ISSN 1806-9312  
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4335 - Vol. 78 / Edição 4 / Período: Julho - Agosto de 2012
Seção: Artigo Original Páginas: 120 a 125
Do nistagmo às provas calóricas com ar e com água
Autor(es):
Anna Carolina Marques Perrella de Barros1; Heloisa Helena Caovilla2

Palavras-chave: líquidos labirínticos, nistagmo fisiológico, testes calóricos, testes de função vestibular, vestíbulo do labirinto.

Keywords: caloric tests, labyrinthine fluids, nystagmus, physiologic, vestibular function tests, vestibule, labyrinth.

Resumo: A prova calórica é uma importante ferramenta na avaliação da função labiríntica.
OBJETIVO: Comparar o nistagmo pós-calórico da prova com ar a 50ºC e 24ºC com o da prova com água a 44ºC e 30ºC. Desenho científico: Estudo clínico cruzado randomizado.
MATERIAL E MÉTODO: 40 indivíduos hígidos submetidos à avaliação da função vestibular incluindo a prova calórica com ar a 50ºC e 24ºC e com água a 44ºC e 30ºC.
RESULTADOS: À comparação das provas com ar e com água, não houve diferença significante entre os valores da velocidade angular da componente lenta (VACL) do nistagmo pós-calórico quanto à ordem de realização das estimulações, entre as orelhas e entre os valores de predomínio labiríntico e de preponderância direcional. Os valores da VACL foram maiores nas estimulações com água (p = 0,008; p < 0,001) e a temperatura fria evocou respostas mais intensas (p < 0,001).
CONCLUSÃO: À comparação entre as provas com ar a 50ºC e 24ºC e com água a 44ºC e 30ºC, observam-se valores de velocidade da componente lenta similares em ambas as orelhas, maiores na temperatura fria e na prova com água e resultados semelhantes de predomínio labiríntico ou de preponderância direcional do nistagmo pós-calórico em ambas as provas.

Abstract: The caloric test is an important tool for the assessment of labyrinthine function.
OBJECTIVE: To compare the nystagmus response in the caloric tests with air at 50ºC and 24ºC and with water at 44ºC and 30ºC. Study Design: Randomized crossover clinical trial.
MATERIALS AND METHODS: 40 healthy individuals were submitted to a neurotological evaluation, including caloric tests with air at 50ºC and 24ºC and water at 44ºC and 30ºC.
RESULTS: Comparing the air and water caloric tests, there were no significant differences among the post-caloric nystagmus slow-phase velocity in relation to the stimulation order, between ears and between the values of unilateral weakness and directional preponderance. The slow-phase velocity values were higher with water (p = 0.008, p < 0.001), and cold stimulation produced stronger responses (p < 0.001).
CONCLUSION: Comparing 50ºC and 24ºC air caloric test and 44ºC and 30ºC water caloric test, we observed similar slow-phase velocity values for both ears, higher responses in the cold temperature and in the test with water, and similar results of unilateral weakness or directional preponderance for post-caloric nystagmus in both tests.

INTRODUÇÃO

A prova calórica, geralmente, é a parte mais informativa da vestibulometria. É o único procedimento que avalia cada labirinto separadamente e permite reconhecer o lado acometido e caracterizar a intensidade da lesão vestibular1,2, apesar de apresentar grande variabilidade intra e inter-individual em seus parâmetros de avaliação2,3.

A estimulação térmica do labirinto provoca corrente endolinfática nos canais semicirculares, polarizando ou despolarizando as células sensoriais da crista ampular e desencadeando o reflexo vestíbulo-ocular. O estímulo quente gera uma corrente ampulípeta, na direção do utrículo, com excitação do canal semicircular lateral estimulado e nistagmo na mesma direção do labirinto em teste. O estímulo frio resulta em uma corrente ampulífuga, em direção contrária ao utrículo, com inibição do canal semicircular estimulado e nistagmo na direção oposta ao labirinto avaliado2-5.

Além das correntes de convecção, outros mecanismos podem estar envolvidos na evocação das respostas calóricas, como a transdução mecânica da cúpula, o efeito térmico nas estruturas neurossensoriais e a adaptação neural, combinados de forma não linear2.

