Considerações Estatísticas
Idade. - MOURE acha que existe a ozena congênita. MAHÚ, examinando uma grande quantidade de lactentes, jamais encontrou ozenosos, mesmo que a mãe fosse atingida por essa afecção. Conclue então que não há ozena nos primeiros meses da vida. Certos autores consideram a ozena excepcional antes dos seis anos.
Em 64.778 doentes examinados, no ambulatório da Santa Casa de São Paulo encontramos 29 ozenosos, sendo 11 masculinos e 18 femininos, entre 1 e 5 anos, e 179 entre 6 e 10 anos, sendo 58 masculinos e 121 femininos, ó que confirma a asserção dos autores. E' tambem assinalada a raridade nos recem nascidos. O caso mais precoce foi observado por MAHÚ em uma menina de 18 meses. Entre nós, Duarte Moreira relata dois casos de ozena em lactentes, um de 11 meses de idade e outro com 13.
Na criança, antes da puberdade, não é tão rara, porém, é entre os 11 e 20 anos que a nossa estatística apresenta maior proporção, tendo sido encontrados 1.292 casos, ou seja uma percentagem de 0,85% para homens e 1,13% para mulheres num total de 64.778.
Seria interessante para o estudo etiológico e patológico examinar sistematicamente todas as crianças das escolas. Poderiam ser descobertas, nesta idade, não os sinais clássicos da rinite atrófica ozenosa, mas uma forma inicial cuja evolução anterior poderia ser seguida. Existirá um sinal revelador do mal ou será ele latente, constituindo um achado de exame? Será a moléstia uma sequela das febres eruptivas? Haverá uma coriza crónica pré-monitória ? A coriza será fétida? A rinoscopia revelará uma atrofia ou hipertrofia preatrófica dos cornetos? PAULO SAES, num dos seus últimos trabalhos sobre difteria nos escolares, observou : "o material retirado de doentes de rinite atrófica fétida, revela sempre a presença de bacilos semelhantes ao diftérico. Inversamente, temos notado que nos casos de difteria nasal, convenientemente tratados, surge algum tempo depois uma rinite atrófica, dando uma relação entre essas duas entidades mórbidas, fato já assinalado há tempos, porem não confirmado". A terapêutica orientada nestes sentido, foi por nós empregada com o uso da anatoxina antidiftérica, cujo resultado foi nulo.
E' na época da puberdade que se observa maior número de ozenosos. Os autores são unânimes sobre este ponto.
Frequência. - A frequência da ozena genuina com todos esses caracteres essenciais, exceção feita de todas as pseudo-ozenas, rinites purulentas com mau cheiro, rinites atróficas sem odor, não é tão grande quanto se poderia crer. A nossa estatística, elaborada apenas em uma parte do serviço hospitalar de S. Paulo, deu-nos informes interessantes. A cifra percentual de 3,80%, num total de 64.778, doentes não representa por certo uma percentagem matemática, pois estearão possivelmente catalogadas no seu conjunto todas as rinites, com ressalva, claro está, dos casos de rinite atrófica luética, comprovada. Hoje, que já dispomos de elementos outros para elucidação diagnóstica, é possivel admitir-se uma redução na percentagem verificada. 0 que é. frequente, é o número de cacosmias mal etiquetadas. Os clínicos muito pouco conhecem esta moléstia, o que dificulta estabelecer uma correlação com as moléstias gerais. Os rinologistas podem estabelecer uma relação numérica entre a rinite atrófica fétida e outras rinopatias. Já contamos com um outro contingente auxiliar - a radiografia que poderá ser uma boa ajuda para o diagnóstico diferencial. Parece-nos, no entanto, como dizem alguns autores, que não tem razão de ser esta questão de idade, sob o ponto de vista end6crino. 0 mais admissivel é que a moléstia já constatada, na infância sob a forma de uma coriza, de uma rinite hipertrófica ou mesmo de uma rinite atrófica não fétida agrava-se com a puberdade, surgindo então o mau cheiro revelador, o que reclama um exame especializado.
