INTRODUÇÃOO pólipo antrocoanal ou pólipo de Killian é uma lesão polipóide solitária benigna que acomete principalmente crianças e adultos jovens. Estudos demonstram que o pólipo de Killian representa entre 4-6% de todos os pólipos nasais da população em geral, contudo, na população pediátrica, esta porcentagem atinge 33%1. Origina-se de uma hipertrofia da mucosa do antro do seio maxilar próximo ao óstio e desenvolve-se, por estímulos desconhecidos, através do óstio do seio maxilar para a cavidade nasal e em direção à coana e parte posterior da nasofaringe, podendo estender-se até a orofaringe11. Raramente tem origem em outra região, como nos seios esfenoidal ou etmoidal3. O pólipo aumenta de volume muito rapidamente, provavelmente devido ao retorno venoso do seu pedúnculo, que é comprimido pelo óstio, assim, o pólipo passa a ficar cada vez mais edematoso. Manifesta-se clinicamente por uma obstrução nasal, geralmente unilateral, mas que pode ser bilateral, especialmente nos casos em que o pólipo é extremamente volumoso, com importante desvio do septo nasal. Acompanha-se de secreção mucosa ou muco-purulenta e, excepcionalmente, pode obstruir o óstio da tuba auditiva promovendo otite média secretora. A epistaxe pode ser um sinal, não clássico, de apresentação do pólipo de Killian10. Nota-se que o óstio do seio maxilar encontra-se aumentado de diâmetro, provavelmente devido à presença do pedúnculo do pólipo, o qual agiria aumentando suas dimensões. Na histopatologia, o pólipo de Killian apresenta-se com uma cavidade central cística rodeada por edema e com uma parede externa revestida por epitélio respiratório normal. Em alguns casos, encontram-se microcistos em seu interior, porém não são encontradas estruturas glandulares.
A primeira descrição do pólipo antrocoanal foi feita por Palfyn, em 1753, relatando o caso de uma mulher com um pólipo nasofaríngeo estendendo-se até o nível da úvula. Contudo, somente em 1906, Killian, pela primeira vez, descreveu precisamente a história natural do pólipo antrocoanal, incluindo que sua origem estava no seio maxilar e não na coana posterior, como se acreditava antigamente. Contudo, Killian não conseguiu confirmar a origem no antro maxilar do pólipo, a qual foi documentada por Kubo em 190911. Ao exame físico, através da rinoscopia anterior ou com o uso de nasofibroscópio, observa-se um pólipo único saindo pelo meato médio e projetando-se na coana, podendo preencher parcial ou totalmente o cavum. Na tomografia computadorizada, observa-se opacificação e preenchimento homogêneo da cavidade do seio maxilar, da cavidade nasal ipsilateral e, eventualmente, do cavum, podendo evidenciar também desvio das paredes nasais e, em especial, do septo nasal, mas sem destruição óssea. Este é considerado o melhor exame de imagem para essa afecção. A tomografia também auxilia na escolha da técnica cirúrgica a ser utilizada, uma vez que mostra com clareza todos os limites da massa tumoral. Os principais diagnósticos diferenciais são feitos com grande cisto mucoso de retenção, tumor de antro maxilar, mucocele, sinusite maxilar e com meningoencefalocele. O tratamento é exclusivamente cirúrgico, podendo utilizar vários tipos de acesso para abordagem do pólipo. Os mais utilizados são a microcirurgia endonasal, a cirurgia endoscópica e a técnica de Caldwell-Luc4. Apesar de seguir rigorosamente as técnicas cirúrgicas preconizadas, ainda ocorre, com relativa freqüência, recidiva do pólipo. Por este motivo é recomendada, na maioria das vezes, a exploração antral com remoção da doença sinusal maxilar.
OBJETIVODescrever dezesseis casos de pacientes com diagnóstico histopatológico de pólipo antrocoanal atendidos no Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.
MATERIAL E MÉTODOTrata-se de um estudo de coorte histórica longitudinal realizado através da análise dos prontuários dos pacientes submetidos a polipectomia por pólipos de Killian ou por outros pólipos nasais, atendidos no período de 01.03.1991 a 30.04.2001, no Setor de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará. O estudo foi submetido à aprovação pelo comitê de ética em pesquisa da Faculdade de Medicina da referida universidade.
RESULTADOSApós a revisão dos dezesseis casos, observou-se nove pacientes (56,2%) do sexo masculino e sete (43,8%) do sexo feminino (Gráfico 1), sendo que, em dez pacientes (62,5%), o pólipo localizava-se na fossa nasal esquerda e, em seis (37,5%), na fossa nasal direita (Gráfico 2).
A idade variou entre 8 e 43 anos, com a grande maioria dos casos situando-se entre 8 e 20 anos (Gráfico 3).
Os principais sintomas observados foram obstrução nasal constante e unilateral em treze (81,3%) pacientes, rinorréia purulenta em sete (43,8%), epistaxe em seis (37,5%), rinorréia hialina em quatro (25%), roncos noturnos e dor facial em três (18,8%) pacientes, além de obstrução nasal bilateral, disfagia, sangramento oral, halitose, crises esternutatórias e cefaléia em dois pacientes e disfonia, dispnéia, prurido nasal, anosmia e cacosmia em um paciente (Quadro 1).
