ISSN 1806-9312  
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798 - Vol. 69 / Edição 6 / Período: Novembro - Dezembro de 2003
Seção: Artigo Original Páginas: 791 a 799
Análise perceptivo-auditiva, acústica computadorizada e laringológica da voz de adultos jovens fumantes e não-fumantes
Autor(es):
Daniele C. de Figueiredo1,
Paula R. F. de Souza2,
Maria Inês R. Gonçalves3,
Noemi G. de Biase4

Palavras-chave: voz, fumo, tabaco, qualidade vocal, freqüência fundamental

Keywords: voice, smoking, tobacco, voice quality, fundamental frequency

Resumo: Objetivo: Realizar a avaliação laringológica, análise perceptivo-auditiva e acústica computadorizada das vozes de adultos jovens fumantes e não-fumantes, sem queixa vocal, compará-las e verificar a incidência de alterações laríngeas. Forma de estudo: Caso-controle. Material e Método: Foram analisadas as vozes de 80 indivíduos com idades compreendidas entre 20 e 40 anos. Estes foram divididos em quatro grupos: 20 homens fumantes, 20 homens não-fumantes, 20 mulheres fumantes e 20 mulheres não-fumantes. Este estudo envolveu laringoscopia, realizada e interpretada por uma médica otorrinolaringologista, e gravação em fita cassete das vogais sustentadas /a/, /µ/, /i/ e /u/, contagem dos números de 1 a 20, emissão dos dias da semana, dos meses do ano e da canção "Parabéns a você". A gravação em fita cassete foi editada para posterior análise espectrográfica e avaliação perceptiva auditiva por quatro avaliadores com experiência na área de voz. Resultados: Após a análise, foi constatada uma discreta diminuição da freqüência fundamental da voz dos indivíduos fumantes de ambos os sexos, bem como maior incidência de rouquidão e de alterações laríngeas entre os tabagistas.

Abstract: Aim: The goal of this study was to make the laryngological, auditory perceptual and acoustic computer analyses of young adults' (smokers and non-smokers) voices, without vocal complaint, compare them and verify the incidence of vocal alterations. Study design: Clinical comparative. Material and Method: The voices of 80 individuals with age range from 20 to 40 years were analyzed. These individuals were divided in four groups: 20 male smokers, 20 male non-smokers, 20 female smokers and 20 female non-smokers. This analysis involved laryngoscopy, which was performed and interpreted by an otolaryngologist, and cassette tape recordings of the sustained vowels /a/, /µ/, /i/ e /u/, number counting from 1 to 20, speech of the days of the week, months of the year and singing of "Happy Birthday". The cassette tape recordings were edited for further spectrographic analysis and auditory perceptual evaluation made by four speech therapists experienced in the major of voice. Results: After the analysis, a slight reduction of the fundamental frequency of the voice of smokers of both sexes was noticed, as well as higher incidence of hoarseness and laryngeal alterations among the smokers.

INTRODUÇÃO

A fonação se dá com a vibração das pregas vocais durante a expiração, o que promove o deslocamento de sua túnica mucosa, e formação de onda de baixo para cima, até que as bordas livres se toquem novamente. Para a boa qualidade vocal e riqueza de harmônicos, é necessária a elasticidade dessa túnica e sua flexibilidade. O movimento muco-ondulatório dessa túnica depende do fluxo de ar transglótico. Em condições normais, o ar desliza pelas paredes da laringe com atrito reduzido, enquanto que, no fumante, essa camada protetora se modifica, aumentando o atrito do ar. Dessa forma, ocorre um turbilhonamento do ar em vez do deslizamento, causando um trauma na túnica mucosa, sendo que as forças que lá atuam deixam de ser uniformes, havendo um conseqüente desarranjo no ciclo vibratório, alterando a qualidade vocal e ocasionando ataques vocais bruscos, sensações de ardor, aperto e pigarro ao falar1.

É sabido que o consumo de tabaco promove inúmeras alterações em todo o organismo humano, mas quais são os danos causados por este especificamente na voz de um indivíduo?

