INTRODUÇÃOO ruído é um dos agentes físicos que mais ocorrem no âmbito do trabalho, sendo um dos principais problemas identificados na área industrial, nos meios de transportes e no convívio social.
A exposição prolongada a sons de forte intensidade produz sucessivas mudanças na estrutura da orelha interna, inicialmente transitórias e posteriormente permanentes. O resultado final é a lesão das células sensoriais, e a expressão, em grau máximo, é a destruição da maioria das células ciliadas do órgão de Corti e consequente perda auditiva induzida pelo ruído (PAIR). Estudos experimentais evidenciaram o comprometimento de estruturas neurais na PAIR1-3. Estes estudos constataram, além das alterações degenerativas nas células ciliadas externas e internas, o comprometimento de sinapses neuronais proximais às células sensoriais e a degeneração de fibras nervosas aferentes do nervo coclear. Estes autores sugeriram duas hipóteses que explicariam o dano neuronal: hiperatividade neural pela estimulação acústica excessiva e/ou resposta neuronal à degeneração de células ciliadas.
A PAIR é causada por exposição do indivíduo a uma atividade exercida sob uma intensidade acima de 85 dB Nível de Pressão Sonora (NPS), oito horas por dia, regularmente, por um período de vários anos, instalando-se em geral nos primeiros cinco anos de exposição4. Esta apresenta como características principais ser sensorial, irreversível e, na maioria dos casos, bilateral e simétrica. Quanto ao espectro de frequências atingidas, a PAIR manifesta-se predominantemente nas frequências de 3, 4 ou 6 kHz e, com a continuidade da exposição sonora, estende-se às frequências adjacentes, as quais levam mais tempo para serem comprometidas.
A PAIR é observada e estudada em diversas categorias profissionais, dentre elas os motoristas de ônibus coletivo. Vários fatores contribuem para o desenvolvimento de perdas auditivas nesta categoria profissional, tais como a localização do motor na posição dianteira e o alto nível de ruído do ambiente urbano5. Vários estudos constataram a PAIR em motoristas de ônibus coletivo, tendo sido relatada uma prevalência de 32,6% a 55,4%6-10. No estudo de Fernandes et AL.9, em que os todos os ônibus possuíam motor dianteiro, a perda auditiva foi mais acentuada em 49,1% das orelhas direitas e 62,8% das orelhas esquerdas.
A audiometria é atualmente o exame complementar diagnóstico mais utilizado para detectar a perda auditiva induzida por ruído. Quando necessário, deve-se utilizar outros testes complementares, tais como imitanciometria, logoaudiometria, emissões otoacústicas evocadas (EOAE), e Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico (PEATE)4,11.
O PEATE é um método simples, objetivo e não invasivo de avaliação da via auditiva neural que permite a predição do limiar psicoacústico através do limiar eletrofisiológico. Em raros casos de simulação não é possível confiar na avaliação audiométrica, pois depende da resposta do paciente. Esta situação obriga o otorrinolaringologista ou médico do trabalho a solicitar exames objetivos, como o PEATE e/ou EOAE. Portanto, torna-se fundamental conhecer os tipos de respostas eletrofisiológicas mais comuns encontradas em indivíduos com PAIR, e desta forma permitir o diagnóstico audiológico mais preciso.
