ISSN 1806-9312  
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4487 - Vol. 79 / Edição 5 / Período: Setembro - Outubro de 2013
Seção: Artigo Original Páginas: 629 a 635
Influência da estratégia de processamento de sinal no desempenho auditivo
Autor(es):
Tatiana Mendes de Melo1; Maria Cecília Bevilacqua2; Orozimbo Alves Costa2; Adriane Lima Mortari Moret3

DOI: 10.5935/1808-8694.20130113

Palavras-chave: avaliação de resultados (cuidados de saúde); implante coclear; percepção da fala; perda auditiva.

Keywords: cochlear implants; hearing loss; outcome assessment (health care); speech perception.

Resumo: Aestratégia de processamento de sinal é um parâmetro que pode influenciar o desempenho auditivo do usuário de implante coclear e torna-se importante otimizar este parâmetro para proporcionar melhor percepção da fala, especialmente em situações de difícil escuta.
OBJETIVO: Analisar os resultados individuais do desempenho auditivo de crianças usuárias de implante coclear, utilizando diferentes estratégias de processamento do sinal.
MÉTODO: Estudo prospectivo com 11 crianças com deficiência auditiva pré-lingual e com habilidade auditiva de reconhecimento em conjunto aberto. Foi realizada a avaliação em três momentos, de acordo com a estratégia de fala utilizada (HiRes 120 e HiRes). Os participantes foram submetidos à audiometria em campo livre e avaliação da percepção da fala (silêncio e ruído).
RESULTADOS: No silêncio, as crianças S1, S4, S5, S7 apresentaram melhor desempenho com a estratégia HiRes 120 e as crianças S2, S9, S11 apresentaram melhor desempenho com a estratégia HiRes. No ruído, também foi possível observar que algumas crianças obtiveram melhor desempenho utilizando a estratégia HiRes 120 e outras com a HiRes.
CONCLUSÃO: Nem todas as crianças avaliadas apresentaram o mesmo padrão de resposta com as diferentes estratégias utilizadas neste estudo, o que reforça a necessidade de olhar clínico na otimização da programação do implante coclear.

Abstract: The signal processing strategy is a parameter that may influence the auditory performance of cochlear implant and is important to optimize this parameter to provide better speech perception, especially in difficult listening situations.
OBJECTIVE: To evaluate the individual's auditory performance using two different signal processing strategy.
METHOD: Prospective study with 11 prelingually deafened children with open-set speech recognition. A within-subjects design was used to compare performance with standard HiRes and HiRes 120 in three different moments. During test sessions, subject's performance was evaluated by warble-tone sound-field thresholds, speech perception evaluation, in quiet and in noise.
RESULTS: In the silence, children S1, S4, S5, S7 showed better performance with the HiRes 120 strategy and children S2, S9, S11 showed better performance with the HiRes strategy. In the noise was also observed that some children performed better using the HiRes 120 strategy and other with HiRes.
CONCLUSION: Not all children presented the same pattern of response to the different strategies used in this study, which reinforces the need to look at optimizing cochlear implant clinical programming.

INTRODUÇÃO

O implante coclear multicanal (IC) representa o mais importante avanço no tratamento de pessoas com deficiência auditiva de grau grave e/ou profundo bilateral, que não apresentam aproveitamento com o aparelho de amplificação sonora individual (AASI).

Todavia, os resultados de percepção da fala com o IC estão intimamente relacionados com fatores como a idade na cirurgia, o tempo de privação sensorial, o tempo de uso do dispositivo, a etiologia da deficiência auditiva e a otimização dos parâmetros de programação.

Um dos parâmetros importantes, estabelecidos no momento da programação do dispositivo, é a estratégia de processamento de sinal, que define como o IC irá transformar a informação acústica em estímulo elétrico para ser transmitido ao nervo auditivo. O objetivo é proporcionar uma representação elétrica de alta fidelidade da informação acústica captada pelo microfone do processador de fala, a fim de tornar possível o reconhecimento de fala para o usuário do IC, principalmente em situações difíceis de escuta, como na presença de ruído competitivo.

