INTRODUÇÃODoença de Rosai-Dorfman (DRD) é caracterizada por proliferação primária de histiócitos nos sinusoides linfonodais1. é uma rara condição proliferativa, geralmente de evolução benigna e autolimitada2. A apresentação clínica clássica é adenomegalias volumosas, indolores, bilaterais em cadeias cervicais. Pode estar associada à febre, perda de peso, leucocitose, provas inflamatórias alteradas e hipergamaglobulinemia policlonal. Os sítios extranodais mais frequentemente acometidos são cavidade nasal e seios paranasais, ocasionando um quadro de obstrução respiratória alta crônica. Na literatura, há também relatos de comprometimentos de outros locais: tecidos moles, Sistema Nervoso Central, pele, globo ocular, ossos, rins, Trato Gastrointestinal, testículos, glândulas salivares e trato respiratório3.
Este relato de caso tem como objetivo descrever uma manifestação atípica de DRD, com comprometimento primário exclusivo de seios paranasais sem linfadenomegalia, Além de reforçar a importância de se pensar em doença sistêmica diante de quadro tomográfico sugestivo de polipose nasosinusal em crianças.
APRESENTAÇÃO DO CASOL.S.O., masculino, apresentava obstrução nasal constante desde os 5 anos, sendo submetido à adenoamigdalectomia. Devido à persistência deste sintoma, foi prescrito corticoide tópico nasal. Aos 10 anos, ocorreu piora importante da obstrução nasal, Além de desnutrição proteico-calórica, perda de peso e Déficit de aprendizagem. Procurou outro serviço, no qual foi realizada TC nos seios da face, evidenciando formação com densidade de partes moles ocupando células etmoidais (destruição dos tabiques intercelulares), em ambos os seios maxilares, com obstrução e alargamento dos complexos ostio-meatais. Imagem com densidade de partes moles na topografia das conchas nasais, laudo sugestivo de polipose naso-sinusal (Figura 1). Ao exame clínico inicial, não foi encontrada linfadenopatia e à videonasofibroscopia evidenciou lesão aspecto granulomatoso em meatos médios bilateralmente.
Figura 1. (a) Tomografia dos seios da face: preenchimento por partes moles de seios etmoidais e maxilares com espessamento ósseo irregular em paredes de maxilares; (b) e (c) Numerosos histiócitos grandes com citoplasma eosinofílico (20X ou 40X); (d) Achados imunohistoquímicos mostraram que a maioria dos histiócitos marcaram positivamente para CD68.
Este paciente foi, então, submetido à cirurgia para exé rese de lesões e diagnóstico histopatológico. Como o achado macroscópico durante o ato cirúrgico tinha aspecto granulomatoso e friável, sugestivos de histiocitose, solicitou-se anátomo-patológico e estudo imuno-histoquímico, suspeitando-se tratar de xantogranuloma juvenil. No estudo microscópio, observou-se a presença de histiócitos, células gigantes e linfócitos, mas na imuno-histoquímica o CD68-positivo e S100-positivo, concluindo tratar-se de Rosai-Dorfman.
Após diagnóstico, foi encaminhado ao serviço de oncohematologia, não sendo encontrado comprometimento sistêmico. Ficou sob observação por 1 ano e só então queixou-se de dor na perna esquerda. Na ressonância, múltiplas lesões nodulares sólidas na medular dos ossos dos membros inferiores, predominando na tíbia esquerda. Aspectos sugestivos de doença neoplásica da medula óssea, compatível com Rosai-Dorfman. Durante um ano fez tratamento quimioterápico. Atualmente, faz avaliação semestral.
DISCUSSÃO E COMENTáRIOS FINAISDRD é mais frequente nas três primeiras décadas de vida. Geralmente, acomete o sexo masculino, 58%4, predominando em afrodescendentes. No caso relatado, o paciente era do sexo masculino, raça parda e tinha 10 anos.
O diagnóstico é feito a partir da imuno-histoquímica com reação positiva para proteínas S100 e CD68.
Desde o início, questionou-se o laudo de polipose nasosinusal da TC de seios da face, por esta ser muito rara em crianças e adolescentes5.
Suspeitou-se de xantogranuloma juvenil como hipótese diagnóstica inicial. Este deve ser considerado no diagnóstico diferencial por tratar-se de uma histiocitose tipo II (não-células de Langerhans), que, normalmente, ocorre na infância. Possui discreto predomínio no sexo masculino. Microscopicamente é caracterizado por histiócitos, células gigantes e células inflamatórias. Características estas compatíveis com DRD, sendo a diferença estabelecida apenas pela imuno-histoquímica6.
Não há consenso na literatura sobre o manejo de pacientes com DRD. O tratamento cirúrgico é indicado para melhora dos sintomas de obstrução.
Este caso ilustrou a diversidade das apresentações clínicas da DRD e a dificuldade de fazer diagnóstico na presença exclusiva de obstrução nasal, Além de alertar sobre a importância de se suspeitar de doença sistêmica diante de quadro sugestivo de polipose nasossinusal em crianças.
REFERÊNCIAS1. Young PM, Kransdorf MJ, Temple HT, Mousavi F, Robinson PG. Rosai-Dorfman disease presenting as multiple soft tissue masses. Skeletal Radiol. 2005;34(10):665-9.
2. Sundaram C, Uppin Shantveer G, Chandrashekar P, Prasad VBN, Umadevi M. Multifocal osseous involvement as the sole manifestation of Rosai-Dorfman disease. Skeletal Radio. 2005;34(10):658-64.
3. Yoon AJ, Parisien M, Feldman F, Young-In Lee F. Extranodal Rosai-Dorfman disease of bone, subcutaneous tissue and paranasal sinus mucosa with a review of its pathogenesis. Skeletal Radiol. 2005;34(10):653-7.
4. Gupta P, Babyn P. Sinus histiocytosis with massive lymphadenopathy (Rosai-Dorfman disease): a clinicoradiological profile of three cases including two with skeletal disease. Pediatric Radiol. 2008;38(7):721-8.
5. Souza BB, Serra MF, Dorgam JV, Sarreta SMC, Melo VR, Anselmo-Lima, Wilma T. Polipose nasossinusal: doença inflama¬tória crônica evolutiva? Rev Bras Otorrinolaringol. 2003;69(3):318-25.
6. Avelino MGA, Pereira FC, Moreira KXR, Fujita RR, Stamm AEC, Weckx LLM. Xantogranuloma juvenil em cavidade nasal. Rev Bras Otorrinolaringol. 2002;68(5):767-9.
1. Doutora em ORL pela UNIFESP-EPM; Professora Adjunta da PUC-GO (médica Otorrinolaringologista do Hospital da Criança de Goiânia e Professora Adjunta da PUC-GO).
2. Graduanda em medicina da PUC- GO (Acadêmica de medicina da PUC-GO).
3. Graduanda em medicina da PUC-GO (Acadêmica de medicina da PUC-GO).
4. Graduanda em medicina da PUC-GO (Acadêmica de medicina da PUC-GO).
5. médica Hemato Pediatra (Hematologista pediátrica).
Hospital da Criança de Goiânia.
Endereço para correspondência:
Rua 86, nº 160. Hospital da Criança
Setor Sul. Goiânia - GO
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 20 de janeiro de 2011. cod. 7527
Artigo aceito em 30 de abril de 2011.