Vários estudos foram realizados com o intuito de observar alterações do PEATE em sujeitos com PAIR. Attias, Pratt12 estudaram, prospectivamente, as mudanças nos traçados do PEATE de 10 operadores de máquinas do gênero masculino com idade entre 18 e 21 anos, expostos a ruído de 112 a 117 dB (A) por oito horas diárias, por 14 meses. Os autores observaram que na população estudada houve modificação das latências absolutas das ondas precoces, porém sem influência significativa na condução neural central. Estudos clínicos controlados com trabalhadores de diversas ocupações profissionais, sem antecedentes de afecções otológicas, com exposição a ruído superior a 85 dB (A) por oito horas diárias e tempo de exposição acima de cinco anos, também não encontraram evidências de comprometimento das vias auditivas neurais nos pacientes estudados13-15. Noorhassim et al.16 avaliaram o PEATE de 22 trabalhadores do gênero masculino entre 50 e 69 anos, com ocupações profissionais diversas e exposição há pelo menos 10 anos a um ambiente de trabalho com intensidade sonora superior a 90 dB (A). O PEATE foi realizado e suas respostas foram analisadas e comparadas com os dados de normatização do aparelho. Dos PEATEs analisados, 72,7% (32/44) estavam alterados, e a prevalência de alterações foi maior entre os pacientes com maior grau de perda auditiva. Houve aumento das latências absolutas médias de PI, PIII e PV, além de prolongamento das médias de LIP III-V e LIP I-V. Os autores associaram as alterações eletrofisiológicas do PEATE à lesão das vias auditivas neurais pela exposição crônica ao ruído. Em função da faixa etária estudada (60 ± 8,7 anos), não excluíram a possibilidade de presbiacusia como fator contribuinte. Attias et al.17 avaliaram, em estudo clínico caso/controle, o PEATE em 13 indivíduos (21 orelhas) entre 21 e 45 anos, sem antecedentes de afecções otológicas e com zumbido induzido por ruído. Os pacientes avaliados exerciam diferentes atividades profissionais, com exposição a ruído acima de 85 dB (A) por mais de cinco anos. No grupo de estudo foram observados potenciais com amplitudes médias significativamente menores, médias das latências absolutas de PIII e das LIP I-III significativamente mais prolongadas. Os autores concluíram que no grupo de estudo ocorreu um comprometimento funcional da via auditiva neural proximal à orelha interna. Thakur et al.18, em estudo clínico caso/controle, avaliaram o PEATE de 24 sujeitos do gênero masculino com idade média de 48 anos (± 7,593), que trabalhavam em diversos setores de manutenção elétrica e mecânica do aeroporto de Mumbai com nível de exposição sonora média de 95 a 110 dB (A) por oito horas diárias durante 15 a 30 anos. No grupo de estudo, foi encontrado um prolongamento estatisticamente significante das latências absolutas médias de PIII na orelha direita e de PIII, PV e LIP I-III na orelha esquerda. Os autores concluíram que a exposição sonora elevada por vários anos no aeroporto contribuiu para as alterações encontradas no PEATE destes trabalhadores, e que estas foram sugestivas de comprometimento da condução neural das vias auditivas até tronco encefálico alto.
A falta de estudos sobre as alterações do PEATE em motoristas de ônibus com PAIR e a disparidade de resultados dos trabalhos anteriores justificou esta pesquisa.
O objetivo deste trabalho é avaliar, pelo potencial evocado auditivo de tronco encefálico, o comportamento das latências absolutas dos potenciais PI, PIII e PV e das LIP I-III, LIP III-V e LIP I-V em uma amostra de motoristas de ônibus urbano com PAIR, comparado a um grupo de indivíduos normo-ouvintes e sem exposição a ruído, com a finalidade de verificar se existe comprometimento das vias auditivas neurais no grupo de estudo.
MATERIAL E MÉTODOFoi feito um estudo clínico prospectivo controlado. A pesquisa, submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição, sob número de projeto 16/06. Após aprovação, procedeu-se a coleta de dados no período de outubro de 2006 a janeiro de 2008. A seleção dos pacientes do grupo de estudo, sequencial, deu-se pelo encaminhamento de trabalhadores de uma empresa de ônibus urbano para realização de exame audiométrico periódico. Para o grupo controle, foram selecionados voluntários. Todos os sujeitos assinaram o Termo de Consentimento livre esclarecido para participação no estudo.
O grupo de estudo (G.PAIR) foi constituído por 50 sujeitos do gênero masculino (100 orelhas), com idade entre 27 e 40 anos (média de 37,5 anos), numa população de motoristas de ônibus urbano com motor dianteiro e exposição sonora média diária de 85 a 93 dB (A) para uma jornada de 8 horas. Os dados da exposição sonora destes trabalhadores foram obtidos a partir da observação dos relatórios de dosimetria realizados pelo setor de Engenharia e Segurança do Trabalho da própria empresa. Para o grupo controle (G.C.), foram selecionados 20 sujeitos (40 orelhas) do gênero masculino, com idade entre 29 e 40 anos (média de 34,2 anos), normo-ouvintes e sem antecedentes de exposição a ruído.
