ISSN 1806-9312  
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913 - Vol. 11 / Edição 6 / Período: Novembro - Dezembro de 1943
Seção: Associações Científicas Páginas: 537 a 557
ASSOCIAÇÕES CIENTÍFICAS - PARTE 1
Autor(es):
-

SECÇÃO DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA PLÁSTICA DA ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE MEDICINA.

Reunião de 18 de Fevereiro de 1943

Presidida pelo dr. Mário Ottoni de Rezende e secretariado pelos drs. Sílvio Marone e Luis Piza Neto, realizou-se, no dia 18 de fevereiro de 1943, uma reunião ordinária dá Secção de Otorrinolaringologia e Cirurgia Plástica da Associação Paulista de Medicina.

Expediente :

O sr. secretário fez a leitura de uma carta recebida da diretoria da Associação Paulista de Medicina, comunicando que a apresentação de trabalhos só é permitida aos senhores sócios ou
a pessoas especialmente convidadas para isso.

Também foi lido um ofício do dr. José de Paula Assis, comunicando que tomou posse do cargo para o qual foi designado no Hospital ex-Humberto Primo, em substituição ao dr. Homero Cordeiro que exonerou-se a pedido. O sr. presidente congratula-se com o dr. Assis por este fato.

Com a leitura da ata da última reunião verificou-se não ter constado na mesma o relatorio do Snr. Presidente, Dr. Paulo Saes e que é o seguinte:

"Meus caros colegas e amigos.

Com a sessão de hoje, atinge a Secção de Oto-rino-laringologia e Cirurgia Plástica o seu décimo primeiro ano de intenso e útil trabalho em prol do progresso da especialidade em nosso meio.

Termina também o honroso mandato que a vossa extrema generosidade depositou em nossas mãos.

Lancemos, pois, as nossas vistas para o caminho percorrido e façamos um relato do que de mais importante ocorreu neste ano de 1942.

De uma maneira geral, podemos afirmar, embora reconheçamos não nos caber mérito algum nisto, que a nossa presidência procurou não desmerecer o brilho dos mandatos anteriores e isto nós devemos á cooperação generosa e à colaboração profícua e bondosa de numerosos colegas.

A produção científica espontânea em nosso meio ainda é relativamente escassa, mas basta um apelo amigo, um estímulo animador ou mesmo uma insistência um tanto importuna e vemos surgir trabalhos de interesse, que ficariam amarelando nos arquivos por falta desse agente propulsor.

Os nossos agradecimentos, pois, aos colegas que colaboraram para a organização das ordens do dia, com material abundante, passando quasi sempre para a sessão seguinte, por falta de tempo de esgotá-lo.

As discussões sobre os trabalhos, por vezes muito animadas, mantiveram-se num nível científico elevado, dentro da maior cordialidade e com cunho de grande sinceridade.

Freqüência - O nosso apelo para uma assídua freqüência às sessões não foi em vão. Com todos os fatores a perturbá-la, tais como dificuldade de transporte, mau tempo reinante, dias impróprios, tivemos como presença mínima 15 a 20 consócios e pudemos anotar numa sessão a freqüência recorde de 38 especialistas.

Trabalhos - Para 11 sessões ordinárias realizadas (férias em junho), foram apresentados 29 trabalhos.

Destes, alguns foram estudos de grande fôlego, aprofundados, outros notas prévias que traduzem progresso terapêutico, outros, por fim, observações clínicas ou cirúrgicas, com comentários próprios, todos afinal, com o seu interesse a justificar a apresentação.

Não desejando por em relevo determinados trabalhos, que já receberam os justos elogios nas sessões de apresentação, transcrevo os títulos dos mesmos, pela ordem cronológica:

1) Dr..Francisco Hartung - (Conferência) - Meningite pneumocócicas. Operação e sulfamidoterapia. Cura.

2) Dr. Homero Cordeiro, Dr. Dario Pedroso e Dr. Mauro Candido de Sousa - Mastoidite aguda a bacilo, de Perez.

3) Dr. Hugo Ribeiro de Almeida - Considerações sobre a anatomia do musculo do estribo.

4) Dr. Laet Toledo César - Um caso de angioma pulsatil do maxilar superior.

5) Prof. Edmundo Vasconcellos - Divertículos do esôfago. Extirpação total. Cura.

6) Dr. Francisco Prudente de Aquino - As otites e suas correlações com os distúrbios gastro-intestinais da 1. infância.

7) Dr. Mauro Graziani - Orientação moderna na cirurgia dos cistos maxilares.

8) Dr. Antonio Duarte Cardoso - Um novo material de inclusão em cirurgia plástica. (Nota prévia).

9) Dr. Otoniel Galvão - Enfísema subcutâneo por manobra de Valsava.

10) Dr. Otoniel Galvão - Migração de um ascaris através da trompa de Eustáquio e conduto auditivo esterno (casos de consultório).

11) Dr. Rebelo Neto - A via transpalatina na cura da atresia congênita das coanas.

12) Dr. José A. Arruda Botelho - Estenose congênita do laringe.

13) Dr. Frederico Müller - Lupus da pele e lupus da mucosa nasal.

14) Dr. Ângelo Mazza - Método para obtenção do audiogramas pelos diapasões.

15) Dr. Francisco Hartung - Otites em lactentes.

16) Dr. Enio Salerno - Otite média, atrite e abscesso retro-auricular.

17) Dr. Ernesto Moreira - Cirurgia da ozena na criança.

18) Dr. Silvio Marone - Sobre 2 casos de osteo-mielite do seio frontal e do osso malar tratados pelo bacteriófago.

19) Dr. Carlos Gama e J. E. de Rezende Barbosa - Osteo-mielite frontal - Operação de Furstenberg.

20) Dr. Gustavo dos Reis - Um caso de sindrome de Charlin.

21) Dr. Frederico Müller - Sobre um caso fatal de hemorragia por erosão vascular de uma veia do pescoço.

22) Dr. J. E. Paula Assis - Mucocele do seio maxilar.

23) Dr. Luiz Piza Neto - Cirurgia endonasal nas sinusites maxilares.

24) Dr. José Augusto Arruda Botelho - Estenoses cicatriciais do esôfago.

25) Dr. Enio D'Aló Salerno - Osteite do conducto.

26) Dr. Silvio Ognibene - Purpura hemorragica post-amigdalite aguda.

27) Dr. Gustavo dos Reis e Antonio P. Corrêa - Polipos de Killian
(a propósito de 7 casos).

28) Dr. J. E. de Rezende Barbosa - O ouvido interno e os traumatismos cranianos.

29) Dr.. J. E. de Rezende Barbosa - Surdez e hereditariedade.
A todos, os nossos agradecimentos.

Defesa de classe - Embora a secção não tenha ação como orgão de defesa de classe, lançou o seu protesto contra o afastamento do prezado colega Dr. Homero Cordeiro, da chefia do serviço do ex-Hospital Humberto L°, o qual foi encaminhado ao Sindicato Médico. O caso teve solução favorável, com a sua reintegração.