O tempo médio entre o início dos sintomas e a procura por atendimento médico especializado foi de três anos (Gráfico 4).
Em relação às técnicas cirúrgicas utilizadas, dois pacientes (12,5%) foram submetidos a remoção do pólipo apenas por acesso cirúrgico endonasal e os demais foram submetidos a cirurgia combinada endonasal e externa via Caldwell-Luc (Gráfico 5).
Destes dezesseis pacientes, dois já haviam sido submetidos à polipectomia anterior, sendo um há um ano e seis meses da cirurgia atual nesta mesma instituição, e outro, cinco anos antes da cirurgia atual, em outra instituição médica.
No período analisado, foram realizadas 74 cirurgias nasossinusais para tratamento de pólipos, sendo 16 (21,6%) por pólipos de Killian, e 48 (78,4%) por polipose nasossinusal (Gráfico 6). Nesta casuística não houve nenhuma complicação trans ou pós-operatória.
DISCUSSÃOApesar de não ser uma afecção rara, o pólipo de Killian teve pouca divulgação nos últimos anos, com poucos casos descritos na literatura especializada. Trata-se de uma doença benigna unilateral que se origina ao nível do assoalho do seio maxilar, próximo às raízes dentárias e migra para a cavidade nasal, cavum e até orofaringe. Microscopicamente, é indistinguível do cisto intramural. Syme, em Towbin11, encontrou 26 pacientes (3,0%) com pólipos de Killian em uma série de 878 pacientes com pólipos nasais. Na série de Heck em Towbin11 foram encontrados 56 pacientes (3,7%) com pólipo antrocoanal em 1.720 pacientes com pólipos nasais. No grande experimento de 118.374 pacientes examinados em mais de treze anos no Helsinki University Central Hospital, Sirola em Towbin11 relatou 1.295 casos de pólipos nasais, sendo 80 (6,3%) pólipos de Killian. Nesta casuística foram encontrados 74 casos de pólipos nasais, sendo que, destes, 16 (21,6%) eram pólipos de Killian. A incidência aumentada em relação à literatura pesquisada está ligada ao fato de só terem sido considerados, para o estudo, aqueles pacientes com diagnóstico histopatológico de pólipo inflamatório, não incluindo outros blastomas nasais que entrariam como diagnóstico diferencial. O pólipo de Killian ocorre mais comumente em crianças e adultos jovens. No presente estudo, 11 pacientes (68,75%) apresentavam-se com até vinte anos de idade. É considerado o pólipo mais comum em crianças, tendo como etiologia, provavelmente, uma doença inflamatória bacteriana crônica e/ou fibrose cística. Alergia é uma causa rara. Raji et al.8 e Lapantin em Raji et al.8 não mostram diferença significativa em relação à incidência por sexo. Entretanto Piquet em Raji et al.8 e Rugina em Raji et al.8 demonstram uma clara predominância para o sexo masculino. Neste estudo há uma discreta predominância para o sexo masculino (1:1,3). Gomes et al.3 apresentam, em sua casuística, como principais sintomas: obstrução nasal bilateral (7/12), roncos noturnos (5/12), obstrução nasal unilateral (4/12) e respiração bucal (3/12). Raji et al.8, em seu estudo, tiveram como principais sintomas obstrução nasal unilateral (9/12), rinorréia purulenta (8/12), roncos noturnos (4/12) e obstrução nasal bilateral (3/12). Neste trabalho, obstrução nasal unilateral (13/16) e rinorréia purulenta (7/16) foram os sintomas mais freqüentes. Segundo Marshal em Gomes et al.3, dependendo de suas dimensões, o pólipo antrocoanal pode acarretar obstrução tubária e desenvolver otite média secretora unilateral, o que não ocorreu nesta casuística. Robson et al.10 descreveram um caso de um jovem que apresentou epistaxe severa como sintoma. No presente estudo foram encontrados 6 (37,5%) pacientes com epistaxe, sendo que nenhum apresentou epistaxe severa. A simples avulsão do pólipo de Killian pode acarretar recorrência do mesmo em aproximadamente 25% dos pacientes3. Aktas em Raji et al.8 reporta 4 casos de recorrência em 8 pacientes operados com ressecção simples. É necessária a identificação da origem do pólipo, pois o componente sinusal deve ser ressecado, na tentativa de evitar a recidiva da tumoração. Apesar de nos casos relatados neste estudo terem sido seguidas rigorosamente as técnicas cirúrgicas preconizadas, ainda se observou recidiva do pólipo antrocoanal em dois pacientes (12,5%).
CONCLUSÕES1. Pólipo antrocoanal foi uma afecção que predominou entre crianças e adultos jovens.
2. O acesso combinado externo e endonasal foi a abordagem cirúrgica mais empregada.
3. Apesar da abordagem da origem do pólipo no seio maxilar, há a possibilidade de recidiva pós-operatória.
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1 Mestre em Otorrinolaringologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/ USP, Professor Assistente e Chefe da Residência Médica do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.
2 Mestrando do Serviço de Patologia do Departamento de Patologia e Medicina Legal da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará, Professor Substituto do Serviço de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.
3 Doutor, Professor Adjunto e chefe do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.
4 Mestranda do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará, Médica Assistente do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.
Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.
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Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 2 de maio de 2005. cod 292.
Artigo aceito em 21 de outubro de 2006.