O capítulo das laringites constitue um assunto importante para ser focalisado sob o ponto de vista clínico e bem interessante para ser difundido entre os não laringologistas.
Toda laringite, quer seja aguda ou crônica, provoca alteração na voz. Para o especialista, frequentemente consultado quando isto acontece, o simples sintôma rouquidão não constitue gravidade maior. O mesmo não pensa o cliente, geralmente leigo, que, ao se notar disfônico, procura apressadamente o especialista, a quem confessa sua preocupação pela doença que reputa grave.
O capitulo das laringites é vastíssimo, razão pela qual, procuraremos hoje sintetisar alguma cousa apenas sobre determinado tipo de laringite crônica - a laringite dos profissionais da voz, tambem chamada miastenía laringéa ou fonastenia, expondo algo de nossa observação pessoal sobre o assunto.
A miastenia laringéa afeta, de preferencia, as pessôas que são obrigadas ao uso da voz devido a sua profissão, como se dá com as professoras, oradores, speakers, camelots, cantores, advogados, pregadores, etc. No entanto, êstes transtornos da fonação podem sobrevir tambem nos que não são profissionais da voz, sempre que existam as mesmas causas capazes de produzir a miastenia laringéa. Vejamos que causas principais serão estas.
1.º) a má orientação do orgão vocal na classificação do tipo de voz. 2.º) o esforço vocal, isto é, o uso prolongado da voz em tonalidade mal colocada. 3.º) reflexão, no laringe, do máu estado geral do organismo. 4.º) uso intempestivo do orgão vocal nos períodos de inflamação aguda, como nas gripes e outras doenças infecciosas.
Inúmeros casos de fonastenia passam desapercebidos, ou por dificuldades diagnósticas, ou por comodidade ao se lhe atribuírem o simples rótulo de laringites crônicas sem se preocuparem com a verdadeira etiologia.
O bom estado das vias áereas superiores (fossas nasais, cavum, orofaringe e seios faciais) é indispensável para uma voz falada ou cantada norma). O mesmo podemos dizer relativamente aos demais orgãos como pulmões, fígado, glandulas endócrinas. As glandulas de secreção interna têm importante papel no desenvolvimento e funcionamento do orgão vocal, como podemos vêr nos períodos da vida em que a constelação endócrina sofre alterações (puberdade-muda da voz, menstruação, gravidez e menopausa).
A fonastenia se deve, em última análise, à sobrecarga de trabalho dado às cordas vocais; esta sobrecarga compromete depois a função dos músculos laringeus, em particular os tiro-aritenoideus ou adutores das cordas vocais, cuja paresia, que então se instala, passará a dificultar a união das cordas vocais em fonação, originando a disfonia, mais ou menos acentuada de acôrdo com o grão da paresia.
Podemos dizer, com Jackson, que, o trabalho dos músculos laringeus dentro dos limites apropriados aumenta a sua força, mas, a sobrecarga dêste trabalho produz uma desordem da qual êles não mais se livrarão.
O abuso vocal, sobrecarregando o trabalho da musculatura laringéa, leva, no fim de algum tempo, a produzir alterações tais como espessamentos e nódulos nos bordos livres das cordas vocais (laringite nodular). O nódulo vocal se desenvolve no bordo livra da corda vocal, na união do terço médio com o terço anterior, devido ao traumatismo repetido das cordas vocais durante a sua vibração, dependente por sua vez do funcionamento vibratório anormal devido a parecia dos adutores e dos tensores que ocasiona a falta de contato das cordas vocais. O nódulo vocal é um fibroepitelioma limitado e raramente se apresenta único, comprometendo sempre as duas cordas vocais. Quando único, o nódulo vocal póde se degenerar mais tarde em polipo da corda vocal.
Todos os fatores que acabamos de assinalar exigirão, sem dúvida, grande esforço para a linguagem falada, a qual passará a ser empregada cada vez com maior sacrifício.
Dentre a classe dos profissionais da voz falada, são as professoras as maiores vítimas da miastenia laringéa pelo sacrifício que lhes é imposto de falarem muito durante as aulas, que, às vezes, são totalmente gritadas. Como resultado, cêdo se ressentem de esfalfamento a que submeterão o orgão vocal, vindo em consequencia o esgotamento e o cansaço representados pela disfonia, cujo grão varia da mais discreta até a afonia completa.
Recentemente fizemos parte de uma comissão de médicos encarregada pelo Departamento de Biometria Médica da P. D. F. para examinar as professoras extra-classe, isto é, professoras que se achavam afastadas do magistério por motivo de doença e readaptadas em outras funções.