Resta tambem saber se a idade e as condições anatômicas tem mais importância do que a condição fisiológica. Em França, a puberdade feminina aparece entre 13 e 16 anos, nos paises frios mais tarde e nos quentes, às vezes, antes dos 10 anos. De um modo geral, o aparecimento da puberdade no homem é mais tardia. A nossa estatística concorda com estes dados, pois encontramos 1.292 ozenosos em 64.778 doentes examinados, sendo 737 mulheres e 555 homens, dando ainda uma percentagem maior para mulheres, de acordo, portanto, com os dados estranjeiros.
Com o evoluir da idade, decresce a percentagem, assim é, que ela vai rareando até aos 50 anos, sendo excepcionalmente observada depois desta idade. A proposito, vem-me à lembrança um caso que se apresentou como raridade a um colega menos experiente. Tratava-se de uma senhora com 54 anos de idade, portadora de R. A. F. Em conversa mais íntima com a paciente e seu esposo, este declarou que há 8 ou 10 anos já havia percebido o mau cheiro. Há que acentuar que o jovem e distinto colega estava certo que se tratava de um caso recente.
A frequência é variavel, segundo os paises e raças. A repartição geográfica da ozena é muito irregular. Há paises inteiros onde a ozena é inteiramente desconhecida (África, Oceania) e outros onde é muito espalhada (Europa, Asia). O Brasil, onde o elemento negro forma três quartas partes de sua população, no dizer dos autores, estranjeiros a ozena deveria ser rara, e no entanto, pelas nossas estatísticas podemos afirmar o contrário. HÖRK em Viena e outros autores, constataram que 20% dos doentes da Policlínica são ozenosos. BELINOFF, de Sofia, observou 9.562 doentes de O. R. L. 1.780 rinites, sendo 220 ozenosas ou seja uma percentagem de 2,3%. TAPTAS, de Stamboul, indica : 6.013 doentes de O: R. L. e 50 ozenosos. A. MENDONÇA, de Lisboa, sobre 30.000 doentes de O. R. L. apenas 100 ozenosos (0,33%).
Duarte Moreira, chegou às seguintes conclusões
1) Em 10.000 doentes da especialidade examinados, encontraram-se 120 casos de ozena, ou seja 1,2%.
2) Os doentes mais atingidos foram os da raça branca, seguindo-se os mestiços e negros, com as percentagens respectivamente de 81,6, 14,2, 4,2.
3) A ozena predominou no sexo feminino, na razão de -2 para 1 (Sexo feminino 67% e sexo masculino 33%).
4) A maior frequência da ozena se verificou na puberdade, entre onze e quinze anos. Em relação a essas estatísticas, a nossa apresenta uma proporção de 3,80% pois dos 64.778 doentes de O. R. L. encontramos 1.292 casos.
RAÇAS
Dentre os fatores que mais teem concorrido para obscurecer o valor incomparavel das nacionalidades americanas para os estudos da raça, especialmente para os estudos da biologia étnica está a ação exercida por aqueles publicistas e cientistas europeus, que reagiram contra os teorizadores da superioridade das raças germânicas.
Os pregoeiros do pangermanismo haviam criado, com sua doutrina, um sistema de idéias extremamente chocantes do orgulho de vários povos civilizados. Este fato deu motivo a uma reação que se caraterisou, como era de esperar, pela sustentação da tese oposta : da igualdade de todas as raças. Para demonstrar esta tese equalitarista, estes doutrinadores reacionários se preocuparam em acentuar a nenhuma importância dos estudos das raças. Como todas as raças eram iguais, que valeria estarmos a perder tempo com as pesquisas sobre biologia diferencial das raças ? Estas preocupações equalitaristas, e, a massa de dados aparentemente corroborativos das alegações dogmáticas, reforçadas pelas incertezas, contradições e exageros dos teoristas da superioridade, lançaram uma confusão indescritivel sobre a compreensão dos problemas raciais.
Tamanha foi a obscuridade que em torno deles se fez, que ainda hoje ninguem consegue ver com clareza nenhum dos problemas a eles relativos. Constitui-se como que um estado de ceticismo generalizado, sob a ação do qual os fatos de diferenciação racial mais patentes eram postos em dúvida, formando-se em torno deles um ambiente de displicência e desinteresse.
