ISSN 1806-9312  
Quarta, 27 de Novembro de 2024
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681 - Vol. 13 / Edição 2 / Período: Março - Abril de 1945
Seção: - Páginas: 122 a 127
INSUFICIÊNCIA DAS TÉCNICAS CORRENTES DA AMIGDALECTOMIA TOTAL (*)
Autor(es):
MOYSÉS CUTIN

São Paulo

A revisão de nossos doentes amigdalectomizados e a oportunidade de observar pacientes operados por outros cirurgiões, chamou-nos a atenção, a presença de restos de tecido amigdaliano (em maior ou menor porção) ao nivel do terço inferior da loja em não pequeno número de casos.

Os métodos operatórios seguidos não influiram em muito neste resultado, quer fossem pelo Sluder ou por dissecção.

Seguiamos o mais fielmente possivel a técnica preconizada pelos autores consagrados da especialidade, que neste ponto são concordes.

Os operados provenientes de outros especialistas tambem foram por Sluder e dissecção. Traziam muitos deles a chancela de nomes conceituados entre os especialistas brasileiros, habeis cirurgiões, alguns dos quais tivemos a honra de ver operar com uma impecabilidade inexcedivel. O problema apresentava-se, pois, não como causa fortuita.

Dentro da literatura médica encontram-se muitos autores que tambem mostram-se insatisfeitos com os resultados; assim, nos Annales lemos um trabalho de Le Mée em relação ao método de Sluder: que Sluder teve dificuldades durante sete anos; Ballenger teve bom resultado sinão em 70 a 72 por cento. O próprio Le Mée em 971 pacientes operados tomou 120 dentre eles ao acaso; em 14 tinha deixado o polo inferior.

Denis Browne, no International Anatomical Congress London, 1927, declarou textualmente a respeito da tonsilectomia: "Probably the most commonly attempt of all operations, being certainly the most commonly unsuccessful".

O mesmo disseram Wingate Todd e Robert Fowler em outros termos referente ao método de dissecção, especialmente em relação ao polo inferior.

Mais próximo a nós diz Loza: "Conhecemos infinidades de casos que foram amigdalectomizados três ou quatro vezes".

Todos os tratados correntes continuam a descrever a técnica operatória sem modificações, nestes últimos vinte anos. Não dando atenção às verificações das insuficiencias por parte dos cirurgiões e não tomando em consideração os trabalhos dos anatomistas que aprofundaram o conhecimento da região a abordar, revelando minúcias, até então passadas desapercebidas.

Exporemos alguns dados anatomicos mais interessantes e que, ao nosso ver, esclarecem os pontos importantes para uma compreensão das faltas e uma técnica cirurgica mais apurada.
O seio tonsilar localiza-se na segunda bolsa branquial; no terceiro mês o tecido endodermico, para uns, e para outros o ectodermico emitiria prolongamentos no mesoderma. Para estes seria a amigdala uma dependência do estomódio.

Segundo Hammar, no seio tonsilar primitivo forma-se um broto que se transforma em uma plica tonsilar, identica com a plica tonsilar do nascituro. Mais adiante aparece uma dobra intratonsilar que divide a amigdala em dois lobos, um anterosuperior e outro postero-inferior, que depois desaparece. Nos meses fetais mais tardios pode surgir a inconstante plica retrotonsilar.

Diversos tipos de amigdala podem se apresentar em relação a essas dobras:

1 - Uma só plica existe, a anterior.

2 - Existem as duas e a amigdala é envolvida por uma plica anular.

3 - A plica triangular não existe, só a posterior.
4 - Ambas faltam e a superficie fica exposta.

No entanto, a face interna na sua porção superior é recoberta de mucosa, se a tonsila não sofreu o processo de involução, nas intervenções quando se procura penetrar no polo superior através da chamada fosseta supratonsilar, incisando a mucosa, cáe-se sôbre tecido amigdaleano, o que não deveria acontecer, conforme as descrições anatomicas correntes, pois, segundo elas, a amigdala seria separada do vertice da fossa amigdaleana pela supra citada fosseta.

O polo inferior, que varia de, estensão em relação à base da lingua, pode mergulhar no sulco glosso-epiglotico. Em outros casos há uma distância maior, mas é cheio por tecido linfoide que o une assim à amigdala lingual.

Adquire grande importância cirurgica o estudo da face externa. Estão todos os autores concordes em admitir que não existe capsula amigdaleana no verdadeiro sentido anatomico, mas sim uma condensação fibrosa periférica do tecido próprio da amigdala que a separa dos tecidos vizinhos. Está presa ao fundo da loja amigdaleana por um tecido areolar, zona facilmente descolavel. No terça inferior ao nível do hilo, segundo Viela, não existe capsula. Neste ponto a amigdala deixa de ter um plano de clivagem, ficando solidaria com os tecidos ambientes.





