ISSN 1806-9312  
Quarta, 30 de Outubro de 2024
Listagem dos arquivos selecionados para impressão:
Imprimir:
3348 - Vol. 72 / Edição 2 / Período: Março - Abril de 2006
Seção: Artigo Original Páginas: 227 a 234
Respostas Auditivas Evocadas de Latência Média: Um estudo de padronização
Autor(es):
Francisco Sales de Almeida1, Paulo Roberto Pialarissi2, Luiz Eduardo Ferreira Paiva Júnior3, Maria Aparecida Oliveira Almeida4, André Silva5

Palavras-chave: respostas auditivas de latência média, potenciais auditivos, eletrofisiologia da audição.

Keywords: Auditory middle latency response. Auditory potentials. Auditory electrophysiology.

Resumo: A presença das respostas auditivas evocadas de latência média nos permite a avaliação da integridade do sistema auditivo periférico e central, bem como dos núcleos e vias auditivas existentes até no nível da região tálamo-cortical e córtex auditiva primária. Objetivo: Temos como objetivo avaliar a presença ou não destas várias deflexões, bem como de suas latências e intervalos e fazer um estudo de padronização. Forma de Estudo: Estudo de coorte contemporâneo com corte transversal e o delineamento sendo quantitativo, descritivo e não-experimental. Material e Método: Estudar as várias deflexões, positivas e negativas, eliciadas pelos potenciais auditivos de latência média, em uma população de indivíduos adultos jovens, com idade entre 18 e 30 anos, de ambos os sexos, com audição normal. Utilizamos estimulação sonora monoauricular e captação, separadamente, nos dois hemisférios cerebrais, com eletrodos de superfície. Resultado: Neste trabalho verificou-se que os cruzamentos analisados não apresentaram resultados estatisticamente significativos e estipulou-se uma padronização com fundamentação nos resultados obtidos. Podemos afirmar genericamente, tendo-se em conta a não-significância estatística encontrada, que para as ondas Po, obteve-se, respectivamente, para a média e para o desvio padrão os valores de 12,09ms e 1,84; para Na 17,91ms e 2,60; para Pa 29,41ms e 5,66; para Nb 41,43ms e 8,89; para Pb 51,44ms e 12,63 e finalmente para o intervalo Na-Pa 11,52ms e 4,99. Conclusão: 1-Foi verificada a presença das deflexões Po, Na e Pa em todos os registros, enquanto que as deflexões Nb e Pb estiveram ausentes em 06 registros apenas. 2- Com a obtenção desses registros, avaliamos que a captação dessas deflexões nos serve como um método confiável para a detecção dos potenciais auditivos de latência média, ocorrendo a partir de atividade elétrica gerada, possivelmente, em sítios localizados na região tálamo-cortical, evocados com a utilização de estímulos sonoros. A partir daí, estabelecemos um padrão de respostas, em nosso meio, para indivíduos jovens, com audição normal, possibilitando-nos a realização de estudos posteriores em pacientes com alterações do sistema auditivo.

Abstract: The presence of auditory middle latency evoked responses allows us to make an evaluation of the peripheral and central auditory system integrity , as well as the nucleus and auditory ways existing until the level of the thalamus-cortical region and primary auditory cortex. Aim: Our objective is to evaluate the presence or not of this numerous peaks, as well as, their latencies and intervals and extend to make a standardizing study. Way of study: Contemporary study of Coorte with transversal cut and the outline was quantitative, descriptive e non experimental. Material and method: Studying several peaks, positives and negatives, caused by the middle latency auditory potentials, in a population of young adults individuals, ranging from 18 to 30 years old, from both genders, with normal hearing. It was used a monoauricular resonant stimulation and a capitation, separately, in both cerebral hemispheres, with surface electrodes. Result: In this research was verified that the analyzed crossings did not present statistically significant results and it was stipulated a pattern from the obtained results. Based on the non-statistical difference found we can affirm that to the Po waves was obtained respectively an average and standard deviation of 12,09 and 1,84; for Na 17,91 and 2,60; for Pa 29,41 and 5,66; for Nb 41,43 and 8,89; to for 51,44 ms e 12,63 and finally to the interval Na-Pa 11,52 and 4,99. Conclusion: 1- The presence of the defluxions Po, Na, and Pa was verified in all the registers, whereas the defluxions Nb and Pb were absent in only 06 registers. 2- By having these registers, we evaluated that the inveiglement of these defluxions can be used as a reliable method to detect the average latency of the auditory potentials, by electrical generated activities, possibly in sites located in the thalamus-cortical area, evoked by sonorous stimulation. From that point, we establish a pattern of responses for young ones with normal hearing, helping us with future studies in patients with alterations in the hearing system.