Os órgãos vestibulares, em condições fisiológicas, são sensíveis a estímulos que variam de 0,001 Hz a 8 Hz6, sendo que os canais semicirculares respondem de modo mais eficiente a movimentos angulares de 1 a 6 Hz7.

A prova calórica permite a avaliação do canal semicircular lateral; anormalidades devem ser interpretadas em conjunto com outros testes, pois não indicam, necessariamente, que todo o labirinto está acometido8. Esta prova fornece uma informação parcial sobre o funcionamento vestibular, pois provoca uma corrente endolinfática no canal semicircular lateral correspondente a apenas 0,003 Hz da movimentação angular cefálica7.

Foram idealizados vários métodos para a avaliação da função vestibular por meio da estimulação térmica. Inicialmente, a água era o único elemento empregado para evocar a resposta nistágmica9. Foi também referido o uso de éter e cloreto de etilo10 e preconizados a prova calórica bifásica com ar, em que as temperaturas quente e fria são rapidamente alternadas durante a estimulação, produzindo resposta nistágmica bidirecional11, a prova calórica com mudança térmica contínua, em que a temperatura era regulada durante o teste e reduzida em taxa constante até o surgimento do nistagmo12, e o uso de um balão de silicone no meato acústico externo com água circulante, que permitia a realização da prova em orelhas com membranas timpânicas perfuradas13; a estimulação poderia ser bitérmica alternada, bitérmica simultânea, monotérmica e por meio de apenas provas geladas2.

Irrigadores a ar tornaram-se comercialmente disponíveis por volta da década de 196014 e são amplamente utilizados hoje em dia. No Brasil, um equipamento de estimulação calórica com ar, o Ototermoar, provocou comportamento reacional do labirinto semelhante ao da prova com água em indivíduos hígidos e diferenciou indivíduos hígidos de pacientes com distúrbios vestibulares, permitindo concluir que a prova com ar era tecnicamente viável, passível de ser utilizada na prática clínica15.

O ar constitui um meio mais confortável e seguro para o teste, sem contraindicações para o uso, e pode ser empregado na avaliação de pacientes com perfurações na membrana timpânica, com otites externas e cavidades com mastoidectomia2,10,16-18. Diferentemente da água, não precisa ser coletado durante a irrigação e o tempo inicial necessário para atingir a temperatura quente é menor9.

As propriedades térmicas do ar e da água são significativamente diferentes. A capacidade de manter a temperatura do ar é menor do que a da água19,20. A exigência técnica da prova com o ar é maior16. O modelo e o diâmetro da ponta do irrigador, o quanto é inserido no meato acústico externo, o direcionamento e o fluxo do ar, a temperatura no ambiente de teste e a localização do equipamento na sala de exame podem afetar as características do ar e, assim, a amplitude das respostas pós-calóricas3,16,17,21.

A literatura evidencia a busca dos pesquisadores para definir o melhor procedimento e obter a resposta calórica com o uso do ar. As temperaturas utilizadas na prova calórica com ar quente variaram entre 42ºC e 51ºC e na prova fria entre 20ºC e 30ºC, com fluxos de ar entre 5 e 13L/min e tempo de estimulação de 60 a 100 segundos10,14,17,18,20,22,23.

Na irrigação com água, as temperaturas empregadas equivalem a 7ºC acima e abaixo da temperatura corpórea, 44ºC para a prova quente e 30ºC para a fria. Na irrigação com ar, são necessários gradientes de 13ºC, correspondentes a 50ºC, para a estimulação quente, e a 24ºC para a fria, para evocar uma reposta com amplitude semelhante à obtida pela estimulação com a água2,16,23.

O parâmetro mais importante para a avaliação quantitativa da prova calórica, passível de análise graças à possibilidade de registro da resposta, é a velocidade angular da componente lenta (VACL) máxima, que é proporcional à intensidade do estímulo aplicado24. As estimulações quente e fria com ar habitualmente produzem respostas nistágmicas similares às produzidas com água19,25, com confiabilidade da resposta similar à da prova com água9,19 e confiabilidade teste-reteste adequada26. No entanto, há o relato de que os valores absolutos da VACL foram mais intensos na prova com água17,20 e apresentaram maior variabilidade na prova com ar22,27. Respostas diferentes à comparação entre estímulos quentes e frios são de pouca importância, pois o objetivo primordial da prova calórica é demonstrar se a resposta a um mesmo estímulo quente ou frio é simétrica nas duas orelhas28.