Estas dúvidas, estas incertezas, só são plenamente justificaveis entre os povos europeus. Compreende-se perfeitamente que seja impossivel a esses povos discernir o papel que cada uma das suas raças formadoras desempenhou na elaboração e na evolução de sua história. Tão remota é a época em que estas raças começaram a se caldear aí, que é realmente um problema insoluvel a discriminação da função exercida por elas nos destinos desses diversos povos.
Desde o neolítico, talvez mesmo desde o paleolítico superior ou ainda desde o mezopaleolítico, os pesquisadores da prehistória encontram seguros documentos, provas em suma, de que essas diversas raças, que atualmente a análise étnica reconhece como sendo origem dos elementos formadores das nacionalidades européias,já viviam dentro do mesmo habitat, já se cruzavam, já cooperavam na obra de formação das culturas, e na evolução da história de cada grupo.
E este periodo longínquo deve remontar no mínimo a 30.000 anos. Ora, a nossa situação não é de modo algum comparavel à desses povos : nossa formação foi feita de modo inteiramente diferente. O encontro das diversas raças humanas, vindas da Europa e da África, em terras americanas tem no máximo um horizonte de 400 anos.
O nosso problema étnico começa por não consernir apenas as raças européias no mundo americano ; outros elementos entraram como fatores de formação e elaboração dos grupos humanos. E' o negro com suas várias modalidades de cultura e de tipo, é o índio, tambem, com suas diferenciações de cultura e sua diversidade de tipos, distinguindo-se em grupos retardatários e em grupos de organização superior : desde o azteca e do inca senhores de uma alta civilização, até o tapúia neolítico puro caçador nômade, ainda numa fase rudimentar de civilização.
Não é possivel, pois, sustentar nesses lados do Atlântico onde as desigualdades étnicas revestem-se de relevo tão nítido que os problemas de diferenciação das raças sejam problemas sem interesse. O fato de terem afluido para aqui etnias vindas de todos os continentes, torna a América ao contrário, o centro por excelência dos estudos da Raça, quer no ponto de vista da antropologia física, quer no ponto de vista da antropologia social. As profecias pessimistas sobre o nosso destino, devemo-la a BRYCE, que não só no Brasil como nos Estados Unidos, contemplou unicamente o lado por onde descem as aguas turvas. Não basta ser um bom escritor e um observador de momento para analisar provas e instituições. GOBINEAU no seu célebre livro - A desigualdade das Raças humanas - "assevera a incontestavel supremacia das tribus brancas". Acha que o negro é uma raça essencialmente cruel. Esteve ele no Brasil em 1868, como ministro de Napoleão III. Dos brasileiros só conviveu estreitamente com D. Pedro II. Estabeleceu-se entre eles um estreito comércio de simpatia e amizade. Mas, nem por isso o diplomata francês abriu mão dos preconceitos com que nos olhava ; a sua correspondência particular revela que para ele não passavamos de um paiz de negros. GOBINEAU prega a supremacia dos brancos e contradiz-se a cada passo relatando textualmente que o gênio artístico só apareceu depois da aliança dos brancos com os pretos. Seu pensamento não tem a objetividade e o rigor científico que se requerem nos investigadores de raça. Si BUCKLE e GOBINEAU resuscitassem em 1940, para buscar no Brasil a confirmação de suas profecias pessimistas teriam de estarrecer de espanto. 0 primeiro achava nossa natureza incompativel com a civilização. O segundo assegurava que jamais atingiriamos o coeficiente moral e intelectual da Europa, e, que viriamos a ser uma África sul-americana, da qual teriam desaparecido todos os brancos. O tempo encarregou-se de desmentir duramente os augúrios desses romancistas antropológicos.