INTRODUÇÃO

A captação dos potenciais auditivos evocados de latência média (AMLR) reveste-se de uma importância muito grande na tentativa de melhorar a objetividade da avaliação da função auditiva em pacientes com deficiência auditiva, tanto no que se refere à determinação dos limiares auditivos quanto ao estudo do período de latência e valores das amplitudes das suas várias deflexões.

Esses potenciais representam uma série de deflexões, positivas e negativas, que ocorrem entre 10 e 80ms após o início do estímulo auditivo, as quais estão situadas após os potenciais evocados do tronco cerebral, precedendo as respostas tardias, estas relacionadas às funções corticais e cognitivas.

Estas respostas foram registradas pela primeira vez no "Massachusetts Institute of Technology" por Geisler et al.1, em 1958, utilizando já nesta época um aparelho computadorizado de mediação de respostas. Esses autores inferem que as ondas observadas em seu trabalho seriam representativas de atividades aferentes auditivas relacionadas às regiões anteriores ao córtex cerebral.

Contudo, em 1963, a estas respostas foram atribuídos geradores puramente de potenciais miogênicos2. Com isto, estes potenciais deixaram de ser estudados como tendo valor para avaliação das vias auditivas aferentes.

A partir de 1967 são desenvolvidos trabalhos que demonstram a aplicabilidade clínica destas respostas3, tendo sido isso reforçado a partir dos registros com eletrodos de superfície realizados em pacientes submetidos a neurocirurgias.

Em 1974, são descritas várias ondas, eliciadas por estimulação sonora, entre as quais, N18 (Na), P30 (Pa) e P50 (Pb), já procurando individualizá-las e separando-as das respostas miogênicas puras, tais como as que ocorrem por contração do músculo pós-auricular e do músculo temporal5.

Estudos posteriores6 demonstram a presença destas ondas mesmo quando havia paralisia muscular obtida com a administração de succinilcolina. Estas observações foram reforçadas por outros trabalhos realizados a seguir em que foi utilizado um agente anestésico (Fentanil) associado a pancuronion que provocava anestesia muscular7.

Vários autores, a partir daí, realizam estudos a respeito dos sítios geradores das ondas com latência entre 10 e 80ms, tanto em animais, diferenciando as contribuições das porções sensoriais primárias daquelas originadas das vias extra-lemniscais do sistema auditivo, por exemplo, substância reticular, sugerindo a importância das vias tálamo-corticais8, como em pacientes submetidos a neurocirurgias, usando-se eletrodos de superfície, descrevendo detalhadamente as várias ondas e os seus locais de geração9.

Apesar destas evidências, os estudos mais sistematizados destas respostas para avaliação das vias auditivas aferentes só começaram a ganhar importância a partir do final da década de 80.

Em nosso meio, podemos citar um estudo pesquisando os potenciais elétricos auditivos de latência média em indivíduos normais do sexo feminino, com o objetivo de determinar os tempos de latência das deflexões positivas (Pa, Pb e Pc) e das deflexões negativas (Na, Nb, Nc) em relação ao lado estimulado e a freqüência de aparecimento de cada uma destas deflexões10, e, mais recentemente, um outro estudo detectando estas respostas em crianças e adolescentes normo-ouvintes11.

Vários autores consideram que a captação dos potenciais auditivos de latência média tem grande aplicabilidade clínica em diversas situações, tais como na determinação eletrofisiológica dos limiares auditivos na faixa de freqüências baixas, na avaliação do funcionamento do implante coclear, na avaliação do funcionamento das vias auditivas, na localização de lesões das vias auditivas e nas aplicações intra-operatórias12.

Esses potenciais evocados podem ser utilizados para a avaliação do processamento de informações, como foi verificado, em estudos, ao se analisar concomitantemente os potenciais auditivos de latência média nas modalidades sômato-sensoriais e auditivas, especificamente o P50, em indivíduos saudáveis, do sexo masculino. Esse estudo oferece suporte para a teoria de deficiência do processamento de informações em indivíduos com esquizofrenia (defeito em P50)13.

Na tentativa de explorar outros aspectos do processamento de informações, foi estudada a habituação das respostas evocadas auditivas (P50) com a utilização de estímulos repetitivos. Observou-se então, que a amplitude da resposta P50 ao segundo de dois estímulos homólogos estava, significativamente, menos reduzida em pacientes com enxaqueca do que em voluntários saudáveis14.