Relações externas - A secção foi representada no II Congresso Latino Americano de Cirurgia Plástica, reunido em Buenos Aires, pelo dr. Rebelo Neto, e na Sociedade de O. R. L. do Rio de Janeiro, em visita de intercambio científico e de amizade, pelo Dr. Francisco Hartung. Ambos desempenharam-se com brilho.

Procuramos trazer às nossas sessões figuras brilhantes, da Otorrinolaringologia nacional, pois que estrangeiros não se tornavam prováveis pelo conflito mundial. Obtivemos promessa favorável dos Profs. João Marinho e Renato Machado, que infelizmente não puderam realizar as suas palestras.

O Dr. Aristides Monteiro, presidente da Sociedade de O. R. L. do Rio de Janeiro, que não pode comparecer à última sessão de Dezembro, nos dará o prazer de receber à sua visita nesta sessão de transmissão de diretoria.

Eis os principais fatos, em resumo da nossa gestão, devendo esternar os nossos agradecimentos aos dignos secretários Drs. Antonio P. Corrêa e Mauro Candido de Souza, pela dedicação e solicitude com que deram desempenho aos seus cargos.

Como vedes, si em nossa presidência não houve brilho que outrem vos poderia oferecer, justo é que se reconheça o esforço dispendido para que não desmerecessemos da vossa confiança ao eleger-nos para tão dignificante posto.

Passamos agora a presidência ao Dr. Mauro Ottoni de Rezende, que o consenso unânime dos seus colegas resolveu reconduzir ao posto onde há doze anos atrás soube dar o sopro vivificante desta secção, no início de suas atividades. A sua presença neste cargo significa atividade científica na especialidade, pois pelo seu prestígio, pelo seu dinamismo contagiante, dará certamente um impulso progressista aos nossos trabalhos, que terão de sua parte o seu comentário justo e experiente.

Tendo como auxiliares dois colegas brilhantes, como Silvio Marone e Luiz Piza Neto, será o Dr. Mario Ottoni o timoneiro seguro, que digno de toda a confiança de seus pares, conduzirá a nossa secção aos seus melhores destinos, elevando-lhe cada vez mais o prestígio e o valor científico que felizmente goza. São esses os nossos ardentes votos".


ORDEM DO DIA:
ODONTOLOGIA DE GUERRA. - PAPEL DO DENTISTA
MILITAR - Dr. Maria Graziani

Discorrendo sobre a importância da odontologia de guerra, nos tempos atuais, o dr. Mário Graziani traça de início um paralelo entre a organização dos serviços de odontologia na guerra passada e na atual conflagração. Os exércitos modernos dispõem de eficientes serviços odontológicos; entretanto, a criação desses serviços é antiga, já em 1617 Woodal, na Inglaterra, chamava a atenção para a alarmante proporção de enfermidades buco-dentárias no exército inglês, a qual clamava por uma urgente assistência odontológica. Em 1676, já se escrevia sobre os métodos odontológicos no tratamento dos ferimentos de guerra da mandíbula. Em 1816, publicavam-se trabalhos sobre os ferimentos buco-máxilo-faciais no decorrer da batalha de Waterloo. - Ainda na Inglaterra, em 1821, fundava-se o primeiro serviço odontológico militar, e, em 1860, estabelecia-se um curso de cirurgia bucal no programa da Escola Médica do Exército. Entretanto, frisa o conferencista, em todos os países, somente a trágica necessidade e a experiência, fruto da guerra de 1914, fez com que se desse muito maior importância à odontologia militar. Assim é que, em 1914, já se publicava, na Alemanha, o importante tratado de Schroeder e Willinger, sobre os serviços odontológicos nos campos de batalha.

O corpo expedicionário dos Estados Unidos, quando enviado para lutar em solo francês, na última grande guerra, contava com um cirurgião dentista para cada 500 homens. Desde então, esse país tem estado na vanguarda no setor odonto-militar. No início da guerra atual, somente o Corpo Odontológico da Reserva, do exército dos Estados Unidos, contava com 5.000 dentistas, número este que tem aumentado, à medida que as necessidades das tropas aumentam.

Diz o conferencista ter ouvido e lido muitas vezes que quem venceu a primeira Grande Guerra foi o Serviço de Saúde do Exército francês, com suas gigantescas atribuições de recuperar os soldados feridos e devolvê-los para a linha de frente. Pois bem; foi esse mesmo serviço de saúde o primeiro a possuir um serviço de odonto-estomatologia bem organizado. E o que foi a contribuição dos dentistas militares para o êxito das suas atividades contam-nos muito bem os jornais e as revistas médicas e odontológicas da época.

A guerra era de trincheiras, dentro das quais viviam milhares de soldados, nas mais deficientes condições higiênicas. Conseqüência lógica desse gênero de vida foi a falta de higiêne bucal, acompanhada por sua vez de suas conseqüências: instalava-se toda classe de enfermidades buco-dentárias. Esses fatos tornaram-se alarmantes diante do grande número de baixas nas fileiras E em 1915, uma grande epidemia de estomatite de Vincent e de transtornos gastro-intestinais, entre as tropas, obrigou os exércitos aliados a tomarem providências enérgicas, ampliando, cada vez mais, os serviços de estomatologia.

A seguir, fala sobre as modernas organizações dos serviços odontológicos de campanha inclusive da organização brasileira, a qual foi moldada pela do Serviço de Saúde francês. Com efeito, nossas autoridades militares, numa prova evidente de que não descuram da nossa eficiente preparação militar, nem bem declarava o Brasil guerra aos seus agressores, já o Ministério da Guerra, por intermédio do Serviço de Saúde do Exército, organizava numerosos cursos de emergência para dentistas civis, com a finalidade de instruir os cirurgiões dentistas brasileiros nos misteres da cirurgia de guerra, tornando-os aptos para bem cumprir seus deveres para com a pátria, tão pronto seus serviços se tornarem necessários. E, recentemente, o sr. presidente da República assinou um decreto-lei autorizando os profissionais, que concluíram os referidos cursos, a ingressarem no quadro de oficiais do corpo de saúde.

O dr. Graziani, fala, a seguir, sobre o papel do cirurgião dentista nas campanhas terrestres, na marinha e na aeronáutica. Discorre sobre a responsabilidade enorme que pesa sobre os componentes dos serviços de saúde, tanto médicos como dentistas, principalmente numa guerra como a em que estamos empenhados, em que um golpe de envergadura pode ser desfechado a qualquer momento, nos mais imprevistos setores e na retaguarda, no coração mesmo das grandes cidades.

Em todas as guerras, inclusive na de 1914, as granadas e as balas causaram menor número de vítimas do que as enfermidades e as infecções. Mas, em virtude dos extraordinários avanços das ciências médicas, na guerra atual, as doenças têm causado muito menores danos que os ferimentos de guerra, quer entre as tropas, quer entre as populações civis. Nesta segunda guerra mundial, os serviços de saúde necessitam, antes de mais nada, de cirurgiões.

