros avanços tecnológicos a substituíram, considerando-se especialmente o número de anastomoses entre os sistemas da artéria carótida externa (ACE) e da artéria carótida interna (ACI), e a distância entre o local de sangramento e o da ligadura, a qual reduz consideravelmente a sua efetividade15, 17.

A ligadura transmaxilar da artéria maxilar na fossa zigomática é freqüentemente efetiva no controle do sangramento com origem nos ramos nasais19, 31. Usando-se o microscópio cirúrgico, a artéria é dissecada dentro da fossa zigomática, próximo à tuberosidade da maxila. Em algumas situações, há dificuldade em se identificar a artéria com todos os seus ramos, o que é responsável por falha técnica, mas existe uma variação considerável no número e tamanho dos ramos oriundos da artéria maxilar21, 37, 25, 37, o que pode resultar em uma ligadura ineficaz e persistência do sangramentos8, 29.

Algumas complicações têm ocorrido, incluindo-se fistula oroantral, e anestesia hemifacial19; e o método pode às vezes falhar no controle do sangramento. Esta técnica foi inicialmente proposta por Seiffert em 192826, melhorada por Chandler e Serrins em 19653, e popularizada por Montgomery em 1980. Macery, em 198414, propôs a ligadura transoral da artéria maxilar na região zigomática, sem abertura do seio maxilar. A distância entre a ligadura e o ponto de sangramento, trismo pós-operatório e disestesia dental ou facial são desvantagens deste método.

Concordando com o significado etimológico da palavra epistaxe (sangramento que vem de cima), os sangramentos podem se originar do sistema da artéria etmoidal; e, embora menos freqüente, podem ser notavelmente severos e impressionantes8, 10, 11. De acordo com Golding-Wood8, o sangramento etmoidal ocorre mais freqüentemente em pessoas jovens, a seguir de um trauma de face. A ligadura externa da artéria etmoidal anterior e da artéria septal, como recomendado por Silverblatt28 em 1955, pareceu ser efetiva no controle da epistaxe, mas não ganhou popularidade devido às dificuldades técnicas. A ligadura externa pode resultar em perda visual transitória ou permanente, devido à relação próxima entre o canal etmoidal posterior e o nervo óptico (3 a 8 mm)7, ou em diplopia4, 16. Estas complicações não são comuns, e o acesso externo, usando-se o microscópio cirúrgico, é um excelente acesso para a artéria etmoidal, com um alto índice de sucesso (Stamm e colaboradores 1995)34. Snynderman e Carrau30 realizaram, em 67% de seus pacientes, ligadura da artéria etmoidal anterior e da artéria esfenopalatina ao mesmo tempo, devido à dificuldade em localizar o local de sangramento. Heermann (1986)10, 11 tratou todos os seus pacientes, com epistaxe severa, com a eletrocoagulação das artérias etmoidais anterior e posterior nos seus canais ósseos no teto do complexo etmoidal, usando um acesso microscópico intranasal.

O problema mais significativo da coagulação arterial intranasal é a possibilidade de uma fístula liquórica, quando o cautério é usado no interior dos canais etmoidais, e o cirurgião não identifica exatamente os vasos10, 11, 34.

A eletrocoagulação intranasal dos ramos nasais da artéria maxilar, combinada com a eletrocoagulação das artérias etmoidais anterior e posterior, com ou sem etmoidectomia parcial, parece ser um método efetivo no tratamento da epistaxe severa usando-se o microscópica operatório e endoscópios9, 10, 11, 13, 22, 30, 32, 33, 34, 38. As vantagens deste método são a proximidade entre a ligadura arterial e o local de sangramento e a visualização direta dos vasos' envolvidos5, 10, 11, 13, 32, 33, 34, 38.

Através do mesmo acesso, desordens associadas, tais como pólipos, sinusite, deformidade septal, e tumores, podem ser tratadas ao mesmo tempo.