Foi sugerido que a atividade reticular ascendente parece estar afetada nos pacientes ao se estudar as respostas auditivas evocadas de latência média em pacientes com Síndrome Obstrutiva da Apnéia do Sono, antes e depois do tratamento. Após o tratamento da apnéia, houve significativa melhora da hipóxia noturna e também um aumento na amplitude do pico P1 da latência média e esses potenciais tiveram uma melhor distribuição no seu campo elétrico no couro cabeludo15.

Também foi usada a captação de respostas auditivas do tronco cerebral e das respostas auditivas de latência média para se estudar um grupo de pacientes com zumbidos, em comparação com os registros obtidos em indivíduos normais e em indivíduos idosos. Nos grupos com zumbidos e nos idosos, no que concerne aos potenciais do tronco cerebral, foram observadas alterações em relação à onda VII, e, no que concerne aos potenciais de latência média, foram observadas muitas ondas largas ocorrendo em alguns dos componentes destes grupos, mas não em todos. Houve, ainda, o alargamento destas ondas médias sem o correspondente alargamento dos potenciais do tronco cerebral. Isto sugere, na visão dos autores, que poderia haver uma alteração seletiva dos geradores das ondas de latência média nos pacientes com zumbidos e distintos efeitos da idade sobre a fisiologia coclear16.

Análises comparativas, efetuando-se a captação de respostas auditivas evocadas de latência média por registros eletroencefalográficos e por meio de dados magnetoencefalográficos foram sugeridos fontes supra-temporais múltiplas para as diversas deflexões observadas. Correlacionam-se, então, Pa (28ms) à porção medial do giro de Heschl; Nb (40ms)/ Pb1(52ms) à face lateral do giro supra-temporal; e Pb2 (74ms) à porção ântero-lateral do giro de Heschl17. Estes achados estão de acordo com registros prévios intracerebrais invasivos e com estudos em animais, que relatavam as áreas secundárias envolvidas na geração dos componentes auditivos evocados de latência média.

A captação destas respostas pode sofrer ação de agentes externos, tais como bebida alcoólica18 ou drogas anestésicas19.

Podemos fazer os seus registros para estudar pacientes com deficiência auditiva20.

Também estudando os potenciais auditivos evocados de latências curta, média e longa, verificou-se a confiabilidade do registro destes potenciais, ao realizar o procedimento de teste-reteste, no período de um ano, em adultos jovens e em indivíduos de mais idade (entre 21 e 92 anos)21.

Ao se realizar a captação simultânea de potenciais auditivos evocados intracerebrais diretamente do córtex auditivo e do corpo geniculado medial22, em um paciente, verificou-se uma resposta inicial negativa gerada no nível do corpo geniculado medial, com latência ao redor de 13,5ms, e dois picos positivos (P21 e P29), com amplitudes maiores para tons de baixa freqüência e sugerem, então, a existência de uma possível organização tonotópica desse núcleo. Observa-se, também, que picos originados da atividade talâmica estavam fortemente entrelaçados com a atividade cortical registrada nos giro de Heschl antes do período de 30ms (sendo que N13 precede o primeiro componente cortical em 3,5ms; enquanto que P21 e P29 precede e atrasa-se, respectivamente, em relação às duas respostas corticais seguintes, que possuem polaridade reversa, em um intervalo de 1,5 - 2ms). Este estudo fornece novos dados funcionais sobre a atividade do corpo geniculado medial e sugere um papel mais complexo do tálamo na percepção sonora.

Pode-se afirmar, ainda, que a captação destes potenciais é extremamente útil na avaliação de pacientes com implante coclear2, pois podem ser produzidos por ondas elétricas, tendo a vantagem sobre os potenciais do tronco cerebral, porque os seus períodos de latência são maiores e não se confundem com os estímulos geradores.

Esses potenciais representam uma importante ferramenta para avaliação da função cerebral, não só sob o ponto de vista auditivo, mas também em pacientes com afecções neurológicas, como tem sido demonstrado em vários estudos com pacientes comatosos ou que sofreram trauma craniano24.

Nos últimos anos, muitos trabalhos científicos têm sido realizados, mostrando que esses potenciais estão relacionados aos núcleos e às vias auditivas situados na região tálamo-cortical e córtex auditivo primário, principalmente no tracto tálamo-cortical25,26,27.

Entretanto, em nosso país, pouco tem sido produzido a esse respeito.