Na primeira guerra mundial, os ferimentos da face e dos maxilares eram os mais numerosos, isso devido às condições particulares da guerra de trincheiras, onde a cabeça é a parte mais exposta. Nesta segunda conflagração não se pode dizer que eles sejam menos numerosos, embora tenha havido uma verdadeira revolução na arte de guerrear.

Passando em revista os modernos agentes vulnerantes, fala o autor sobre as armas de hoje, as quais são muito mais mortíferas. Atualmente não se verifica, praticamente, ferimentos por baionetas, espadas ou lanças, sendo que, em, geral, os ferimentos são produzidos por projéteis de fuzil ou de armas automáticas ou por estilhaços de obuses, de artilharia ou de avião. Faz uma série de interessantes projeções, mostrando exemplos de ferimentos dos maxilares, na guerra atual e na guerra passada, discorrendo sobre os cuidados de emergência que se devem ter para com os referidos ferimentos. Todos os métodos modernos para tratamento desses ferimentos são expostos, demonstrando o conferencista grande conhecimento da matéria. Também a prótese restaurado buço-máxilofacial é objeto de brilhante exposição, tendo o conferencista projetado numerosos casos de perda de substância da face e dos maxilares, restaurados por meios protéticos.

Logo que se iniciaram os bombardeios aéreos de Londres, na famosa batalha da Inglaterra, verificou-se a falta de postos dotados de recursos odontológicos, onde os feridos pudessem receber os necessários cuidados de emergência. Mas quando, no começo de 1940, os jornais de Nova York noticiavam essa falta e transmitiam um apelo de Sir Harold Gillies, o grande cirurgião plástico que chefia, na capital inglesa, os serviços de socorros de emergência, os dentistas americanos prontamente atenderam a esse apelo. Sir Harold Gillies necessitava de ambulâncias odontológicas, equipadas para prestar socorros urgentes durante os bombardeios. Fundou-se nos Estados Unidos um comitê, constituído por associações odontológicas de todos os recantos do país, obtendo-se em pouco tempo, os fundos necessários. E em maio de 1940, embarcava para a Inglaterra a primeira ambulância odontológica, equipada com completo arsenal odontológico de urgência, com todo o necessário para atender aos ferimentos máxilofaciais, principalmente os casos de fraturas, tais como aparelhos de imobilização e contenção, e instrumental cirúrgico e protético para essas intervenções.

Após nova série de projeções, finaliza sua conferência, concitando todos os profissionais especializados a estudar com afinco, para que, na hora em que os primeiros brasileiros tombarem nos campos de batalha, estejam aptos para bem cumprir sua nobilitante missão.

COMENTÁRIOS:

Dr. Rebelo Neto: Tenho só que louvar a palestra que o dr. Graziani acaba de fazer, onde demonstrou possuir grandes conhecimentos do assunto. Devo dizer que apreciei principalmente a parte final, em que ele relatou como Gillies conseguiu na Inglaterra, a colaboração eficiente dos cirurgiões dentistas. Mas, quer me parecer que, no nosso meio, o cirurgião dentista, mesmo muito culto, não se encontra na altura de dar tratamento eficiente a casos de ferimentos faciais, nem de tão amplos misteres. Creio que a ação do cirurgião dentista, em tempo de guerra, já é bastante considerável e mesmo que ele não se afaste da sua esfera, já terá muito a fazer, não tendo tempo para se dedicar a outros assuntos.

Dr. Mário Otoni Rezende: Não havendo mais quem queira se manifestar sobre a magnífica palestra que acabamos de ouvir, quero dizer alguma causa sobre o meu modo de compreender o assunto. 0 dr. Graziani demonstrou possuir magníficos conhecimentos médico-cirúrgicos da zona buco-máxilo-facial, e o seu trabalho foi muito bem recebido, não só no meio dos cirurgiões dentistas como também entre os médicos que se dedicam à cirurgia da boca.

No presente trabalho, ficou demonstrada, claramente, a necessidade de uma maior cooperação que deve o odontologista dar aos serviços especializados das lesões de guerra da boca e vizinhanças. A parte de prótese, propriamente dita, deve estar ligada à habilidade do cirurgião dentista, que com ela lida facilmente, sem chegar entretanto à execução de operações de maior vulto como as que se referem por exemplo às lesões traumáticas dos tecidos moles da face em extensão. Com esta orientação o dentista estará dentro de seu campo, auxiliando grandemente o especialista da cirurgia facial.

Já tive ocasião de dizer anteriormente ao dr. Graziani que discordava também coxa ele no mesmo ponto de vista aventado pelo dr. Rebelo Neto. Concordo que para a maioria dos cirurgiões dentistas em nosso meio, muito embora o ensino odontológico tenha sido muito aperfeiçoado nos últimos tempos, é muito difícil a execução da cirurgia facial mais especializada, e creio mesmo que poucos são os especialistas que conseguem fazer o que o dr. Graziani faz. Portanto, ficando o dentista dentro de sua especialidade, trabalhando em cooperação com o cirurgião plástico ou geral, creio que será o ideal.

O dr. Graziani demonstrou, em sua palestra, conhecimentos absolutamente modernos a respeito de cirurgia de guerra, particularmente no que se refere à cirurgia facial. Expor claramente os cuidados com que os cirurgiões devem lidar com os ferimentos faciais, sobretudo com as partes moles, onde qualquer retalho, por pequeno que seja, desde que esteja em boas condições, deve ser poupado, pois são da maior importância plástica. Assim, espero que os ensinamentos, hoje ministrados pelo dr. Graziani, sejam bem aproveitados pelos srs. especialistas, que devem estar preparados para uma condição de emergência no momento atual.

Dr. Mário Graziani: Eu agradeço, sinceramente, as honrosas referências e os comentários que acabo de ouvir. Entretanto, quero crer, houve uma falta de compreensão por parte do dr. Rebelo Neto e do sr. presidente em certo ponto de minha palestra. Eu me referi a "dentistas especializados". A cirurgia geral não é praticada pelos médicos em geral, mas pelos médicos cirurgiões. O mesmo acontece na odontologia: a cirurgia é praticada pelos profissionais nela especializados. É essa aliás, a orientação do Ministério da Guerra que está atualmente preparando um certo número de dentistas, familiarizando-os com a cirurgia buco-máxilo-facial de guerra, em numerosos cursos de emergência.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES EM TORNO DAS SINUSI
TES NAS CRIANÇAS (*) - Dr. Jorge Fairbanks Barbosa

O A. inicia por chamar a atenção dos colegas para a importância do assunto de que se ocupa. Faz ver que, embora muito freqüentes, as sinusites nas crianças não tem merecido, devidamente,
a atenção dos especialistas. Expõe o desenvolvimento dos seios para-nasais, durante os primeiros anos de vida. Estuda alguns
aspectos anatômicos e fisiológicos, procurando, daí deduzir noções de importância na compreensão da sintomatologia e orientação do tratamento. Estuda a ocorrência das sinusites infantis, entre 23.000 doentes, examinados no Ambulatório de Otorrinolaringologia da Santa Casa, sob a orientação do dr. Mário Otoni Rezende. Estuda, demoradamente, a sintomatologia, baseando-se em 90 casos, dos quais, 20 foram tratados sob seus cuidados. Em seguida entra no terreno da terapêutica, batendo-se pelo tratamento conservador. A cirurgia só deve ser indicada na impotência do conservativismo. Expõe aos seus colegas a conduta terapêutica que tem seguido e os resultados satisfatórios que obteve. Termina com a apresentação de algumas observações, ilustrando-as com a projeção de chapas radiográficas obtidas antes e depois do tratamento. Agradece finalmente a atenção dos colegas e, em especial, a do sr. presidente, a quem deve seu modesto trabalho não somente pela sugestão do tema, como ainda pelo estímulo com que o levou a estudá-lo.

