ISSN 1806-9312  
Sexta, 19 de Abril de 2024
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4522 - Vol. 79 / Edição 6 / Período: Novembro - Dezembro de 2013
Seção: Artigo Original Páginas: 704 a 708
Avaliação comparativa entre os métodos objetivo e subjetivo em lâminas coradas pela imuno-histoquímica
Autor(es):
Fernando de Andrade Quintanilha Ribeiro1, Celina Siqueira Barbosa Pereira2, Ricardo Junchen Chi3, Patrícia Lumi Yokomizo4, José Humberto Tavares Guerreiro Fregnani5, Rafael Malagoli Rocha6

DOI: 10.5935/1808-8694.20130129

Palavras-chave: avaliação da tecnologia biomédica; colesteatoma; histologia comparada; imuno-histoquímica.

Keywords: biomedical technology evaluation; cholesteatoma; compared histology; immunohistochemistry.

Resumo: Métodos objetivos de avaliação são frequentemente cobrados em estudos científicos. Exames histológicos com coloração imuno-histoquímica podem ser avaliados por meio de fotometria.
OBJETIVO: Comparar este método objetivo com a avaliação subjetiva realizada por três observadores independentes, utilizando lâminas de colesteatoma adquirido da orelha média.
MÉTODO: Foram selecionadas um total de 54 imagens de colesteatomas imuno-histoquimicamente coradas pelos anticorpos anti-TNF-R2 (32 lâminas) e anti-TGF-α; (22 lâminas). O anticorpo secundário utilizado nos dois grupos foi o Max Polimer Detection System (Kit Novo Link, Novocastra®, UK). As amostras foram processadas por um scanner digital de lâminas (modelo ScanScope - Aperio). As áreas selecionadas foram submetidas à análise por fotometria.
RESULTADOS: A avaliação objetiva por fotometria foi comparada com a avaliação subjetiva por três observadores e submetidas à análise estatística. A análise estatística revelou reprodutibilidade moderada (K valores entre 0,41 e 0,60) para os dois grupos.
CONCLUSÃO:O presente estudo demonstrou que as características irregulares das lâminas de colesteatoma da orelha média coradas pela imuno-histoquímica impossibilita a sua adequada avaliação objetiva, enquanto a avaliação subjetiva por observadores experientes se mostrou mais confiável.

Abstract: Objective methods of assessment are often required in scientific studies. Histological tests with immunohistochemical staining can be assessed by photometry.
OBJECTIVE: To compare this objective method with the subjective evaluation performed by three independent examiners, using slides of acquired middle ear cholesteatomas.
METHOD: We selected a total of 54 cholesteatoma images, immunohistochemically stained by anti-TNF-R2 (32 slides) and anti-TGF-α, (22 slides). The secondary antibody used in the two groups was the Max Polymer Detection System (Novo Link Kit, Novocastra®, UK). The samples were processed by a digital slide scanner (ScanScope - Aperio). The selected sites were analyzed by photometry.
RESULTS: The objective assessment by photometry was compared with the subjective evaluation by three examiners and subjected to statistical analysis. The Statistical analysis revealed moderate reproducibility (K values between 0.41 and 0.60) for both groups.
CONCLUSION: Our study showed that the irregular characteristics of middle ear cholesteatoma slides stained by immunohistochemistry prevents its proper objective evaluation, while the subjective assessment by experienced examiners was more reliable.

INTRODUÇÃO

Muitas revistas têm cobrado dos autores um método objetivo para a avaliação dos cortes histológicos, tanto nas colorações habituais pela hematoxina-eosina quanto pela imuno-histoquímica. Nesta última, observa-se a reação pela visualização de coloração acastanhada que impregna partes específicas das células como a membrana celular, o citoplasma ou o núcleo1-3. Ao analisar esta expressão, um observador experiente pode classificá-la de forma qualitativa (presente ou ausente) e quantitativa (fraca, moderada, intensa). Por essa avaliação ser subjetiva, muitas vezes mais de um observador é necessário para a análise quantitativa do material. Vários métodos objetivos para a análise dessas reações têm sido propostos4-7.

A fotometria é um desses métodos e consiste na digitalização da lâmina e análise da imagem digital por um programa que realiza leitura do fluxo de luz, ou seja, quanto maior a impregnação do tecido pela reação imuno-histoquímica, menor o valor observado no fotômetro. Porém, vários tecidos, quando submetidos à avaliação imuno-histoquímica, são heterogêneos, com áreas onde a reação é intensa e outras com expressão fraca ou moderada do antígeno. Nestes casos, o observador classifica o fragmento pela coloração predominante no campo estudado.

O objetivo deste trabalho é comparar a reprodutibilidade entre os métodos objetivo e subjetivo para a avaliação da expressão de reações imuno-histoquímicas na matriz do colesteatoma adquirido da orelha média humana.


MÉTODO

Este trabalho foi submetido à avaliação e aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição (projeto nº 163/11).