Os povos americanos são, pois, tão preciosos para os estudos de biologia da raça, quanto os climas tropicais o são para as pesquisas sobre a febre amarela e a malária. Os germes patogênicos que produzem o empaludismo ou o tifo ictiróide, podem ser observados nos tubos e caldos de cultura dos laboratórios, na França na. Inglaterra e na Alemanha ; mas só nos trópicos, só sob seus climas ardentes é que seu estudo pode ser feito de maneira fecunda. O mesmo acontece com a biologia e a psicologia das raças ; uma e outra podem ser estudadas em centros puramente arianos, em populações puramente arianas ; porém, só na América, só entre as populações heterogênias, onde se caldeiam os tipos antropológicos mais diferentes, onde as raças mais primitivas se misturam com as raças arianas ; só aí é que elas podem ser estudadas em condições étnicas de eficiência investigadora : Até 1890 os nossos meios intelectuais, nossos centros de cultura, os grandes nomes representativos das ciências sociais, como das ciências naturais estavam com efeito deixando-se impressionar pelas provas inegaveis das diferenciações raciais em nosso pais. Para não falar dos sociólogos e historiadores, como Silvio Romero e José Veríssimo, basta recordar o que se passava nos centros de cultura, onde se moviam os especialistas na ciência do Homem : naturalistas como Batista Caetano e Batista Lacerda, ou médicos como Moura Brasil, Êrico Coelho, Jansen Ferreira e principalmente Nina Rodrigues. Este grupo de espíritos, em sua maior parte médicos, estavam então vivamente empenhados em estabelecer a discriminação sob critérios rigorosamente científicos, dos caracteres diferenciais das três raças formadoras da nossa nacionalidade : a negra, a americana e a caucásica. Eles já haviam observado que essas raças, esses "tipos antropológicos" como diríamos hoje, não reagiam de maneira idêntica, aos diversos estímulos vindos do meio social ou do meio cósmico ; cada qual parecia ter uma individualidade própria, uma maneira peculiar, uma forma específica de reação. E' assim que MOURA BRASIL, já havia notado em sua vasta clínica oftalmológica, certa tendência preferencial do tipo negro para o glaucoma, e havia mesmo começado a observar uma certa variação no campo visual entre as tres raças formadoras.
No Brasil a obra de caldeamento e fusão das raças não está ainda hoje inteiramente realizada. No dizer de SILVIO ROMERO todo o brasileiro é mestiço, se não no sangue pelo menos nas idéias.
Na população brasileira atual, podemos distinguir uma grande maioria de mestiços, em grau muito variado de cruzamento e uma minoria de elementos antropológicos puros, não cruzados.
Estes compreendem : a) A raça branca representada pelos brancos crioulos não mesclados e pelos europeus ou de raça latina principalmente portugueses, e hoje italianos em São Paulo, Minas, etc., ou de raça germânica, os teuto-brasilianos do sul da República.
b) A raça negra, representada pelos poucos Africanos ainda existentes no Brasil e pelos negros crioulos não mesclados.
c) A raça vermelha ou indígena representada pelo brasílio guaraní, selvagem que ainda vagueia nas florestas dos grandes estados do oeste e extremo norte, assim como em alguns pontos de outros estados, tais como Baía, São Paulo, Maranhão, etc. e pelos seus descendentes civilizados mais raros e só observados nos pontos vizinhos dos recessos a que se têm refugiado os selvagens.
Por seu turno, os mestiços brasileiros carecem de unidade antropológica e tambem podem ser distribuídos por um número variavel de classes ou grupos. Os mestiços compreendem:
1.º) Os mulatos, produto do cruzamento do branco com o negro, grupo muito numeroso constituindo quasi toda a população de certas regiões do país e divisivel em:
a) Mulatos dos primeiros sangues.
b) Mulatos claros, de retorno à raça branca e que ameaçam absolvê-la de todo.
c) Mulatos escuros, cabras, produto de retorno à raça negra, uns quasi completamente confundidos com os negros crioulos, outros de mais facil distinção ainda.
2.°) Os mamelucos ou caboclos, produto do cruzamento do branco com o índio, muito numerosos em certas regiões, na Amazônia por exemplo. Ainda podemos dividí-los em dois grupos : os que se aproximam e se confundem com a raça branca, e o dos verdadeiros caboclos, mestiços dos primeiros sangues cada vez mais raros.
3.°) Curibocas ou cafusos, produto do cruzamento do índio com o negro, este mestiço é extremamente raro na população das capitais.