COMENTÁRIOS:

Dr. Roberto Oliva: Nada tenho a dizer em torno do trabalho do dr. Fairbanks Barbosa, senão que foi brilhante. Nele foram considerados todos os aspectos das sinusites nas crianças e o seu autor chamou a atenção particularmente para o pequeno número de sinusites encontradas em cerca de 20.000 doentes examinados no serviço. É de se presumir, que muitos dos casos não foram diagnosticados, o que é explicado pelo grande número de doentes, acarretando uma sobrecarga de serviço que torna impossível um exame acurado de todos. Há pouco tempo, lendo um trabalho inglês sobre as sinusites em crianças, verifiquei que em hospital de Londres, não especializado, foram autopsiadas no decorrer de um ano, 230 crianças, e destas, 30% apresentavam sinusite supurada.

Quero pedir permissão, para agora expor um ponto que não ficou bem explicado no presente trabalho. Quando o autor se referiu ao fator tosse, encarando-o como um dos sintomas que as crianças apresentam quando acometidas de afecções das vias aéreas superiores; isso foi explicado por meio de uma excitação das paredes da faringe; não é propriamente esta excitação leve da faringe que provoca a tosse, mas sim as secreções dos seios que descem até aos brônquios, dando a bronquite sinusal, que, muitas vezes, passa como uma bronquite crônica ou muitas vezes, de natureza tuberculosa. Entretanto, feito o diagnóstico de sinusite e tratada esta afecção, desaparecem estes sintomas, que são, além de clínicos, também radiológicamente perceptíveis. Pedia assim que o dr. Fairbanks Barbosa reconsiderasse este ponto no seu trabalho, pois assim o mesmo ficaria a meu ver, livre de qualquer crítica.

Dr. Paula Assis: Quero dizer apenas algumas palavras em homenagem ao dr. Fairbanks Barbosa. Acho que deveríamos dar muito mais valor do que se faz atualmente aos sintomas de sinusites nas crianças, pois isto tem um verdadeiro caráter social, uma vez que é possível estar a etiologia da ozena ligada a esta sinusite infantil; assim sendo, com estes cuidados se poderia prevenir um grande número de casos de rinite atrófica fetida. Devemos também dar mais importância à rinorréia infantil, sobretudo quando ela persiste, apesar da extirpação das amígdalas e adenóides.

Dr. Francisco Prudente de Aquino: Quero apenas alguns minutos de atenção, para agradecer ao dr. Fairbanks o muito que aprendemos com a sua verdadeira aula de hoje. Quero também sugerir para que ele leve o seu trabalho ao conhecimento dos pediatras, pois estou de acordo em que o número de sinusites encontradas em crianças é, entre nós, muito pequena em comparação com o que se vem observando outros meios, e isto talvez seja devido ao fato de não se levar em consideração alguns tantos pequenos elementos de diagnóstico. Assim talvez se conseguiria despertar a atenção dos srs. pediatras para certos sintomas muito sugestivos, tais como cefaléias, diarréias por exemplo, rinites crônicas, etc.

Outra questão é a seguinte: o dr. Fairbanks referiu que manda sistematicamente fazer a pesquisa da eosinofilía no muco nasal, para verificar se trata de uma reação alérgica ou não. Mas devemos reconhecer que, entre nós, estes exames não têm sido bem feitos, uma vez que os nossos homens de laboratório retiram o muco nasal com um estilete e o exame assim feito, não merece fé. O muco nasal deve ser obtido pelo assoar do nariz pelo próprio doente. Além disso, o laboratório deve dar o resultado obtido baseado sobre 100 células da série branca examinada, isto é, sobre 100 polinucleares qual a percentagem de neutrofilos e qual a de eosinofilos.

Quanto a questão do tratamento cirúrgico, creio que, principalmente na infância, devemos ser conservadores o mais possível, pois não nos devemos esquecer que a criança, somente na puberdade é que obtêm o seu completo desenvolvimento orgânico. Assim sendo, também o feitio morfológico do rosto só se identifica, só se completa inteiramente na puberdade. Ora, se começarmos a intervir precocemente no rosto das crianças, talvez que elas possam ter o feitio do seu rosto alterado ou não se completar, de uma maneira harmônica, o desenvolvimento das diversas partes do rosto infantil, pois uma intervenção cirúrgica sobre ossos não completamente desenvolvidos, pode acarretar uma parada de desenvolvimento dos mesmos, ou mesmo alterar o ritmo de ossificação dos mesmos.

Dr. Ernesto Moreira: Depois de todos estes comentários ao trabalho do dr. Fairbanks Barbosa, quero apenas deixar o meu comentário sobre a questão das radiografias. Notei que as radiografias apresentadas mostravam uma grande espessura das paredes ósseas em sua grande parte, o que fala muito em favor de uma possível futura atrofia da mucosa nasal. Assim, eu pediria ao dr. Fairbanks que continuasse a observação destas crianças sob este ponto de vista e sobretudo, sob o ponto de vista da função olfativa.

Dr. Ênio D'Aló Salerno: Desejo trazer a contribuição de 775 casos infantis, dos quais 7 apenas eram de sinusite e destes 4 em meninos e 3 em meninas. Nestes casos, foram realizadas 5 punções e creio que este processo é aconselhado, porque, além de ser um meio seguro de diagnóstico, serve também para a via de introdução do líquido de lavagem do seio doente.

Dr. Sílvio Marone: Em relação à parte estatística do dr. Fairbanks Barbosa e do dr. Salerno, seria interessante que se fizesse baseada na quantidade de casos de doentes masculinos e femininos examinados. Assim, tais estatísticas teriam uma base certa e verdadeira.

Em relação à sugestão do dr. Ernesto Moreira, acho-a muito interessante, pois se acompanharmos radiológicamente os casos durante alguns anos, poderemos surpreender um ou outro processo luética latente dos seios que, como se sabe, se traduz por uma osteite condensantes das paredes sinusais, o que, muitas vezes pode permitir confusão com um processo infeccioso banal. No que diz respeito ao tratamento, sugiro o uso dos bacteriófagos, que dá bons resultados, dentro de pouco tempo; mesmo nos casos sem resultados satisfatórios, o bacteriófago confere certo grau de imunidade local e geral.