A endoscopoia nasal, usada como um método de diagnóstico, também pode ser usada no tratamento da epistaxe posterior. Esta técnica tem uma taxa de sucesso entre 82% e 90%, dependendo da experiência do cirurgião5, 24, 30, 38. Wurman38 propôs este procedimento usando telescópio de 4 mm e de 0° e 30°. Prechamandra, usando o endoscópio24, coloca pequenos tampões nasais confinados à área de sangramento, além de eletrocauterização local ou cauterização química. Snynderman e Carrau30, usando uma técnica endoscópica transnasal, acossaram o forame esfenopalatino, ressecando a porção inferior e anterior da concha média.

Isto também pode ser realizado para melhorar o acesso cirúrgico ao meato médio. Uma antrostomia ampla do meato médio é criada e o forame esfenopalatinó e suas artérias são identificados. Os ramos terminais da artéria maxilar são identificados e dissecados e podem ser coagulados ou ligados.

Na nassa experiência, 173 pacientes foram tratados cirurgicamente para controlar epistaxes severas. A técnica consistiu de eletrocoagulação seletiva transnasal (microscópica e endoscópica) dos ramos nasais da artéria maxilar e, quando necessário, eletrocoagulação da artéria etimodal, próximo à área de sangramento, dentro do nariz, ao mesmo tempo. Outro acesso usado para tratar o sangramento das artérias etmoidais anterior e posterior, foi o acesso externo através do microscópio, usando-se coagulação bipolar. Este acesso é usado apenas quando a coagulação intranasal não teve sucesso ou na presença de sangramento profuso.

Eletrocoagulação -transnasal microendoscópica dos ramos nasais da artéria maxilar

A cirurgia pode ser realizada tanto com o microscópio operatório quanto com os endoscópios. O paciente é colocado em posição supina, com a cabeça levemente elevada, aproximadamente 10°, e inclinada em direção ao cirurgião, que fica do lado oposto do sangramento, quando estiver usando o microscópio operatório. Quando a cirurgia é realizada com endoscópios, utiliza-se um de 0° e de 4 mm de diâmetro.

A cavidade do nariz é preparada com cotonóides embebidos em solução vasoconstritora, para reduzir o sangramento e o volume das conchas. Quando se usa o microscópio operatório, a concha média é fraturada em direção ao septo do nariz, muito cuidadosamente, para que não seja danificado o seu suprimento arterial. A concha inferior é fraturada para ampliar o campo cirúrgico. Neste estágio, um espéculo nasal autostático tamanho 2 é posicionado, para manter uma boa exposição do campo cirúrgico. A porção caudal da concha média é um dos pontos de referência anatômicos mais importantes, por causa da sua relação próxima com o forame esfenopalatino, através do qual os ramos nasais da artéria maxilar surgem. Outro ponto de referência é a parede posterior do seio maxilar. Usando-se um microcautério ou um micro-bisturi, uma incisão vertical é feita aproximadamente a 1 cm anterior da porção caudal da concha média, através da mucosa e do periósteo. Este retalho é elevado até que as bordas do forame esfenopalatino estejam expostas, identificando-se as artérias nasal lateral posterior e a artéria septal, as quais se originam da artéria maxilar e entram na cavidade nasal pela fossa pterigopalatina. Uma vez identificados, ambos os ramos arteriais são isolados através de dissecção, e coagulados (monopolar ou bipolar), o mais longe possível das bordas do forame, para evitar qualquer possível retração do segmento proximal para o interior da fossa pterigopalatina (Figura 1). Ao fim do procedimento, o retalho de mucoperiósteo é reposicionado e mantido em posição com fragmentos de Gelfoamâ ou Surgicelâ. O tamponamento também diminui o gotejamento de sangue da área cirúrgica. As conchas inferior e média são reposicionadas, e um tamponamento suave com gaze dentro de um dedo de luva ou Merocelâ é posicionado dentro do nariz, por 24 horas, para prevenir qualquer sangramento menor causado pela manipulação cirúrgica. Naqueles casos nos quais é necessário ligar os ramos terminais da artéria maxilar através do acesso transnasal transmaxilar, é preferível que se faça uma ampla antrostomia do meato médio, e então se identifique o forame esfenopalatino. A pinça Kerrison é então inserida dentro do forame esfenopalatino, para remover o osso da parede posterior do seio maxilar. A artéria maxilar e os seus ramos são então identificados, individualmente isolados, e eletrocoagulados com bipolar ou clipados.



