INTRODUÇÃOO potencial miogênico evocado vestibular (VEMP) configura uma mudança reflexiva no tônus do músculo, denominada de reflexo vestíbulo-cervical, tendo como objetivo estabilizar a cabeça no momento de uma translação inesperada1.
As ondas desse potencial se definem pelas seguintes características:
a) latência: tempo que transcorre desde a estimulação acústica até o aparecimento do valor mais negativo ou positivo das ondas;
b) Morfologia da onda;
c) Amplitude pico a pico ou a diferença de valores entre o onto mais negativo e o mais positivo de uma onda2.
De acordo com a literatura, existem alguns aspectos relacionados com o indivíduo que devem ser considerados no VEMP, como tensão do músculo esternocleidomastoideo (MECM), intensidade do estímulo, idade e gênero3.
Um importante parâmetro para a adequada interpretação do VEMP é o monitoramento do estado de contração do MECM, o qual deve permanecer, durante todo o registro, com nível eletromiográfico elevado4,5. Além da tensão do MECM, a intensidade do estímulo interfere na amplitude desse potencial; porém, não interfere na latência, a qual permanece constante4.
A amplitude do potencial reflete a magnitude do reflexo muscular4. Existe grande variação interpessoal dessa resposta, decorrente da variação de massa e tônus da musculatura individual, o qual é maior nos homens quando comparado às mulheres6,7.
Não existem pesquisas que demonstrem a influência dos gêneros no VEMP, sem a participação da musculatura nas respostas, ou seja, respostas decorrentes apenas da funcionalidade do sistema vestibular, especificamente da participação do sáculo. Dessa forma, este estudo tem como objetivo comparar os parâmetros do VEMP entre os gêneros em indivíduos jovens, utilizando-se monitoramento do estado de contração do músculo, para que o nível de tensão muscular mantenha-se similar para todos os sujeitos estudados.
MATERIAL E MÉTODOO estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição, mediante o Parecer n° 698. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para a participação na pesquisa.
Foram selecionados adultos de ambos os sexos, incluindo-se no estudo, sujeitos com limiares auditivos iguais ou inferiores a 20 dBNA (ANSI -1969), com diferenças entre as orelhas por frequência iguais ou inferiores a 10 dB.
Foram excluídos aqueles que apresentavam exposição a ruído ocupacional ou de lazer, cirurgias no ouvido, mais de três infecções de ouvido no ano corrente, uso de medicação ototóxica, presença de alterações sistêmicas que possam contribuir para patologias cócleo-vestibulares, como diabetes, hipertensão arterial, etc.; alterações hormonais e presença de zumbido, vertigens, tonturas ou outras alterações cócleo-vestibulares.
Foram submetidos ao VEMP 80 indivíduos jovens, sendo 40 homens e 40 mulheres.
Inicialmente, foi aplicado um questionário para a triagem dos participantes. Logo após, foram realizados os seguintes procedimentos: otoscopia, audiometria tonal liminar e VEMP.
O equipamento utilizado para captação do VEMP foi um equipamento desenvolvido no Brasil em duas Universidades Públicas. Os estímulos sonoros foram apresentados por meio de fones de inserção, em ambiente acusticamente tratado.
O registro do VEMP foi realizado por meio de eletrodos de superfície posicionados sobre a pele. O eletrodo ativo foi colocado na metade superior do MECM ipsilateral à estimulação; o eletrodo de referência, sobre a borda anterior da clavícula ipsilateral e o eletrodo terra, na linha média frontal.
Para obtenção do registro dos VEMP no MECM, o paciente permaneceu sentando, com rotação lateral máxima de cabeça para o lado contralateral ao estímulo. O estímulo foi iniciado pela aferência direita e, posteriormente, repetido na aferência esquerda. As respostas foram replicadas, ou seja, registradas duas vezes do lado direito e duas vezes do lado esquerdo.
Foram promediados estímulos
tone burst na frequência de 500Hz, na intensidade de 90 dBNA, utilizando-se um filtro passa banda de 10 a 1000 Hz, com amplificação de 10 a 25 microvolts por divisão. Os registros foram realizados em janelas de 80 ms.