Dr. Mário Otoni Rezende: Até há pouco tempo atrás, era comum a observação de crianças que apareciam no serviço com "nariz escorrendo", sintoma ao qual ninguém dava grande importância. Hoje, entretanto, vemos que este sintoma não é tão banal quanto parece, sobretudo quando o corrimento nasal muda de aspecto, tornando-se muco-purulento. Freqüentemente as crianças nada sentem a não ser o corrimento nasal, e não devemos esperar pelo sintoma "dor de cabeça" para fazermos o diagnóstico de sinusite, uma vez que este sintoma freqüentemente falta nas crianças, pois ainda não há canais comunicando os seios com o nariz, mas apenas ostios. Modernamente, com o auxílio dos raios X, o diagnóstico de sinusite infantil, começa a ser feito mais intensivamente e por este motivo, as estatísticas modernas são completamente diferentes das estatísticas de alguns anos atrás. Mas o fato é, que a sinusite nas crianças existe e com grande freqüência.

Um outro motivo pelo qual pedi ao dr. Fairbanks para trazer até nós o seu trabalho, é pelo modo brilhante como nele está relatada a questão do tratamento. Até há pouco tempo, era comum a indicação da cirurgia; mas, a cirurgia da face da criança é um problema muito sério pois os seus ossos são ainda diplóico e assim uma infecção que aí se instale, trará quasi que fatalmente, uma osteomielite dos ossos da face que evoluem com muita facilidade, em quadro de muita gravidade. No meu modo de entender, ninguém deve nem mesmo puncionar os seios paranasais das crianças e muito menos praticar neles a cirurgia. Também não há necessidade disso, pois os casos tratados curam-se, perfeitamente, pelo método conservador.

Quanto à questão do banho de luz, não serve para as crianças, pois elas não o suportam, sendo preferível, por isso, o uso das ondas curtas. Além disso, as vacinas devem ser, feitas e sempre que possível com germens das vias aéreas superiores. A vacina é essencial na terapêutica bem orientada. Quanto ao bacteriófago, pode ser usado juntamente com a efedrina que se usa para ás instilações, não havendo nenhum inconveniente nisso.

Dr. Fairbanks Barbosa: Respondendo aos amáveis comentários do dr. Oliva, em torno do nosso trabalho, quero dizer que, para ser breve, passamos por alto sobre certas questões que mereciam maior atenção. Assim, aconteceu com a tosse. Realmente, discutindo a causa deste sintoma, além da irritação da faringe e da laringe, lembramos também a importância do acúmulo das secreções que, dos seios, caminham para as vias aéreas inferiores. O dr. Oliva tem justa razão, quando afirma que muitas bronquites têm o seu ponto de partida em uma afecção sinusal. Aliás em nossas observações, há mesmo um caso de bronquectasía, provavelmente de origem sinusal.

O dr. Paula Assis, lembra a possibilidade das sinusites infantis estarem ligadas à etiologia da ozena. Compartilhamos desta opinião. Temos visto a freqüente associação de sinusites crônicas à atrofias da pituitária, e temos observado que estas atrofias tendem a regredir, após a cura dos seios. Levantamos agora uma hipótese: é sabido que alguns especialistas contra-indicam a amigdalectomia nos pré-ozenosos. Acham que a intervenção agrava a atrofia da pituitária. Não estaríamos atribuindo à intervenção o que se deve a uma sinusite tórpidas? É sabido que amígdalas, hipertrofiadas podem ser conseqüentes à uma afecção sinusal. Extraem-se as tonsilas mas não se eliminam as afecções dos seios. A sinusite continua a preparar o terreno para a futura ozena. Pelo menos em alguns casos, creio que poderemos pensar assim.

O dr. Aquino se refere ao problema da pesquisa de eosinofilos no muco nasal. Expõe brilhantemente a conduta do analista. Nosso trabalho é muito falho, sobretudo no tocante à parte do laboratório. Podemos afirmar, porém, que não nos sentimos culpados disso. Bem que era nosso desejo uma documentação citológica e bacteriológica das secreções retiradas dos seios das crianças que tratamos. Mas, em nosso meio, isso não nos foi possível. Queremos também dizer a V. S. que não procedemos a pesquisas sistemáticas nesse sentido. Apenas nos preocupamos com aqueles casos, em que a etiologia alérgica fora suspeitada.

O dr. Moreira nota nas radiografias que projetamos, uma grande espessura das paredes ósseas e acha que isto fala a favor de uma possível futura atrofia da mucosa nasal. É preciso, contudo, lembrar que os seios das crianças são exíguos e, por conseguinte, suas paredes são espessas.

O dr. Salerno traz a sua contribuição de 7 casos, em que 4 ocorreram em meninos. Daqui não se pode concluir a maior incidência sobre o sexo masculino. Sua casuística é pequena, para tanto . Creio que, se reunir um maior número de casos, virá confirmar a observação de outros estudos, mostrando a incidência maior sobre o sexo feminino. É apologistas da punção. Respeitamos sua opinião, mas somos contrários a ela e, em nossa exposição, justificamos porque.

Ao dr. Marone devo dizer que temos experimentados os bacteriófagos. Não nos queixamos dos resultados. Eles são indicados nos casos em que se suspeita de uma lesão óssea, como freqüentemente ocorre nas sinusites odontogênicas. Nos casos de sinusites hiperplásticas ou polipósas, nada podemos esperar deste agente terapêutico. E, estes casos são freqüentes.

Sr. presidente: Somos grandes entusiastas do tratamento conservador. Entretanto, é preciso reconhecer que ele falha em alguns casos. Nestes, a cirurgia se impõe como uma tábua de salvação. Nunca nos apegamos a ela, sem que tenhamos exaurido todos os recursos conservadores. Tem razão, V. S., quando recusa a intervenção nos 5 ou 6 primeiros anos de vida. Realmente, nos 5 ou 6 primeiros anos de vida, só excepcionalmente as lesões sinusais são irreversíveis e rebeldes ao tratamento conservador. Mais uma vez, nossos agradecimentos a V. S. e ao demais colegas que nos honraram com comentários tão amáveis.

Nada mais havendo a tratar, foi encerrada,,a reunião.

Reunião de 17 de Março de 1943

Presidida pelo dr. Mário Ottoni de Rezende e secretariada pelos drs. Sílvio Marone e Luís Piza Neto, realizou-se, no dia 17 de março de 1943, uma reunião do Secção de Otorrinolaringologia e Cirurgia Plástica da Associação Paulista de Medicina.

Expediente:

Aberta a sessão pelo sr. presidente, pediu a palavra o dr. J. E. Rezende de Barbosa, solicitando que conste em ata um voto de congratulações ao dr. Roberto Oliva, em virtude de sua recente eleição e posse para o cargo de presidente da Sociedade de Medicina e Cirurgia de S. Paulo.

O sr. presidente considerou esta proposta aprovada por unanimidade, tecendo ainda congratulações especiais e em nome da Secção ao dr. Oliva.

A seguir, o sr. presidente apresentou à Casa, o dr. Ricardo Saens, da Universidade de Lima (Peru), que agradeceu a todos as provas de amizade e todas as gentilezas que tem recebido nesta sua estada no Brasil, tecendo ainda alguns interessantes comentários em torno de atividades médicas e científicas que ora estão sendo realizadas no Peru.