Esta comissão, composta dos Drs. Werneck Passos, Maciel Pinheiro, Nelson Santos e o autor destas notas, chegou às seguintes conclusões: das 140 professoras examinadas e que estavam readaptadas em função extra-classe, 104, eram portadoras de afecções diversas que impossibilitavam o exercício do magistério, tais como doenças dos aparelhos circulatório e respiratório, doenças nervosas (neuroses), afecções do aparelho de locomoção, etc. Das 36 restantes, todas estavam readaptadas por doenças de evolução determinada e irreversíveis, afetando os orgãos da audição e fonação, sendo que das referidas 36, 17 eram portadoras de disfonias permanentes, em diversos grãos, devidas a fórmas diferentes de laringites crônicas, como veremos na relação abaixo:
1) A.C.P.L. - fem., 46 anos - Fonastenia-monocordite crônica. 2) A.S.A. - fem., 40 anos - Fonastenia-paresia dos adutores das cordas vocais. 3) A.F.J.P. fem., 43 anos - Laringite nodular (disfonia permanente). 4) A.M.X. fem., 48 anos - Nevrite do acústico em O. D., com surdes acentuada. 5) C.G.B. - fem., 40 anos - Tímpano esclerose (surdês incuravel) 6) D.S.L. - fem., 48 anos - Tímpano esclerose (surdês incuravel) 7) E.M.F. - fem., 27 anos - Polipo da corda vocal esquerda (disfonia permanente) 8) E.C.S. - fem., 42 anos - Fonastenia-paresia dos adutores das cordas vocais. 9) F.C. - fem., 43 anos - Fonastenia-paresia dos adutores das cordas vocais. 10) I.M.G.O. - fem., 46 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 11) I.P.C. - fem., 45 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 12) J.B.G. - fem., 46 anos - Tímpano-esclerose (surdês progressiva). 13) J.R.A. - fem., 50 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 14) J.C.M.A. - fem., 55 anos - - Fibroma da corda vocal esquerda (disfonia permanente). 15) J.F.A.M. - fem., 47 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 16) L.A.F. - fem., 42 anos - Monocordite esquerda. Fonastenia. 17) L.B.F. - fem., 43 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 18) L.M.P. - fem., 49 anos - Fonastenia-paresia, dos adutores das cordas vocais. 19) L.L.T. - fem., 24 anos - Fonastenia-paresia dos adutores das cordas vocais. 20) M.A.B. - fem., 35 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 21) M.A.A. - fem., 41 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 22) M.A.M.D. - fem., 43 anos - Laringite nodular (disfonia permanente). 23) M.L.M.A.S. - fem., 40 anos - Laringite crônica (disfonia permanente). 24) M.S.S. - fem., 44 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 25) M.A.T.M. - fem., 36 anos - Fonastenia-paresia dos adutores das cordas vocais. 26) M.L.F. - fem., 42 anos - Laringite nodular. 27) M.C.R. - fem., 37 anos - Fonastenia (disfonia permanente). 28) N.A.F.M. - fem., 45 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 29) N.M.G.T. - fem., 52 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 30) O.C.S.P.B. - fem., 54 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva). 31) R.L.G. - fem., 54 anos - Tímpano-esclerose por obstrução tubária crónica. 32) R.F.G. - fem., 47 anos - Tímpano-esclerose (surdês progressiva). 33) S.L.R. - fem, 37 anos - Paresia dos adutores das cordas vocais (disfonia permanente). 34) W.B.C. - fem., 30 anos - Paresia dos adutores das cordas vocais (disfonia permanente). 35) Y.C.P. - fem., 49 anos - Tímpano-esclerose (surdês incuravel). 36) L.R.R. - fem., 48 anos - Oto-esclerose (surdês progressiva).
Finalisando estas nossas observações, achamos por bem sugerir alguns conselhos aos responsáveis pela orientação profissional das professoras, particularmente das de ensino primário.
1.º) Inspeção médica obrigatória por ocasião da admissão ao Instituto de Educação ou a outro qualquer Instituto Profissional, focalisando principalmente os orgãos da visão, audição e fonação, pois sabemos que muitas doenças de evolução crônica têm origem exatamente na idade em que é feita esta admissão. Esta inspeção médica deve ser rigorosa e eliminatória afim de evitar que, posteriormente venham as pessôas predispostas sofrer os inconvenientes do excesso profissional a que serão obrigadas forçosamente.
2.º) Inspecção médicas anuais ou mesmo semestrais para todas as professoras que acusarem distúrbios progressivos ou permanentes da audição, fonação e visão.
3.º) Afastamento do magistério e readaptação em função extra-classe para todas as professoras portadoras de disfonias permanentes até que a voz readquira total e definitivamente a sua tonalidade e intensidade normais.
(*) Assistente do Serviço de O. R. L do Hospital do Servidor da prefeitura do Distrito Federal
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