Foram utilizadas 54 lâminas previamente coradas pelo método da imuno-histoquímica no Departamento de Morfologia da instituição. Todas as amostras foram fixadas em formol a 10% e processadas pelas técnicas habituais, com inclusão em parafina. Os cortes de três micrômetros de espessura foram obtidos por um micrômetro rotativo e avaliados previamente com a coloração de hematoxilina-eosina (HE) para a confirmação da presença e integridade da matriz (epitélio) e da perimatriz. Para o estudo imuno-histoquímico, foi promovido o bloqueio da peroxidase endógena e, posteriormente, a recuperação antigênica com citrato (pH 6,0) em panela a vapor. Os anticorpos primários utilizados foram o anti-TNF-R2 e anti-TGF-α (Labvision®, EUA), na titulação de 1:100. Em 32 lâminas, o anticorpo primário empregado foi o TNF-R2 (grupo 1) enquanto o TGF-α foi utilizado nas outras 22 lâminas (grupo 2). O anticorpo secundário utilizado nos dois grupos foi o Max Polimer Detection System (Kit Novo Link, Novocastra®, UK).

As lâminas foram analisadas com um microscópio ótico modelo Axioscope 40 (Carl Zeiss), com ocular de 10x e objetivas de 10x, 20x e 40x. A seleção dos dois grupos de lâminas corados com anticorpos primários diferentes foi um meio de avaliar melhor eventuais variações de coloração de citoplasma, membrana e núcleo. No grupo 1, a reação ao anticorpo anti-TNF-R2 foi citoplasmática e nuclear e, no grupo 2, o anticorpo anti-TGF-α corou apenas o citoplasma das células. A avaliação subjetiva da reação imuno-histoquímica foi feita por três observadores experientes, independentemente, de forma qualitativa (presente ou ausente) e quantitativa, de acordo com a intensidade da coloração observada (fraca = 1, moderada = 2 e acentuada = 3). Quando não havia concordância entre as três avaliações, a lâmina era discutida para se chegar a um consenso.

Estas mesmas amostras foram processadas por um digitalizador de lâminas histológicas modelo ScanScope (Aperio), no Departamento de Anatomia Patológica, obtendo-se imagens digitais de alta resolução dos cortes histológicos. As imagens foram projetadas na tela do monitor e, por meio de uma ferramenta de marcação digital, foi delimitada a área mais representativa da reação imuno-histoquímica de cada lâmina. As áreas selecionadas foram submetidas à análise pela fotometria para a avaliação objetiva da sua densidade óptica.

O aparelho avaliou a permeabilidade óptica de cada corte histológico atribuindo-lhe uma numeração, que correspondia à média da intensidade de marcação imuno-histoquímica da área selecionada (Iavg) obtida por meio da contagem de pixels. O Iavg (Average Intensity of all pixels) é um parâmetro que mede a intensidade do brilho de um pixel. A escala de Iavg é graduada de zero (preto) a 255 (branco), de forma que valores altos de Iavg indicam imagens mais claras e brilhantes. Isso ocorre, pois a intensidade do brilho do pixel é proporcional à quantidade de luz que atravessa a lâmina submetida ao scanner.

Para a análise estatística, houve a necessidade de categorizar a expressão dos marcadores da análise objetiva em três grupos (expressão fraca, moderada e intensa), para compará-la com a avaliação subjetiva e verificar se houve reprodutibilidade entre os métodos. Foi calculada a amplitude dos valores (diferença entre os valores mínimo e máximo) para cada grupo de lâminas. O valor obtido foi dividido em três partes. O primeiro terço, com os menores valores, correspondeu à classificação grau 3 (expressão intensa). O segundo terço correspondeu ao grau 2 (expressão moderada) e o último terço, ao grau 1 (expressão fraca). Após a transformação de variáveis numéricas em ordinais, utilizou-se o teste de kappa ponderado (K).

O trabalho foi duplo cego, uma vez que os observadores que obtiveram as respostas pelo método subjetivo não tiveram conhecimento do resultado objetivo e vice-versa.


RESULTADOS

Na avaliação objetiva, o intervalo obtido de Iavg para o primeiro grupo de lâminas, coradas com o anticorpo anti-TNFR2, foi de 98,97 a 183,78. A amplitude entre os valores máximo e mínimo foi de 84,81. Dividindo esta amplitude por 3, obteve-se o valor 28,27. Logo, os intervalos de amplitude foram: 98,97 a 127,23 (grau 3), 127,24 a 155,51 (grau 2) e 155,52 a 183,78 (grau 1). O valor do Iavg é inversamente proporcional à graduação numérica, ou seja, uma fraca intensidade interpretada pelo observador (avaliação subjetiva) corresponde a um valor elevado de Iavg (avaliação objetiva) obtido pela fotometria.

Para o segundo grupo de lâminas, coradas com o anticorpo anti-TGF-α, o intervalo obtido de Iavg foi de 114,61 a 194,28. A amplitude entre os valores máximo e mínimo foi de 79,67. Dividindo esta amplitude por 3, obteve-se o valor 26,55. Logo, os intervalos de amplitude foram: 114,61 a 141,16 (grau 3), 141,17 a 167,72 (grau 2) e 167,73 a 194,28 (grau 1).

