Professor Titular de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense - Niterói/RJ
Mestranda da Fundação Oswaldo Cruz - FIOCRUZ/ENSP
Médica Otorrinolaringologista responsável pelo Setor de Otoneurologia da Clínica Luiz Pires de Mello
Endereço para correspondência: Praia de Icaraí, 341 apt. 1301 bloco A Icaraí - Niterói RJ 24230-005 - Telefax. (0xx21) 2612-2288 - E-mail: rpmello@urbi.com.br
INTRODUÇÃOPelo que vimos, as revisões de estapedectomia não são incomuns e dependem muito da experiência do cirurgião na primeira cirurgia.
Sabe-se que o número de cirurgias da otosclerose vem caindo paulatinamente nos centros de ensino, sendo que nos Estados Unidos os residentes atualmente fazem cinco estapedectomias em seu treinamento cirúrgico o que deixa muito a desejar no aprendizado para sua vida diária no futuro.
Nós próprios ficamos com o dilema em diversas situações, como na necessidade ou não do emprego de brocas cortantes, em se tratando de obliteração do nicho da janela do vestíbulo por tecido ósseo espessado, que leva na grande maioria dos casos a disacusia sensorioneural avançada e, por muitas vezes, a anacusia. Outro ponto de importância, é sabermos da necessidade ou não da reabertura de toda a janela do vestíbulo com tecido de cicatrização e múltiplas aderências, quando nos deparamos com uma prótese de arame, tombada lateralmente à sua borda, na estapedectomia primária ou se devemos abri-la total ou parcialmente para colocação de nova prótese.
Cirurgiões mais experientes1-7 podem apresentar melhores resultados auditivos no pós-operatório, com fechamento do espaço aéreo-ósseo menor ou igual a 10dB ou até 20dB, entre 18% a 80%, ficando a nossa casuística em torno de 78,3% até 20dB. Estatísticas apresentadas mostram que a disacusia sensorioneural pode estar ausente ou atingir até 20% dos casos reoperados.
A tomada audiométrica8,9 é feita entre as diferenças de nível auditivo, nas vias aérea-óssea nos pré e pós-operatório nas freqüências de 500, 1000 e 2000Hz, que são as freqüências da palavra, vendo-se a quantificação da via óssea, que representa a reserva coclear10,11.
Nessas revisões não usamos o laser12-16 e mantivemos a técnica tradicional da cirurgia1,2,17-20, com o emprego de ganchos especializados, usando raramente brocas afiadas para a abertura da base do estribo. A prótese empregada nas revisões foi na grande maioria a de teflon de 0,6mm ou 0,4mm de espessura e também em alguns casos a prótese de aço e teflon. Em poucos casos usamos próteses só metálicas, em se tratando de otosclerose obliterativa.
A audiometria de controle foi feita 06 meses e 12 meses após a revisão cirúrgica, sendo que 08 pacientes não retornaram para segunda triagem auditiva.
MATERIAL E MÉTODOSetenta e quatro (74) revisões de estapedectomia/estapedotomia foram realizadas em 68 pacientes, sendo que seis deles foram submetidos a uma segunda revisão no período compreendido entre julho/1980 e junho/1999 na clínica privada e no Hospital Universitário Antônio Pedro/Niterói-RJ. Desse total, 43 foram mulheres (47 ouvidos) e 23 homens (27 ouvidos) com idade variando de 20 a 76 anos.
Tabela 1. Revisões de estapedectomia de acordo com sexo, idade e lado
As revisões foram realizadas com anestesia local com auxílio de sedação intravenosa ou uso de Dormonid® (midazolam), sublingual uma hora antes da cirurgia, sendo a via empregada a transcanal com incisão de 6/7mm a nível do rebordo timpânico.
Ao iniciarmos a revisão, após a abertura da caixa timpânica, verificávamos a mobilidade do martelo e da bigorna por palpação, e no caso de presença de aderências fibrosas, as retirávamos com muito cuidado até atingirmos o nicho da janela oval, removendo a seguir a prótese mal posicionada, se existente, sendo a mais comum a de arame. Para evitarmos mobilizações prejudiciais a recuperação auditiva, por muitas das vezes, cortávamos 2/3 dessa prótese, deixando pequena parte aderida à borda da janela oval, optando por colocação de nova prótese para recompor a audição. Em muitos casos não reabríamos totalmente o nicho da janela oval, só o fazendo em caso de múltiplas aderências que penetravam na orelha interna. Procurávamos fazer um pequeno pertuito para colocação da prótese. Quando havia erosão no ramo longo da bigorna ou retirávamos a mesma sem reaproveitá-la, ou esculpíamos a mesma para interposição entre a janela do vestíbulo e o cabo do martelo, ou usávamos prótese de arame de 6½ mm ou a própria prótese de teflon de 6mm.
