INTRODUÇÃOA paralisia facial periférica é um quadro relativamente comum, sendo na grande maioria de causa idiopática, a chamada Paralisia de Bell. No entanto, devemos estar atentos para diagnósticos diferenciais de doenças graves, potencialmente letais, mesmo que incomuns.
Assim, chamamos a atenção para casos em que a paralisia facial é manifestação de uma metástase no osso temporal, um quadro raro, mas que aparentemente teve sua incidência aumentada nos últimos anos, podendo ter seu diagnóstico retardado por falta de investigação apropriada e ágil do especialista1.
Nesse artigo, relatamos o caso de uma paciente com paralisia facial periférica como primeira manifestação de uma neoplasia metastática de sítio oculto, bem como revisão da literatura pertinente. Destacamos sua importância devida à grande dificuldade diagnóstica e sua evolução desfavorável.
RELATO DE CASOSMS, 40 anos, feminino, branca, deu entrada no serviço de urgência de otorrinolaringologia com queixa de paralisia facial periférica à direita há 15 dias, negando otorréia ou otalgia prévia. Antecedentes familiares e pessoais sem relevância clínica.
Ao exame físico, apresentava-se em bom estado geral, e com paralisia facial grau IV2. À otoscopia, retração MT D, com presença de tumor esbranquiçado na região atical com lamelas (suspeito de colesteatoma).
Realizado Tomografia computadorizada de ossos temporais e audiometria (Figura 1A) na investigação inicial, mantendo acompanhamento ambulatorial, com retorno semanal da paciente.
Figura 1. A - áudio inicial; B - áudio Final; C - RNM com Metástase em MAI; D - resultado Necropsia; E - Paralisia Facial G V à E.
Na evolução, após uma semana, paciente iniciou com queixa de hipoacusia, além de uma piora do quadro de paralisia facial atingindo grau V (Figura 1E). Realizado nova audiometria (Figura 1B), confirmando piora dos limiares e evoluindo para disacusia profunda à direita. Na eletroneuromiografia encontrados sinais de comprometimento severo e crônico do nervo facial direito, de natureza axonal. Devido à piora clínica da paciente associado à perda auditiva rapidamente progressiva, achados estes incomuns para paralisia facial periférica Bell, foi realizada ressonância nuclear magnética (Figura 1C), a qual evidenciou inúmeras imagens em parênquima cerebral, associado a edema perilesional importante, sugestivo de metástases.
Paciente foi internada para investigação do sítio primário, sendo descartados tumores de mama, pulmão, gastrintestinais ou cutâneos, mas antes mesmo de se localizar a lesão primária, paciente faleceu de hipertensão intracraniana após dois meses do início da paralisia facial, apesar de todas as medidas aplicadas.
Foi submetida à necropsia (Figura 1D), sem identificação do foco tumoral, macroscópico. Realizado estudo imuno-histoquímico das metástases, indicando um painel sugestivo de carcinoma pancreático, porém, o diagnóstico final foi de carcinoma indiferenciado de sítio indeterminado.
DISCUSSÃOEm nossa revisão de literatura encontramos 148 casos publicados de lesões do osso temporal como primeira manifestação de metástases. Os principais sítios de origem do tumor foram, em ordem decrescente, mama, pulmão, rim, estômago e próstata3, e os principais sintomas são paralisia facial, hipoacusia, zumbido, alteração do equilíbrio corporal e vertigem, podendo esses sintomas estarem sozinhos ou associados.1,3,4
Os casos de paralisia facial secundário a neoplasias em geral se apresentam com mau prognóstico, progressivos, sem melhora alguma com a terapia utilizada, o que é incomum nos casos de paralisia de Bell.1,3,4 Nesses casos, pode haver atraso no diagnóstico etiológico, agravando, dessa forma, o prognóstico do paciente. Nesses casos, é mandatória a realização de exames complementares, em especial, a Ressonância Magnética.3,4
CONSIDERAÇÕES FINAISDevemos estar sempre atentos em todos os casos de paralisia facial, especialmente nos que se mostram com evolução atípica, para que não se retarde o verdadeiro diagnóstico. Devemos, ainda, concluir que sempre que o quadro se apresentar de forma atípica, ou em que os exames iniciais não sejam compatíveis com a história clínica, os exames de imagem são de grande utilidade, não devendo ser postergados.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS1. Miro Castillo N, Roca-Ribas Serda F, Barnadas Molins A, Prades Marti J, Casamitjana Claramunt F, Perello Scherdel E. Facial paralysis of Metastatic Origin. Review of metastatic lesions of the temporal bone. An Otorrinolaringol Ibero Am. 2000;27(3):255-63.
2. House JW, Brackmann DE. Facial nerve grading system. Otolaryngol Head Neck Surg. 1985;93(2):146-7.
3. Boahene DO, Olsen KD, Driscoll C, Lewis JE, McDonald TJ. Facial nerve paralysis secondary to occult malignant neoplasms. Otolaryngol Head Neck Surg. 2004;130(4):459-65.
4. Alaani A, Hogg R, Saravanappa N, Irving RM. An Analysis of diagnostic delay in unilateral facial paralysis. J Laryngol Otol. 2005;119(3):184-8.
1 Médico residente.
2 Médico residente.
3 Médico residente.
4 Médico Otorrinolaringologista, Médico Voluntário Departamento de ORL UNIFESP.
5 Doutorado. Professora Afiliada departamento ORL UNIFESP. Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo.
Endereço para correspondência: Av. Jandira 79 apto. 133 Moema 04080-000 São Paulo SP.
E-mail: fabiobrod@terra.com.br
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 17 de abril de 2007. cod. 4458.
Artigo aceito em 14 de julho de 2007.