ISSN 1806-9312  
Quarta, 27 de Novembro de 2024
Listagem dos arquivos selecionados para impressão:
Imprimir:
3269 - Vol. 71 / Edição 4 / Período: Julho - Agosto de 2005
Seção: Artigo de Revisão Páginas: 526 a 534
Dor craniofacial e anormalidades anatômicas das cavidades nasais
Autor(es):
Jeferson Cedaro de Mendonça , Ivo Bussoloti Filho

Palavras-chave: dor craniofacial, cefaléia, septo nasal, conchas nasais.

Keywords: craniofacial pain, headache, nasal septum, nasal concha

Resumo: A relação entre variações anatômicas nasais e dores craniofaciais é analisada com base em uma revisão da literatura a respeito deste assunto. Os fatores fisiopatológicos que podem estar implicados nesta reação se mostram muito mais amplos do que simples alterações do septo nasal e conchas nasais que possam causar estímulo mecânico, através do contato entre estas estruturas abrangendo fatores infecciosos, inflamação neurogênica, correlação com migrâneas e o papel da obstrução nasal. Os achados clínicos de diversos autores incluindo a utilização do teste com anestésico tópico para comprovação desta relação causal, assim como para indicação de tratamento cirúrgico, além dos bons resultados deste tratamento, são citados. Discute-se o mecanismo de alívio da dor obtido através de correções cirúrgicas do septo e conchas nasais Estes dados nos levam a concluir que há múltiplos fatores etiológicos envolvidos, o que, inevitavelmente, questiona o papel do aspecto mecânico como fundamental.

Abstract: The causal relation between anatomical variations of the nose and headaches and facial pain is analyzed through literature review of the topic. The pathogenesis that can be involved in this relation proves to be wider than simple alteration of nasal septum and turbinates that can cause mechanical stimulus through contact between these structures, which covers infectious factors, neurogenic inflammation, correlation with migraines and the role of nasal obstruction. The clinical findings of a lot of authors including the test with topical anesthetic to prove this causal relation, the indication of surgical treatment, in addition to good results of this treatment, are reported. The mechanism of pain relief obtained through surgical correction of nasal septum and turbinate is discussed. These data make us conclude that there are multiple etiologic factors involved, which makes us question the fundamental role of the mechanical aspect.

INTRODUÇÃO

A cefaléia é um sintoma muito freqüente, sendo estimado que constitui queixa em mais da metade dos indivíduos que procuram um médico1. É também um sintoma de difícil estudo pela grande variedade de apresentações clínicas e etiologias2. Não raro, pacientes portadores de cefaléias e dores craniofaciais de difícil tratamento e longo tempo de evolução procuram o otorrinolaringologista, muitas vezes já tendo sido investigados por clínicos gerais, neurologistas e oftalmologistas3.

Em relação às causas nasais de cefaléia, além da etiologia inflamatória, alérgica ou neoplásica como: sinusopatias, poliposes, rinites específicas ou alérgicas, abscessos e tumores4, considera-se também casos onde somente variações anatômicas das cavidades nasais bastariam para determinar o sintoma doloroso. O otorrinolaringologista ganha, portanto, uma responsabilidade maior nesta investigação, não se limitando a afastar diagnósticos evidentes, mas atendo-se a particularidades anatômicas das cavidades nasais, para tanto auxiliando-se de tomografia computadorizada e endoscopia naso-sinusal5. Observa-se, no entanto, que muitos fatores podem estar implicados na produção de dor de etiologia nasal, de tal modo que o aspecto fisiopatológico que relaciona variações anatômicas nasais e dor craniofacial ganha amplas proporções. Muitos autores têm estudado o assunto desde o início do século, definindo síndromes clínicas como síndrome do nervo etmoidal anterior6, síndrome do nervo naso-ciliar, síndrome da fissura olfatória7, cefaléia do contato septal4, síndrome da cefaléia dos quatro dedos8 e cefaléia do esporão nasal9. Muitas observações clínicas feitas por estes autores, incluindo bons resultados no tratamento destes pacientes com procedimentos cirúrgicos simples, são relevantes na determinação da relação causal entre variações anatômicas nasais e dor craniofacial.