O sr. presidente, em nome de Secção, cumprimentou o dr. Saens encarregando-o de ser o portador de um abraço de todos os médicos brasileiros aos colegas peruanos.

Da ordem do dia constou o seguinte trabalho:

O OUVIDO NA AVIAÇÃO - J. E. de Rezende Barbosa

O A. fez um apanhado sobre o comportamento do aparelho vestibular dos aviadores e passageiros de avião, demonstrando a excitação normal e anormal a que o mesmo poderá ser submetido nos diferentes tipos de vôo, o papel do mesmo na manutenção do equilíbrio geral do aviador, principalmente sua função no "sentido do vôo". Tratou, com detalhes, das diferentes ilusões que o aparelho vestibular pode fornecer ao piloto e passageiros, bem como da patogênia, profilaxia e tratamento do "mal do ar". Finalmente fez a apologia do "vôo cego", do vôo dirigido pela aparelhagem de bordo, indicando a necessidade do ensino do vôo cego nos cursos pré-solo.

O trabalho não foi comentado. O sr, presidente agradeceu ao dr. Rezende Barbosa em nome da Secção e, nada mais havendo que tratar, foi encerrada a sessão.



SOCIEDADE DE OTO-RINO-LARINGOLOGIA DO RIO DE JANEIRO

Ata da 48.a sessão ordinaria

Aos 16 dias de Abril de 1943, reuniu-se em sessão ordinária a Sociedade de O.R.L. do Rio de janeiro sob a presidência do Dr. Aristides Monteiro, secretariada por Dr. Benfica de Menezes.

Aberta a sessão pelo Sr. Presidente foi lida a ata da sessão anterior que foi aprovada, não havendo quem pedisse a palavra no expediente passou-se a ordem do dia.

FERIMENTO DA EPIGLOTE - Dr. Álvaro Pontes

Por ocasião da data primeiro marcada para esta sessão, 2 de Abril de 1943, como houvesse falta de número, o A. apresentou o doente motivo de sua comunicação, sendo examinado pelos presentes, inclusive o Sr. Presidente, Dr. Aristides Monteiro; o paciente então tinha boas deglutição, fonação e gustação.

No caso em questão, operado pelo A. no Hospital Miguel Couto, tratava-se de um adulto, vítima de agressão a navalha, com ferimento interessando a pele, músculo cutícula do pescoço, aponeurose superficial, músculos infra-hioideos, membrana tiro-hioidea, e de modo completo e transversal a cartilagem epiglote. Sob anestesia local, o A. procedeu a sutura imediata de todos esses elementos anatômicos, sem drenagem, tendo o doente alta em boas condições ao cabo de 7 dias; ficou apenas saída de pequena serosidade por um ângulo da cicatriz, que cedeu em 12 dias.

O ferimento ainda se estendia para cima, para a região supra-hioidea, e interessava a glândula sub-maxilar esquerda, que também foi suturada. O A. faz considerações sobre os ferimentos do laringe em tempo de paz e em tempo de guerra, com referência a Anatomia patológica, complicações, diagnóstico e tratamento, citando trabalhos nacionais.

COMENTÁRIOS:

O Dr. Aristides Monteiro com a palavra tece considerações em torno da comunicação do Dr. Pontes, cita um caso que observou juntamente com o Dr. Paulo Brandão, no Hospital S. Francisco de Assis e publicado no "O Hospital", julho de 1938; vinha a doente acompanhada pelo marido que nos informa ter ela tentado se suicidar com profunda e externa navalhada no pescoço. O fato ocorrera dias antes, tendo sido socorrida por outro colega que a medicara de urgência. Mais alguns dias como não fechasse a ferida aconselhou-a a procurar um serviço especializado. O exame nos mostrava uma incisão no sentido transversal do pescoço, indo de um externo cleido mastóideo a outro sem comprometê-los. O feixe vásculo nervoso do pescoço não foi atingido por milagre, neste ponto a ferida estava já granulando. Foi uma verdadeira incisão como fazemos para laringectomia, o corte interessou a membrana tireóidea, secionando pois o laringe do ioide. Toda a região se mostrava a olho nu, vendo-se o vestíbulo do laringe e a glote, para baixo; e, olhando-se para cima o ioide e o hipofaringe. Os bordos da ferida estavam afastados cerca de 3 centímetros, deixando ver toda a anatomia da região correspondente. A excitação da doente era grande; internamo-la e fizemos um curativo oclusivo, pretendendo mais tarde operá-la para fechar a ferida do pescoço. Vinte e quatro horas mais tarde, fomos obrigados a dar alta em vista do estado de excitação da doente que nos fez suspeitar de alienação mental; foi internada no Hospício Nacional, onde três dias após jogava-se de uma das janelas, morrendo instantaneamente. O orador elogia a conferência do Dr. Pontes pelos ensinamentos preciosos que nos trouxe, agradecendo em nome da Sociedade a sua presença entre os especialistas da casa.

Dr. Álvaro Pontes: agradece ao Dr. Aristides Monteiro os comentários sobre seu trabalho.


MIXOMA DO MAXILAR SUPERIOR - Dr. Fernando Linhares

(Este trabalho já foi publicado na Revista Brasileira de O.R.L. Vol. XI, n. 4-5, 1943).

COMENTÁRIOS:

Prof. Ermiro Lima: elogia a técnica empregada pelo autor, evitando a tentação das grandes incisões. Diz ainda que modernamente todas as intervenções devem ser dirigidas no sentido de conservar o mais possível a estética da face, sendo contrário às incisões grandes e deformadoras.

Cita dois casos de ressecção do maxilar superior em que teve ótimos resultados levando em consideração este ponto de vista.

Com a palavra Dr. Fernando Linhares que agradece os comentários em torno de sua comunicação.

Dr. Aristides Monteiro passa a presidência da mesa ao Prof. Ermiro Lima para fazer sua comunicação.

MIOCLONIA VÉLO-FARINGO-LARINGEA - Dr. Aristides Monteiro

Estas mioclônias são pouco observadas pelos especialistas e suas publicações ainda mais escassas. Os neurologistas são os que mais se têm ocupado do assunto, por serem conseqüência não raro de doenças nervosas ou tumores encefálicos, sendo verificadas também em casos de encefalite epidêmica.

Atribuísse a SPENCER a descrição do primeiro caso (1886) pelo simples fato de que este autor desconhecia as publicações anteriores, pois não "tivera disso conhecimento antes". Contudo, o verdadeiro mérito de uma descrição príncipe e completa deve-se a KUPPER (1863), treze anos antes de SPENCER ao comunicar um síndrome mioclônico, ritmado de 140 vezes por minuto, interessando o véu do paladar, o laringe, o assoalho da boca, a raiz da língua, e abalos oculares discutíveis, estendendo-se à asa do nariz, com perturbações auditivas que foram a causa do exame. Esta descrição como diz GUILLAIN ultrapassa a de SPENCER, cujo mérito reside exclusivamente em introduzir o termo "nistagmus faríngeo e faríngeo", fonte de tantas confusões. Tal designação teve no espírito de seu criador, uma intenção manifesta em procurar esclarecer de qualquer maneira o problema da etiologia do nistagmo ocular. Antes mesmo de KUPPER, registraram-se duas citações de POLITZER (1862) e BRECK, (1865) sem maiores esclarecimentos. Até hoje mais de sessenta casos tem sido publicados.

