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Artigo publicado no Caderno de Debates da RBORL:
Vol.64 ed.5 de Setembro-Outubro em 1998 (da página 12 à 22)
Autor: João J Maniglia*, Ricardo F. Maniglia**, Sérgio F. Maniglia***, Fábio L. Ouriques****.
Artigo
Introdução
Inicialmente, devemos entender o conceito do que seja cirurgia convencional de seios paranasais. Em princípio, seriam os métodos cirúrgicos usados por praticantes de boa formação que determinam o padrão de tratamento aceito para a época. Quanto a este padrão, são analisados os resultados da cirurgia com relação à morbidade do procedimento, grau de dificuldade cirúrgica e porcentagem de cura. Outros procedimentos serão descartados quando submetidos à mesma análise e a comparação com padrão convencional os coloque em inferioridade.
Em contraposição à cirurgia convencional, largamente aceita pelos praticantes da época, colocam-se as inovações. Elas são responsáveis pela mudança do padrão convencional e surgem de avanços conceituais na interpretação da doença ou de progresso tecnológico capaz de facilitar a avaliação do paciente e determinar a extensão da doença (por exemplo, tomografia computadorizada e ressonância magnética) ou da melhoria técnica capaz de facilitar o procedimento cirúrgico (microscópios, endoscópios, monitoração por vídeo-endoscopia e navegação, e o uso de microinstrumentos e motorizados - power tools).
O avanço conceitual é puramente biológico, determinado pela compreensão da etiologia da doença, sua fisiopatologia, com a clara determinação dos fatores locais ou sistêmicos, predisponentes, desencadeantes ou agravantes, responsáveis por sua manifestação clínica.
A determinação do tratamento da doença está baseada em princípios bastante antigos que determinam a invasividade mínima eficiente (prima non noccere).
A seleção dos procedimentos deve ser feita gradativamente, usando-se inicialmente os menos invasivos, para, em seqüência, os mais invasivos, com o objetivo de preservar a função e a vida, com o melhor resultado estético possível. A cirurgia é denominada convencional quando a passagem do tempo comprovar sua eficácia na cura da doença. Contra este padrão de referência, a cirurgia inovativa deve oferecer igual ou melhor resultado, com menor risco e mais baixa morbidade para ó paciente.
Entretanto, a inovação geralmente não tem progresso linear, e o teste do tempo muitas vezes condena certos modismos ao esquecimento. Ocasionalmente, um avanço tecnológico pode ressuscitar e ser viabilizado por outro avanço tecnológico. Para análise mais concreta do que seja cirurgia convencional, consideraremos os métodos de tratamento do começo do século, em relação aos mais recentes, na cura da sinusite. A falha do tratamento convencional é responsável pela impressão negativa da população de que "sinusite não tem cura". O médico responsável pelo tratamento deve ter uma fundamentação conceitual bastante clara para determinar os objetivos do tratamento cirúrgico, frente à nossa compreensão inadequada da etiologia e fisiopatologia da doença.
Fisiopatologia dos seios paranasais
Não existe qualquer informação categórica sobre a função dos seios paranasais, e é possível que ela não exista.
O osso pneumatizado seria um resquício embriológico, sendo comum nas aves que voam e que aparece em mamíferos, em cavidades conectadas com o sistema respiratório (fossas nasais, seios paranasais, ouvido médio e mastóide).
A presença de cavidade óssea não colapsável com revestimento de mucosa respiratória e a necessidade de ventilação, manutenção de pressão e sistema de drenagem de muco, através de óstios e canais de drenagem estreitos, criam uma situação desfavorável na saúde e na doença da via respiratória alta (Figuras 1 e 2).
A função da mucosa respiratória é o fator mais importante em fisiologia nasal e de seios paranasais. A arquitetura anatômica da fossa nasal e dos seios etmoidais é bastante variável nas diferentes raças e formas de crânio, no desenvolvimento das várias estruturas do meato médio, produzindo bloqueio dos seios paranasais anteriores (maxilar, etmóide anterior e frontal), com prejuízo da ventilação, originando pressão negativa e deficiência de drenagem do muco, que seriam fatores predisponentes na infecção dos seios paranasais.