No Brasil, entre as marcas de IC aprovadas para comercialização pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), há a Advanced Bionics. O primeiro IC com o dispositivo dessa marca ocorreu em março de 1991, para fins de pesquisa: o Clarion 1.0, que foi aprovado para distribuição comercial, nos Estados Unidos, pela Food and Drug Administration (FDA), em março de 1996, para adultos e, em junho de 1997, para crianças, com o dispositivo chamado Clarion 1.2. Esses dispositivos disponibilizavam três diferentes estratégias de processamento de sinal: a Continuous Interleaved Sampling (CIS), a Simultaneous Analog Stimulation (SAS) e a Multiple Pulsatile Sampler (MPS).

Um grande passo para os dispositivos da Advanced Bionics foi representado pelo desenvolvimento do sistema de processamento de fala HiResolution (HiRes) lançado em 2002, que proporcionou mais informações temporais que as estratégias de processamento de sinal descritas anteriormente. As altas taxas de estimulação, associadas à extração das pistas temporais de estrutura fina proporcionada por essa estratégia, resultam na transmissão do sinal acústico, para o usuário de IC, em alta resolução. De acordo com pesquisas realizadas por diversos centros de IC, em nível internacional, é notória a contribuição da estratégia HiRes para a otimização da percepção da fala dos usuários do IC da Advanced Bionics1-5.

E, em 2006, a empresa lançou a estratégia de processamento de sinal HiRes 120, baseada na técnica dos canais espectrais virtuais, a fim de fornecer a representação espectral do sinal acústico de forma mais detalhada, juntamente com os demais recursos proporcionados pela estratégia HiRes.

Na estratégia HiRes, o som de entrada é filtrado em 16 bandas espectrais e a energia de cada banda é extraída e repassada, com altas taxas de estimulação, a um único eletrodo correspondente. No processamento de sinal da HiRes 120, o sinal de entrada é analisado em uma gama espectral de 120 bandas, para que, posteriormente, a energia seja retransmitida aos eletrodos, variando a proporção do nível de corrente, de forma simultânea, a dois eletrodos adjacentes. Isto permite que os usuários dessa estratégia de sinal aproveitem melhor sua audição residual, em relação à capacidade de discriminação auditiva, recebendo informações espectrais com maior resolução, se comparada à estratégia HiRes. O aumento da informação espectral, em combinação com a resolução temporal fina, já implementada na estratégia HiRes, proporciona melhores resultados de percepção da fala no ruído e na apreciação musical.

Desde o seu lançamento, a HiRes 120 vem sendo recomendada pela Advanced Bionics como estratégia de processamento de sinal utilizada na programação do processador de fala de crianças e adultos. Em geral, as diferentes empresas de IC orientam os fonoaudiólogos da equipe de IC sobre a estratégia de processamento de sinal recomendada para cada modelo do dispositivo. Contudo, é extremamente importante o olhar clínico para a avaliação dos resultados pós-IC, nas diferentes estratégias de processamento de sinal, uma vez que, às vezes, a estratégia recomendada pela empresa não beneficia todos os usuários de IC da mesma forma.

Neste contexto, o objetivo do presente estudo foi analisar e comparar os resultados individuais do desempenho de percepção da fala em crianças usuárias de IC, utilizando duas diferentes estratégias de processamento do sinal do sistema HiResolution da Advanced Bionics.


MÉTODO

Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos (Ofício nº 68/2011).

Casuística

A casuística foi composta por crianças com deficiência auditiva pré-lingual, implantadas unilateralmente com os dispositivos HiRes 90K, da Advanced Bionics, com idade entre 5 e 10 anos, de ambos os gêneros, que apresentavam habilidade auditiva de reconhecimento de palavras em conjunto aberto, de acordo com as categorias de audição propostas em 19946, e construção de frases de quatro ou mais elementos, conforme apresentado nas categorias de linguagem propostas em 19967. Foram excluídas da casuística as crianças que apresentavam pelo menos um dos seguintes itens: inserção parcial dos eletrodos, não uso do IC por um período maior que seis meses, hipótese diagnóstica de espectro da neuropatia auditiva e hipoplasia de nervo auditivo e múltiplas deficiências associadas à perda auditiva.