4.°) Os pardos, produto do cruzamento das três raças e provenientes principalmente do cruzamento do mulato com o índio, ou com os mamelucos caboclos. O modo porque estes diversos elementos antropológicos se ajustam e se combinam para formar a população brasileira é extremamente variavel nas diversas zonas ou centros de população do país.
Que devia ser assim basta refletir : 1.º) na desigualdade com que nos tempos coloniais a população branca foi distribuida pelo extenso território, em pequenos núcleos afastados e independentes, uns dos outros ; 2.°) em que, tendo com a independência, cessado quasi completamente a imigração portuguesa, ao encetar-se de novo, já agora com italianos e alemães, procurou ela de preferência certas regiões do pais com exclusão de outras ; 3.°) em que foi desigual a distribuição pelo pais, do negro importado com o tráfico, como tambem, de modo desigual foi o índio repelido ou destruido pelos invasores. Assim a principio, os portugueses - raça pura, acharam-se em face do índio - raça vermelha, mas, quando o índio começou a recuar ante a invasão européia, os invasores já não eram só portugueses, mas, brancos e mamelucos. A raça negra que embora dominada e como instrumento da raça branca, invadiu por sua vez o país e ajudou o branco a repelir o índio, achou-se em face do branco, do índio e dos mestiços e cruzou com todos. Mas, evidentemente, se em certos pontos ainda pode cruzar facil e diretamente com o índio, em outros só o poude fazer com os brancos e os mamelucos, porque, de há muito o índio tinha fugido ou desaparecido. Cessou primeiro a imigração portuguesa, os brancos ficaram em minoria em face dos negros importados com o tráfico e dos mestiços que aumentavam pelo contínuo e incessante cruzamento. Cessou por sua vez a imigração africana, toda em favor do mestiçamento, que continuava e continua a crescer. A situação atual é a seguinte : em certos estados, todo ,o litoral do norte, as raças puras ameaçam desaparecer ou se diluir no mestiçamento. O índio extingue-se, os africanos não são mais importados, e a imigração européia não existe.
Como o mestiçamento mediato e imediato continua em larga escala, como por outro lado nada limita ou circunscreve a reprodução das raças puras entre si, a consequência é que num futuro mais ou menos remoto se terão elas diluido de todo no cruzamento mestiço. "Sabe-se que, na mestiçagem, a seleção natural ao cabo de algumas gerações, faz prevalecer o tipo da raça mais numerosa, e entre nós das raças puras a mais numerosa, peia imigração européia, tem sido e tende ainda mais a sê-lo, a branca" afirmou SILVIO ROMERO. Esta opinião de SILVIO ROMERO, funda-se em duas suposições contestaveis, e contrárias de todo ponto de vista a uma observação imparcial dos fatos, diz NINA RODRIGUES. A primeira e da persistência da imigração européia para o norte ; a segunda e da futura extinção da raça negra nesta zona. O clima do norte é inadaptavel ao europeu. Temos pois, que das duas raças puras ainda existentes - e que parecem entregues definitivamente à sua sorte sem poder contar muito com o auxílio de novas imigrações - uma a negra, é perfeitamente adaptavel ; a outra, a branca, é de uma adaptação mais dificil. Ora, como nestas condições a raça que tende a predominar é a mais adaptavel, o receio deve ser que a reversão à raça pura seja em favor da raça negra. E, na melhor hipótese, quando se queira contar em favor da raça branca a sua civilização superior, o mais que se pode esperar é que ela venha a cruzar largamente com o negro, dando os mestiços estaveis em que SILVIO ROMERO Vê a condição de resistência da raça branca aos rigores do nosso clima. Este mestiço será forçosamente o mulato ou quando muito o pardo, com uma dose mínima de sangue indígena.
