As fronteiras sempre separaram os homens, criando alegações para conflitos de maior ou menor proporção. Não as linhas imaginárias dos mapas ou os marcos nas cidades de países vizinhos, mas a defesa de limites territoriais geográficos.
Na Medicina, para o bem e para o mal, não é diferente. Cirurgiões plásticos defendem que somente eles possam realizar cirurgias estéticas. Reclamam haver 'invasão' de outras especialidades em suas áreas precípuas.
No Brasil, nos demais países sul-americanos e nos norte-americanos, médicos também fazem cirurgias plásticas vinculadas às suas especialidades. Oftalmologistas, por exemplo, respondem não somente pela enucleação ocular, mas pela correção de pálpebras caídas. Mastologistas, após a ressecção de um tumor, colocam próteses de silicone nas mamas das pacientes.
Quem conhece mais os olhos do que os oftalmologistas? Os otorrinolaringologistas dominam conhecimentos sobre a face. Então, por que não poderíamos fazer uma cirurgia plástica ou reparadora da face?
Foi esta posição que levamos, em recente reunião, aos dirigentes da Associação Médica Brasileira (AMB) e Conselho Federal de Medicina (CFM). Ao contrário da postulação de alguns colegas cirurgiões plásticos, acredito haver mercado para todos, e que quanto mais profissionais aptos a fazer cirurgias estéticas, reparadoras ou não, melhor para pacientes e médicos.
Com a maior longevidade, e consequente envelhecimento da pirâmide etária brasileira, as pessoas anseiam, além da saúde, boa aparência. É um desejo natural dos seres humanos. Portanto, necessitaremos de mais médicos habilitados a este tipo de cirurgia. Inclusive, obviamente, otorrinos.
Outra questão a considerar é o caótico trânsito brasileiro que, infelizmente, é repleto de acidentes. Traumas são provocados e temos de atender a estes feridos, com cirurgias reparadoras e estéticas em nossa especialidade.
Não concordo que nos proíbam, por exemplo, de fazer uma rinoplastia puramente estética se somos chamados para fazer a rinosseptoplastia funcional. Nós, otorrinos, somos os mais indicados para comandar estes tipos de procedimentos, e outros correlatos na face. Se analisarmos o grau de dificuldade de uma cirurgia otológica como a descompressão do nervo facial, que é feita pelo médico otorrinolaringologista, por que não fazer uma otoplastia (correção de orelha em abano ou orelha protrusa), cujo grau de dificuldade é muito menor? Igual princípio se aplica a uma parotidectomia em relação a uma ritidoplastia.
Isto não significa invasão de outras áreas, mas trabalhar para dar ao paciente um atendimento completo, com ética, respeito e profissionalismo.
O Sol e as cirurgias plásticas não são privilégio de alguns médicos, mas direitos de todos.
José Eduardo Lutaif Dolci Médico otorrinolaringologista, é presidente da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORL-CCF), professor titular e diretor do Curso de Graduação em Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
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