Falta ainda, em nosso meio, uma padronização maior para a nossa população, quanto ao aparecimento das várias deflexões positivas (Po, Pa, Pb) e negativas (Na, Nb), de acordo com sua ordem de aparecimento, de suas respectivas latências e amplitudes e no que se relaciona à estimulação de uma orelha isoladamente ou de ambas, concomitantemente. Tomando como base esses dados, podemos criar um protocolo de exame adaptado à nossa realidade, com a finalidade de estudar as variáveis que interfeririam na captação dos potenciais de latência média, com a utilização de estímulos auditivos, quer sejam com clique quer sejam com "tone burst".

A partir dessas evidências, propomo-nos a estudar um grupo de pacientes normais e avaliar a presença das várias deflexões correspondentes aos potenciais auditivos de latência média, bem como suas latências e amplitudes, tendo os seguintes objetivos:

1 - Identificar as deflexões positivas e negativas no traçado da resposta auditiva evocada de latência média (situadas entre 10ms e 80ms após a estimulação sonora) em uma população de adultos jovens, com audição normal.

2 - Analisar as características dessas respostas (latência de cada deflexão e intervalo Na-Pa) e efetuar a sua devida padronização para a população estudada.

CASUÍSTICA E MÉTODO

O delineamento foi quantitativo, descritivo, não-experimental. O estudo foi de coorte contemporâneo com corte transversal. Os dados foram coletados em ambiente laboratorial. O estudo teve dimensão de comparação entre-indivíduos.

A amostra constou de um grupo de 50 indivíduos, adultos jovens de ambos os sexos, 34 do sexo masculino e 16 do sexo feminino, residentes em Itajubá. O objeto do estudo foi o indivíduo. A amostragem foi não-probabilística e por conveniência. Os exames foram realizados no Hospital Odontomed Itajubá, no Serviço de Otorrinolaringologia.

Como critérios de inclusão, foram estudados os indivíduos adultos jovens, com idade entre 18 e 30 anos, com audição normal e sem história pregressa de doenças otológicas e/ou neurológicas.

Foi obtida a anamnese dos indivíduos participantes do estudo, que foram submetidos à inspeção otológica clínica, medida de imitância acústica, pesquisa dos reflexos estapedianos, audiometria tonal convencional (freqüências testadas entre 250 Hz e 8000 Hz) e logoaudiometria para a comprovação da saúde auditiva.

A captação dos Potenciais de Latência Média foi efetuada com o equipamento e com os indivíduos situados dentro de uma cabina acústica blindada, para serem evitadas interferências elétricas de quaisquer naturezas (por exemplo, a eletricidade estática). Com isso, só restariam as interferências próprias dos indivíduos testados ou do examinador.

Procuramos evitar estas interferências específicas por meio de cuidados adicionais. Os eletrodos, assim como os fones auriculares foram posicionados pelo próprio examinador, após a devida orientação ao indivíduo. As condições ambientais da cabina (temperatura, luminosidade, silêncio, posicionamento) foram as mais adequadas para manter o conforto e o relaxamento do indivíduo, sem, contudo, permitir o sono. Os eletrodos foram afixados após cuidadosa limpeza da pele, sendo usada, para tanto, pasta eletrolítica adequada; tornando assim possível uma melhor captação dos potenciais a serem estudados. O exame apenas teve o seu início quando a linha de base do eletroencefalograma mostrava-se estável, sem interferências.

O equipamento utilizado é o Sistema Operacional CE - EP 25. A marca CE indica que a "Interacoustics AS" cumpre as exigências requeridas do anexo VI da diretriz médica 93/42/EEC e que o equipamento foi aprovado pela TÜV, com identificação nº 0123.

Este equipamento, adicionalmente, consta de:

 Eletrodos: um como ativo, dois como referências e outro como "terra" (indiferente) permitindo a análise individual de cada hemisfério cerebral.

 Pré-amplificador: EPA 25, com dois canais, obtendo ganho de até 80dB, e que trabalha na faixa de freqüência de até 8000Hz.

 Medidor de Impedância: com informação para cada eletrodo, individualmente.

 Estimulador sonoro: os estímulos podem ser apresentados desde 1,1 a 80,1/segundo, através de Fones auriculares 3A ABR com moldes de inserção, calibrados em um acoplador IEC 126 ou Fones auriculares TDH 39. Produz "clicks" de 100ms em três polaridades (condensação, rarefação, alternados) e "tone burst" nas freqüências de 500, 1000, 2000, 3000 e 4000Hz. Nível de estimulação entre 20 e 130 dB Nível de Pressão Sonora - "NPS" (-10 a 100 dB Nível de Audição - "NA"). Ruído branco mascarador, calibrado em NPS, com nível de mascaramento de 0 a 40 dB relativos ao estímulo.