Nos fumantes, durante a fonação à luz estroboscópica, percebe-se a perda do movimento harmônico da túnica mucosa, uma vez que o muco está mais viscoso1. Além disso, a mucosa fica irritada e, portanto, torna-se edemaciada, interferindo na capacidade de vibração das pregas vocais. Antes das lesões estarem devidamente instaladas, já há alterações no muco e, portanto, no movimento muco-ondulatório da túnica mucosa das pregas vocais1.

Em estudo realizado por Sorensen & Horii (1982), foram feitas as gravações das vozes de 80 falantes adultos normais, 40 fumantes e 40 não-fumantes, sendo 20 homens e 20 mulheres em cada grupo, com idade compreendida entre 25 anos e 1 mês a 49 anos e 11 meses. Todos os indivíduos realizaram audiometria tonal para as freqüências de 500, 1000 e 2000 Hz e aqueles cuja acuidade auditiva estava fora dos padrões de normalidade foram excluídos da amostra, uma vez que uma alteração de acuidade auditiva pode afetar as características da freqüência fundamental da voz. Suas vozes foram gravadas em tarefas de leitura, fala espontânea e produção das vogais sustentadas /a/, /i/ e /u/ e em seguida digitalizadas e analisadas em computador. Houve redução de freqüência fundamental nos grupos dos fumantes em relação aos dos não-fumantes, tendo sido essa diferença estatisticamente significante no sexo masculino, mas não no feminino, concluindo-se que o tabagismo provoca uma irritação no epitélio da laringe que pode prejudicar os tecidos laríngeos e, portanto, alterar o sinal de voz ali gerado.

De acordo com Lee et al. (1999), a freqüência fundamental já é levemente reduzida em fumantes passivos, contudo em níveis irrelevantes, apesar de já haver mudanças na camada de cobertura das pregas vocais. Quanto à qualidade vocal, Medina et al. (1990) estudaram 100 mulheres chilenas hospitalizadas de 42 a 51 anos de idade, entre as quais 45 nunca tinham fumado, 36 era fumantes e 19 eram ex-fumantes. Foi realizada a análise perceptivo-auditiva e houve alta incidência de rouquidão entre as fumantes, observando-se maior incidência de voz rouca permanente nas fumantes.

O objetivo do presente estudo foi realizar a análise comparativa da avaliação laringológica, perceptivo-auditiva e acústica computadorizada das vozes de adultos jovens fumantes e não-fumantes, sem queixas vocais.

MATERIAL E MÉTODO

Foram realizadas avaliação otorrinolaringológica e análises perceptivo-auditiva e acústica computadorizada das vozes de 80 indivíduos, sendo 20 homens fumantes, 20 homens não-fumantes, 20 mulheres fumantes e 20 mulheres não-fumantes, com idades compreendidas entre 20 e 40 anos.

Antes de iniciar a pesquisa, esta foi previamente analisada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo/Hospital São Paulo (CEP nº478/01).

Para participar desta, os indivíduos primeiramente deveriam pertencer à faixa etária pré-estabelecida e serem consumidores de tabaco ou nunca terem feito uso do mesmo. Em seguida os selecionados responderam a um questionário, cujo modelo segue em anexo (Anexo), para conhecer, mapear e controlar os hábitos vocais dos mesmos, tendo sido selecionados aqueles que não apresentavam queixas vocais e que não apresentaram outros fatores predisponentes ao desenvolvimento de disfonias, tais como consumo prévio de tabaco (ex-fumantes) e uso profissional da voz (professores, cantores, atores, etc.).

O primeiro procedimento realizado foi o exame otorrinolaringológico, incluindo laringoestroboscopia, realizado e analisado por uma médica otorrinolaringologista experiente. Para este, foi utilizado o método clássico: os indivíduos ficaram sentados com a boca aberta e a língua protraída, envolvida em gaze e mantida em posição por pinça digital. A anestesia tópica foi realizada com a aspersão de xilocaínaR spray e, depois disso, foi introduzido o laringoscópio rígido até que se obtivesse completa visão da laringe. Durante a avaliação, os indivíduos foram orientados a respirar pela boca, sem esforço e, quando solicitado, a emitir a vogal /µ/, de modo sustentado em intensidade e tom, o mais próximo possível da sua emissão habitual.