A alteração da espessura da mucosa respiratória, seja por vasodilatação (com edema), proliferação celular, tanto nas reações alérgicas quanto nas reações inflamatórias, pode produzir nas reentrâncias e pequenas cavidades do etmóide anterior o contato mucoso e conseqüente paralisia do movimento ciliar, que são fatores preponderantes na formação dos pólipos nasais e obstrução de ventilação e drenagem nos seios paranasais.
Figura 1 - Dissecção cadavérica. No canto superior direito da figura, a órbita; no canto Inferior direito, o seio maxilar; no canto superior esquerdo, o seio frontal; e o labirinto etmoidal, no centro.
Figura 2 - Tomografia computadorizada do seio frontal, extremamente pneumatizado.
Existem casos em que a alteração congênita da mucosa com anormalidade do movimento ciliar (síndromes de Kartagener e Young, entre outras) ou alteração reostática do muco (mucoviscidose) ou da diminuição da imunidade local (deficiência de IgA) apresentam situações nas quais o tratamento cirúrgico pode não ser curativo e o bem-estar do paciente vir a depender de tratamento clinico durante toda a vida.
Na presença dos fatores predisponentes, a superposição de fatores desencadeantes - como reações alérgicas, irritação por poluentes, infecções virais ou bacterianas, entre outros - pode desencadear o bloqueio agudo de ventilação e drenagem dos seios paranasais, com o desenvolvimento da baixa imunidade local e infecções bacterianas agudas ou crônicas.
Pode existir a cura espontânea, ou após tratamento por antialérgicos ou antibióticos, subseqüente normalização da mucosa e reversão do bloqueio no meato médio.
A reincidência das infecções bacterianas ou a cronificação destas podem eventualmente ser a causa de indicação do tratamento cirúrgico do seio paranasal afetado.
Estes fatos introduzem um novo elemento na avaliação da espessura da mucosa do seio paranasal, que é a reversibilidade da mucosa enferma espessa para mucosa sadia.
Após o desenvolvimento e uso dos endoscópios, pode se verificar que cirurgias pequenas de normalização do complexo ostiomeatal, com ventilação e aeração dos seios maxilares e frontais, são eficientes na normalização da mucosa, na aeração e drenagem dos seios, comprovadas por endoscopia, tomografia computadorizada e cura dos pacientes.
Entretanto, sabemos de casos em que a mucosa periférica dos seios não tem a capacidade de normalização, o que exige cirurgias mais invasivas, com a necessidade de remoção de pólipos e granulações, provocando reparação por fibrose e perda do epitélio ciliado, indispensável para a normalização do seio.
Em resumo, podemos dizer que são quatro os fatores que asseguram a normalização do seio paranasal: 1.) aeração; 2.) drenagem; 3.) ausência de contato mucoso; e 4.)mucosa reversível.
Figura 3 - Punção trans-meática em seio maxilar esquerdo através do meato inferior.
Indicação de tratamento e seleção da cirurgia
A cirurgia eficiente deve ser tão radical quanto for necessário; e tão conservadora, quanto possível. A preservação da mucosa ou sua reposição na área crítica do óstio são indispensáveis para a normalização do seio. A via de acesso do tratamento cirúrgico deve ser a menos invasiva possível, e na maioria das vezes será pela via natural (fossa nasal).
A via externa será de exceção quando a patologia é de localização periférica no seio (frontal e maxilar) e quando da falha do tratamento por via natural, na ausência de ponto de reparo anatômico confiável, assim como no tratamento do seio que originou complicação (osteomielite, abscessos orbitários e intracranianos). Em se tratando de seio frontal, após a falha da cirurgia preservadora do seio, resta a opção de cirurgia obliterativa ou, de nossa preferência, a cranialização do seio. Na cirurgia de base de crânio usam-se os seios paranasais como via de acesso para o tratamento de patologias desta região; e a cranialização do seio frontal pode ser parte integrante dela.