Foram incluídos no G.PAIR motoristas de ônibus com os seguintes critérios de inclusão: tempo de trabalho na empresa igual ou superior a cinco anos; ausência de antecedentes pessoais de afecções otológicas pregressas; perfil audiométrico com perda auditiva sensorioneural somente nas frequências sonoras entre 3 a 6 kHz, bilateralmente; limiares auditivos tonais entre 3 a 6 kHz não superiores a 45dB NA; índice percentual de reconhecimento de fala superior a 90%; imitanciometria com timpanometria dinâmica tipo "A" de Jerger e presença de reflexo estapédico contralateral de 0,5 a 4kHz; repouso auditivo de 14 horas para execução dos testes auditivos e do PEATE. Foram critérios de exclusão do G.PAIR: antecedentes pessoais de doenças neurológicas; atuação em outra atividade laborativa e/ou de lazer com exposição a ruídos; exposição pregressa a solventes orgânicos.
Para inclusão no G.C. foram selecionados indivíduos com as seguintes condições: ausência de antecedentes de afecção otológica prévia; ausência de antecedentes de exposição a ruído e/ou trauma sonoro; limiares auditivos tonais de no máximo 25 dB NA para as todas as frequências do audiograma (0,25 a 8 kHz); índice percentual de reconhecimento de fala superior a 90%; imitanciometria com timpanometria dinâmica tipo "A" de Jerger e presença de reflexo estapédico contralateral de 0,5 a 4kHz.
Os pacientes foram avaliados através de anamnese, seguindo um roteiro de acordo com os critérios de inclusão e exclusão. Todos os pacientes foram submetidos à otoscopia. A audiometria tonal foi realizada pela técnica descendente-ascendente, pela via aérea nas frequências de 0,25, 0,5, 1, 2, 3, 4, 6 e 8 kHz. Quando detectado, no teste pela via aérea, limiar auditivo igual ou maior a 25 dB, o mesmo foi feito pela via óssea nas frequências de 0,5, 1, 2, 3 e 4 kHz. Hz. O índice percentual de reconhecimento de fala foi feito em intensidade confortável para o paciente, esta determinada a partir da média nas frequências sonoras de 0,5, 1, 2 kHz. A audiometria foi realizada com Audiômetro Interacoustics® AC33 e a imitanciometria com imitanciômetro Interacoustics® AT 235, calibrados de acordo com a Rede Brasileira de Calibração e segundo a norma ISO 8253-1. O PEATE foi realizado com equipamento Smart Intelligent Hearing System® - Siemens, em sala silenciosa, com os pacientes acomodados em uma poltrona reclinável. Procedeu-se a limpeza da pele com éter e a colocação de eletrodos descartáveis Meditrace® na região correspondente às apófises mastoides (M1 e M2) e na parte superior da fronte (Fpz), de acordo com o Sistema Internacional de Eletrodos Encefálicos 10/20. A impedância elétrica máxima entre os eletrodos admitida foi abaixo de 5 kOhms. Para estimulação acústica foram utilizados fones de inserção (tipo ER3A Insert Earphones). A estimulação foi monoaural, ipsilateral constituída por cliques não filtrados de polaridade rarefeita e com frequência interestímulo de 19,3/s a uma intensidade de 80 dB NA, e número total de estímulos de, pelo menos, 1.000 cliques. O índice de rejeição aceito para o teste foi de no máximo 20%. Foram executadas duas séries de estímulo em cada orelha para certificação da reprodutibilidade do PEATE. Todos os exames foram iniciados pela orelha direita. Ao final dos testes, os traçados foram analisados quanto à ocorrência de PI, PIII e PV e quanto aos valores das latências absolutas e das LIPI-III, LIPIII-V e LIPI-V nas orelhas direitas e esquerdas.
Para todas as variáveis das latências absolutas e LIPs foram calculadas as médias e os desvios-padrão. Para análise da diferença estatística entre as orelhas direita e esquerda em ambos os grupos foi aplicado o teste de Wilcoxon. A seguir, as variáveis dos grupos controle e PAIR foram analisadas comparativamente, na pesquisa de diferenças estatisticamente significantes. A análise das diferenças entre os grupos foi realizada aplicando-se o teste de Mann-Whitney. Admitiu-se o nível de significância de 5% (α = 0,05) em todos os testes estatísticos aplicados.
RESULTADOSNo grupo PAIR a comparação da lateralidade das orelhas, pelo teste de Wilcoxon, das médias dos limiares tonais nas frequências audiométricas de 3, 4 e 6kHz, demonstrou que os mesmos foram significativamente maiores na orelha esquerda (Tabela 1).
No grupo controle, os potenciais PI, PIII e PV foram identificados em todas as orelhas.