 Gravação: até 900ms, com ganho de 74 a 104dB (seleção automática ou manual). Possui filtros passa baixo (nenhum ou desde 17Hz a 12000Hz), filtros passa alto (nenhum ou desde 0,83Hz a 500Hz) e filtros analógico (desde 0,5Hz).

 Sistema operativo: Windows 98.

O protocolo de exame adotado em nossa pesquisa, para a captação dos potenciais de latência média, foi o seguinte:

 Estímulo: "click", com duração de 100ms, com polaridade alternada, sem uso de mascaramento, na freqüência de 7,0 estímulos por segundo, num total de 1000 estímulos.

 Intensidade do estímulo: 70dB NPS, apresentados através de fones auriculares TDH 39.

 Eletrodos: O eletrodo "terra", colocado na glabela; o eletrodo "ativo", colocado na região superior do couro cabeludo, a meia distância do vértice craniano e da região mastóidea, sobre cada hemisfério cerebral, e dois eletrodos "referências", cada um colocado em um lóbulo do pavilhão auricular.

 Impedância: com impedância dos eletrodos ao redor de 2 ohms, sendo aceito no máximo, 3 ohms.

 Período de registro: de 0 a 80ms.

 Filtros: utilizaram-se filtros passa alto de 10Hz e passa baixo de 1200Hz.

 Índice de Reprodutibilidade: 95%.

 Estimulação mono-aural.

 Seqüência das etapas dos estímulos e da captação das respostas:

Estimulação Captação (*colocação do eletrodo ativo)

1. Orelha Direita Hemisfério Cerebral Direito (ODHD)

2. Orelha Esquerda Hemisfério Cerebral Direito (OEHD)

3. Orelha Direita Hemisfério Cerebral Esquerdo (ODHE)

4. Orelha Esquerda Hemisfério Cerebral Esquerdo (OEHE)

Dessa forma, efetuamos 4 registros isoladamente em cada um dos 50 indivíduos, perfazendo um total de 200 registros dos potenciais auditivos evocados de latência média.

Os resultados obtidos em cada uma das etapas acima mencionadas foram tabulados isoladamente, sendo realizados cruzamentos com os resultados obtidos em cada uma das etapas.

Os parâmetros do estudo das respostas auditivas de latência média (latência e intervalos) foram processados por meio eletrônico, com recurso computacional por meio do programa Excel.

Consideramos para efeito da análise as deflexões positivas e negativas que surgiram no período de tempo de 10ms a 80ms após o estímulo sonoro. As deflexões positivas foram denominadas de Po, Pa e Pb, enquanto as negativas foram denominadas Na e Nb, de acordo com a ordem de seu aparecimento. As latências e os intervalos foram medidos em milissegundos (ms).

Os resultados obtidos foram submetidos à análise estatística descritiva consistindo das variáveis independentes: porcentagens, freqüências, desvio padrão, média e número de casos validados. Foram utilizados, como testes estatísticos, o "t de Student" com aceitação do nível de significância menor que 0,05.

Foi estabelecido um cruzamento das variáveis: latências das ondas Po, Na, Pa, Nb, Pb e do intervalo Na-Pa, respectivamente nas seqüências ODHD, ODHE, OEHE e OEHD, no sentido de se estabelecer seu nível de significância.

A relevância do estudo é estabelecer um padrão de normalidade para diferentes variáveis (latências e intervalos) em relação às diversas ondas registradas.

Todos os indivíduos participantes desse estudo foram devidamente esclarecidos a respeito dos procedimentos a que seriam submetidos e também sobre os objetivos da pesquisa, tendo aceitado, livre e espontaneamente, participar do estudo em questão.

Esse estudo constou de avaliações não-invasivas que não acarretaram nenhum dano ao paciente.

A pesquisa, que envolveu a participação de seres humanos, obedeceu estritamente às normas éticas estabelecidas de acordo com a Resolução no 196/96, de 10 de outubro de 1996 do Conselho Nacional de Saúde, do Ministério de Saúde.

Este estudo teve a sua aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem Wenceslau Braz de Itajubá.

RESULTADOS

Os registros das variáveis (latência de cada onda e intervalo Na-Pa) foram obtidos da quase totalidade dos indivíduos examinados e podem ser observados na Tabela 1.

Nesta tabela podem ser observados os valores correspondentes às médias das latências de cada deflexão, positiva e negativa e do intervalo Na-Pa, também dos valores mínimos e máximos e do desvio padrão de cada uma destas variáveis. Mostra ainda os números de exames válidos para esta análise.