Por outro lado, é freqüente a observação das grosseiras deformidades das cavidades nasais em pacientes assintomáticos, de acordo com relatos4, pois, nem todo paciente com \"impactação\", referindo-se a esporões septais em contato com a parede lateral, tem cefaléia.

O objetivo deste trabalho é discutir os diversos aspectos fisiopatológicos que relacionam anormalidades anatômicas das cavidades nasais com dores craniofaciais, assim como algumas de suas implicações clínicas e terapêuticas.

REVISÃO DA LITERATURA

Anatomia

A relação causal entre variações anatômicas nasais e cefaléia tornou-se objeto de investigação de diversos autores que passaram a dar especial atenção ao papel da inervação sensitiva da cavidade nasal, pois sua estimulação, principalmente mecânica, seria considerada desencadeante da dor referida6,4,8-10.

Os ramos oftálmico e maxilar do nervo trigêmeo são responsáveis pela sensibilidade da mucosa nasal. O ramo oftálmico divide-se nos seguintes nervos: lacrimal, frontal e nasociliar, sendo que, este por sua vez, origina os nervos etmoidais anterior e posterior, e o nervo infratroclear. Através destes ramos, o nervo oftálmico é responsável pela sensibilidade do globo ocular, pálpebras, fronte, a raiz e uma porção lateral da pirâmide nasal, as células etmoidais e a mucosa nasal de parte da concha média e superior e região correspondente do septo nasal7.

O nervo etmoidal anterior é o principal responsável pela sensibilidade da região nasal considerada desencadeante da dor, e seu trajeto é descrito a seguir: ele deixa a órbita pelo forame e canal etmoidal anterior para penetrar na fossa craniana anterior, que, após trajeto entre a dura-máter e osso atinge a cavidade nasal, através de uma fenda ao lado da crista galli. O nervo então desce por um sulco na face interna do osso próprio do nariz quando se exterioriza passando entre o osso próprio do nariz e a cartilagem lateral superior, como nervo nasal externo. Na cavidade nasal, manda ramos mediais para o septo e laterais para as porções anteriores das conchas média e superior e para a parede lateral anterior a elas6. As características anatômicas do nervo etmoidal anterior, ou seja, seu trajeto superficial em relação à mucosa nasal e os estreitos canais ósseos que atravessa, o tornariam suscetível a processos patológicos7.

O ramo maxilar, através dos nervos ptérigo-palatinos, manda os ramos nasais póstero-superiores, responsáveis pela sensibilidade das conchas média e superior e meato superior. Os ramos nasais póstero-inferiores, provenientes do nervo palatino maior, também ramo do maxilar, são responsáveis pelo soalho da cavidade nasal, meatos inferior e médio, além da concha inferior. A região superior do septo tem sua sensibilidade pelo nervo nasopalatino, outro ramo do palatino maior, que se dirige ao forame incisivo. Além disso, fibras do nervo maxilar, ao se exteriorizarem pelo forame intra-orbital através do nervo de mesmo nome, emite ramos nasais para a pele da região lateral da pirâmide, incluindo a asa nasal. Enfim, a maior área da mucosa da cavidade do nariz é inervada por ramos do nervo maxilar, com exceção das porções anteriores das conchas média e superior, e a região anterior a elas, assim como a área correspondente do septo nasal, que são inervadas por ramos do oftálmico.