No grupo de PAIR, a ausência PI foi identificada em 18% (N=9) das orelhas, das quais 10% (5/50) à direita e 08% (4/50) à esquerda. A ausência de PI e PIII ocorreram em 10% orelhas (N=5), das quais 02% (1/50) à direita e 08% (04/50) à esquerda. A ausência de PI, PIII e PV ocorreram em 02% (01/50), na orelha esquerda. Estes valores estão representados nos Gráficos 1 e 2, separadamente, pela lateralidade da orelha.
Gráfico 1. Prevalência de PI, PIII e PV, na orelha direita do G.PAIR
Gráfico 2. Prevalência de PI, PIII e PV, na orelha esquerda do G.PAIR
Para análise das diferenças estatísticas entre as orelhas direitas e esquerdas em cada grupo, o teste de Wilcoxon demonstrou que em ambos os grupos, G.C. (p = 0,0182) e G.PAIR (p = 0,0020), a latência média de PI da orelha direita foi significativamente maior que a da orelha esquerda. No G.PAIR, a média da LIPI-III (p = 0, 0278) da orelha esquerda foi significativamente maior que a da orelha direita. A Tabela 2 demonstra a média e o desvio padrão das latências absolutas de PI, PIII e PV, e das LIPI-III, LIPIII-V e LIPI-V, de acordo com a orelha e com o grupo de estudo. A Tabela 3 exibe os níveis descritivos de "p", obtidos com o teste de Wilcoxon.
Quanto à comparação das latências médias entre os grupos segundo a lateralidade, foi observado um prolongamento estatisticamente significante das três variáveis, PI, PIII e PV em ambas as orelhas, no grupo PAIR. (Tabelas 4 e 5)
Quanto à comparação entre os grupos, consideradas a lateralidade da orelha e a média das LIPs, houve prolongamento da LIPI-III em ambas as orelhas e da LIPI-V da orelha esquerda, no grupo PAIR. (Tabelas 6 e 7).
DISCUSSÃOEstudos experimentais evidenciaram o comprometimento de estruturas neurais na PAIR1-3, provavelmente secundário à degeneração de células ciliadas e/ou consequente à hiperatividade neural pelo excesso de estimulação acústica. Vários autores, através do PEATE, pesquisaram se há evidências de comprometimento neural em indivíduos com PAIR, mas os resultados encontrados foram díspares em função dos métodos de estudo e do perfil da amostra12,18. Além disso, nos trabalhos destes autores, várias ocupações profissionais foram contempladas como objeto de estudo; entretanto, na literatura pesquisada, a avaliação em motoristas de ônibus urbano foi limitada às pesquisas de prevalência e de fatores de risco de PAIR5,10.
O presente estudo procurou avaliar uma amostra homogênea, com a escolha de sujeitos com a mesma profissão e, portanto, exposição a intensidades sonoras similares; de perfis audiométricos semelhantes, caracterizados por perda auditiva sensorioneural leve, a fim de evitar dificuldade de obtenção dos registros do PEATE em função de PAIR em grau moderado ou maior; de uma amostra com idade não superior a 40 anos para evitar influências decorrentes da presbiacusia eventualmente associada à PAIR. A imitanciometria foi realizada para verificar a integridade funcional do sistema tímpano ossicular e o repouso auditivo de 14 horas foi importante para afastar alterações transitórias do limiar auditivo. A escolha do período de trabalho acima de cinco anos fundamentou-se no fato de que a maioria das PAIR se instala nos primeiros cinco anos de exposição4. No presente trabalho, foram excluídos do grupo de estudo indivíduos com doenças neurológicas pregressas e com exposição a solventes orgânicos, para evitar a possibilidade de alteração do PEATE decorrentes destes fatores, preocupação também demonstrada por vários autores13,14,17,18.
A escolha do perfil audiométrico dos pacientes deste estudo, caracterizado por perda auditiva sensorioneural restrita às frequências de 3 a 6 kHz e com limiares tonais não superiores a 45 dB pode se constituir em um viés nos resultados aferidos, pois não contemplou a avaliação dos portadores de PAIR em grau moderado a severo; entretanto garantiu maior reprodutibilidade e sensibilidade do PEATE sobre possíveis alterações neurais nos primeiros anos de instalação da PAIR.