Método EstatísticoOs dados foram tabulados e processados pelo aplicativo para microcomputador
Statistical Package for Social Sciences (SPSS) versão 16.0. Para a descrição dos dados, fez-se uso da apresentação tabular e gráfica das médias, dos desvios-padrão e dos percentis. A normalidade das amostras foi observada por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov.
Após os dados obtidos serem caracterizados com a utilização de técnicas de estatística descritiva, aplicou-se o teste não-paramétrico de Mann-Whitney para comparação das variáveis. Os valores foram considerados significativos para
p menor que 0,05 (
p<0,05). O valor do erro beta admitido foi de 0,1.
RESULTADOSPara análise dos resultados, foi utilizado o Teste de Mann-Whitney com nível de significância de 5% (
p = 0,05). A análise referiu-se às latências e às amplitudes absolutas de P13 e N23 e ao índice de assimetria da amplitude. As variáveis referentes às respostas do VEMP foram comparadas quanto ao lado avaliado e quanto ao gênero.
Ao confrontar os lados direito e esquerdo, verificou-se que não houve diferença estatisticamente significativa entre os resultados de latência e amplitude de P13 e de N23 (Tabelas 1 e 2).
Ao comparar os achados em função do gênero, não se constatou diferenças estatisticamente significativas em relação à latência e amplitude, para as ondas p13 e n23 (Tabelas 3). O valor do índice de assimetria para a amplitude variou de 26,56% a 32,98%.
DISCUSSÃOEm relação à frequência do estímulo acústico, verifica-se uma variedade de frequências descritas. A opção por 500 Hz como estímulo deve-se às melhores respostas encontradas em frequências iguais ou inferiores a esta4,8-9.
A colocação dos eletrodos de superfície no MECM foi a técnica mais utilizada, pois, segundo literatura, as respostas são mais consistentes e homogêneas2,9-10. Em relação ao local da colocação do eletrodo no MECM para realizar o VEMP, pesquisas sugerem que o terço médio desse músculo é o melhor local para o registro da resposta11-15. Estudos demonstram que a posição que promove a melhor ativação do MECM é a rotação lateral máxima da cabeça, com o indivíduo sentado16-18.
A análise das respostas do VEMP obtidas nesta amostra de indivíduos jovens normais mostrou resultados similares a outros estudos, quanto aos valores de latência e amplitude2,4,9.
Ao confrontar os lados direito e esquerdo, verificou-se que não houve diferença estatisticamente significativa entre os resultados de latência e amplitude de P13 e de N23, indo de acordo com alguns estudos2,12,19, que afirmam não encontrar diferenças estatisticamente significativas entre os resultados.
Não houve mudanças no VEMP relacionadas com o gênero para a latência e absoluta das ondas P13 e N23, e diferença de latência interaural entre os dois componentes, corroborando com a literatura2,20.
A resposta da amplitude pode ser influenciada pelo nível de contração muscular21. Possivelmente, esta foi a razão pela qual não se obtiveram valores diferentes entre os gêneros, pois houve um monitoramento da tensão do MECM durante todo o exame, para que a diferença entre os mesmos fossem eliminadas e apenas a função sáculo fosse realmente avaliada, indo ao encontro de alguns estudos22 e contra outros9.
CONCLUSÕESNão houve diferença entre os gêneros quanto aos fatores latência e amplitude por haver um monitoramento da tensão do músculo esternocleidomastoideo durante o exame.
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1. Graduação em Fonoaudiologia, Fonoaudióloga
2. Graduação em Fonoaudiologia, Fonoaudióloga
3. Graduanda em Fonoaudiologia, Estudante
4. Doutorado em Otorrinolaringologia, USP. Professor da Universidade Federal de Sergipe
5. Doutor em Física Aplicada à Medicina e Biologia, USP. Professor da Universidade Estadual de Alagoas - UNCISAL
6. Doutorado em Física Aplicada à Medicina e Biologia, USP. Coordenador de Formação em Recursos Humanos em C&T da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Alagoas - FAPEAL
Laboratório de Instrumentação e Acústica (LIA), Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (UNCISAL).
Endereço para correspondência:
Pedro de Lemos Menezes
Rua Dr. Antônio Cansanção 55 apto. 703 Ponta Verde
Maceió AL 57035-190
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 5 de maio de 2010. cod. 7071
Artigo aceito em 21 de junho de 2010.