Fisiopatologia

A sensibilidade da mucosa nasal foi pesquisada através de estimulação com corrente farádica em diversas áreas da cavidade nasal de voluntários orientados a descrever o que sentiam. Observou-se que as conchas e óstios são muito mais sensíveis à estimulação que a mucosa de revestimento dos seios paranasais12. Com isso conceituou-se que a cefaléia das sinusopatias tem origem nasal, e não nos seios paranasais infectados, como seria de se esperar. Os mesmos autores apóiam-se nas observações de dor mais intensa provocada em seus experimentos, na vigência de congestão e hiperemia das conchas, comparada a quando estivessem livres de tais alterações, independentemente do estado dos seios paranasais. Apóiam-se também na abolição da dor em pacientes com sinusite, através da retração ou anestesia das conchas e estruturas nasais. Observou-se também que a dor referida acometia áreas do ramo maxilar principalmente, e em menor grau oftálmico. Este estudo seria citado em trabalhos subseqüentes7. Outros autores, provocando estímulos químicos e táteis (pressão) em diversas regiões da cavidade nasal, notaram o aparecimento de dor referida tanto nas regiões de inervação pelo ramo oftálmico como pelo maxilar do nervo trigêmeo3. Também definiram a inervação da porção anterior da concha média e a região correspondente do septo pelo nervo etmoidal anterior e, ao estimularem estas áreas, notaram dor na distribuição dos nervos infra e supra-troclear, divisões cutâneas do ramo oftálmico, correspondendo ao canto interno e supraorbital. Algumas observações consideram que o estímulo deflagrador dos sintomas ocorre na área denominada retro-tubercular, localizada atrás do espessamento septal, ao nível da articulação condro-etmoidal, e que seria de distribuição do ramo oftálmico7; no entanto, outros autores consideram que esta região tem inervação pelo gânglio esfenopalatino6, ou seja, nervo maxilar.

A importância da inervação sensitiva da mucosa nasal no desencadeamento do sintoma doloroso foi reforçada pela observação do alívio deste pela aplicação de um anestésico tópico, a cocaína, na cavidade nasal, justamente entre a cabeça da concha média e o septo, cuja sensibilidade é conduzida pelo nervo etmoidal anterior3,8,10,13. São citados também vasoconstritores9 e lidocaína13, causando alívio imediato, caracterizando a positividade do teste, cujo significado clínico será exposto posteriormente.

Estes dados apoiaram a idéia de se definir áreas da mucosa nasal desencadeantes da dor como a porção anterior da concha média e a região correspondente ao septo nasal 3-4,6.

A dor referida pelos pacientes situa-se principalmente nas áreas supridas pelos ramos cutâneos do nervo oftálmico, principalmente os nervos supra e infra-troclear, ou seja, canto interno, região supra-orbital e têmporo-zigomática3,9. Há autores que citam até o pescoço e membro superior6.

O mecanismo da dor referida já é citado em 19467, afirmando-se que a associação próxima de fibras sensitivas nasais e intraorbitais e seus núcleos a nível central explica a similaridade de sintomas do envolvimento patológico das duas áreas, exemplificando que dor orbital pode ser produzida em regiões intra-nasais. Fibras aferentes de receptores para dor localizados na mucosa nasal e paranasal terminam no mesmo pool de neurônios sensoriais no núcleo do nervo trigêmeo, que fibras provenientes de receptores cutâneos. Essas duas vias desembocam nos mesmos neurônios em uma área cortical comum. \"O centro cortical não pode distinguir a fonte periférica original dos impulsos por essa via comum, portanto, quando a mucosa é estimulada, os impulsos aferentes de dor são falsamente localizados após chegarem ao córtex sensorial. Eles são mal interpretados baseados em experiências prévia como vindo da pele, região de onde os impulsos normalmente chegam àquele ponto do cérebro.\"5 Outro mecanismo de dor referida considera a presença de edema neurogênico em regiões distantes do local estimulado: fibras trigeminais contendo substância P, ao serem estimuladas, têm capacidade de deflagrar impulsos antidrômicos responsáveis por liberação de substância P em outras áreas inervadas por ramos trigeminais, o que leva a um processo inflamatório nestes locais, explicando o aparecimento de dor em regiões distantes da estimulada14.

Considerou-se que o estímulo da região da mucosa nasal citada é causado pelo contato entre as estruturas nasais decorrentes de variações anatômicas de origem constitucional ou ainda traumática4,8,15, hipertrofia da concha média ou sua pneumatização3,11,14,16.

A pneumatização das conchas médias pode ocorrer, pois elas fazem parte do complexo etmoidal que se expande de acordo com os espaços potenciais 17.