1) Palato-faringeo. 2) palato-glosso. 3) levantador do palato. 4) lóbo superior. 5) lóbo inferior. 6) fibras do tonsilofaringeo. 7) fibras separadas do estilo faringeo. 8) capsula anatomica da fascia faringea. (Todd and Fowler).

Segundo Wingate e Fowler, o músculo palato-faringeo, que forma o pilar posterior, por suas fibras laterais penetra no tecido amigdaleano.

O músculo palato-glosso envia um feixe mais volumoso, que alguns anatomistas querem ver como um músculo independente, o amigdalo-glosso. O que fez a Viela enxergar uma espécie de cinto formado nas extremidades pelos amigdalo-glossos e na porção média a base da lingua.

Browne assinala uma faixa de tecido fibroso que, segundo a doutrina de cristalização das linhas de força de Arbuthnot Lane, conecta o polo inferior à base da lingua, chamando de ligamento suspensor.

A irrigação da amigdala é feita por artérias multiplas pela origem e com vias de penetração irregulares. Segundo Bulatnikow, originam-se: carótida externa, maxilar externa, palatina ascendente, lingual, faringea ascendente e palatina descendente.

Quanto ao ponto de penetração, Lund encontrou quatro em vinte pares de amigdalas, uma ou duas arteriolas provenientes da abobada palatina penetrar no polo superior; duas vezes penetrarem na porção média e uma vez em vinte provir da parede do faringe, na parte superior.

As descrições habituais do sistema venoso tonsilar ressaltam a existência de um plexo na face externa, como dependencia do plexo venoso faringeo. Browne nega a existência deste plexo; insiste na presença da veia que corre no leito amigdaleano. Seria esta veia séde das hemorragias post-operatorias e não as arterias.

Ha uma unidade de vistas em apreciar o valor dos dois metodos de amigdalectomia, pelo Sluder e suas modificações e o método de dissecção. Sendo o primeiro raramente adequado ao adulto, a sua indicação maior é na criança, pela necessidade de agir com rapidez.

Descreveremos esquematicamente o método de dissecção de acordo com os manuais correntes, os mais atuais como o de Segura e Canuyt, Imperatori.

Através de uma incisão feita na mucosa, procura-se o plano de clivagem e começa-se a dissecar do polo superior para baixo com uma espatula ou simplesmente com o dedo recoberto de gaze, de modo que a amigdala fique presa só pelo seu pediculo, isto é, pelo terço inferior de sua face externa; aqui chegados, passaremos a traduzir as palavras de Wingate Todd e Fowler: "Então, coloca-se uma alça ao redor da parte inferior do orgão, acreditando-se desta maneira completar a operação. O resultado é a imperfeita enucleação; o polo inferior fica dividido pela alça e parte é deixada na porção inferior do leito tonsilar".

Seria inutil insistir na significação de deixar uma porção da amigdala, por menor que seja. A indicação maior da amigdalectomia é de erradicar uma infeção focal que esteja acarretando moléstia grave. O especialista fica confiante no resultado completo de sua intervenção, pois seguiu a rigor a técnica preconizada. Mas o médico assistente verá a molestia seguir seu curso sem modificação, apesar da indicação acertada.

A solução seria seguir a técnica de Fisher, fazendo a dissecção total e ligar os vasos que estivessem sangrando.

Uma outra solução, para contornar o perigo de hemorragia que proviesse da secção do hilo, seria incisar a última porção com o Galvano-cautério e não com alça galvanica, o que seria incidir nas mesmas faltas.

Conclusões. - 0 resto das amigdalas que se encontram com muita frequência (polo inferior) após as operações, não são por falta de técnica, mas sim por insuficiência desta. A técnica clássica peca por não tomar em consideração os detalhes anatomicos.

SUMMARY

The presente of tonsilar remainders in post-operations is verified in great number. (Lower lobe.)

The explanations is the deficiency of the ususal tecnics.

This study tries to prove that the deficiency is caused by the lack of considering anatomical details.

The author thinks that it. is better to proceed, in the tonsil surgery, in the same way as in the tecnic of common surgery.

The artifices used to avoid the danger of hemorrhage, like the Sluder method or the dissection method, makes that the tonsil is not completely extirpated, which in determined cases the lower lobe is more bound to the surrounding tissues and cannot be detached by snares.

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(*) Este trabalho foi baseado em doentes vistos na clinica privada, no Serviço da Cátedra de oto-rino-laringologia da Faculdade de Medicina, nos ambulatorios do IAPTC e Sociedade Beneficente "Linath Hatzedek."
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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