INTRODUÇÃOA deficiência auditiva pode levar a múltiplos comprometimentos que interferem no desenvolvimento lingüístico, educacional e psicossocial da criança. Assim, a avaliação auditiva na faixa etária escolar é necessária para a identificação e correção precoce das alterações auditivas.
A privação sensorial da audição nos primeiros anos de vida provoca um atraso na aquisição e desenvolvimento da linguagem que interfere no desenvolvimento social, psíquico e educacional da criança, e torna-se essencial que o comprometimento auditivo seja detectado o mais cedo possível.
Doenças de orelha média na infância geralmente são responsáveis por grande incidência de alterações auditivas devido à perda auditiva condutiva, geralmente resultado de otites médias secretoras, como referido por Grimes1 (1985).
A rubéola congênita constitui um fator etiológico significativo de deficiência auditiva com predomínio de perda auditiva neurossensorial de grau profundo ou moderado simétrico sendo necessário seu diagnóstico precoce para adaptação de próteses auditivas segundo Azevedo et al2 (1989).
A audição normal é fundamental para o desenvolvimento da linguagem, que favorece a interação social e a aquisição de conhecimentos além de tornar possível transmitir pensamento e sentimentos, assim é imprescindível que o diagnóstico da deficiência auditiva seja feito o mais precoce possível, como referido por Abe & Stamm3 (1991) e Costa et al4 (1991).
A deficiência auditiva pode resultar de diversas etiologias como as genéticas e as devido à predominância de fatores ambientais. A predominância acentuada dos casos de etiologia ambiental reflete as condições médico-sanitárias da população, de cuja melhoria depende a profilaxia da deficiência auditiva em nosso meio, segundo Simões & Maciel-Guerra5 (1992).
As crianças com deficiência auditiva devem ser avaliadas em relação ao tipo da perda auditiva, sua severidade, identificação de sua etiologia, para que seja realizada a adequada reabilitação. A perda auditiva ocorre de duas formas: a condutiva e a neurossensorial. A perda condutiva é atribuída à otite média, com perda de leve a moderada, e à malformação da orelha média e/ou externa, com perda moderada a severa. A perda neurossensorial pode ter várias etiologias como hereditária, perinatal, rubéola, meningite, ototoxicidade, adquirida e outras, como relatado por Todd6 (1994).
A perda auditiva adquirida pode ser relacionada à poluição, principalmente industrial, devido a metais pesados como o chumbo, referido por Osman et al7 (1999).
No caso da otite média crônica é importante a prevenção de complicações severas, sendo necessário o diagnóstico precoce e seu tratamento cirúrgico, como referido por Vartiainen8 (1998).
A prevalência de perda auditiva em escolares dobra quando é incluído o estudo com crianças portadoras de perda auditiva neurossensorial mínima; existe maior dificuldade para o progresso educacional e importante alteração na performance escolar, segundo Bess et al9 (1998).
A presente pesquisa objetiva identificar e quantificar as alterações audiométricas mais freqüentes em escolares de escola pública.
CASUÍSTICA E MÉTODOApós autorização pela comissão de ética em pesquisa foi realizado o estudo no Ambulatório de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás, no mês de novembro de 1998.
Foram avaliados 121 escolares da 1ª à 8ª série, de escola pública do município de Goiânia, com faixa etária de 7 a 14 anos, avaliados por médicos otorrinolaringologistas através de exame clínico otorrinolaringológico, anamnese e otoscopia, audiometria tonal e imitânciometria, sendo que foi realizada a remoção de cerume quando necessário para a execução dos exames audiometricos.
Nas audiometrias as perdas auditivas foram planas, sendo considerado normal até 15 dB e leve até 25 dB.
RESULTADOSEm audiometrias realizadas em 121 escolares, totalizando 242 orelhas, foram encontradas: 184 (76%) orelhas com audiometria dentro dos limites da normalidade e 58 (24%) orelhas com audiometria alterada (Gráfico 1).
As alterações audiométricas mais freqüentes foram: perda auditiva condutiva leve em 26 (12%) sendo 16 (8%) esquerdas e 9 (4%) direitas, perda auditiva neurossensorial leve em 15 (7%) orelhas sendo 5 (2%) esquerdas e 10 (5%) direitas (Gráfico 2, 3 e 4).
Imitanciometrias realizadas nas 242 orelhas obtendo curvas de Timpanometrias: Tipo "A" 230 (94%), Tipo "B" 6 (3%) e Tipo "C" 6 (3%). Reflexos acústicos presentes em 236 (97%) e ausentes em 6 (3%) (Gráfico 3).
A otoscopia apresentou alterações compatíveis com otite média secretora, com secreção em ouvido médio e bolhas em 6 orelhas (3%), não foram encontras perfurações de membrana timpânica ou retrações e as outras membranas timpânicas se apresentaram sem alterações.