Contemplando tais características, a casuística totalizou 15 participantes. Contudo, quatro foram excluídos deste estudo devido a problemas com agendamento e retorno ao centro de IC em que foi desenvolvido este estudo.

Deste modo, a casuística deste estudo foi composta por 11 participantes, todos usuários do componente interno HiRes 90K e processador de fala modelo platinum. O IC foi adaptado na orelha esquerda em oito participantes e, na orelha direita, em três participantes. Em nenhum dos casos avaliados havia histórico de intercorrência no componente interno e todos apresentavam os 16 eletrodos intracocleares ativos.

Quanto ao aparecimento da deficiência auditiva, todos os participantes eram portadores de deficiência auditiva de origem congênita, fizeram uso de AASI antes da realização do IC e a cirurgia do IC foi realizada antes dos 3 anos de idade. No que se refere à etiologia, quatro participantes foram identificados com perda auditiva genética e os outros sete casos apresentavam etiologia de origem idiopática.

Todas as crianças que participaram deste trabalho eram usuárias frequentes de IC. Quanto ao uso do AASI na orelha contralateral ao IC, seis participantes faziam uso desse dispositivo e cinco não utilizavam o AASI contralateral. Todos estavam inseridos em programa terapêutico com abordagem aurioral, na cidade de origem e matriculados em escolas regulares.

Tais informações, bem como os dados demográficos e demais informações pertinentes ao estudo, foram coletados a partir do prontuário do paciente. Os dados demográficos de cada participante encontram-se no Anexo A. Para facilitar a identificação dos participantes, os mesmos foram numerados de participante número 1 (S1) a participante número 11 (S11).

A Tabela 1 apresenta a distribuição da casuística, avaliada em relação à idade na ocasião do IC, ao tempo de privação sensorial auditiva, à idade do participante no início do presente estudo e ao tempo de uso do dispositivo (início do estudo).




Instrumentos e Procedimentos

Os participantes foram submetidos aos procedimentos desta pesquisa, os quais incluíram: 1) pesquisa dos limiares audiométricos em campo livre, 2) avaliação da percepção da fala por meio do teste HINT, no silêncio e na presença de ruído. Tanto a pesquisa dos limiares audiométricos em campo livre quanto a avaliação da percepção da fala foram executadas com os participantes dispondo somente do IC, mesmo aqueles que faziam uso de IC e AASI no seu dia-a-dia.

Todos os procedimentos listados foram aplicados integralmente em três momentos distintos (Figura 1):


Figura 1. Esquema representativo das etapas do protocolo de avaliação.



1ª Avaliação (linha de base): procedimentos realizados com o uso da estratégia HiRes 120. A HiRes 120 foi a estratégia de linha de base do presente estudo, pois era a estratégia já utilizada pelos participantes da casuística. Após essa avaliação, foi realizada a mudança de estratégia de processamento de sinal para a HiRes;

2ª Avaliação: Após três meses de uso da estratégia HiRes, os participantes foram novamente avaliados por meio dos procedimentos listados acima. Após a avaliação, foi realizada a mudança de estratégia de processamento para a HiRes 120;

3ª Avaliação: Após três meses de uso da estratégia HiRes 120, os procedimentos listados foram executados novamente.


Antes de iniciar a aplicação dos procedimentos descritos a seguir, foi realizada a avaliação do componente externo (processador de fala, antena transmissora, microfone e fios), por meio de inspeção visual, e do componente interno, por meio da telemetria de impedância. Os procedimentos foram realizados a fim de descartar qualquer problema do dispositivo que interferisse nos resultados apresentados.

Para a programação do processador de fala, nos momentos em que foi realizada a mudança de estratégia de processamento de sinal, utilizou-se um microcomputador portátil, acoplado à interface de programação e ao software de programação da Advanced Bionics - o SoundWave, versão 2.0.