Uma vasta lista de variações anatômicas predisponentes a cefaléias, acometendo septo nasal, células do agger nasi, concha média, bulla etmoidal e uma combinação de todos eles, é considerada nesta fisiopatologia5, incluindo-se ainda alterações da concha superior, assimetria do complexo etmoidal e alterações da base do crânio10.

Outros autores efetuaram uma revisão de uma série de cortes coronais de tomografia computadorizada de seios da face, analisando alterações ósseas, incluindo pneumatização da concha média, células do agger nasi e de Haller, não encontrando correlação nítida destas alterações com patologia18.

Muitos autores consideram a existência de pressão entre tais estruturas como principal estímulo3-4,6,9-11, mas mesmo sem o contato permanente entre as estruturas, este se estabelece de acordo com o ciclo nasal, e é influenciado por estímulos físicos, climáticos, tais como umidade e temperatura, além de químicos, alérgicos e inflamatórios10,11.

O contato entre as estruturas, além de constituírem um estímulo mecânico àquelas regiões consideradas origem da dor, promove um processo inflamatório local devido à disfunção mucociliar, o que pode levar à liberação de mediadores que se relacionam com o processo doloroso. Além disso, a aproximação de superfícies mucosas causa ressecamento da mucosa devido ao efeito de Bernoulli (aumento da velocidade do fluxo e diminuição da pressão conforme diminuição da área de secção) no fluxo aéreo, com acúmulo de muco e limitação da função ciliar11. O processo inflamatório local vem a agravar a pressão existente entre as estruturas pelo aparecimento de edema. Tais alterações criam condições para o desenvolvimento de processo infeccioso local, sendo fator importante para o surgimento da dor. A presença de mediadores como a substância P e histamina diminuem o limiar para dor em receptores da mucosa nasal19.

A teoria da existência de um reflexo local desencadeado pelo contato entre as estruturas, com liberação de aminas vasoativas e surgimento de edema constitui um mecanismo valorizado na literatura3. Este mecanismo pode ter a substância P como mediador deste reflexo. A substância P é um neuropeptídeo conhecido desde 1931, e encontrado em fibras nervosas sensitivas da mucosa nasal e paranasal, entre outros lugares20,21. Estímulos diversos em receptores polimodais localizados na mucosa nasal, como irritantes infecciosos, químicos, calóricos ou simplesmente mecânicos (pressão), geram um impulso ortodrômico para o córtex cerebral, mediado pela substância P, responsável pelo sintoma doloroso. Além do impulso ortodrômico, tais estímulos geram também impulsos antidrômicos, ou seja, no sentido contrário ao que seria de se esperar para fibras aferentes, capazes de liberar substância P na mucosa nasal, mediando extravasamento de plasma, vasodilatação, contração de musculatura lisa e hipersecreção. Este mecanismo é chamado de reflexo axonal (Figura 1). O edema da mucosa pode aumentar a pressão existente entre as estruturas, perpetuando o estímulo em um ciclo vicioso5. A ocorrência de trauma local pelo contato e pressão entre as estruturas também levaria à liberação de substância P na mucosa nasal14.

Outro mecanismo relacionado às variações anatômicas citadas é a obstrução dos óstios de drenagem dos seios paranasais, resultando em pobre aeração desses, levando à cefaléia por vácuo (vacuum headache) ou hipóxia5,10,15,22.

Além desse mecanismos, a cefaléia é citada como sintoma secundário à obstrução nasal devido a desvio do septo, em freqüências que variam de 23%23 a 58%15, e sua correção cirúrgica levaria não só à melhora da obstrução nasal, como também da cefaléia24. Observa-se, por outro lado, que a falha do tratamento cirúrgico no controle da dor pode estar relacionada à persistência, pelo menos parcial, da obstrução nasal25.

Autores em nosso meio observam a obstrução nasal em 82% de 11 casos de síndrome da cefaléia do corneto médio26.