Os exames audiométricos8,9,11,18 realizados no pré-operatório foram a audiometria tonal e vocal, a imitanciometria e o SRT, sendo esses exames repetidos no pós-operatório para sabermos da existência de ganho auditivo ou não10,11. Durante algumas revisões de estapedectomia usamos os diapasões em 512Hz e 1024Hz após o ato cirúrgico, para sabermos se a prótese estava no lugar, com conseqüente presença de boa audição do paciente.
As revisões foram realizadas sempre que os pacientes se queixavam de queda auditiva de pelo menos 20dB ou apresentavam tontura com instabilidade, casos em que pensávamos na existência de fistula perilinfática.
Reoperamos também cinco casos, anteriormente operados de fenestração do canal semicircular lateral com emprego de prótese de arame do cabo do martelo à janela do vestíbulo, casos não computados nesta estatística.
RESULTADOSNossos resultados foram baseados em 74 orelhas operadas, sendo 68 de primeira revisão e seis de segunda revisão (02 casos de obliteração da janela oval, 02 casos de erosão do ramo longo da bigorna e 02 casos de subluxação da bigorna).
Nos casos de suspeita de fistula perilinfática (05 casos) baseávamo-nos mais no desequilíbrio dos pacientes, o que nos fazia pensar em fistula perilinfática. As revisões nos mostraram pacientes operados com tubo de polietileno fixado à apófise lenticular.
A idade da revisão dos pacientes é descrita na Tabela 2.
Tabela 2. Idade dos pacientes na cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia
A média de tempo entre a primeira cirurgia e a cirurgia revisional foi de onze anos, sendo doze casos reoperados com menos de doze meses.
Tabela 3. Tempo de revisão pós-estapedectomia/estapedotomia
Os tipos de prótese encontrados foram tubo de polietileno, arame, aço e teflon, aço puro e teflon.
Tabela 4. Próteses encontradas durante a cirurgia revisional de estapedectomia/ estapedotomia.
Os tipos de prótese usados em nossas revisões foram teflon, na grande maioria, prótese de aço e teflon, aço e arame.
Tabela 5. Próteses empregadas durante a cirurgia revisional de estapedectomia/ estapedotomia.
O selamento da janela do vestíbulo foi realizado com o tecido conjuntivo do próprio tímpano, gordura, gelfoam e/ou pericôndrio.
Não pudemos confirmar problemas de disacusia sensorioneural com o emprego de gelfoam como apregoou Sheehy23, que suspendeu o seu uso em 1968.
Com relação à reoperação no que tange ao período da revisão, observamos na Tabela 6.
Tabela 6. Tempo de revisão pós estapedectomia/estapedotomia.
Com relação aos seis casos da segunda revisão o espaço de tempo foi o descrito na Tabela 7.
Tabela 7. Espaço de tempo entra a primeira e a segunda revisão de estapedectomia/ estapedotomia.
A melhora auditiva foi encontrada em 78,3% dos pacientes em até 20dB na primeira audiometria realizada seis meses após a cirurgia revisional e dezenove casos fecharam gap - igual ou menor que 10dB.
Tivemos também seis casos de disacusia sensorioneural variável e com perda auditiva grave, principalmente nos casos com base do estribo espessada, na cirurgia primária onde tivemos grande dificuldade de abrir esta base sendo necessário o emprego de brocas cortantes. Na cirurgia revisional em que tivemos que usar novamente as brocas cortantes, o resultado auditivo foi ruim, levando à anacusia de dois pacientes.
Deslocamento da Prótese - 23 Casos (31,08%)
O deslocamento da prótese com ou sem aderências fibrosas associadas foi a causa mais comum de nossas revisões. Nas revisões o que encontramos no caso de deslocamento da prótese foi a saída de sua porção inferior do centro da janela oval para a porção lateral da mesma ou a má contratura de sua porção alta na longa apófise da bigorna. Por vezes se encontrava caída no fundo da caixa.