Revisão histórica da dinâmica da cirurgia convencional
Para efeito de ilustração, vamos usar três períodos neste século e imaginar qual seria a cirurgia convencional da época para o tratamento do seio paranasal que não tivesse respondido ao tratamento conservador.
Figura 4 - Cirurgia de Caldwell-Luc mostra janela antro-nasal em meato inferior.
Cirurgia convencional no começo do século
Podemos visualizar o Dr. Howard Lothrop, em Boston, na Universidade de Harvard, em 1914, e imaginar como ele faria o tratamento das afecções inflamatórias dos seios paranasais. Ele certamente usaria o espelho frontal para cirurgias - e não disporia do uso de antibióticos.
Já se contava com o recurso da radiografia dos seios paranasais, e as indicações de cirurgia eram feitas para o tratamento da supuração aguda e crônica e tratamento de complicações.
As cirurgias podem ser revistas em livros da época (como o The catarrhal and suppurative diseases of lhe acessory si nuses of the nose - escrito por Ross Hall Skillern, M D).
Já eram conhecidos dois princípios da fisiologia dos seios paranasais (aeração e drenagem); porém, a mucosa era considerada doente e o tratamento consistia na remoção do mucoperiósteo. A seguir, descrevemos suscintamente as suas indicações e a seleção de cirúrgicas para os diversos seios paranasais.
Seio maxilar
A mais freqüente indicação de cirurgia no seio maxilar certamente seria a sinusite maxilar odontogênica.
O tratamento inicial não seria feito via meato médio, pelas dificuldades de cateterização do óstio deste seio e pela possibilidade de complicação orbitária do procedimento.
A punção transmeática em meato inferior com lavagem efetuaria o tratamento das sinusites agudas e exacerbação aguda das sinusites crônicas (Figura 3).
O tratamento da sinusite maxilar crônica ou de complicações seria feito pela técnica de Caldwell-Luc ou Denker, com remoção do mucoperiósteo e confecção de janela antronasal em meato inferior (Figura 4).
Seios etmóide e esfenóide
A padronização da etmoido-esfenoidectomia intranasal, feita no começo do século, foi bem desenvolvida por Yankauer, em Nova Iorque, em 1928. O objetivo e extensão da cirurgia permanecem os mesmos até hoje (marsupialização do etmóide e esfenóide), sendo o progresso posterior principalmente tecnológico e de mudança no conceito da fisiopatologia da enfermidade.
Seio frontal
A infecção frontal aguda seria inicialmente tratada por remoção do corneto médio, sondagem por via intranasal e lavagem do seio afetado. Nos casos de insucesso do tratamento ou cronificação da doença, as várias técnicas de sondagem e dilatação do dueto fronto-nasal (Ingais, Halle ou Good) seriam usadas com risco de meningite iatrogênica para o paciente e sucesso variável na cura da doença. Quando da persistência da infecção aguda, a trepanação do seio frontal (via externa) com intubação e lavagem pós-operatória do seio era feita até cessar a supuração e permeabilização do seio frontal para a fossa nasal. As doenças crônicas ou complicadas seriam inicialmente tratadas por via intranasal. O tratamento incluiria ressecções de septo nasal (técnica de Killian), remoções do corneto médio e etmoido-esfenoidectomia intranasal com sondagem e dilatação do ducto fronto-nasal (Figura 5). Nos casos mais resistentes, poderiam ser usadas a cirurgia de Halle (Figura 6) ou a de Ingals (Figuras 7 e 8) nessa reconstrução.
Figura 5 - Raspas frontais de Thomson e Suttivan.
Figura 6 - Cirurgia intranasal de reconstrução de dueto fronto-nasal de Walle.