O viver desses mestiços parece ser folgado e divertido. Porque já o prudente ANTONIL nos diz ser provérbio, na sociedade de seu tempo ; que o "Brasil é inferno dos negros, purgatório dos brancos e paraiso dos mulatos e mulatas". Não há portanto motivo para crer, por outro lado na degeneração das nossas populações. Fisicamente, o conjunto de nosso povo não tem feição menos robusta que a dos japoneses, de franceses do sul, de espanhóes, de portugueses do continente ou dos chineses, que imigraram por exemplo para as Filipinas, e formam a aristocracia da população, tendo o mesmo carater étnico dos chineses. Nos grandes centros europeus, não é raro que o aspeto dos indíviduos impressione pela fraqueza do corpo e pela morbidez das fisionomias, sendo comum, verem-se figuras evidentemente degeneradas. Se, com estas razões se levar mais em conta que os critérios conteporânios de avaliação da saude são ainda empíricos, baseados em conceitos da saude e da moléstia induzidos de observações mui limitadas, no tempo e no espaço ; que a reflexão sobre os fenómenos da história nosológica da nossa espécie e sobre os da hereditariedade mostra que as raças atuais contando séculos de vida em sociedade - nas clássicas civilizações que conhecemos onde a cultura dos espíritos e a elevação da arte floresceram a par do mais completo desmazelo, no que toca a higiene e ao conforto. - devem ter em circulação no sangue, germes de quasi todos os males que assolaram a humanidade não há motivo para duvidar da média da saude do nosso povo e da possivel restauração de suas forças. Quanto aos caracteres psíquicos, as nossas raças são constituidas, em sua natureza individual de seres dotados das melhores tendências humanas. 0 nosso país precisa, de uma vez por todas, formar um espirito e uma diretriz prática, que o conduza, salvando-o do atravancamento das opiniões e das tendências particularistas e sistemáticas, em que está dividido, a organizar e pôr em movimento as suas próprias forças.
Estas considerações um pouco à margem do massiço deste trabalho, são perfeitamente oportunas e justificaveis.
Ainda há, como muito bem pondera ALBERTO TORRES, um acervo de frases feitas sobre nosso povo, que já se tornaram lendárias ; a nós compete rebatê-las como acabamos de fazer, com nossos próprios elementos.
"O grande problema do Brasil, é a organização dos seus valores". Duas grandes questões estão na hora atual, preocupando os antropólogos do mundo inteiro : a aclimatação da raça branca nos climas quentes, e a constituição de tipos étnicos diferenciados pela mestiçagem.
Há de certo muita coisa não satisfatória na vida do Brasil ; porem, atribuir tais condições a composição racial do pais, ou a mestiçagem de raças, é erro crasso
A história do tráfico, no Brasil, é uma longa história cheia de episódios curiosos. Adiantemos agora, para o presente estudo, que o número de negros entrados, com o comércio de escravos, foi elevadíssimo. Pretende-se que em 1798, para uma população total de 3.250.000 habitantes, o número de negros libertos era de 406.000 e o de escravos ascendia a 1.582.000, dos quais 221.000 pardos e 1.361.000 negros, segundo os cálculos do Dr. F. P. Santa Apolônia. Em 1817, segundo estatística de Henry Hill, para uma população total de 3.300.000 almas, contavam-se 80.000 negros livres e 1.000 escravos pretos e pardos.
Na estatística oficial de 1817 - 1818, o número total de habitantes era de 3.817.000 com 585.000 pardos e pretos livres e 1.930.000 escravos, dos quais 202.000 pardos e 1.728.000 negros. Em 1819, o cálculo foi feito para um total de 4.396.132 habitantes : 2.488.743 pessoas livres e 1.107.389 escravos (365).
Esses números se distribuiam em proporções desiguais pelas várias províncias do Brasil, para os campos agrícolas da cana de açucar e do algodão, no nordeste, da cana e do café, no Rio e S. Paulo, os trabalhos da mineração em Minas Gerais, os serviços domésticos e do "ganho" em todos os pontos do Brasil, principalmente nas capitais e cidades costeiras.
Das estatísticas do conselheiro Veloso de Oliveira, podemos destacar o quadro, apresentado por CALÓGERAS, atendendo-se a divisão por províncias (366), onde se verifica que o número de negros escravos atingia ao máximo em Minas Gerais (168.545), seguindo-se Baía (147.263), Rio de Janeiro e Corte (146.000), Maranhão (133.332), Pernambuco (97.633), São Paulo (77.667), Ceará (55.439) e as demais províncias com menos de 50.000 negros escravos.