A estimulação calórica com o ar foi questionada devido à variabilidade das suas respostas9,16,27. A variabilidade das respostas pós-calóricas com ar poderia ser explicada pela tendência da temperatura do ar de equilibrar-se com a do ambiente. A utilização de temperaturas mais distantes da corpórea e o aumento no tempo da irrigação e no fluxo ampliam a intensidade da resposta; as variações teste-reteste diminuem quando o fluxo e a duração do estímulo são aumentados e quando a temperatura está próxima à do ambiente22. Em níveis acima de 10 L/min, o desconforto causado pelo estímulo acústico é maior22 e, em níveis abaixo de 5 L/min, a transferência de calor é drasticamente reduzida23.

Pesquisas recentes sobre a prova calórica com água e com ar geralmente abordam temas relacionados aos achados em vestibulopatias. Em nosso meio, nas provas calóricas com ar a 42ºC e 18ºC e com água a 30ºC e 44ºC em vestibulopatias periféricas crônicas, foi encontrada prevalência de casos com anormalidades dos valores de VACL sobre a de predomínio labiríntico e preponderância direcional, e a de predomínio labiríntico sobre a de preponderância direcional29.

A importância diagnóstica da prova calórica e a escassa informação da literatura em nosso meio sobre a comparação entre as estimulações térmicas labirínticas com água e com ar motivaram a realização desta pesquisa.

As temperaturas de 50ºC e 24ºC da prova calórica com ar têm sido recomendadas por centros avançados de Otoneurologia de diversos países e não há em nosso meio nenhum trabalho científico que compare os resultados desta prova com os da prova calórica com água convencional.

O presente estudo tem utilidade prática para a rotina da avaliação da função vestibular e também abre perspectivas para outros estudos com a prova calórica a ar nestas temperaturas, possibilitando uma comparação pertinente com os resultados da literatura internacional.

O objetivo do presente estudo é comparar o nistagmo pós-calórico da prova com ar a 50ºC e 24ºC com o da prova com água a 44ºC e 30ºC.


MATERIAL E MÉTODO

O presente estudo foi realizado após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição, sob número 0054/09. O termo de consentimento pós-informado foi obtido para todos os pacientes antes do início da investigação.

O grupo de estudo foi constituído por 40 indivíduos, voluntários, 25 do gênero feminino e 15 do gênero masculino, com idade entre 18 e 40 anos, sem queixas otológicas.

Como critérios de inclusão, foram selecionados indivíduos hígidos sem sintomas e sinais de alteração do equilíbrio corporal e que não estavam fazendo uso de medicamentos. Foi realizada uma entrevista diretiva para excluir antecedente pessoal de doenças otoneurológicas e uso de medicamentos. Foram, também, excluídos os indivíduos hígidos com resultados alterados no exame vestibular e com nistagmo espontâneo de olhos fechados e/ou pré-calórico, devido à possível influência destes sinais sobre os resultados da prova calórica.

Após inspeção visual do meato acústico externo, para garantir que o mesmo estivesse sem cerúmen ou corpo estranho, os participantes foram submetidos à avaliação da função vestibular4, composta por testes de equilíbrio estático e dinâmico; pesquisa de nistagmo posicional e de posicionamento; e pesquisa de nistagmo espontâneo e semiespontâneo, movimentos sacádicos, rastreio pendular, nistagmo optocinético, prova rotatória pendular decrescente e prova calórica com ar a 50ºC e 24ºC e com água a 44ºC e 30ºC à vecto-eletronistagmografia digital (VENG - Neurograff Eletromedicina Ind. e Com. Ltda. - EPT- Brasil), utilizando otocalorímetro a ar (modelo OAT 10, adaptado para as temperaturas de 5ºC e 24ºC, Neurograff Eletromedicina Ind. e Com. Ltda. - EPT - Brasil) e otocalorímetro a água (modelo OC 214 - Berger). As respostas foram registradas e analisadas no software VecWin 2 (Neurograff Eletromedicina Ind. e Com. Ltda - EPT - Brasil). Antes da coleta de dados, os otocalorímetros foram calibrados, com ajuste da temperatura segundo as especificações técnicas dos fabricantes.