Figura 7 - Cirurgia intranasal de reconstrução de dueto fronto-nasal de Ingals; ressecção da porção anterior da concha média e sondagem frontal.
Figura 8 - Cirurgia de Ingals: alargamento do ducto fronto-nasal com raspas e broca elétrica.
Figura 9 - Dissecção mostra seio maxilar (esq.); etmóide (centro); e concha média (dir.).
Figura 10 - Radiografia mostra clips de preta ligando ramos da artéria maxilar em ambas fossas ptérigo-palatinas.
A cirurgia externa seria o último recurso, podendo ser utilizada desde a fronto-etmoidectomia de Jansen (e posteriormente de Lynch), com total remoção do mucoperiósteo do seio frontal, até a cirurgia de Riedel, com extrema desfiguração para o paciente.
Em casos bilaterais, a técnica de drenagem medial bilateral de Lothrop seria indicada.
Cirurgia convencional em 1970
Através de uma revisão de procedimentos do livro Surgery of the Upper Respiratory System, publicado pelo Dr. William Mont Gomery em 1971, notamos a enorme variação de cirurgias desenvolvidas nesse período, tanto no tratamento da supuração quanto no uso dos seios paranasais, no tratamento de tumores, cistos ou fístulas liquóricas. O uso dos antibióticos facilitou o tratamento das infecções agudas; porém, ele não dispunha da videoendoscopia, da tomografia computadorizada ou ressonância magnética na avaliação e tratamento dos seus pacientes. O uso da luz frontal elétrica e do microscópio já era bastante disseminado.
Seio maxilar
A cirurgia do seio maxilar teve grande desenvolvimento nesta época. A sinusite maxilar aguda era tratada com antibióticos e punção transmeática inferior, com lavagem do seio. A cirurgia de Caldwell-Luc, com janela em meato inferior, continuava a ser o tratamento preferido da sinusite maxilar crônica.
A etmoidectomia transmaxilar (Figura 9) foi usada extensivamente para o tratamento de polipose nasal difusa, pólipo de Killian e maxilectomias parciais (papiloma invertido e carcinomas).
Foi desenvolvido o acesso à fossa ptérigo-palatina, usando-se o microscópio para ligadura da artéria maxilar e seus ramos no tratamento da epistaxe recidivante (Figura 10), e secção do nervo vidiano (no tratamento da rinite vasomotora, atualmente abandonada). A secção do nervo vidiano não suportou a passagem do tempo, e foi abandonada.
Figura 11 - Fibroma ossificante de seio efinóide e esfenóide removido por etmoidectomia externa.
Figura 12- Tomografia computadorizada com contraste intratecal, mostra encefalocela adquirida em seio etmóide.
Seio etmóide
A cirurgia etmoidal intranasal permanece inalterada; porém, amplia-se enormemente a indicação de cirurgias externas, tanto para as patologias orbitárias (drenagem de saco lacrimal, descompressão de órbita na doença de Graves, ou drenagem de abscessos orbitários), quanto para as patologias sinusais (mucoceles e tumores - Figura 11), e também no tratamento de fístulas liquóricas ou encefaloceles de teto e lâmina crivosa do etmóide (Figura 12).
Seio esfenóide
O acesso externo ao seio esfenóide permitiu a hipofisectomia total no tratamento de pacientes com tumores metastáticos de mama e próstata (atualmente abandonada), a descompressão do canal do nervo óptico (Figura 13), a drenagem do granuloma de colesterol (ou colesteatoma) da ponta do rochedo e o tratamento com retalhos mucosos da fístula liquórica em seio esfenóide.
Tumores de hipófise eram removidos por via sublabial ou intranasal trans-septal - com o uso do microscópio cirúrgico.
Figura 13 - Dissecção de cadáver mostra acesso retmoidectomia externa direita; seio esfenóide, túrcica, canal óptico e quiasma óptico.