O desvio padrão, para cada uma das variáveis, é apresentada no Gráfico 1, representando as quatro formas do estudo ODHD, OEHD, ODHE e OEHE.

Foram realizadas 4 testagens em cada indivíduo, perfazendo um total de 200 testagens em toda a pesquisa. Como verificado na Tabela 2, as deflexões Po, Pa e Na foram registradas em todos os testes, enquanto que as deflexões Nb e a Pb estavam ausentes em 6 testes.

Na Tabela 3, encontramos os valores de significância em relação aos cruzamentos das respostas obtidas em cada etapa de estimulação e de captação.






Gráfico 1. Análise dos registros obtidos em cada onda (Po, Na, Pa, Nb e Pb) e do intervalo Na-Pa, com os valores dos desvios padrões, nos seus diferentes critérios de estimulação e captação, referentes aos indivíduos participantes deste estudo.


DISCUSSÃO

Pudemos detectar a presença das várias deflexões, positivas e negativas, no período de 10ms a 80ms após a estimulação sonora, na quase totalidade dos registros efetuados, dentro dos parâmetros observados por outros autores11,17,22. Isso torna o exame de captação de potenciais de latência média uma ferramenta muito importante a ser utilizada no diagnóstico funcional e topográfico das lesões auditivas12,20, como também na avaliação do processamento de informações13,14.

Adotamos, em nosso trabalho, a nomenclatura aceita por vários autores considerando as diversas deflexões de acordo com o seu período de latência. Assim as ondas positivas foram denominadas de Po, Pa e Pb e as ondas negativas de Na e Pa5,9,10.

As deflexões Po, Na e Pa estiveram presentes em todos os 200 registros, enquanto as deflexões Nb e Pb estiveram ausentes em 6 registros.

Como não foi encontrada uma diferença significante estatisticamente podemos inferir que a resposta encontrada é semelhante em todas as captações estudadas. Fundamentada nessa afirmação foram somados todos os valores obtidos nas captações, ODHD, ODHE, OEHD, OEHE, estabelecendo um único valor de média e desvio padrão para cada variável.

Para a onda Po, obtiveram-se respectivamente a média do período de latência e o desvio padrão correspondente os valores de 12,09ms e 1,84; para a onda Na, 17,91ms e 2,60; para Pa 29,41ms e 5,66; para Nb 41,43ms e 8,89 e para Pb 51,44ms e 12,63.

Em relação ao intervalo Na-Pa, o seu valor médio encontrou-se em 11,52ms e o seu desvio padrão em 4,99.

Apesar de não ter sido efetuada uma pesquisa a respeito dos locais de geração das diversas ondas, podemos inferir que pelos seus períodos de latência, estas deflexões são geradas em sítios localizados na região tálamo-cortical e córtex auditivo primária e/ou cortical primária, como já amplamente observada na literatura mundial8,9,17,22.

Acreditamos, então, que estas várias ondas são geradas através da estimulação sonora em vias auditivas aferentes anteriores ao córtex cerebral, como foi inicialmente observado por Geissler et al. em 19581.

A partir destas constatações, podemos considerar que os registros das deflexões Po, Na e Pa são fundamentais para verificação da integridade das vias auditivas, no nível da região tálamo-cortical e córtex auditiva primária12,25-27.

Assim esse exame poderia ser utilizado ainda como método de avaliação de pacientes com problemas neurológicos (como traumatismo craniano ou em estado de coma)4,24, bem como no acompanhamento de indivíduos com implante coclear12,23 ou, ainda, na avaliação topográfica de pacientes com zumbidos16. Estes assuntos podem ser temas para estudos posteriores.

Como referido na literatura, estes potenciais tendem a manter o mesmo padrão de registro através da pesquisa "teste-reteste" no prazo de 1 ano21, indicando um alto grau de confiabilidade.

Analisamos os registros obtidos em relação ao local da captação dos potenciais auditivos considerando-se a colocação dos eletrodos, sobre a região especifica de cada hemisfério cerebral. Ao fazermos o cruzamento destes registros obtidos entre si, não pudemos notar diferenças significativas de uma região de captação para outra.

Temos observado a possibilidade da captação no mesmo ato tanto das respostas auditivas evocadas de latência média (núcleos e vias auditivas das regiões subcorticais e corticais primárias) como das respostas auditivas evocadas de curta latência (núcleos e vias auditivas do tronco cerebral). Isto torna este exame uma ferramenta de extraordinária importância na prática clínica diária.