As percentagens relativas da população escrava eram mais significativas : 66,6% no Maranhão, nas fazendas algodoeiras ; 42,5% em Goiás, na mineração aurífera ; 38,6% em Mato Grosso 38,39% em Alagoas ; as médias nas demais províncias oscilavam entre 20,3% no Piauí a 32,6% em São Paulo ; as percentagens mínimas achavam-se no Rio Grande do Norte, 12,8%, no Paraná, 17,2% e na Paraíba, 17,4%.
Na estatística dos "Escravos matriculados (e libertos arrolados) na forma da lei n.° 3.270, de 28 de setembro de 1885 e Regulamento aprovado pelo Decreto n.° 9.517, de 14 de novembro do mesmo ano" (367), observamos os seguintes números, num total de 723.419 negros escravos e 18.946 libertos : Minas Gerais, 191.952 escravos e 4.121 libertos ; Rio de Janeiro, 162.421 escravos e 9.496 libertos ; São Paulo, 107.329 escravos e 2.553 libertos ; Baía, 76.838 escravos e 1.001 libertos ; Pernambuco, 41.122 escravos e 259 libertos ; Maranhão, 33.446 escravos e 452 libertos ; Sergipe, 16.875 escravos e 204 libertos; Alagoas, 15.269 escravos e 202 libertos ; Pará , 10.535 escravos e 26 libertos ; as demais províncias apresentavam números inferiores a 10.000, sendo o menor número encontrado no Ceará, com apenas 108 escravos.
Do cotejo desses números com o quadro de Santa Apolônia, verifica-se que as zonas onde havia maior número de escravos eram Minas Gerais ; Rio de Janeiro ; São Paulo ; Baía ; Pernambuco Maranhão ; seguindo-se os demais Estados. Podemos considerar como focos principais da escravatura, centros de mercados de escravos, de onde redistribuídos para as regiões circunvizinhas : a) um primeiro foco, compreendendo a Baía, com irradiação a Sergipe, onde os negros escravos foram destinados aos campos da lavoura nas fazendas do recôncavo, aos serviços da mineração na zona diamantina, aos trabalhos domésticos e de "ganho" no litoral ; b) um segundo foco, compreendendo o Rio de Janeiro e São Paulo, onde os escravos foram distribuidos aos trabalhos das fazendas açucareiras e cafeeiras da baixada fluminense, das fazendas paulistas, aos serviços citadinos na Corte ; c) um terceiro foco, compreendendo a zona da mineração em Minas Gerais, de onde irradiaram para os Estados limítrofes (trabalhos de mineração do ouro, em Goiás) ; d) um quarto foco, incluindo as províncias açucareiras do nordeste (Pernambuco, com irradiação a Alagôas e Paraíba) ; um quinto foco, compreendendo Maranhão, com irradiação ao Pará, nos trabalhos da lavoura do algodão, etc.
Destes focos principais, o Negro escravo disseminou-se por todo o Brasil, como o provam as estatísticas referidas. A sua história completa ainda não foi escrita. Compete aos estudiosos de todos os pontos do Brasil fazer esta reivindicação do trabalho escravo em seus Estados respectivos.
Antes da abolição, as pesquisas estatísticas sobre a população negra, no Brasil, puderam ser feitas. Ainda em 1830, um cômputo aproximado revelou uma percentagem de 71,31% de brancos e caboclos e 28,69% de negros. Depois da campanha abolicionista, uma série de preconceitos começou a entravar estas pesquisas. O censo de 1920 esbarrou com estes prejulgados sentimentais e não cogitou das percentagens raciais respectivas. No Negro Year Book de 1931-1932 (368) que é uma publicação destinada ao estudo dos problemas do Negro em todo o mundo, encontro, para o Brasil, a seguinte estimativa : população total, 39.000.000 habitantes ; população negra 11.700.000, com alta percentagem, portanto, de 30%, só estando acima as Antilhas e Bermuda.