Nesse momento do estudo, vários indivíduos foram descartados da amostra, ou por não conseguirem realizar o exame, ou por apresentarem lesões organo-funcionais e orgânicas. Nestes casos, foram indicadas avaliações mais completas e terapia de voz.

A laringoestroboscopia dos indivíduos que permaneceram no estudo foi analisada e considerada com aspecto normal ou alterada, de acordo com as observações de presença de edema, hiperemia, espessamento epitelial e alterações de onda mucosa, em uma ou ambas as pregas vocais.

A seguir, os indivíduos selecionados tiveram suas vozes gravadas em cabina acústica, mantendo 15cm de distância entre a boca e o microfone, durante a emissão das vogais sustentadas /a/, /µ/, /i/ e /u/, contagem dos números de 1 a 20, emissão dos dias da semana e meses do ano e da canção "Parabéns a Você" em condições habituais de freqüência e intensidade. Foi utilizado um microfone unidirecional Áudio-technica MB 4000C e as vozes foram gravadas em fitas cassete com gravador profissional Marantz PMD 221. Com base nessa gravação, foram realizadas duas análises: acústica computadorizada e perceptivo-auditiva.

Na análise acústica computadorizada, a gravação da vogal /µ/ de cada indivíduo foi analisada pelo programa SoundScope 2.0, da G.W. Instruments, em computador Pentium. Essa análise forneceu dados detalhados e objetivos da voz de cada um dos indivíduos selecionados: freqüência fundamental (f0); jitter (J); shimmer (S); e proporção harmônico-ruído (PHR).

O último procedimento realizado foi a análise perceptivo-auditiva, realizada por quatro fonoaudiólogas com experiência na área de voz. Para esta análise, a fita original foi editada, sendo que as fonoaudiólogas não tinham conhecimento sobre a identificação dos indivíduos no momento. As vozes foram classificadas quanto a qualidade vocal, pitch e loudness de cada indivíduo, de acordo com o modelo de classificação proposto por Behlau & Pontes (1995).

Os dados obtidos foram comparados estatisticamente entre os subgrupos de fumantes e não-fumantes de cada sexo e entre os grupos de homens e mulheres.





DISCUSSÃO

Após preenchimento do questionário, como já referido anteriormente, os indivíduos foram submetidos à avaliação otorrinolaringológica pela otorrinolaringologista. O resultado desta está exposto nas Tabelas 3, 4, 5 e 6, sempre na quarta coluna, tendo sido consideradas somente as alterações exclusivas de pregas vocais; presença de edema, hiperemia, espessamento epitelial e alterações de onda de mucosa.

No grupo de homens não-fumantes, 50% dos indivíduos (n=10) apresentaram alterações na prega vocal. Acredita-se que mesmo com o desenvolvimento tecnológico associado à experiência da médica otorrinolaringologista que realizou os exames, alguns indivíduos poderiam ter uma alteração estrutural mínima, a qual não foi diagnosticada no momento do estudo, uma vez que foi dado ênfase na pesquisa de alteração do tipo edema, hiperemia, espessamento epitelial e alterações de onda de mucosa. Ainda segundo Gonçalves (1994), 30% das AEM são diagnosticadas apenas no ato cirúrgico.

Segundo Garnett (2001) o tabagismo está intimamente relacionado à afecções laríngeas, podendo causar desde edemas (como o Edema de Reinke), que são processos inflamatórios, até leucoplasia, hiperplasia e câncer, fazendo-se necessária a intervenção precoce, que pode ser cirúrgica e/ou fonoaudiológica, mas que exige o fim do consumo de tabaco. Os indivíduos que apresentavam lesões orgânicas evidentes, decorrentes ou não do tabagismo, foram excluídos do presente estudo, já que nosso objetivo era identificar alterações iniciais, que ainda não caracterizassem doença. Tal fato pode explicar o porquê de não se encontrar diferença estatisticamente significante entre os grupos de fumantes e não fumantes, quanto aos achados de pregas vocais alteradas.

A primeira análise fonoaudiológica propriamente dita realizada no presente estudo foi a análise acústica computadorizada. Esta nos forneceu dados de freqüência fundamental, jitter, shimmer e proporção harmônico-ruído (Tabelas 1 e 2).