Após a realização desta padronização, como vimos anteriormente, a captação destes potenciais de latência média apresenta-nos uma grande possibilidade de estudos, sob o ponto de vista auditivo e neurológico. Permite-nos avaliar eletrofisiologicamente o nível de audição do indivíduo, e nos dá a possibilidade de uma forma mais abrangente do estabelecimento do local da lesão, no caso de doenças retrococleares.

As respostas obtidas após um estímulo em uma orelha e com captação ipsilateral, quando cruzada com as respostas obtidas na outra orelha nas mesmas condições, e também, quando cruzada com as respostas obtidas contralateralmente, apresentam-se estatisticamente sem significado.

A análise das amplitudes de cada onda isoladamente ou na composição de duas delas (por exemplo: Na-Pa) poderá ser realizada em outro estudo, para verificação de sua significância e importância, através da especificidade e sensibilidade.

Não realizamos a pesquisa destes potenciais com o uso de medicamentos ou em pacientes anestesiados, porém estas situações podem ser temas de pesquisas futuras18,19.

A similaridade de respostas dos desvios padrões apresentada no Gráfico 1 reflete que há pouca diferença entre a dispersibilidade dos dados referentes às variáveis específicas analisadas, e que essa diferença, como mostrada na Tabela 3 não tem significância estatística. As respostas do gráfico 1 ilustram que os valores de cada uma das variáveis se dispersam de forma semelhante para estímulos em qualquer orelha e em captações em qualquer hemisfério em pacientes normoacústicos e sem história pregressa de qualquer distúrbio retrococlear.

Em vista desses dados pode-se inferir que alguma doença retrococlear poderá alterar esses valores de forma significante, podendo até mesmo, futuramente, se criar padrões clínicos e/ou laboratoriais de resposta de potencial de latência média específicas. Esse tipo de exame poderá, na prática clínica, constatar distúrbio da anatomia e da fisiologia auditiva podendo vir a ser um exame sensível ou mesmo específico.

CONCLUSÃO

Concluímos que:

1. Foi verificada a presença das deflexões Po, Na e Pa em todos os registros, com a média do seu período de latência de 12,09ms para Po, de 17,91ms para Na e de 29,41 para Pa; enquanto que as deflexões Nb e Pb estiveram ausentes em 6 registros apenas, sendo que a média de seus períodos de latências estava em 41,43ms e 51,44ms, respectivamente. A média do intervalo Na-Pa foi de 11,52ms.

2. Com a obtenção desses registros, avaliamos que a captação dessas deflexões nos serve como um método confiável para a detecção dos potenciais auditivos de latência média, ocorrendo a partir de atividade elétrica gerada, possivelmente, em sítios localizados na região tálamo-cortical, evocados com a utilização de estímulos sonoros. A partir daí, estabelecemos um padrão de respostas, em nosso meio, para indivíduos jovens, com audição normal, possibilitando-nos a realização de estudos posteriores em pacientes com alterações do sistema auditivo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Geisler C, Frishkopf LS, Rosenblith WA. Extracranial responses to acoustic clicks in man. Science 1958;128:1210-1.

2. Bickford RG, Galbraith RF, Jacobson JL. The nature of averaged evoked potentials recorded from the human scalp. Electroenceph Clin Neurophysiol 1963;15:720.

3. Goldstein R, Rodman LB. Early components of averaged evoked responses to rapidly repeats auditory stimuli. J Speech Hear Res 1967;10:6.

4. Celesia GG, Broughton RJ, Rasmussen TH, Branch C. Auditory evoked response from the exposed human cortex. Electroenceph Clin Neurophisiol 1968;24:458-66.

5. Picton TW, Hillyard SA, Krausz HI, Galambos R. Human auditory evoked potentials: Evaluation of components. Electroenceph Clin Neurophysiol 1974;36:179-90.

6. Harker LE, Hosick E, Voots RJ, Mendel M. Influence of succinilcholine on middle component auditory evoked potentials. Arch Otolaryngol 1977;103:133-7.

7. Kileny PR, Berry DA. Selective impairment of late vertex and middle latency auditory responses. In: Menches G, Gerber S, Editores. The Multiply Handicapped Hearing Impaired Child. New York: Grune and Sttraton; 1983.

8. Mcgee, T, Ozdamar O, Kraus N. Auditory middle latency responses in the guinea pig. Am J Otolaryngol 1983;4:116-22.

9. Lee YS, Lueders H, Dinner DS, Lesser RP, Hahn J, Klen G. Recording of auditory evoked potentials in man using chroni subdural electrodes. Brain Res 1984;197:115-31.

