INTRODUÇÃOO angiofibroma extranasofaríngeo (AEN) é um tumor histologicamente semelhante ao angiofibroma nasofaríngeo juvenil (ANJ), diferindo deste último em suas características clínicas e epidemiológicas
1-3. Prevalência, gênero, idade, sítio acometido, etiopatogenia, apresentação clínico-tomográfica e recorrência são totalmente diferentes
1-3, o que leva alguns autores a classificar o AEN como uma doença distinta do ANJ
1.
Há menos de uma centena de casos de AEN descritos na literatura mundial, sendo o local mais acometido o seio maxilar, seguido do etmoidal, sendo raro em septo nasal
1-3. O objetivo deste trabalho é relatar um caso de AEN com apresentação rara em septo nasal.
APRESENTAÇÃO DO CASOW.S.R., 10 anos e 11 meses, apresentava obstrução nasal bilateral havia seis meses, pior à direita, contínua, com hiposmia, roncos, sem epistaxe. Endoscopia nasal evidenciava lesão rosada, lisa, não friável, não ulcerada, aparentemente inserida em septo nasal, obstruindo fossa nasal direita (FND) em seu terço posterior até a coana, podendo ser vista pela outra fossa nasal. Meatos médios e recessos esfenoetmoidais livres. Tomografia computadorizada (TC) mostrava lesão com densidade de partes moles em FND (Figura 1A-B). Realizada abordagem endoscópica, com identificação de lesão inserida em septo nasal, dissecção subperiosteal e excisão com margem de sua inserção. Acompanhamento pós-operatório com 1 ano e 9 meses sem recorrência (Figura 1C). Estudo histopatológico evidenciou angiofibroma (Figura 1D).
Figura 1. A: Tomografia computadorizada axial pré-operatória mostrando a lesão, inserida em septo nasal e estendendo-se até coanas; B: Tomografia computadorizada axial pré-operatória mostrando fossa pterigopalatina sem acometimento; C: Tomografia computadorizada axial pós-operatória; D: Corte histológico em HE demonstra proliferação fusocelular com áreas de hialinização tendo de permeio vasos por vezes arqueados.
DISCUSSÃOO ANJ é a neoplasia benigna mais comum da nasofaringe, apesar de representar menos de 0,05% dos tumores de cabeça e pescoço
1,2,4,5. Acomete quase exclusivamente o sexo masculino, entre 12 e 14 anos
1,2,4,5. Já o AEN é bem mais raro, mais comum em mulheres, entre 17 e 22 anos, e seu sítio mais comum é o seio maxilar, seguido pelo etmoidal, sendo muito raro em septo nasal e conchas inferiores
1-3. A origem do ANJ é na margem superior do forame esfenopalatino
1,2,5 com etiologia controversa
4. O AEN tem sua etiologia ligada ao erro de migração da
fascia basalis1, justificando sua presença em localizações variadas
2. Nosso paciente apresentava idade, gênero e localização discrepante da maioria dos AEN, confirmando a raridade de apresentação deste caso.
O crescimento inicial do ANJ segue um padrão bem definido para fossa nasal, nasofaringe e fossa pterigopalatina
4, levando à tríade obstrução nasal, epistaxe de repetição e tumor nasofaríngeo
1,2,5. Radiologicamente, o ANJ apresenta sinais característicos: Holman-Miller (anteriorização da parede posterior do seio maxilar) e alargamento do forame esfenopalatino - fossa pterigopalatina
1,2,4,5. Já o AEN pode evoluir com grande variedade de sintomas e sinais radiológicos, a depender do sítio de localização
1,2. Nosso paciente relatava obstrução nasal, devido à localização rara em septo nasal.
Histologicamente, o AEN é semelhante ao ANJ, com estroma de tecido conectivo e matriz de vasos dilatados sem camada muscular
2,3,5. Como diagnóstico diferencial, temos hemangioma e hemangiopericitoma
3. Enquanto o ANJ pode ser suspeitado pelo quadro clínico e tomográfico característicos
2,4,5, o exame histopatológico é essencial na confirmação diagnóstica do AEN
1. O tratamento é cirúrgico em ambas as doenças
2. Apesar do AEN, assim como o ANJ, ser irrigado pela artéria maxilar
4, ele pode não apresentar epistaxes ou sangramento intraoperatório excessivo, devido ao predomínio de estroma fibroso, diferentemente do ANJ
1,2. Embora seja benigno, ANJ é localmente agressivo, com taxas de recorrências de 6% a 27,5%
2, devido à remoção incompleta do tumor
5. AEN praticamente não apresenta recorrência, pois sua localização extranasofaríngea facilita a ressecção total
1-3. Nosso paciente não se queixava de epistaxe, não apresentou sangramento intraoperatório excessivo e já está há 1 ano e 9 meses sem recorrência.
Portanto, apesar de histologicamente semelhantes, AEN e ANJ podem ser consideradas doenças distintas, devido à etiopatogenia, epidemiologia, apresentação clínico-tomográfica e evolução totalmente discrepantes
1.
CONSIDERAÇÕES FINAISApesar de raro, o AEN deve ser considerado no diagnóstico dos tumores vasculares de cabeça e pescoço. As características clínicas e epidemiológicas fazem do AEN uma entidade distinta do ANJ.
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http://dx.doi.org/10.1590/S0034-72992003000300015 1. Graduação em Medicina pela UNIFESP-EPM (Médico-residente de 3º ano em Otorrinolaringologia pela UNIFESP-EPM)
2. Graduação em Medicina pela UFC (Médico-residente de 2º ano em Otorrinolaringologia pela UNIFESP-EPM)
3. Mestre em Ciências pela UNIFESP-EPM (Médico Assistente do Setor de Rinologia da UNIFESP-EPM)
4. Livre-docente (Chefe do Departamento de Patologia da UNIFESP-EPM)
5. Doutor em Ciências pela UNIFESP-EPM (Vice-chefe do Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da UNIFESP-EPM)
6. Doutor em Ciências pela UNIFESP-EPM. Coordenador do Fellowship em Rinologia da UNIFESP-EPM (Preceptor-Chefe da Residência em Otorrinolaringologia da UNIFESP-EPM)
Setor de Rinologia, Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço Escola Paulista de Medicina Universidade Federal de São Paulo.
Endereço para correspondência:
Eduardo Macoto Kosugi
Rua Prof. João de Oliveira Torres, nº 416. Jardim Anália Franco
São Paulo - SP. Brasil. CEP: 03337-010
Tel: +55 (11) 2671-5883
E-mail:
edumacoto@uol.com.brEste artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) do BJORL em 11 de junho de 2012. cod. 9262.
Artigo aceito em 6 de outubro de 2012.