Os indivíduos foram distribuídos em dois grupos de forma randomizada, de acordo com a prova calórica, que foi primeiramente realizada. O Grupo I foi submetido inicialmente à prova calórica com ar e o Grupo II foi submetido inicialmente à prova calórica com água, para evitar uma possível influência da ordem das estimulações, habituação e efeitos residuais de uma prova sobre a outra23.

Previamente à avaliação funcional do sistema vestibular, os pacientes foram orientados a não fumar, não consumir chocolate, bebidas alcoólicas ou cafeinadas nos três dias que antecederam a avaliação. No dia do exame, foram instruídos a não usarem maquiagem, cremes faciais ou lentes de contato.

Na sala de exame, a luminosidade permaneceu reduzida e utilizou-se equipamento de ar condicionado, que manteve a temperatura ambiente em aproximadamente 21ºC, para evitar a interferência de variações térmicas da água e do ar nos resultados.

Para realização da VENG, os pacientes tiveram a pele limpa para possibilitar a colocação de três eletrodos de cloreto de prata ativos e um eletrodo terra. Os eletrodos foram dispostos no canto externo periorbitário direito, no canto externo periorbitário esquerdo e na linha média frontal, utilizando a disposição triangular de derivações, que permite identificar a direção do nistagmo e aferir a velocidade angular de sua componente lenta em três canais de registro30.

A calibração dos movimentos oculares foi realizada no início e, quando necessário, no decorrer do exame e, sistematicamente, antes da prova calórica para minimizar modificações na amplitude da resposta ocasionadas pela variação do potencial córneo-retinal.

Durante a prova calórica com água e com ar, o paciente foi mantido na posição supina com a cabeça elevada 30ºC31. A estimulação térmica foi realizada em cada ouvido separadamente, com ar a 50ºC e 24ºC, em fluxo de 8L/min, durante 60 segundos9,19, respeitando um intervalo de três minutos entre uma estimulação e outra19; e com 250 ml de água, a 44ºC e 30ºC, durante 40 segundos, com intervalo de cinco minutos entre uma estimulação e a seguinte4,32. Foi respeitado um intervalo de 15 minutos após o término da resposta nistágmica da última estimulação da prova calórica com água ou com ar e o início da primeira estimulação da prova seguinte com ar ou com água.

Cada sujeito foi submetido a oito estimulações calóricas. As estimulações calóricas quentes e frias com ar ou com água foram realizadas na seguinte ordem: quente na orelha direita, quente na orelha esquerda, fria na orelha esquerda e fria na orelha direita. Foram utilizadas estratégias como a conversação, a nomeação e o uso de cálculos matemáticos para estimular a atividade mental e evitar inibição cortical da resposta calórica. Presença de vertigem, direção e VACL do nistagmo pós-calórico foram analisadas com os olhos fechados e com os olhos abertos. A VACL foi escolhida como o parâmetro de avaliação da intensidade das respostas.

Todo o registro do nistagmo pós-calórico foi avaliado, sendo selecionado o trecho mais representativo do registro do nistagmo pós-calórico, com as respostas mais intensas em termos de VACL. Os valores percentuais de predomínio labiríntico e de preponderância direcional do nistagmo pós-calórico foram calculados utilizando os valores da VACL nas quatro estimulações com ar e nas quatro estimulações com água33.

Foi realizada análise estatística descritiva para caracterização da amostra. Para as variáveis quantitativas, foram observados os valores mínimos e máximos e calculados os valores de médias e desvios-padrão. Para as variáveis qualitativas, foram calculadas as frequências absolutas e relativas.

O teste qui-quadrado foi utilizado para avaliar a homogeneidade dos grupos I (ar-água) e II (água-ar) em relação às variáveis idade e gênero.