10. Matas CG, Barbosa MSM, Munhoz MS, Fukuda Y. Potenciais elétricos auditivos de média latência: estudo em indivíduos normais do sexo feminino. Rev Bras Otorrinolaringol 1994;94:102-4.

11. Sclochat A. Resposta de latência média em crianças e adolescentes normo-ouvintes. Pró-Fono Revista de Atualização Científica 2003;15:65-74.

12. Kraus N, Kileny P, Mcgee T. Middle Latency Auditory Potentials. In: Katz J. Editor. New York: Lippincott Williams & Wilkins; 1999. p.384-402.

13. Arnfred SM, Eder DN, Hemmingsen RP, Glenthoj BY, Chen AC. Gatting of the vertex somatosensory and auditory evoked potential P50 and the correlation to skin conductance orienting response in healthy men. Psychiatry Res 2001;101:221-35.

14. Ambrosini A, De Pasqua V, Afra J, Sandor PS, Schoenen J. Reduced gating of middle-latency auditory evoked potentials (P50) in migraine patients: another indication of abnormal sensory processing. Neurosci Lett 2001;306:132-4.

15. Miyamoto T, Miyamoto M, Takekkawa H, Kubo J, Hirata K, Katayama S. A comparison of middle latency auditory-evoked response in obstructive sleep apnea syndrome before and after treatment. Psichiatry Clin Neurosci 2001;55:251-2.

16. Gerken GM., Hesse PS, Wiorkowski JJ. Auditory evoked responses in control subjects and in patients with problem-tinnitus. Hear Res 2001;157:52-64.

17. Yvert B, Crouzeix A, Bertrand O, Seither-Preisler A, Pantev C. Multiple supratemporal sources of magnetic and electric auditory evoked middle latency components in humans. Cereb Cortex 2001;11:411-23.

18. Nicholas CL, Sullivan EV, Pfefferbaum A, Trinder J, Colrain IM. The effects of alcoholism on auditory evoked potentials during sleep. J Sleep Res 2002;11:247-53.

19. Alpiger S, Helbo-Hansen HS, Jensen EW. Effect of sevoflurane on the mid-latency auditory evoked potentials measured by a new fast extracting monitor. Acta Anaesthesiol Scand 2002;46:252-6.

20. Hesse PA, Gerken GM. Amplitude-intensity functions for auditory middle latency responses in hearing-impaired subjects. Hear Res 2002;166:143-9.

21. Waldhovd KB, Fjell AM. One year test  retest reliability ERPs in young and old adults. Int J Psychophysiol 2002;46:29-40.

22. Yvert B, Fischer C, Guenot M, Krolak-Salmon P, Isnard J, Pernier J. Simultaneous intracerebral EEG recordings of early auditory thalamic and cortical activity in human. Eur J Neurosci 2002;16:1146-50.

23. Firszt JB, Chambers RD, Kraus N, Reeder RM. Neurophysiology of cochlear implant users: effect of stimulus current level and electrode site on the electrical ABR, MLR and N1-P2 response. Ear Hear 2002;23:502-15.

24. Logi F, Fischer C, Murri L, Maughiere, F. The prognostic value of evoked responses from primary somatosensory and auditory cortex in comatose patients. Clin Neurophysiol 2003;114:1615-27.

25. Cacace AT, Satya-Murti S, Wolpaw JR. Human middle-latency evoked potentials: vertex and temporal components. Electroencephalography and clinical Neurophysiology 1990;77:6-18.

26. Liégois-Chauvel C, Musolino A, Badier JM, Marquis P, Chauvel P. Evoked potentials recorded from the auditory cortex in man: evaluation and topography of the middle latency components. Electroencephalography and clinical Neurophysiology 1994;92:204-14.

27. Kraus N, Mcgee T. The middle latency response generating system. EEG 1995;(suppl 44):93-101.

1 Doutorado/USP/SP, staff do hospital Odontomed.
2 Doutor em Otorrinolaringologia pela USP, Professor Titular da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
3 Graduando em Medicina, Acadêmico da Faculdade de Medicina de Itajubá.
4 Pós-graduanda em Audiologia pelo CEDIAU, Fonoaudióloga do Hospital Odontomed.
5 Graduando em Medicina, Acadêmico da Faculdade de Medicina de Itajubá.
Hospital Odontomed.
Endereço para correspondência: Francisco Sales de Almeida - Rua Major Belo Lisboa 88 sala 307 Centro Itajubá MG 37500-000.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 4 de junho de 2005.
Artigo aceito em 20 de fevereiro de 2006.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


Imprimir:
Todos os direitos reservados 1933 / 2024 © Revista Brasileira de Otorrinolaringologia