Figura 14 - Fato de cirúrgica: mostra retalho frontal após remoção da mucosa e obliteração dos duetos frontonasais, antes de obliterar com gordura abdominal.
Figura 15 - Foto cirúrgica: angiofibroma de cavum em fossa ptérigo-palatina e infratemporal.
Figura 16 - Foto cirúrgica: remoção de encefalocele gigante por etmoidectomia externa.
Seio frontal
O Dr. MontGomery, em seu livro, usaria as mesmas técnicas intranasais no tratamento de infecções agudas dos seios frontais inclusive trepanação externa e lavagem.
Devido aos maus resultados das cirurgias de Lynch e Lothrop, ele utilizou com grande sucesso a técnica do retalho osteoplástico e obliteração do seio com gordura abdominal (Figura 14).
Cirurgia convencional na virada do segundo milênio
Agora podemos imaginar o autor principal deste artigo em sua prática diária, com o benefício dos antibióticos para tratar infecções agudas, com o conhecimento dos avanços biológicos (da necessidade da preservação ou reposição da mucosa sinusal ou do óstio), tecnológicos de diagnóstico (tomografia computadorizada com reconstrução em três dimensões, com simulação cirúrgica e ressonância magnética) e de instrumental cirúrgico (luz elétrica frontal, microcirurgia, cirurgia vídeo-endoscópica, monitoração por navegadores e instrumentação motorizada para preservação de mucosa). Nesta década, foi desenvolvida a cirurgia de base de crânio, utilizando-se seios paranasais normais, para tratar com sucesso doenças de difícil acesso.
Podemos fazer uma lista das cirurgias atuais relacionadas aos seios paranasais.
Seio maxilar
A sinusite maxilar resistente ao tratamento com antibióticos, em sua vasta maioria (inclusive a fúngica), pode ser curada por via intranasal, por uncifectomia e janela antro-nasal de meato médio, por remoção parcial das fontanelas anterior e posterior, usando vídeo-endoscopia (com endoscópios de zero, 30 e 70 graus).
A antrotomia maxilar externa (via incisão gengivobucal), com preservação de mucosa sinusal e janela antronasal média, substituiu a cirurgia de Caldwell-Luc e pode ser usada em fístula buco-anual, pólipo de Killian e, com etmoidectomia transmaxilar, tratar polipose nasal difusa e papiloma invertido de fossa nasal, além de outras indicações. O acesso transmaxilar à fossa ptérigo-palatina e infratemporal possibilita a cura de angiofibromas de cavum (Figura 15) e, associado ao acesso trans-zigomático neurocirúrgico, a remoção de meningiomas e neurinomas de base de crânio.
Seio etmóide
A partir dos estudos de MesserKlinger, Wigand, Stammberger, Draf e outros, a conceituação do complexo ostiomeatal, sua anatomia endoscópica e a determinação de seu valor no funcionamento dos seios paranasais anteriores, ficou evidenciada a viabilidade de cura da sinusite com cirurgias minimamente invasivas. Em 1985, introduzida nos EUA, esta cirurgia foi denominada funcional endoscópica (Functional Endoscopic Sinus Surgery - FESS), por Kennedy.
A mudança de conceituação em que a mucosa não é considerada doente e responsável pela sinusite e, sim, secundariamente alterada pela obstrução do complexo ostiomeatal, originou a busca de instrumentação protetora de mucosa (pinças cut-thru e ferramentas motorizadas) que evitassem o arrancamento mucoso, com a conseqüente osteíte e cicatrização prolongada por fibrose. A maior dificuldade da cirurgia videoendoscópica foi com o tratamento do seio frontal, com cirurgias agressivas no recesso frontal (com estenose em 12% dos pacientes com seios frontais normais, conforme Lanza e Kennedy).