Gráfico 1. Gráfico das audiometrias normais 76% e alteradas 24%.
Gráfico 2. Gráfico demonstra: audiometrias normais, 184 orelhas, perdas auditivas condutivas, 26 orelhas e perda auditiva neurossensoriais leves, 15 orelhas.
Gráfico 3. Timpanometrias alteradas sendo curvas: Tipo "A" 94%, Tipo "B" 3% e Tipo "C", 3%.
Gráfico 4. Perda auditiva condutiva nas orelhas: esquerdas, 16 e direitas, 9.
Gráfico 5. Perda auditiva neurossensorial leve em orelhas: esquerdas, 5 e direitas, 10.
DISCUSSÃOA alterações auditivas na faixa etária escolar devem ser identificadas e corrigidas precocemente, porque a deficiência auditiva interfere no desenvolvimento lingüístico, educacional e psicossocial da criança, como referido por Abe & Stamm (1991) e Costa et al (1991).
Foi identificada incidência de perda auditiva condutiva como resultado de otites médias secretoras em evolução ou em involução, relacionadas com a presença de timpanometrias com curva tipo B nos casos em evolução e timpanometrias tipo C nos casos em involução que ainda apresentavam disfunção tubária, como observado por Grimes (1985).
Salientamos a necessidade de investigação das etiologias das deficiências auditivas neurossensoriais tentando identificar: rubéola congênita, causas genéticas, fatores ambientais, poluição industrial e otite média crônica como citado por Grimes (1985), Azevedo et al (1989), Simões & Maciel-Guerra (1992), Todd (1994), Vartiainen (1998) e Osman et al (1999).
Existe a necessidade do diagnóstico precoce para a realização de tratamento e adequada reabilitação das crianças com perdas auditivas nesta faixa escolar, como referido por Todd (1994).
A incidência de perda auditiva condutiva e neurossensorial leves nos escolares pode estar relacionada com o baixo rendimento escolar destas crianças, concordando com Bess et al (1998).
CONCLUSÕESA análise de nossos resultados permite concluir que a incidência de disacusia leve é significativa na faixa escolar, sendo mais freqüente a disacusia de condução que a neurossensorial no grupo estudado o que compromete a atenção e audição do escolar, sendo necessário o seu diagnóstico e tratamento precoce para melhorar o rendimento escolar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS1. Grimes CT. Audiologic Evaluation in Infancy and Childhood. Pediatric Annals 1985;14:211-9.
2. Azevedo MF, Vilanova LCP, Carvalho RMM, Garcia VL, Fujinami AA. Rubéola congênita: caracterização dos aspectos clínicos e audiológicos. Acta Awho 1989;8:97-104.
3. Abe LMO, Stamm DG. Detecção Precoce da Deficiência Auditiva. Ars Cvrandi - A revista do clínico geral 1991;37-43.
4. Costa EA, Ferreira RPI, Mari AR. Da necessidade de se identificar a deficiência auditiva na criança o mais cedo possível. Jornal de Pediatria 1991;67:137-41.
5. Simões AM, Maciel-Guerra AT. A surdez evitável: predominância de fatores ambientais na etiologia da surdez neurossensorial profunda. Jornal de Pediatria 1992;68:254-57.
6. Todd NW. At-risk populations for hearing impairment in infants and young children. International Journal of Pediatric Otorhinolaryngology 1994;29:11-21.
7. Osman K, Pawlas K; Schutz A, Gazdzik M, Sokal JA, Vahter M. Lead exposure and hearing effects in children in Katowice, Poland. Environ Research Section 1999;80:1-8.
8. Vartiainen E. Changes in the clinical presentation of chonic otitis media from the 1970s to the 1990s. The Journal of Laryngology and Otology 1998;112:1030-37.
9. Bess FH, Dodd-Murphy J, Parker RA. Children with minimal sensorineural hearing loss: prevalence, educational performance, and functional status. Ear & Hearing 1998;19:339-54.
1 Mestre em Otorrinolaringologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo e Doutoranda em Otorrinolaringologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
2 Mestrando em Otorrinolaringologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
3 Preceptor da Residência Médica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás.
4 Residente de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás.
Instituição: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás.
Endereço para correspondência: Simone Adad Araújo - Rua 20, nº 324, apto 201, Setor Central, Goiânia/Goiás CEP 74030-110 - Telefone (0xx62) 224.2282
Apresentado no 35º Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia e 9º Congresso Iberolatinoamericano de Otorrinolaringologia.
Artigo recebido em 01 de novembro de 2001. Artigo aceito em 20 de dezembro de 2001.