O teste t-Student foi utilizado na análise comparativa dos grupos I (ar-água) e II (água-ar) em relação à média da VACL do nistagmo pós-calórico.

O teste t-Student pareado foi utilizado na análise comparativa entre a orelha direita e esquerda às provas com ar a 50 e 24ºC e com água a 44ºC e 30ºC, na análise comparativa por orelha entre as provas com ar, a 50ºC e 24ºC, e com água a 44ºC e 30ºC, na análise comparativa entre as provas com ar a 50ºC e 24ºC e com água a 44ºC e 30ºC em cada orelha e na análise comparativa entre os valores relativos de predomínio labiríntico e preponderância direcional do nistagmo às provas com ar a 50ºC e 24ºC e com água a 44ºC e 30ºC.

As análises estatísticas foram realizadas pelo programa computacional SPSS 15,0 para Windows (Statistical Package for Social Sciences, versão 15.0, 2006); o nível de significância adotado foi de 5% (α = 0,05). O poder dos testes foi calculado quando houve diferença significante entre os grupos; os valores encontrados variaram de 87% a 100,0%, indicando que o tamanho amostral foi suficiente para se obter mais de 80% de poder.


RESULTADOS

Foram avaliados 40 indivíduos hígidos, 25 (62,5%) do gênero feminino e 15 (37,5%) do masculino, com média etária de 26,45 anos (variação de 18 a 39 anos) e desvio padrão de 5,62 anos. Todos os indivíduos relataram vertigem às estimulações calóricas com ar e com água.

A Tabela 1 apresenta os valores descritivos da distribuição dos indivíduos hígidos nos grupos I (ar-água) e II (água-ar) e a análise comparativa entre os grupos quanto à idade e ao gênero. Não houve diferença estatística significante entre os dois grupos em relação às variáveis idade e gênero.




A Tabela 2 mostra os valores de média, desvio-padrão, mínimo e máximo da velocidade angular da componente lenta do nistagmo pós-calórico nas provas com ar a 50ºC e 24ºC e com água a 44ºC e 30ºC na orelha direita e esquerda, e o p-valor da análise estatística comparativa, considerando a ordem em que as provas foram executadas. Independentemente da ordem de realização das provas, não houve diferença significante entre os valores da VACL do nistagmo pós-calórico com ar e não houve diferença significante entre os valores da VACL do nistagmo pós-calórico com água.




A Tabela 3 apresenta os valores de média, desvio-padrão, mínimo e máximo da VACL e de predomínio labiríntico e preponderância direcional do nistagmo pós-calórico à estimulação com ar a 50ºC e 24ºC e com água a 44ºC e 30ºC e a análise estatística comparativa dos resultados entre as orelhas, as temperaturas e as provas. Não houve diferença estatística significante à comparação dos valores de VACL entre as orelhas nas provas calóricas com ar e com água. Houve diferença estatística significante (p < 0,001) entre os valores de VACL à comparação da prova com ar quente com a prova com ar frio e à comparação da prova com água quente com a prova com água fria, em cada orelha; a temperatura fria evocou respostas mais intensas do que a temperatura quente nas provas com ar e com água. Houve diferença estatística significante (p = 0,008; p < 0,001) entre a prova calórica com ar em relação à prova com água em todas as estimulações; os valores de VACL foram maiores nas estimulações com água do que com ar. Não houve diferença estatística significante entre os valores de predomínio labiríntico (p = 0,761) e de preponderância direcional (p = 0,391) à comparação dos resultados das provas com água e com ar.




DISCUSSÃO

Na comparação entre os resultados nos grupos ar-água (Grupo I) e água-ar (Grupo II), quanto à ordem de realização das provas, não houve diferença estatística significante entre os valores da VACL do nistagmo pós-calórico com ar e entre os valores da VACL do nistagmo pós-calórico com água, não importando qual prova precedeu a outra, descartando um possível efeito de ordem nas respostas pós-calóricas. À semelhança de nossos achados, em outro estudo não houve evidências de adaptação fisiológica do nistagmo pós-calórico em normais, pois a ordem de realização das estimulações também não interferiu na amplitude da resposta34.