Tabela 8. Cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia causada por deslocamento da prótese - 23 casos.
Tabela 9. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por deslocamento da prótese - 23 casos.
Erosão do Ramo Longo da Bigorna - 9 Casos
Com relação à necrose do ramo longo da bigorna tivemos nove casos de primeira revisão, sendo dois operados com polietileno, três com arame, dois com aço e teflon e dois com prótese de teflon. Reaproveitamos a bigorna, esculpindo a mesma em quatro casos. Em um caso, como a lesão óssea era pequena, reaproveitamos a bigorna em seu todo, colocando prótese de aço e teflon em parte na própria longa apófise sem erosão. Nos outros quatro casos usamos prótese de arame de 6½ mm do cabo do martelo à janela oval (em 03) e no outro caso usamos prótese de aço e teflon do cabo do martelo à janela oval, pois o martelo estava um pouco verticalizado. Selamos a janela com tecido conjuntivo pericôndrio e gelfoam.
Tabela 10. Cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia causada por erosão do ramo longo da bigorna - 1ª revisão - 9 Casos.
Tabela 11. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por erosão do ramo longo da bigorna - 1ª revisão - 9 casos
Tivemos dois casos de segunda revisão nos quais a audição piorou após a cirurgia proposta, sendo que no 1º caso retiramos a bigorna reaproveitada e colocamos prótese de aço e teflon do cabo do martelo à janela oval.
Tabela 12. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por erosão do ramo longo da bigorna - 2ª revisão - 02 Casos.
Aderências Fibrosas - 9 Casos (12,16%)
Tivemos nove casos de aderências fibrosas, sendo quatro casos com emprego de arame, dois casos com emprego de aço e teflon e dois casos de teflon na primeira cirurgia. Em todos os casos fizemos a liberação das aderências, retirando total ou parcialmente as próteses. No caso das de arame, com recolocação em seu lugar de prótese de teflon. Nos outros quatro casos, colocamos duas próteses de teflon e duas próteses de aço e teflon.
Tabela 13. Cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia causada por aderências fibrosas - 09 Casos.
Tabela 14. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por aderências fibrosas - 09 Casos.
Subluxação da Bigorna - 5 Casos
Foram operados pelo autor dois casos de subluxação da bigorna, tendo grande dificuldade na colocação da prótese na estapedectomia inicial, com resultado auditivo ruim. Nesse dois casos operados inicialmente com próteses de arame, retiramos as próteses e a bigorna luxada e colocamos prótese de arame de 6,5mm do cabo do martelo à janela oval forrada com tecido conjuntivo. Nos outros três casos de pacientes externos, fizemos a retirada de duas próteses de teflon e uma de arame que se encontravam lateralizadas, pois a bigorna estava luxada, reaproveitando duas bigornas que foram esculpidas e recolocadas entre o cabo do martelo e a janela oval forrada com tecido conjuntivo. No terceiro caso usamos prótese de aço e teflon do cabo do martelo à janela oval com selamento da mesma com tecido conjuntivo.
Tabela 15. Cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia causada por subluxação da bigorna - 1ª revisão - 05 Casos.
Tabela 16. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por subluxação da bigorna - 1ª revisão - 05 Casos.
Tivemos dois casos em que a audição manteve-se ruim no período pós-operatório e optamos então por uma segunda revisão. No primeiro caso, tínhamos colocado prótese de teflon na porção da bigorna não erosada, tendo a mesma se encontrado deitada no fundo da caixa durante a revisão. Retiramos a bigorna erosada e colocamos prótese de arame do cabo do martelo à janela do vestíbulo. No segundo caso, tínhamos feito uma interposição de bigorna esculpida entre o cabo do martelo e o nicho da janela oval, que durante a revisão foi encontrada caída no fundo da caixa. Optamos por prótese de arame de 6,5mm do cabo do martelo à janela oval para recuperação auditiva.
Tabela 17. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por subluxação da bigorna - 2ª revisão - 02 Casos.