A média das latências absolutas de PI da orelha direita foi significativamente maior que a da orelha esquerda em ambos os grupos. É importante ressaltar que, neste trabalho, todos os PEATEs foram iniciados sistematicamente pela orelha direita, fato que pode ter exercido influência na produção de um potencial com latência mais prolongada em função de um estado de vigília mais alerta e ou de maior tensão dos pacientes na fase inicial do registro dos traçados.
Em portadores de PAIR, diversos autores observaram o prolongamento significativo das latências absolutas de PI, PIII, PV e da LIPI-III12,17,18, resultados semelhantes aos do presente trabalho. Neste trabalho, na orelha esquerda do G.PAIR, a média da LIPI-V apresentou prolongamento significativo, à custa do prolongamento da LIPI-III. Estes dados indicaram que, além da lesão coclear, houve danos na sinapse neural das células ciliadas e nas fibras neurais do nervo coclear (1); a diferença da média das LIPIII-V entre os grupos, controle e PAIR, não foi significativa em ambas as orelhas, o que sugeriu integridade anatomofuncional das vias neurais do núcleo coclear ao lemnisco lateral (2); que houve maior comprometimento funcional das vias auditivas neurais à esquerda.
No presente estudo, identificou-se a ausência de PI em 18% das orelhas, de PI e PIII em 10% e potenciais de PEATE não detectáveis em 2% no G.PAIR. Estas prevalências, relativamente baixas, são justificadas pelo fato da amostra ter sido constituída por portadores de PAIR leve. As ausências de PI e de PIII também foram notadas em diversos estudos13-16, e esta ausência foi mais frequente em perdas auditivas mais severas. Observa-se, nestas pesquisas, que a condução neural não se mostrou afetada, pelo fato das latências de PV não estarem prolongadas, contrapondo-se aos resultados encontrados no presente trabalho. Neste, a ausência de potenciais PI e ou PIII foi mais prevalente na orelha esquerda, o que foi justificado pelo seu maior comprometimento funcional.
Noorhassim et al. (1996)16 também observaram, em seu trabalho, prolongamentos das latências de PI, PIII e PV, e das LIPI-V e LIPIII-V; entretanto, em função da faixa etária estudada (60 ± 8,7 anos), a possibilidade de coexistência de presbiacusia não pôde ser afastada. No presente estudo para evitar este viés, procurou-se avaliar sujeitos com idade máxima de 40 anos.
Neste trabalho a média das LIPI-V foi significativamente mais prolongada na orelha esquerda, quando comparada à do grupo controle, da mesma forma que foi constatada por Thakur et al.18. Por outro lado, Xu et al. observaram as médias das LIPI-V dentro dos valores de normalidade em ambas as orelhas14.
Vários fatores colaboram na PAIR nos motoristas de ônibus urbano, tais como a localização do motor na posição dianteira e sem isolamento acústico adequado; à idade da frota de ônibus, em geral acima de oito anos; à falta de manutenção preventiva dos veículos e o alto nível de ruído urbano, o qual os autores descrevem como sendo superior ao limite de conforto acústico5. Da mesma forma que no presente estudo, Fernandes et al.9 relataram uma prevalência de PAIR mais acentuada nas orelhas esquerdas dos motoristas de ônibus urbano com motor dianteiro na cidade de São Paulo.
Na cidade de Salvador, a maioria dos ônibus urbanos não possui sistema de ar condicionado, condição que, somada às características climáticas, influencia o trânsito destes veículos com as janelas abertas, fato que favoreceu a propagação do ruído urbano para o interior da cabine do motorista. Este fato deve ser considerado como possível causa de uma maior exposição sonora da orelha esquerda.
Deste estudo, foi possível inferir que, além da lesão das células ciliadas do órgão de Corti, ocorreu de forma precoce o comprometimento funcional das vias auditivas neuronais do tronco encefálico baixo, e estas alterações foram, provavelmente, proporcionais ao grau de exposição sonora.
CONCLUSÃOA PEATE é um exame complementar útil na avaliação da PAIR e demonstra de forma precoce que além da lesão sensorial, ocorre lesão das primeiras vias neurais aferentes do sistema auditivo.
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1 Mestre em Otorrinolaringologia pela FCM da Sta. Casa de S. Paulo, Médica ORL do Hospital Sto. Antonio, Salvador, BA.
2 Doutor em Medicina, Prof. Adjunto.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 3 de agosto de 2008. cod. 5970
Artigo aceito em 29 de agosto de 2008.