Não houve diferença estatística significante à comparação das respostas da orelha direita com as respostas da orelha esquerda nas estimulações a 50ºC e 24ºC da prova calórica com ar e a 44ºC e 30ºC com água, à semelhança do que foi referido por outros autores17,23.

Verificou-se que os valores de VACL foram maiores nas estimulações com água do que com ar, tanto para a orelha direita quanto para a orelha esquerda. Alguns autores também relataram respostas pós-calóricas evocadas por água maiores do que na estimulação com ar14,20,26 ou semelhantes10,17,19,23.

Houve diferença estatística significante à análise comparativa das respostas às estimulações quentes (50ºC com ar e 44ºC com água) e às estimulações frias (24ºC com ar e 30ºC com água) em cada orelha. A temperatura fria provocou respostas mais intensas do que a temperatura quente tanto na prova com ar como na prova com água. À semelhança de nossos achados, foram relatadas respostas maiores na temperatura fria do que na quente na prova com água26,28,35 e com ar26. No entanto, outros estudos mostraram que o estímulo quente provocou respostas mais intensas do que o estímulo frio na prova calórica com água9,14 e na prova com ar9,11, ou que foram obtidos resultados semelhantes nas duas temperaturas à prova com ar14,17,19,23 e com água17,19,23.

Não houve diferença significante entre os valores relativos de predomínio labiríntico e de preponderância direcional do nistagmo nas provas calóricas com ar e com água, à semelhança do que foi encontrado em outros estudos14,23. O indicador clássico de lesões vestibulares periféricas é a comparação das respostas entre as duas orelhas na prova calórica bitérmica, pelo uso da fórmula de predomínio labiríntico22. Foi observado que o uso do ar como estímulo calórico não interfere na medida clínica do predomínio labiríntico27.

O emprego de diversas configurações de fluxo, duração e temperatura do estímulo térmico na avaliação da função vestibular10,14,17,18,20,22,23 e a utilização de distintos protocolos para realizar a prova calórica com água e com ar dificultam a comparação e a integração dos achados dos vários centros de pesquisa, sendo necessário que cada laboratório estabeleça seus próprios valores de referência36.

As diferenças encontradas nas respostas pós-calóricas à comparação com outros estudos em indivíduos hígidos podem ser justificadas pelas propriedades térmicas diferentes da água e do ar como vetores da estimulação labiríntica. Respostas diferentes são esperadas na estimulação com água, que possui calor específico maior do que o ar e é capaz de manter a temperatura no meato acústico externo por mais tempo; o ar foi um substituto satisfatório para a água em 95% dos casos clínicos atendidos em um hospital; os 5% restantes apresentavam hipofunção labiríntica, confirmada com o uso de um estímulo mais intenso, a água gelada19.

Considerando a equivalência entre os valores relativos de predomínio labiríntico e de preponderância direcional do nistagmo pós-calórico na prova com ar e na prova com água nos indivíduos hígidos por nós avaliados e que estes parâmetros são fundamentais para a identificação das disfunções vestibulares, depreende-se que ambas as provas são úteis na rotina otoneurológica.


CONCLUSÃO

À comparação entre as provas com ar a 50ºC e 24ºC e com água a 44ºC e 30ºC, observam-se valores de velocidade da componente lenta similares em ambas as orelhas, maiores na temperatura fria e à prova com água e resultados semelhantes de predomínio labiríntico ou de preponderância direcional do nistagmo pós-calórico em ambas as provas.


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1. Mestre em Ciências - Programa de Pós-Graduação em Distúrbios da Comunicação Humana da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (UNIFESP/EPM) (Fonoaudióloga).
2. Professor Associado Livre-Docente da Disciplina de Otologia e Otoneurologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (UNIFESP/EPM) (Fonoaudióloga).

Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (UNIFESP/EPM).

Endereço para correspondência:
Anna Carolina Marques Perrella de Barros
Rua Baguassu, 141, apto 173. Vl
Regente Feijó - SP. CEP: 03344-015
Email: anna_perrella@yahoo.com.br

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 15 de janeiro de 2012. cod. 8992.
Artigo aceito em 3 de março de 2012.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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