Após a avaliação realizada em cada momento do estudo, o processador de som foi programado com mapas elaborados com a estratégia de processamento de sinal ajustada para cada momento do estudo (HiRes ou HiRes 120), mas a pesquisadora também incluiu no processador de som o mapa antigo da criança, caso ela não se adaptasse ao novo mapa. De acordo com a orientação dada para família, a criança deveria utilizar os novos mapas, ajustados após a avaliação, mas se caso a criança não se adaptasse aos novos mapas, os pais poderiam ajustar o processador de som no programa antigo (programa usado antes da avaliação).

Pesquisa dos limiares audiométricos

Primeiramente, foram obtidos os limiares audiométricos em campo livre, para cada participante, nas frequências de 500, 1.000, 2.000 e 4.000 Hz, utilizando tom warble.

A audiometria em campo livre foi realizada em cabine acústica de 2 x 2 metros e o audiômetro utilizado foi o Midimate 622 - Madsen Eletronics, conectado a um amplificador em campo livre e a duas caixas acústicas, calibrados em dB, nível de pressão sonora (NPS). O usuário de IC foi posicionado a um metro da caixa acústica, a 0º azimute. Esse procedimento foi realizado para assegurar que todos os participantes do estudo apresentassem audibilidade adequada nas frequências da fala, não comprometendo os testes de percepção aplicados neste estudo.

Teste HINT

O HINT foi desenvolvido no House Ear Institute, em 1994, para fornecer uma medida confiável e eficiente dos limiares de recepção da fala para sentenças no silêncio e no ruído e a versão, em português, do teste, o HINT -Brasil8, foi padronizada e publicada em 2008. Como todos os participantes deste estudo eram usuários de IC, o teste HINT foi apresentado somente em campo livre, nas situações de silêncio e com ruído frontal e do lado do IC.

Na condição silêncio, o sinal de fala foi apresentado por meio de caixa acústica localizada a um metro de distância do sujeito, na posição frontal (0º azimute) e com intensidade inicial de 65 dBNPS. Contudo, esse sinal teve uma intensidade variável ao longo do procedimento, a partir da resposta apresentada pelo paciente. Isto ocorreu até que fosse estabelecido o limiar de reconhecimento de sentenças (LRS), que foi obtido quando 50% das sentenças foram repetidas corretamente pelo participante.

Na condição ruído frente, o sinal de fala foi apresentado na presença de ruído competitivo. Ambos os sinais foram apresentados pela mesma caixa acústica, localizada a um metro de distância do sujeito, na posição frontal (0º azimute). Nessas condições, o ruído foi calibrado e mantido na intensidade de 65 dB NPS e a intensidade do sinal de fala foi apresentada, inicialmente, em 50 dB NPS. O sinal de fala teve uma intensidade variável ao longo do procedimento, a partir da resposta apresentada pelo paciente. Isto ocorreu até que fosse estabelecido o LRS, que foi obtido quando 50% das sentenças foram repetidas corretamente pelo participante.

Na condição ruído lado, o sinal de fala foi apresentado na presença de ruído competitivo. O sinal de fala foi apresentado na caixa acústica, na posição frontal (0º azimute), a um metro de distância do participante e o ruído foi apresentado na caixa acústica, posicionada a 90º azimute, ipsilateralmente ao IC, também a um metro de distância do sujeito. De forma semelhante à condição ruído frontal, o ruído foi calibrado e mantido na intensidade de 65 dB NPS e a intensidade do sinal de fala foi apresentada, inicialmente, em 50 dB NPS, porém, a intensidade desse sinal foi variável ao longo do procedimento, de acordo com a resposta apresentada pelo paciente. Isto ocorreu até que fosse estabelecido o LRS, que foi obtido quando 50% das sentenças foram repetidas corretamente pelo participante.

Ao final do teste, o software forneceu automaticamente os valores em dB, nas situações de silêncio (representando o limiar), de ruído frontal e de ruído lateral (representando a relação sinal/ruído) para cada participante.

É importante ressaltar que a sequência de aplicação dos estímulos de fala, nas diferentes situações, ocorreu de forma aleatória, a fim de eliminar variáveis relacionadas ao cansaço, atenção dos participantes e ao fenômeno de aprendizagem. A fim de excluir a variável da mudança das listas na avaliação da percepção da fala, nos diferentes momentos de avaliação do presente estudo, optou-se por utilizar a mesma lista de sentença nos diferentes momentos e nas diferentes condições de avaliação para cada participante.