As avaliações subjetivas e objetivas das lâminas dos dois grupos, bem como o valor do Iavg em pixels encontrado para a área demarcada em cada lâmina, estão representadas nas Tabelas 1 e 2.






Quando comparamos os resultados das duas avaliações para os grupos estudados, a porcentagem de acerto entre os observadores e a fotometria foi de 59,4% para o grupo 1 e 54,5% para o grupo 2, valores abaixo do esperado (Tabelas 3 e 4).






Após a transformação dos valores da avaliação objetiva em números ordinais, ela pode ser comparada com o resultado da avaliação subjetiva pelo método do Kappa ponderado (K), que permite o cálculo da reprodutibilidade entre duas variáveis quando estas são ordinais. O valor do K para o primeiro grupo foi de 0,48 e para o segundo grupo, 0,41. A análise estatística apontou a existência de reprodutibilidade moderada (valores de K entre 0,41 e 0,60) entre as análises subjetiva e objetiva.


DISCUSSÃO

Vários estudos já foram realizados demonstrando a utilidade dos métodos objetivos nas análises diagnósticas de cortes histológicos. O desenvolvimento de novas técnicas de avaliação visa tornar as análises mais objetivas e padronizadas, criando um modelo confiável e reprodutível.

Os métodos objetivos já foram descritos para avaliar impregnações celulares utilizando a imuno-histoquímica6,7. Porém, não foram encontradas na literatura referências ao emprego desses métodos no estudo de colesteatomas adquiridos de orelha média humana.

Utilizamos dois lotes de lâminas com características de coloração diversas para conferir maior fidedignidade ao estudo. Quando comparamos a porcentagem de acertos entre a avaliação subjetiva e a objetiva nos dois grupos, os valores ficaram entre 50% e 60%. A reprodutibilidade, calculada empregando o método do Kappa, foi moderada, com valores no limite inferior dentro do intervalo. Para que um novo método seja utilizado como substituto de outro, já consagrado, a reprodutibilidade deveria ser muito melhor do que a encontrada no presente estudo, com valores de Kappa entre 0,81 a 1,00 (reprodutibilidade muito boa).

Uma possível explicação para essa discrepância de resultados seria a falta de uniformidade da reação nos cortes histológicos de colesteatoma adquirido de orelha média. Como a coloração não é homogênea, sendo diferente em várias áreas de uma mesma lâmina, torna-se necessário selecionar a região mais representativa da lâmina para submeter à análise do fotômetro, o que por si só já reduz a objetividade do método (Figura 1). A grande diversidade de componentes das estruturas histológicas também pode constituir um fator de interferência na avaliação objetiva.


Figura 1. Lâmina digitalizada e submetida à marcação de três áreas, de acordo com a intensidade da reação ao anticorpo (grupo 1). A área 1 foi considerada representativa do caso e as áreas 2 e 3 foram desconsideradas.



Um observador habilitado tem a capacidade de considerar o tecido a ser estudado como um todo, independentemente das eventuais variações encontradas em cada lâmina, e escolher a área mais apropriada do corte histológico para definir a intensidade da reação imuno-histoquímica, condição ainda limitada na fotometria.

Sendo assim, embora o uso de métodos diagnósticos objetivos esteja cada vez mais em evidência, a sua empregabilidade na avaliação da expressão imuno-histoquímica nos casos de colesteatomas adquiridos na orelha média com esses anticorpos foi questionável.

Concluímos que o censo crítico e a experiência humana fazem uma avaliação mais precisa por considerar, na lâmina toda, a espessura do epitélio, a impregnação citoplasmática ou nuclear, artefatos técnicos, etc. Na fotometria, teríamos que escolher vários locais na lâmina ou mesmo avaliar partes da célula e fazer uma média dos achados para obter resultados semelhantes aos que um bom histologista consegue com um olhar.


CONCLUSÃO

O presente estudo mostrou que houve uma reprodutibilidade moderada entre o método objetivo (fotometria) e o subjetivo na análise de reações imuno-histoquímicas de fragmentos do epitélio do colesteatoma adquirido da orelha média humana.


REFERÊNCIAS

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1. Doutorado (Prof. Adjunto do Departamento de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo).
2. Doutorado (Profa. Adjunto do Departamento de Morfologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo).
3. Acadêmico do 6º ano do curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (Residente de medicina).
4. Acadêmica do 3º ano do curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (Estudante de medicina).
5. Doutorado (Pesquisador do núcleo de apoio ao pesquisador do Instituto de ensino e pesquisa do Hospital do câncer de Barretos).
6. Doutorado (Pesquisador Científico do Departamento de Anatomia Patológica do Hospital AC Camargo - São Paulo).

Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

Endereço para correspondência:
Fernando de Andrade Quintanilha Ribeiro
Rua Itapeva, nº 366, cj 74. Bela Vista
São Paulo - SP. Brasil. CEP: 03032-000

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) do BJORL em 1 de maio de 2013. cod. 10895.
Artigo aceito em 6 de julho de 2013.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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