Tabela 1. Comparação dos valores de jitter, shimmer, freqüência fundamental e proporção harmônico-ruído entre os grupos de mulheres não-fumantes (MNF) e mulheres fumantes (MF).



Tabela 2. Comparação dos valores de jitter, shimmer, freqüência fundamental e proporção harmônico-ruído entre os grupos de homens não-fumantes (HNF) e homens fumantes (HF).



A freqüência fundamental está ligada à freqüência de vibração das pregas vocais. Nos homens, varia de 80 a 150 Hz; nas mulheres, de 150 a 250 Hz e, nas crianças, está acima de 250Hz4. Ela é determinada pelo tamanho, tensão e massa da cobertura das pregas vocais combinados com a pressão subglótica. A vibração aumenta quando a tensão aumenta e a massa diminui2. Levando-se em consideração que nos fumantes essa massa tende a ser maior, a vibração deveria estar reduzida. Esperávamos, portanto, que houvesse redução na freqüência fundamental dos grupos de fumantes em relação aos grupos de não-fumantes, o que, de fato, ocorreu. No entanto, essa diferença não foi estatisticamente significante, embora, entre os grupos de mulheres, o valor da significância tenha chegado bem próximo disso (p=0,07). No estudo realizado por Sorensen & Horii (1982), a redução da freqüência fundamental foi mais evidente quando comparados fumantes e não-fumantes em idade mais avançada do que a abrangida pelo nosso estudo. Tal fato sinaliza para os efeitos do cigarro, que são mais pronunciados quanto maior o tempo de exposição. Acreditamos, portanto, que se a faixa etária dos voluntários do presente estudo fosse mais elevada e se a quantidade de indivíduos da amostra fosse maior, a redução da freqüência fundamental viria a ser estatisticamente significante.

O jitter indica a variabilidade da freqüência fundamental em curto prazo medida entre ciclos glóticos vizinhos e expressa a diferença quantitativa entre um período e seu antecessor ou sucessor imediato, ignorando as alterações voluntárias da freqüência2. Em indivíduos normais, o valor do jitter é baixo; contudo, na presença de lesões de pregas vocais, há uma maior aperiodicidade, o que se expressa em valores mais elevados. O jitter é expresso em porcentagem e o valor limite de normalidade é de 0,5%. No grupo de mulheres não-fumantes, apenas 5% dos indivíduos (n=1) apresentou jitter acima desse valor; no de mulheres fumantes, todos os valores de jitter estiveram compatíveis com a normalidade; no de homens não-fumantes, 20% (n=4) apresentaram alteração de jitter e, no de homens fumantes, 10 % (n=2). Nota-se que o maior número de alterações dos valores de jitter ocorreu no grupo que apresentou maior quantidade de alterações nas pregas vocais.

O shimmer indica a variabilidade da amplitude da onda sonora em curto prazo e representa as alterações irregulares na amplitude dos ciclos glóticos, de um ciclo a outro3. Assim como o jitter, apresenta valores elevados nos casos de afecção laríngea. O shimmer também está relacionado ao ruído na produção vocal, portanto, tende a ser mais alto nos casos de soprosidade, por exemplo. Seu valor limite para a normalidade é de 3%. No grupo de mulheres não-fumantes somente 5% dos indivíduos (n=1) apresentou valor superior a esse; no de mulheres fumantes, 10% dos indivíduos (n=2) teve a mesma manifestação; no de homens não-fumantes, 15% (n=3) e, no de homens fumantes, 10% (n=2). Mais uma vez, a maior quantidade de alterações ocorreu no grupo cujo número de alterações laríngeas foi maior.

O termo proporção harmônico-ruído (PHR) é tradução para o termo em inglês Harmonic-to-noise ratio (HNR) e relaciona o componente harmônico versus o componente de ruído da onda acústica3. Sua medida é obtida em dB e é menor nos homens e maior nas mulheres, o que se verificou também neste estudo. Houve diferença estatisticamente significante, entretanto, entre os grupos de homens e mulheres não-fumantes, mas não entre os fumantes.