Este número e esta percentagem não estão de acordo porém, com as pesquisas indiretas tentadas no Brasil, por vários autores, ROQUETTE PINTO e ARTUR LOBO, entre outros, no sentido de corrigirem as deficiências de nossas estatísticas oficiais. O cálculo do Negro Year Book inclue não só negros puros como mulatos, o que explica a alta percentagem referida. Num exame de 30.000 soldados do exército brasileiro, o Coronel Dr. Artur Lobo (369) encontrou as seguintes percentagens:
Brancos - 59% Mulatos e mestiços - 30% Negros - 10% Caboclos - 1%
As percentagens encontradas em 1922, pelo professor ROQUETTE PINTO (370) depois de longos estudos realizados no Museu Nacional, dão os seguintes resultados
Brancos - 51% Mulatos e mestiços - 22% Caboclos - 11% Negros - 14% Índios - 2%
De acordo com este cálculo, teriamos então, para uma população total de 40.000.000 de habitantes (estimativa para 1930),
5.600.000 negros, no Brasil. Para AFRÂNIO PEIXOTO, as percentagens dos negros na constituição antropológica da nossa população, de 1835 a 1935, teria sido "calculadamente as seguintes : 1835 - 51,4 ; - em 1872 - 16,5 em 1890 - 12,0 - em 1912 - 9,0 em 1935 - 8,0 (como está em outros autores, a percentagem seria a de 8%).
Tivessem os autores da magnifica publicação aparecida em 1933, na Revista Portmann, onde abeberei-me de grande contingente de conhecimentos para a elaboração deste trabalho, tais noções de antropologia pátria, certo estou, de que a frase : "no Brasil a ozena é rara, pois que, três quartas partes de sua população é composta de negros" seria riscada, tecendo-se sobre o assunto outras considerações.
Qual o número de negros em toda a América? Num trabalho recente sobre o assunto, Luiz CINCINATO BELLO distribue a população negra do mundo num total de 125.431.000, entre 105.000.000, para a Africa, e 20.431.000 para a América, estes assim avaliados
Negros dos E.E. U.U. (Censo de 1920) - 10.000.000 Negros do Haiti - 2.000.000 Negros do Brasil (segundo ROQUETTE PINTO 14 por cento da população, que era de 40.000.000, em 1930 - 5.600.000 Negros de Cuba (Censo de 1924) - 831.000 Negros em outros paises da América Central e do Sul - 2.000.000
Para as populações Brasileiras, encontrou o Prof. ROQUETTE PINTO, as seguintes porcentagens: Brancos - 51% Mulatos - 22% Caboclos - 11% Negros - 14% Índios - 2%
Não me furto do desejo de terminar estas ponderações repetindo uma vez mais, a frase tão oportuna do grande sociólogo patricio, ALBERTO TORRES
"O nosso país precisa uma vez por todas, formar um espirito e uma nova diretriz prática, que o conduza, salvando-o do atravancamento das opiniões e das tendências particularistas e sistemáticas, em que está dividido, e organizar e por em movimento as próprias forças".
Sexo - A questão do sexo, é um dos pontos mais curiosos na determinação da rinite atrófica ozenosa. Todos os autores estão de acordo em que há uma predominância importante do sexo feminino. As cifras estatísticas são eloquentes sob este ponto de vista : 70% para a maior parte dos autores, 80% para outros, dando uma relação de 3 mulheres para um homem.
A percentagem encontrada na nossa estatística, foi de 1,3 : 1. Para BRINDEL, esta relação não tem importância. Não concordamos com essa maneira de ver. Pois esta predominância, pode muito bem ser explicada. A mulher cuida mais de seus males, do que o homem, pois a puberdade sendo nela mais precoce, sua "coquetterie" também o é. Daí as clinicas hospitalares serem mais frequentadas por mulheres, explicando-se assim a percentagem verificada nesse sexo. Autores há que afirmam que a puberdade tem uma ação direta sobre a eclosão ou o desenvolvimento desta afecção, donde dar-se-lhe a denominação de moléstia da puberdade.
Profissão. - Os autores divergem quanto a esse fator etiológico. Somos de opinião que nenhuma influência exerce a profissão na origem da moléstia.
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