Obliteração da Janela do Vestíbulo por Osso Neoformado - 06 Casos (8,10%)
Tivemos quatro casos de obliteração óssea na primeira revisão, sendo três casos com o uso de teflon e um caso de prótese de aço e teflon, e, dois casos de segunda revisão - casos como citei, pela dificuldade inicial da abertura da base do estribo bastante espessa, nos obrigando a manipulação excessiva com emprego até de microbrocas cortantes, o que nos permitiu abertura de pertuito de 06 a 08mm. Fizemos a revisão, nesses casos, colocando em dois casos próteses de aço e teflon e nos outros dois próteses de teflon. Os dois casos reoperados com aço e teflon foram submetidos a uma segunda revisão por nova reobliteração da janela do vestíbulo, com emprego de duas próteses de aço. No que diz respeito à audição, quatro casos apresentaram disacusia sensorioneural variável e dois casos, anacusia. Todos os pacientes já apresentavam vertigem desde a cirurgia inicial de estapedectomia.
Tabela 18. Cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia causada por obliteração da janela do vestíbulo - 1ª revisão - 04 Casos.
Tabela 19. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por obliteração da janela oval - 1ª revisão - 04 Casos.
Tabela 20. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por nova obliteração da janela do vestíbulo - 2ª revisão - 02 Casos
Fístula Perilinfática - 05 Casos (6,88%)
Após algum tempo, dois pacientes operados de estapedectomia apresentaram-se com tontura, desequilíbrio e perda auditiva progressiva, nos fazendo pensar em fístula labiríntica, confirmadas por exame audiológico. Estes pacientes haviam sido operados com tubos de polietileno como prótese. Foram reoperados, retirando-se as próteses, bem como ao tecido aderencial por sobre o nicho da janela do vestíbulo, selando esta janela com tecido conjuntivo e colocando-se prótese de teflon. Os outros três casos de pacientes externos haviam sido operados com próteses de arame; dois casos, com prótese de aço e teflon; um caso empregando a mesma técnica anterior da cirurgia revisional com emprego de prótese de teflon. Colocamos também prótese de teflon nesses três casos antes selando a janela do vestíbulo com tecido conjuntivo do próprio tímpano.
Tabela 21. Cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia causada por fístula perilinfática - 05 Casos.
Tabela 22. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por fístula perilinfática - 05 Casos.
Prótese Curta - 04 Casos (5,40%)
Desses quatro casos, dois eram pacientes externos. Encontramos aderências por toda base, no nicho da janela do vestíbulo puxando a porção vertical da prótese, levando-a lateralmente à borda da janela do vestíbulo (próteses de arame). Nos outros dois casos em que operamos a primeira estapedectomia, fizemos também a limpeza de todo o tecido cicatricial, retirando as duas próteses de teflon, selando a janela oval com tecido conjuntivo em um caso e pericôndrio em outro. Substituímos as próteses encontradas por quatro próteses de teflon.
Tabela 23. Cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia causada por prótese curta - 04 Casos.
Tabela 24. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por prótese curta - 04 Casos.
Prótese Longa - 03 Casos (4,05%)
Dos três casos reoperados, dois foram de pacientes externos e um do próprio autor. As queixas principais eram tontura, desequilíbrio e dificuldade de locomoção. Fizemos a cirurgia revisional o mais rápido possível (90 a 150 dias) afim de corrigirmos a fístula labiríntica. Encontramos na revisão dois casos de próteses de teflon, com selamento prévio da janela do vestíbulo.
Após a cirurgia as tonturas e o desequilíbrio desapareceram e a audição melhorou.
Tabela 25. Cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia causada por prótese
longa - 03 Casos.
Tabela 26. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por prótese longa - 03 Casos.
Platina Flutuante - 02 Casos (2,70%)
Encontramos nesses pacientes a base do estribo inteira na janela do vestíbulo, nos obrigando a manobra com grande grau de dificuldade, com abertura lateral do promotório e emprego de gancho reto para a retirada da base do estribo. Encontramos uma prótese de arame em um caso e prótese de teflon em outro caso. Retiramos estas próteses, selamos a janela do vestíbulo com tecido conjuntivo e colocamos duas próteses de teflon com boa recuperação auditiva. Ver Tabela 28.
Tabela 27. Cirurgia revisional de estapedectomia/estapedotomia causada por platina flutuante - 02 Casos.
Material da Prótese Encontrada
Tabela 28. Conduta nas reoperações de estapedectomia/estapedotomia causada por platina flutuante - 02 Casos.