Existe a consideração de que as variações anatômicas causando estreitamentos nas cavidades nasais representam o fator desencadeante ou primeiro estágio de diversas formas de enxaquecas10. Tais alterações produzem edema na mucosa nasal quando submetida a alterações climáticas e hormonais, e, conseqüentemente, pressão entre as estruturas e hipoventilação dos seios paranasais, levando à hipóxia tecidual e liberação de serotonina e outras substâncias vasoativas, induzindo finalmente às crises. Os mesmos autores demonstram inclusive o valor do tratamento cirúrgico nasal no alívio desses casos.

Uma população acometida de obstrução nasal por desvio de septo e cefaléia de diversas modalidades clínicas foi estudada e submetida a tratamento cirúrgico, e, dos onze casos com desaparecimento total dos sintomas, quatro tinham diagnóstico de enxaqueca24.

Dentre os diversos mecanismos fisiopatológicos das enxaquecas, o papel de deformidades nasais traumáticas é valorizado por alguns autores que consideram ainda serem agravados por mudanças climáticas27.

Outra correlação fisiopatológica é citada através do relato de dois casos em que os pacientes tinham diagnóstico clínico de cefaléia em salvas, cuja investigação mostrou sinusopatia ipsilateral à dor, e cujo tratamento aboliu os sintomas. A explicação viria por conta de conexões entre fibras nervosas trigeminais, responsáveis pela inervação dos seios paranasais com neurônios parassimpáticos do gânglio esfenopalatino28.

O fato de fibras trigeminais distribuírem-se amplamente ao redor de importantes vasos do sistema nervoso central, constituindo o sistema trigeminovascular, revela o papel fisiopatológico dessas fibras. Quando estimuladas, provocariam um processo inflamatório nesses vasos, mediado por substância P e gene-relacionado à calcitonina, o que é observado experimentalmente na dura-máter de animais por extravasamento de plasma, ativação e degranulação de mastócitos e aumento de vesículas em células endoteliais, o que poderia desencadear crises de enxaquecas29.

Aspectos Clínicos e Diagnósticos

Do ponto de vista clínico encontram-se na literatura diversas descrições sintomatológicas e definições de síndromes que relacionam causas anatômicas nasais com cefaléia e dores craniofaciais, como a síndrome do nervo etmoidal anterior6, onde os pacientes se queixavam de dor frontal, direita ou esquerda, estendendo-se pouco acima da linha supra-ciliar e pouco abaixo dos osso nasais, às vezes até a ponta do nariz, podendo incluir a órbita. Dor tipo pressão, menos localizada, na área do nervo oftálmico, congestão nasal ipsilateral e rinorréia posterior, constitui a síndrome da fissura olfatória7. Quanto ao tipo e intensidade de dor há descrições de intermitente3,8, com características de pressão15,22, latejante ou pulsátil9, intensa e incapacitante9,22, sendo que outros autores a consideram leve a moderada3. Quanto à localização: canto interno, região supraorbital e frontal3,8,9,15,22 podendo atingir a órbita9, região infraorbital e têmporo-zigomática8,22, tanto unilateral3 quanto bilateral, quando constitui a síndrome dos quatro dedos, numa alusão à posição assumida pela vítima desses sintomas8,22. Outras regiões como vértex e nuca também são citadas22. A duração do quadro doloroso em geral é de horas3,8, com freqüência variando de diária9,22 a semanal ou mais rara15. O quadro pode relacionar-se com o nível de congestão da mucosa nasal, influenciado pela posição do paciente pela ação da gravidade3,8,11,24, e também por estímulos externos, como alterações climáticas10. Queixas nasais são observadas acompanhando o quadro doloroso3,10,14. A presença de auras visuais e digestivas precedendo o aparecimento da dor também é citada10. Normalmente não há melhora com analgésico ou tratamento para enxaquecas3.

O exame físico desse pacientes apresenta variações anatômicas nasais como citadas anteriormente, valorizadas com base na suspeita diagnóstica, mas muitas vezes é considerado normal, com ausência de sinais sugestivos de processo inflamatório ou infeccioso3.