Por esta razão, o cirurgião endoscópico deve respeitar o recesso frontal, principalmente em cirurgia de polipose difusa; e, quando na presença de sinusite frontal aguda recidivante ou crônica com ou sem complicações, deverá orientar sua cirurgia no sentido de reconstruir o ducto frontonasal (por via natural ou externa). A via externa pode ser usada para o tratamento da descompressão orbitária no exoftalmo maligno, na remoção de tumores sem reparo anatômico confiável por via intranasal e na correção de fístulas liquóricas e encefaloceles (Figura 16).
O uso da videoendoscopia originou a revisão da anatomia do seio etmóide, aperfeiçoando a etmoido-esfenoidectomia intranasal e a abertura do seio maxilar e revolucionando a rinologia.
Figura 17 - Ressonância magnética mostra microadenoma de hipófise.
Figura 18 - Foto de paciente com mucocele frontal direita.
Figura 19 - Foto cirúrgica; reconstrução de ducto fronto-nasal esquerdo (retalho de Sewall) e molde de silicone.
Seio esfenóide
Atualmente, a cirurgia de seio esfenóide por via intranasal é bem sucedida. Os tumores de hipófise por via transseptal, mesmo com alguma extensão supra e para-selar, são removidos usando-se microscópio e videoendoscópios (Figura 17). A descompressão do canal do nervo óptico e o tratamento de fístulas liquóricas esfenoidais são feitos da mesma forma, bem como a remoção de mucocele e de tumores benignos.
Figura 20 - Foto cirúrgica: cirurgia de Lothrop com retalhos de McNaught bilateral (com molde de silicone).
Figura 21 - Foto de craniotomia anterior, com a remoção do osso frontal e ambos os rebordos orbitários superiores com eliminação (cranialização) do seio frontal.
Figura 22 - Foto cirúrgica do retalho de gália-periósteo.
O acesso ao seio esfenóide pode ser feito por via craniotomia anterior ou média (trans-zigomática), para tratar patologias de base de crânio como meningeomas, angiofibromas, cordomas e craniofaringeomas, entre outras.
Seio frontal
O tratamento cirúrgico das afecções do seio frontal, principalmente as sinusites agudas recidivastes, deve ser feito por via natural, usando-se microscópio e videoendoscopia aliviando o bloqueio do meato médio e complexo ostiomeatal.
O recesso do seio frontal não deve ser violado em casos de polipose nasal difusa em doentes sem sintomatologia frontal (cefaléia), pelo risco de desencadear sinusite frontal crônica como complicação de cirurgia endoscópica.
Quando a sinusite frontal é crônica ou com complicações, ou na remoção de tumores (osteoma) ou na falta do reparo anatômico, a cirurgia deverá ser feita por via externa.
Não usamos mais a trepanação de seio frontal com irrigação em sinusite frontal aguda (ou exacerbação aguda de sinusite frontal crônica que não responda a tratamento clinico), preferindo se fazer a reconstrução do ducto fronto-nasal como elemento de drenagem inicial.
O tratamento da sinusite frontal crônica ou complicada unilateral (por exemplo, mucocele - Figura 18) é feito por fronto-etmoidectomia externa (técnica de Neel-Lake), com reconstrução do ducto fronto-nasal com o retalho mucoso de base septal do agger nasi (Sewall), com excelentes resultados (Figura 19). Quando a patologia é bilateral preferimos a cirurgia externa de drenagem mediana bilateral de Lothrop, com preservação da mucosa do seio frontal e reconstrução dos ductos com retalho de mucoperiósteo do agger nasi com base lateral (McNaught - Figura 20).
Não usamos o retalho osteoplástico e obliteração com gordura de MontGomery, por considerá-los cirurgia bastante radical e não fisiológica.
Em casos de insucesso com as técnicas descritas, ou quando o seio frontal é usado para acesso a patologias de base de crânio, preferimos a cranialização do seio com sua eliminação (Figura 21), usando-se retalho de gáliaperiósteo (Figura 22), separando o compartimento intracraniano das vias aéreas superiores.