A última análise realizada foi a perceptivo-auditiva, que nos forneceu dados sobre a qualidade vocal (percepção física do tom laríngeo modificado pelas cavidades ressonantais), pitch (sensação psicofísica da freqüência fundamental) e loudness (sensação psicofísica de intensidade da voz) dos indivíduos e cujos dados estão expostos nas Tabelas 3, 4, 5 e 6. Esta é a avaliação clássica da qualidade vocal e, embora subjetiva, é essencial, uma vez que o que leva um paciente à terapia de voz é a percepção auditiva que ele e as outras pessoas têm da sua voz3.


Tabela 3. Resultados da análise perceptivo-auditiva (tipo de voz, pitch e loudness) e da laringoscopia no grupo de mulheres não-fumantes.



Tabela 4. Resultados da análise perceptivo-auditiva (tipo de voz, pitch e loudness) e da laringoscopia no grupo de homens não-fumantes.



Tabela 5. Resultados da análise perceptivo-auditiva (tipo de voz, pitch e loudness) e da laringoscopia no grupo de mulheres fumantes.



Tabela 6. Resultados da análise perceptivo-auditiva (tipo de voz, pitch e loudness) e da laringoscopia no grupo de homens fumantes.



A qualidade vocal de um indivíduo pode ser definida como a percepção da complexidade física do tom laríngeo modificado pelas cavidades ressonantais1 e nos fornece informações desde sobre as características físicas até sobre a formação educacional de um indivíduo3. Uma das características da qualidade vocal é o tipo de voz, definido pelo padrão básico de emissão de um indivíduo e que está relacionado com a seleção de ajustes motores empregados, tanto em nível de pregas vocais quanto em nível de ressonância3.

Segundo Aronson (1990), é muito difícil definir o que é uma voz normal, pois a variedade de voz é ilimitada e os padrões de adequação vocal são amplos. De qualquer maneira, pode-se considerar uma voz normal quando a qualidade for agradável e pitch, loudness e flexibilidade forem adequados. Neste estudo, no grupo de mulheres não-fumantes, 45% dos indivíduos (n=9) tiveram a voz considerada normal; no de mulheres fumantes, esse número diminuiu para 15% (n=3); no de homens não-fumantes, 50% (n=10) e, no de homens fumantes, apenas 15% (n=3). Todos os demais indivíduos tiveram tipos de voz considerados alterados em algum aspecto. As alterações mais freqüentes foram rouquidão, soprosidade e a associação dessas duas categorias.

No grupo de mulheres não-fumantes houve rouquidão pura em apenas 5% dos casos (n=1), soprosidade em 20% (n=4) e ambas as categorias associadas em 30% dos casos (n=6). No grupo de mulheres fumantes, a incidência de rouquidão aumentou para 35% dos casos (n=7), bem como a de rouquidão associada à soprosidade; os casos de soprosidade pura foram menos comuns (15% dos casos - n=3). No grupo de homens não-fumantes, houve 15% de rouquidão (n=3), bem como a soprosidade, que curiosamente, só apareceu em indivíduos de descendência nipônica; a associação de ambas as características esteve presente em 20% dos casos (n=4). No grupo de homens fumantes, houve alta incidência de rouquidão (50% dos casos - n=10), contrastando com a ausência de casos de soprosidade pura; 25% dos indivíduos (n=5) apresentaram voz rouca-soprosa; 5% (n=1), voz rouca-crepitante e, outros 5% (n=1), voz tensa. Houve, portanto, alta incidência de rouquidão em ambos os grupos de tabagistas.

É preciso ter muita cautela com relação aos quadros de rouquidão. Um estudo feito por Lieberman (1963) mostrou que a rouquidão só é percebida com unanimidade entre os ouvintes nos casos de afecção laríngea mais severa e avançada, tais como câncer não inicial. Portanto, faz-se extremamente necessária a avaliação laríngea de qualquer indivíduo que apresente essa manifestação por tempo prolongado.

Se conceituarmos disfonia de acordo com Behlau (2001), como um distúrbio da comunicação oral no qual a voz não consegue cumprir seu papel básico de transmissão da mensagem verbal e emocional de um indivíduo, representando qualquer diferença na emissão vocal que impede a produção natural da voz, então poderemos dizer que, neste estudo, apesar de os indivíduos não terem apresentado queixa vocal, muitos deles apresentaram disfonia de grau leve.