Forma de análise dos resultados

Os dados de todas as etapas do estudo foram armazenados em banco de dados do Excel®.

Para análise do desempenho nos três momentos de coleta dos participantes do estudo no teste HINT (condições silêncio, ruído frente e ruído lado), foi utilizado o teste estatístico análise de variância com medidas repetidas. Para as comparações post-hoc, utilizou-se o teste Turkey.

Em ambos os testes estatísticos utilizados no presente estudo, empregou-se o pacote computacional STATA, versão 9.0 e nível de significância de 5%.


RESULTADOS

Todas as crianças avaliadas, com exceção da criança S10, completaram a avaliação proposta nos três momentos do estudo. Como a criança S10 não se adaptou à mudança de estratégia de processamento de sinal realizada após a primeira avaliação do estudo e continuou utilizando o processador de fala no mapa ajustado com a estratégia HiRes 120, a mesma não foi submetida à avaliação proposta utilizando a estratégia HiRes. Deste modo, os resultados obtidos pela criança S10 referem-se apenas ao desempenho auditivo com o uso da estratégia HiRes 120.

Em todos os momentos avaliados no estudo, as crianças apresentaram limiares auditivos com o IC menores que 30 dB, nas frequências de 500 a 4.000 Hz. Tal resultado assegurou que todas as crianças apresentavam audibilidade adequada nas frequências da fala e que a audibilidade dos sons não foi um fator que influenciou no desempenho auditivo obtido pelos participantes.

Os resultados de cada participante no teste HINT, na condição silêncio, ruído frente e lado, podem ser visualizados nos Gráficos 1, 2 e 3, respectivamente.


Gráfico 1. Resultados individuais no teste HINT - silêncio.1: S1; 2: S2; 3: S3; 4: S4; 5: S5; 6: S6; 7: S7; 8: S8; 9: S9; 10: S10; 11: S11.


Gráfico 2. Resultados individuais no teste HINT - ruído frente. 1: S1; 2: S2; 3: S3; 4: S4; 5: S5; 6: S6; 7: S7; 8: S8; 9: S9; 10: S10; 11: S11.


Gráfico 3. Resultados individuais no teste HINT - ruído lado. 1: S1; 2: S2; 3: S3 ;4: S4; 5: S5; 6: S6; 7: S7; 8: S8; 9: S9; 10: S10; 11: S11.



Para facilitar a identificação dos participantes, a coluna correspondente aos resultados de cada participante foi numerada, desde o participante número 1 ao participante número 11.


DISCUSSÃO

A estratégia de processamento de sinal é um parâmetro de programação que está diretamente envolvido com os resultados de percepção da fala pós-IC e, neste contexto, o presente trabalho visou analisar e comparar os resultados individuais do desempenho de percepção da fala em crianças usuárias de IC, utilizando as estratégias de processamento do sinal HiRes e HiRes 120, da Advanced Bionics. De acordo os resultados obtidos, foi possível observar que nem todas as crianças avaliadas apresentaram o mesmo padrão de resposta com as diferentes estratégias utilizadas neste estudo.

Analisando o desempenho auditivo na situação de silêncio, algumas crianças apresentaram melhor desempenho auditivo com a estratégia HiRes 120 (S1, S4, S5, S7), outras apresentaram melhor desempenho auditivo com a estratégia HiRes (S2, S9, S11). Ao considerar que a existência de poucos eletrodos intracocleares ativos já proporciona bons resultados de reconhecimento de fala no silêncio9, seria esperado que as informações espectrais adicionais fornecidas pela estratégia HiRes 120 não influenciassem o desempenho auditivo no silêncio.