J. P., pardo de cinqüenta anos procurou a clínica O. R. L. do Hospital S. Francisco de Assis, a cargo do Dr. Paulo Brandão, em julho do ano passado, queixando-se de perturbações da palavra. Revela que seis meses antes tivera um pequeno ictus, cefaléia intensa, perda de conhecimento, vômitos, ligeira hemiplegia direita que desaparecera em um mês. Daí para cá sentia dificuldade em falar. Alcoólatra, com passado venéreo. Ao exame da garganta, notava-se um síndrome mioclônico lateral direito, individualizado por mioclônias interessando vários territórios. No véu do paladar verifica-se o fenômeno em toda a metade direita do mesmo, sob a forma de mioclônias rápidas, de preferência sob o bordo livre e úvula, que nem sempre participa desses movimentos crônicos. Quando se manda o doente dizer a letra E, os movimentos moderam-se e a palavra fica perturbada.

Ao nível dos pilares posteriores é onde se verificam mais nitidamente os movimentos contrateis, sincrônicos com os do véu; o pilar anterior não participa desta perturbação. Mais de uma vez, com um estilete tocamo-lo para ver se desencadeávamos algum reflexo e começassem as contrações, mas nada conseguimos; um ou outro movimento verificado neste pilar era levado à conta dos de vizinhança. A língua era sede de uma hemiparalisia do mesmo lado das mioclônias.

Os cordões laterais do faringe participavam também dos movimentos dos pilares posteriores. Na musculatura da parede posterior do faringe, correspondente ao lado lesado, notava-se uma ou outra contratura. Esta era regular e uniforme para todo o território muscular que descrevemos, vendo-se com nitidez contrações sincrônicas da corda vocal direita, passando da posição de abdução extrema para a intermediária. O diafragma e os globos oculares estavam livres das contrações. O fundo de olho nada mostrou de anormal, ausência do sinal. de Argyll-Robertson. O ritmo dos movimentos era de 130 por minuto.

Os reflexos no território da garganta são bem conservados, não existindo nenhuma perturbação sensitiva ao nível da gustação.

O exame de audição é normal e o vestibular nada acusa.

No domínio dos nervos cranianos nada se verifica, no facial inferior-se; às vezes, ligeira contratura que se pode levar à conta, de ",tic" nervoso. Marcha normal. O exame neurológico nada revelou digno de nota, segundo observação do nosso prestimoso colega Dr. Frederico Mac Dowell. O psiquismo intacto. A ausculta os aparelhos respiratório e cardíaco estavam normais. Tensão arterial 18 mx. 10 m.m. O exame clínico do aparelho vascular sanguíneo revelou sinais evidentes de arteriosclerose. Wassermann positivo, três cruzes.

As mioclônias podem afetar diferentes territórios musculares e apresentarem as mais variadas formas e combinações musculares. Ora são unilaterais, ora são simétricas, ora afetam tão somente a musculatura do véu do paladar, ora a faríngea, desde os constritores até a musculatura do orifício tubário ; localiza-se outras vezes a mioclônia no laringe, tocando só a aritnóide, ou estendendo-se até a corda vocal que em muitos casos é a única interessada pelo processo mioclônico. O diafragma também em alguns casos participa desse comprometimento.

O globo ocular escravo de sua musculatura não raro é também acometido; nesses casos as oscilações rotatórias não apresentam caracteres especiais que permitem distinguí-las das do nistagmo puro. Esta distinção só é perfeita quando se examina o labirinto com as provas de Barany. Contudo no nistagmo as duas componentes são desiguais, uma lenta e outra rápida, e nas mioclonias; em alguns casos, elas são lentas, podendo-se compará-las com o chamado nistagmo de pêndulo dos otologistas.

Parece que o território muscular onde se instalam estas mioclônias servem para um possível diagnóstico diferencial com outras.mioclônias que aparecem em outras afecções do sistema nervoso, como seja as do síndrome de KOJEVNIKOW, as do síndrome de UNVERRICHT-LUNDBORG, e sobretudo as que se encontram na encefalite epidêmica (GUILLAIN). Estas mioclônias. respeitam em geral o território vélo-faringo-laringea, tendo no máximo de comum os músculos da face, localizando-se de preferência nos membros e no tronco.

O ritmo das mioclônias também constituem um dos característicos do síndrome, valendo _ por um sintoma característico. Os autores mencionam vários números, desde 40 até 200 por minuto. Elas são em geral constantes no ritmo e segundo GUILLAIN este fato decorre, porque nenhum fator conhecido é atualmente suscetível modifícá-lo salvo a contração muscular, e esta ainda parcialmente. O mesmo autor viu o desaparecimento completo das mioclônias durante toda a contração muscular. Ao nosso doente mandamos repetir a letra prolongada "E" para o véu do paladar contrair-se e de fato nessa posição não se notavam os abalos característicos.

Estas contrações musculares podem ser discordantes quando se examina o seu território. Assim as do véu do paladar nem sempre são sincrônicas com as do faringe, da língua e mesmo do laringe.

Todos os fatores fisiológicos como a respiração, o pulso, a alimentação, não influem, no ritmo das mioclônias, ficando pois somente a contração muscular atuando sobre elas. O próprio sono não parece interrompê-las. Nem se conhece agente terapêutico nenhum que impeça, estas contraturas; baseado no fato que PIERRE-MARIE tinha observado que a cicutina em doses progressivas parecia atenuar as mioclônias esqueléticas, empregou-se este medicamento no síndrome que estudamos com algum resultado.

O sincronismo das mioclônias, sua significação e interesse patognomônico, foi evidenciado por FOIX e sua escola. Eles negam que exista uma excitação nuclear que exigiria um entendimento ideal de lesões parcelares irritativas, julgando os a.a. que antes a lesão se localiza na região supranuclear.

O problema etiológico é baseado no fato de se ter observado esses síndromes, principalmente nas pessoas de certa idade e geralmente portadoras de processos vasculares sanguíneos. Não se tem observado grande lesões na substância nervosa, ao contrário, são pequenos focos de hemorragia os responsáveis por estas mioclônias, pois não raro se têm verificado grandes destruições dos centros locais, que se acredita serem os responsáveis pelo síndrome e no entretanto ele não estava presente nesses casos. Os tumores do cerebelo, os aneurismas da artéria vertebral e a encefalite epidêmica, têm sido incriminados como causa eficiente destas mioclonias.

Tanto quanto se pode deduzir do pequeno número de observações verificadas é que em quase todas elas a arterioesclerose tem uma ação marcante na etiologia do fenômeno. O nosso doente não escapou à regra.