Segundo Garnett (2001) a terapia fonoaudiológica é essencial para eliminar técnicas de fala compensatórias (o que pode estar acontecendo entre os fumantes); entretanto, se o indivíduo não cessa os hábitos tabagistas, muito pouco é o sucesso alcançado. Tais mecanismos compensatórios também foram descritos por Koufman e Blalock (1991) em tabagistas especificamente, que desenvolvem alterações de função glótica, desencadeando disfonias funcionais.

Assim, acreditamos que, para os indivíduos que apresentaram alterações, a terapia fonoaudiológica específica para cada tipo de alteração encontrada nas pregas vocais poderia promover resultados satisfatórios na melhoria da qualidade vocal, desde que a primeira providência a ser tomada fosse o abandono do tabagismo. Felizmente, o estudo de Spiegel, Sataloff e Emerich (1997), mostra que o consumo de tabaco está começando a diminuir entre os adultos jovens.

CONCLUSÕES

Dentre todas as análises realizadas, pudemos concluir que:

1. Alterações nas pregas vocais foram mais comuns nos indivíduos do sexo masculino;
2. A qualidade vocal foi significativamente pior entre os indivíduos fumantes, sendo a presença de rouquidão sua característica mais freqüente;
3. Houve redução da freqüência fundamental nos grupos de fumantes em relação aos de não-fumantes, mas esta não foi estatisticamente significante.

AGRADECIMENTOS

Gostaríamos de agradecer a todos aqueles que de alguma maneira contribuíram para a conclusão deste trabalho.

Nossa orientadora, Profa. Dra. Maria Inês Rebelo Gonçalves, agradecemos pela dedicação, pelo suporte teórico, pela disponibilidade, pela amizade, por ter-nos tranqüilizado nos momentos mais críticos e por ter despertado em nós o interesse pela pesquisa científica.

Profa. Dra. Noemi Grigoletto de Biase, muito obrigada pela dedicação e disponibilidade na realização e análise de todos os exames laringológicos.

Fga. Vanessa Pedrosa Vieira, oferecemos nossa sincera gratidão por ter-nos dado todo o suporte necessário à realização da análise computadorizada e também por sua disponibilidade em ser uma das avaliadoras da análise perceptivo-auditiva.

Fga. Mestre Carla Bogossian, agradecemo-la pela disponibilidade na realização da análise perceptivo-auditiva.

Agradecemos ainda a Liliana da Silva e Fga. Camila Mercatelli por ter-nos ajudado a encontrar voluntários para a nossa amostra e a preencher intermináveis fichas para cada um deles; Josefina Grandino (D. Josie), agradecemos pelo carinho e dedicação na coleta bibliográfica; Prof. Dr. Paulo Pontes, por ter participado, mesmo que indiretamente, da orientação do nosso trabalho; e, finalmente, agradecemos a todos os voluntários que tornaram possível a realização deste estudo comparativo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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15. Rother ET, Braga MER. Como elaborar sua tese: Estruturas e referências. São Paulo: Copyright; 2001.




1 Fonoaudióloga pela Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Especializanda do Curso de Motricidade Oral em Oncologia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A. C. Camargo.
2 Fonoaudióloga pela Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Especializanda do Curso de Voz do Centro de Estudos da Voz - CEV.
3 Pós-Doutora pela University of California, Davis, EUA. Professora Afiliada do Departamento de Otorrinolaringologia e Distúrbios da Comunicação Humana da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Professora Adjunto Doutora do Mestrado em Distúrbios da Comunicação Humana da Universidade Tuiuti do Paraná.
4 Doutora em Otorrinolaringologia pela Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Médica colaboradora do setor de Laringologia e Voz da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Professora Assistente Doutora da Faculdade de Fonoaudiologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Endereço para Correspondência: Daniele Cannataro de Figueiredo - Rua Pedro Morcilla Filho, 256 V. Guilhermina São Paulo 03546-010 - Tel/fax (0xx11) 6958-9623 / 9646-8160 - E-mail: danyfig@yahoo.com.br

Trabalho de Iniciação Científica apresentado à Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina.

Projeto apresentado no X Congresso de Iniciação Científica na Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina em 10 de Novembro de 2002, financiado pelo CNPq.

Artigo recebido em 02 de julho de 2003. Artigo aceito em 10 de julho de 2003.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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