Figura 1 - Representação esquemática da eletrocoagulação dos ramos terminais da artéria maxilar no nível do forame estenopalatino; utilizando-se endoscópio de 4 mm e 0°.



Figura 2 - Eletrocoagulação de ramos da artéria etmoidal anterior empregando o sistema monopolar de coagulação com endoscópio de 4mm e 0°.



Eletrocoagulação transnasal microendoscópica das artérias etmoidais anterior e posterior

O nariz do paciente é preparado com uma solução vaso-constritora, como descrito acima. O paciente é colocado em posição supina, e a cabeça é hiper-estendida, para que se tenha o complexo etmoidal em um plano paralelo com a luz do microscópio. Usando-se um espéculo autostático, o microscópio cirúrgico e aspiração contínua, o ponto de sangramento é identificado na confluência do teto do nariz com a porção superior do septo. Esta técnica também pode ser realizada utilizando-se endoscópios, especialmente de 0° e 4 mm de diâmetro.

Os sangramentos ântero-superiores originam-se dos ramos lateral e medial da artéria etmoidal anterior ou de um ramo da artéria etmoidal posterior Os sangramentos póstera-superiores originam-se dos ramos da artéria etmoidal posterior ou da artéria septal. Na última situação, dois sistemas arteriais (ACI-ACE) suprem o sangramento, o qual é controlado por coagulação direta do ponto de sangramento e dos arredores da mucosa nasal (Figura 2).

Se há persistência do sangramento depois deste procedimento, a coagulação das artérias etmoidais deve ser realizada no nível dos seus canais ósseos, no teto do complexo etmoidal, abordando-as através de uma etmoidectomia transnasal parcial. Para se realizar o acesso transetmoidal, o espéculo autostático é introduzido dentro do meato médio, anterior e superiormente. O processo unciforme e a bolha etmoidal são identificados e removidos, para se obter uma exposição completa do complexo etmoidal. A etmoidectomia é feita até o nível do assoalho da fossa anterior, e os canais etmoidais são identificados. O próximo passo é a coagulação das artérias quando elas saem dos seus canais (Figura 3). No momento da coagulação das artérias, deve se evitar a introdução profunda do eletrocautério, para prevenir a ocorrência de fistula liquórica (Heermann10, 11 e Stamm33).

Eletrocoagulação microcirúrgica externa das artérias etmoidais anterior e posterior

Quando o sangramento é proveniente do sistema das artérias etmoidais e não pode ser controlado transnasalmente, é necessário o uso do acesso externo com o microscópio cirúrgico.

Uma incisão é realizada junto ao canto interno do olho, semelhante à da etmoidectomia externa. Uma dissecção subperiostal do conteúdo orbitário da parede interna da órbita é realizada até o nível da junção fronto-etmoidal, onde a artéria etmoidal anterior é identificada e coagulada com um sistema bipolar (Figura 4). Para manter o conteúdo orbitário afastado do canto interno do olho e do nariz, um retrator autostático de Stamm é usado. O instrumento tem uma lâmina de um lado e uma garra curva do outro. Para coagular a artéria etmoidal posterior, a elevação dos tecidos moles da órbita é feita posteriormente até aproximadamente 1 cm. A relação próxima entre a artéria etmoidal posterior e o nervo óptico (4 -7 mm) deve ser mantida em mente durante a eletrocoagulação bipolar destes vasos.

Como um ponto de referência prático, a regra "2-1-1/2" é útil. A artéria etmoidal anterior é encontrada a aproximadamente 2 cm posteriormente à incisão na pele, a artéria etmoidal posterior é identificada aproximadamente 1 cm atrás da anterior, e o nervo óptico está a 0,5 cm da artéria etmoidal posterior.

Resultados e complicações

Entre 1985 e 1998,173 pacientes foram tratados por epistaxe severa com técnicas micro-endoscópicas. As indicações para a cirurgia foram o fracasso do tamponamento nasal ántero-posterior, ou a persistência ou recorrência do sangramento depois do tratamento médico.