Recentemente, foi desenvolvida a cirurgia de Lothrop por via intranasal (Gross e Draf), que aguarda o teste do tempo para sua validação. Estamos desenvolvendo esta cirurgia; porém, usando retalhos mucosos para facilitação técnica e reconstrução do ducto.
Figura 23 - Tomografia computadorizada coronal de sinusite frontal caseosa com drenagem frontal mediana bilateral pela doença.
Figura 24 - Tomografia computadorizada coronal, do paciente da Figura 23, após cirurgia intranasal e drenagem mediana.
Conclusão
A dinâmica na evolução da cirurgia dos seios paranasais faz com que inovações sejam agregadas à cirurgia convencional.
O modelo biológico é o mais difícil de ser compreendido e modificado. Aos conceitos de fisiopatologia sinusal conhecidos desde o começo do século (ventilação e drenagem) somente recentemente adicionamos outros dois (contato mucoso e mucosa reversível).
O progresso tecnológico tem sido realmente assombroso. Quando pensamos nas dificuldades de Lothrop em avaliar os pacientes, o uso de instrumental grosseiro - e comparamos a genialidade de sua contribuição, ficamos estupefatos.
A resolução do bloqueio do meato médio, de preferência assistida por videoendoscopia, é fundamental na resolução de sinusites dos seios anteriores com cirurgia de invasão mínima.
A remoção da porção anterior do corneto médio, além de favorecer a permeabilidade de aeração dos seios anteriores, faz com que o etmóide seja integrado à via respiratória, melhorando a ventilação do paciente (indispensável no nariz caucasiano, alto e estreito).
O problema da polipose difusa não deve ser resolvido por meios cirúrgicos e depende de avanços no tratamento médico, sendo a cirurgia usada como paliativo de melhoria da ventilação. Estes pacientes não têm sua vida ameaçada pela polipose.
O seio frontal é ó único que apresenta risco de vida ao paciente, pela possibilidade de complicação intracraniana. A fronto-etmoidectomia externa - com preservação da mucosa e reconstrução do ducto com retalho mucoso de Sewall, para casos unilaterais, e a drenagem mediana de Lothrop com retalho mucoso bilateral de McNaught - são os padrões dourados na resolução da sinusite frontal aguda recidivada, crônica, ou complicada.
Por serem cirurgias externas, trazem o inconveniente da cicatriz, que na realidade, aliás, é imperceptível na maioria dos pacientes. A -possibilidade de se fazer a drenagem mediana por via intranasal deve aguardar a aprovação do tempo, para ser incluída como cirurgia inovadora (Figuras 23 e 24).
Referências Bibliográficas
1. SKILLERN, R. H. - Accessory Sinus of the Nose. 4th ed., Philadelphia, USA, Lippincoat Co., 1923.
2. MONTGOMERY, W W - Surgery of the Upper Respiratory System. 2nd ed., Philadelphia, USA, Lea & Febinger, 1979, vol. 1, cap. 3-6.
3. MANIGLIA, J. J., MANIGLIA, R. E, OURIQUES, E L. - Base Conceitual Atualizada do Tratamento Cirúrgico das Sinusites. Collectanea Symposium - Série Medicina e Saúde. I Jornada Internacional de Otorrinolaringologia, II Jornada de Fonoaudiologia - Centro de Estudos Otorrinolaringológicos Ricardo Marseillan. 1ª. ed., Ribeirão Preto, São Paulo, Frôntis Editorial, 1998, p. 31-42.
(*) Professor Adjunto do Departamento de Oftalmo-Otorrinolaringologia do Hospital de Clínicas (HC) da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
(**) Acadêmico Interno do Sexto Ano do Curso de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC - PR).
(***) Acadêmico do Terceiro Ano do Curso de Medicina da PUC - PR.
(****) Acadêmico Interno do Sexto Ano do Curso de Medicina da UFPR.
Endereço para correspondência: João J. Maniglia - Rua Bispo Dom José, 2505 - 80440-080 Seminário - Curitiba/ PR. Fax: (041) 244-2877.