De todos os problemas que encerram o estudo das mioclônias nenhum de maior interesse que o da localização e sede da lesão. As poucas autopsias que se fizeram, trazem uma certa uniformidade na sede lesão, porém sem contudo serem muito convincentes.

Segundo GUILLAIN, é impossível corresponder um sinal neurológico, qualquer à mioclônia, apesar de que FOIX e sua escola (GALLET)), mostraram a freqüência relativa dos sintomas associados indicando uma lesão do tronco cerebral (hemiplegia alterna, paralisia funcional do olhar).

Do ponto de vista clínico nada se pode concluir, apesar de algumas observações serem tanto quanto possível completas. O que poderia explicar o síndrome mioclônico quanto à sede da lesão eram as autopsias, essas, infelizmente são poucas e apesar de terem todas uma relativa uniformidade de lesões observadas, ainda é cedo para se aceitar uma localização definitiva.

FOIX e sua escola verificaram uma lesão de foco, correspondendo a calota protuberâncial. A lesão afeta caracteres constantes. Em quatro casos que eles seguiram até à autopsia, verificaram lesões que atingiam o feixe central da calota e a substância reticulada: Um desses elementos diz FOIX é que deve ser incriminado como responsável pela lesão. Esta é restrita e as lesões são absolutamente constantes. Alegam os a.a. franceses que a lesão pode atingir o feixe longitudinal posterior, porém de maneira inconstante, devendo ser responsável pelas perturbações oculares e em particular pelo nistagmo ocular observado em certos casos. Os núcleos dos nervos bulbares estavam intactos e o citado feixe não está em causa nas mioclônias velo-faringo-laringea.

Tais são as conclusões a que chegou FOIX e seus discípulos, como resultado de pesquisas realizadas em quatro doentes que seguiram e autopsiaram depois.

Na mesma ocasião (1926) VAN BOGAERT descreve outra observação anatômica semelhante à de FOIX "lesão maciça do feixe central da calota e da substância reticulada adjacente, cujas degenerescências secundárias traduzem toda a importância. O feixe longitudinal não está indene, os feixes mais externos estão destruídos pelo amolecimento. Dois anos mais tarde o mesmo autor verificou ausência de degenerescência secundária e de lesão focal no feixe central da calota, com seus núcleos indenes. Notaram ao contrário atrofia hipertrófica total da oliva bulbar esquerda, e para-olivas com degenerescência dos entrelaçamentos densos (feutragg) peri e centro-olivares. No núcleo dentado do cerebelo o mesmo amolecimento endo e extracelular. O pedúnculo cerebelar superior direito atrofiado, bem como a comissura de Wernenckinck e o núcleo vermelho.

Na maioria dos casos autopsiados mostraram estes autores que a lesão da oliva bulbar era constante (FOIX) ; no núcleo dentado (KLEIN, FOIX, CHAVANY e HILLEMAND) ; acharam enfim lesões da oliva e do núcleo dentado em muitas observações descritas de epilepsia-mioclônica, daí formularem as seguintes conclusões: "A mioclônia como o tremor, não seriam senão uma forma anormal de descarga motora devida a uma libertação funcional ou anatômica dos próprios centros motores vis-à-vis dum sistema supranuclear. O tremor, por lesão do pedúnculo cerebelar superior, tão bem caracterizado por FOIX e sua escola, é um exemplo de descargas motoras anormais por lesão dum dos elos do sistema cerebeloso. Pensamos que as mioclônias rítmicas observadas nas lesões da calota tem um mecanismo análogo e que podem ser desencadeadas por lesões que destruam as formações anatômicas situadas a alturas diferentes (pedúnculo cerebelar superior, substância reticulada da calota, feixe central da calota). Todas estas formações entram num vasto sistema funcional, do qual as olivas bulbares e os núcleos dentados representam os dois extremos (sinapses) essenciais".

A sede lesão no nosso caso é mais fácil de compreender, porquanto sendo o glossofaríngeo responsável pelos movimentos da língua e estando esta conforme verificamos paralisada em sua metade direita, sabendo que este nervo atravessa a oliva bulbar, nada mais simples que conceber a sede da lesão neste território nervoso, ainda mais que, conforme verificamos, a maioria das necropsias acusam esta região sempre atingida.

GRILL e LAUREN autopsiaram um homem de 60 anos, que em conseqüência de uma arterioesclerose cerebral, sofria há dez meses de mioclônias do musculatura da deglutição e do laringe. Morte por apoplexia. A autopsia mostrou numerosos focos de amolecimento antigos e novos no cérebro. Nos núcleos optoestriados, "status lacunaris", principalmente no putamen. Pequenos focos hemorrágicos e de amolecimento na substância medular do hemisfério cerebelar direito. Por meio destes focos estavam interrompidas as ligações da cortex cerebelar com o núcleo dentado. A oliva mostrava uma degeneração das células nervosas. Os autores suecos pensam que as contrações mioclônicas sejam devidas a um bloqueio da influência reguladora entre a oliva, o cerebelo, o núcleo vermelho, a substância cinzenta da ponte de varollio, através dos quais são perturbados na sua contração normal os respectivos músculos.

Por esta razão, em vista de serem neste território circunscrito à oliva bulbar, núcleo dentado e núcleo vermelho, que se tem verificado anatomicamente as lesões encontradas nos casos de mioclonias vélo-faringo-laringea, é que GUILLAIN propôs, sem pretensão alguma, a título de simples esquema, a figura que acompanha o nosso trabalho, na qual segundo ele, devem-se circunscrever as futuras investigações anátomo-clínicas.

O problema anatômico ainda está em suspenso, as raras observações anatômicas são discordantes, não apresentando nada de definitivo, porque segundo GUILLAIN, em cujos estudos nos inspiramos, o aparecimento do síndrome mioclônico, não é a conseqüência de uma lesão realmente elementar,





B I B L I O G R A F I A

1) GALLET - Le mystagmus du voile. Le syndrome myoclonique de la calote protuberantiale. These de Paris, 1927.

2) GRILL, C. e LAUREN E. - Contribution á 1'étude de la pathogénie des myoclonies laryngo-pharyngées. Zentr. f: Hals. 20.240.1933.

3) GUILLAIN G. e MOLLARET, P. - Deux tas de nyoclonies synchrones et rythméea velo-pharyngo-laryngo-ovulo-diaphrangmatiques. Le problème anatomique et physiopatho logique de ce syndrome. Rev. Neurol. 11.545.1931.

4) GUILLAIN, G. e MOLLARET, P. - Nouvelle contribution a l'étude dez myoclonies velo-pharyngo-laryngo-ovulo-diaphragmatiques. Rev. Neurol. II. 249. 1932.

5) VAN BOGAERT e BERTRAND. I. - Sur les myoclonies associées synchrones et rytbmiques par lésion eu foyers du tronc cérébral. Rev. Neurol. 1.203.1928.

6) VON BOGAERT e HELS'MOORTEL J. - Un tas de myoclonies fatio-palatopharyngo-
laringées au cours dun syndrome Millard-Gruber-Foville. Ann. Malad. Oreilles. 1.39.1926.

Nada mais havendo a tratar foi encerrada a sessão.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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