A técnica utilizada na maioria dos casos foi a eletrocoagulação dos ramos terminais da artéria maxilar ou combinada com a eletrocoagulação dás artérias etmoidais anterior e posterior, com ou sem etmoidectomia transnasal parcial microscópica ou endoscópica. A coagulação bipolar das artérias etmoidais através do acesso externo, usando o microscópio, combinada com a coagulação transnasal dos ramos terminais da artéria maxilar, também foi utilizada (Tabela 1). C) fracasso no controle do sangramento ocorreu em seis pacientes (3,4%), durante o período pós-operátório imediato, por causa de um erro no topodiagnóstico do sítio de sangramento, e durante o período pós-operatório tardio em quatro pacientes (2,3%), devido à cirurgia incompleta, quando um dos ramos terminais da artéria maxilar não foi coagulado. As complicações têm sido infreqüentes e foram normalmente relacionadas com o fracasso na localização do sítio de sangramento, ou com técnicas cirúrgicas inadequadas (Stamm e colaboradores)33. De acordo com Legend e colaboradores33, 34, resultados satisfatórios foram obtidos apenas com a ligação intranasal dos ramos da artéria maxilar em 30 pacientes, e apenas oito deles necessitaram de tratamento cirúrgico das artérias etmoidais. Synderman e Carrau30 verificaram recorrência de epistaxes depois de ligadura dos ramos terminais da artéria maxilar em 13% dos seus casos.



Figura 3 - Representação esquemática da eletrocoagulação da artéria etmoidal anterior no teto do seio etmoidal, pós-etmoidectomia.



Figura 4 - Eletrocoagulação da artéria etmoidal anterior com sistema bipolar, através do acesso externo.



Sinéquias entre a concha média e a parede lateral do nariz ou o septo do nariz, hiposmia unilateral ou anosmia, transitória ou permanente, formação de crostas e infecção local são complicações relacionadas com o trauma cirúrgico ou com coagulação extensa da mucosa nasal. Equimose orbitária e edema foram as complicações mais comuns do acesso externo para a ligadura das artérias etmoidais anterior e posterior.

Conclusões

A revisão dos resultados do tratamento cirúrgico da epistaxe severa por eletrocoagulação intranasal microendoscópica dos ramos nasais da artéria maxilar e/ou das artérias etmoidais, ou a coagulação bipolar das artérias etmoidais usando o acesso externo, permite as seguintes considerações:

1.) O microscópio cirúrgico e o endoscópio proporcionam magnificação e boa iluminação.

2.) A técnica cirúrgica microendoscópica resulta em trauma cirúrgico mínimo, diminui o tempo cirúrgico e a morbidade e melhora a visualização.

3.) A eletroacoagulação dos principais ramos nasais das artérias maxilares deve ser seletiva, evitando-se deste modo o desenvolvimento de circulação colateral.

4.) A eletrocoagulação das artérias etmoidais pode ser realizada no local de sangramento, dentro da cavidade do nariz.

5.) A coagulação bipolar das artérias etmoidais, sob o microscópio cirúrgico e através de um acesso externo, é efetiva no controle da epistaxe severa.

6.) O tratamento cirúrgico da epistaxe severa pode resultar em menor período de hospitalização, é bem aceito pelos pacientes e pode ser realizado em crianças.


Tabela I - Distribuição dos pacientes portadores de epistaxe severa, de acordo com as artérias envolvidas e o tratamento cirúrgico realizado.



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(*) Diretor do Centro de Otorrinolaringologia e Fonoaudiologia de São Paulo - Hospital Professor Edmundo Vasconcelos.
(**) Médica Residente do Centro de Otorrinolaringologia e Fonoaudiologia de São Paulo - Hospital Professor Edmundo Vasconcelos.
(***) Médico Otorrinolaringologista - Centro de Otorrinolaringologia e Fonoaudiologia de São Paulo - Hospital Professor Edmundo Vasconcelos.

Endereço para correspondência: Dr. Aldo Stamm - Rua Afonso Braz, 525 Cjt°. 13 - 04511-010 São Paulo/ SP Brasil - Fax: (011) 822-0223.

 

 

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