Na avaliação da percepção da fala na situação de ruído, quando o ruído foi apresentado na posição frontal, as crianças S2 e S11 apresentaram melhor desempenho auditivo com a estratégia HiRes 120 e as crianças S4, S8 e S9 apresentaram melhor desempenho auditivo com a estratégia HiRes. Quando o ruído foi apresentado na posição lateral, as crianças S1, S2, S8, S9 e S11 apresentaram melhor desempenho auditivo com a estratégia HiRes 120 e a criança S6 apresentou melhor desempenho auditivo com a estratégia HiRes. Considerando os resultados de estudos internacionais desenvolvidos com usuários adultos, com deficiência auditiva pós-lingual e que apontam a melhora no desempenho auditivo no ruído com a estratégia HiRes 12010-13, em função do aumento das informações espectrais proporcionadas pela estratégia9, seria esperado que as crianças avaliadas apresentassem melhor desempenho auditivo na situação de ruído com a estratégia HiRes 120.

O fato de uma criança (S10) não ter se adaptado à HiRes também é um dado relevante neste estudo, pois a criança afirmava que a qualidade do som era ruim e que ela não conseguia compreender a fala das pessoas ao usar o programa ajustado com a estratégia de processamento de sinal HiRes.

A fim de verificar se alguma característica do participante influenciou no padrão de resposta obtido com as diferentes estratégias, o desempenho auditivo no ruído foi analisado comparativamente com as características dos participantes (Anexo A). Entretanto, não houve nenhuma característica demográfica ou audiológica, como audição residual (limiares auditivos pré-IC), tempo de privação sensorial, idade na cirurgia de IC, idade no momento da avaliação ou tempo de uso do IC que tenha sido determinante no padrão de resposta apresentado pelo participante do estudo.

Cabe ainda ressaltar que, tanto na situação silêncio quanto na situação ruído frontal e lateral, algumas crianças apresentaram uma melhora no desempenho auditivo de forma longitudinal (S3, S6, S8 - situação silêncio; S5 e S6 - situação ruído frontal; S5 - situação ruído lateral), representado pela redução do LRS ao longo das avaliações, independentemente da estratégia de sinal utilizada no momento da avaliação. Tal resultado pode estar relacionado ao aprimoramento das habilidades auditivas. De acordo com os critérios de inclusão e exclusão do presente estudo, somente as crianças que apresentavam habilidade auditiva de reconhecimento de palavras em conjunto aberto poderiam ser selecionadas para participar desta pesquisa, porém, o fato delas já terem atingindo a categoria máxima, proposta por Geers6, não impede que o usuário de IC tenha sua habilidade auditiva aprimorada ao longo do tempo de uso do dispositivo.

Deste modo, os resultados apresentados neste estudo reforçam a necessidade do olhar clínico para a avaliação dos resultados pós-IC, nas diferentes estratégias de processamento de sinal, uma vez que, às vezes, a estratégia recomendada pela empresa não beneficia todos os usuários de IC da mesma forma11: algumas crianças avaliadas apresentaram melhor desempenho auditivo utilizando a estratégia HiRes e outras, com a estratégia HiRes 120.

Sugere-se, assim, que os centros de IC desenvolvam estudos futuros que comparem as estratégias de processamento de sinal de outros dispositivos de IC, a fim de verificar o desempenho auditivo de seus usuários com a estratégia de processamento de sinal recomendada e as demais existentes em determinado dispositivo.


CONCLUSÃO

De acordo os resultados obtidos, foi possível observar que nem todas as crianças avaliadas apresentaram o mesmo padrão de resposta com as diferentes estratégias utilizadas neste estudo, tanto em situações de silêncio como no ruído.


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1. Doutora em Ciências. Fonoaudióloga do Núcleo do Ouvido Biônico do Hospital Samaritano
2. Professor Titular da Universidade de São Paulo. Coordenadora do Núcleo do Ouvido Biônico - Hospital Samaritano - SP
3. Professor Doutor. Coordenadora do Centro de Pesquisas Audiológicas do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais - Universidade de São Paulo

Centro de Pesquisas Audiológicas, Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais, Universidade de São Paulo - USP - Bauru (SP) - Brasil.

Endereço para correspondência:
Tatiana Mendes de Melo
Rua Porto Alegre, nº 243, apto. 52B
São Paulo - SP. Brasil. CEP: 03185-020
E-mail: tatianamendes@usp.br

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) do BJORL em 17 de maio de 2013. cod. 10915.
Artigo aceito em 23 de junho de 2013.


Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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