Tais pacientes são diagnosticados como portadores da entidade em questão com base clínica, de acordo com as diversas características expostas acima, sendo o diagnóstico de exclusão, afastando-se causas sinusais infecciosas, causas neurológicas, oftalmológicas, cefaléias vasculares e em salva, conforme relato3,9,11,22. Para o diagnóstico, portanto, tais autores citam a necessidade de avaliação e investigação por neurologista, incluindo eventualmente a tentativa de tratamento, assim como de um oftalmologista. Alguns autores não excluem as cefaléias vasculares e em salva, pois as consideram desencadeadas pelas causas nasais10, como citado anteriormente.

A realização de tomografia computadorizada é importante para se afastar acometimentos dos seios paranasais, dentro do ponto de vista da exclusão, e também visualiza variações anatômicas das cavidades nasais sutis, normalmente não percebidas ao exame físico3,5,11,14.

Do mesmo modo, a endoscopia naso-sinusal é um recurso diagnostico útil, pois também permite a visualização de regiões de difícil acesso na cavidade nasal3,5,14.

A aplicação de medicação anestésica ou vasoconstritora na cavidade nasal, principalmente entre a concha média e o septo, realizada durante um episódio doloroso, constitui o teste com medicação tópica, ou teste com anestésico, um recurso muito utilizado para comprovar o papel fisiopatológico de variações anatômicas nasais na determinação do quadro clínico citado. Uma vez causando alívio da dor vigente, o teste é considerado positivo, comprovando enfim o diagnóstico desta entidade, na visão de muitos autores3-5,8,10,11. Estes utilizam a cocaína no teste, outros autores utilizam a lidocaína13,16 e vasoconstritores tópicos9.

Aspectos terapêuticos

Os pacientes que sofrem episódios dolorosos com causa em variações anatômicas nasais podem ser tratados clinicamente, visando alívio do contato e pressão entre as estruturas, pela redução do edema da mucosa, através da utilização de descongestionantes sistêmicos e tópicos, esteróides tópicos, antibióticos e imunoterapia3,13.

O tratamento cirúrgico é indicado com base na falha do tratamento clínico3,5,25 cuja duração sugerida seria de seis semanas a dois meses13. Além da falha no tratamento clínico, a indicação cirúrgica baseia-se no teste com anestésico, pois ele dá o prognóstico do tratamento cirúrgico considerado, pois havendo um alívio sintomático com a aplicação do anestésico (ou ainda descongestionante), a cirurgia estaria bem indicada5,8,10. A utilização de placebo (solução fisiológica) no lugar de medicação anestésica também é sugerida e, caso promovesse alívio da dor, contra-indicaria a cirurgia, pois estaria prevendo grande possibilidade de recidiva4.

Os procedimentos citados incluem septoplastia, associada ou não à turbirnectomia média parcial ou total, ressecção submucosa de septo3,4,8,10,16,26, rinosseptoplastia24, turbinectomia média endoscópica10,14 e esfenoidectomia10. Há citação de avulsão dos nervos etmoidais para casos de difícil resolução6.

Os pacientes são acompanhados após cirurgia para observação dos resultados por no mínimo dois meses8 até sete anos10 (Tabela 1).

Os pacientes são considerados curados ou com melhora significativa dos episódios álgicos com tratamento cirúrgico de 63,6%15 a 100%3,13 (Tabela 2).

Há um trabalho retrospectivo de 913 pacientes tratados por obstrução nasal devido a desvio de septo onde os autores observam a freqüência de 23% dos pacientes com dor facial associada à obstrução nasal, que se reduzem a 22,2% após ressecção sub-mucosa do septo23. Outro relato descreve diminuição da freqüência do alívio sintomático após um ano de acompanhamento (média de 29,1 meses) quando comparada a menos de um ano (média de 7,3 meses) de 79,3% para 46,2%15.

DISCUSSÃO

As dores craniofaciais e cefaléias são muito freqüentes1, sendo sintomas de difícil estudo pela grande variedade das formas clínicas e pouca objetividade alcançada em sua avaliação. A multiplicidade de etiologias é outro fator importante. Dentre elas, a psicossomática, definida como diagnóstico, o que pode limitar uma investigação mais detalhada na busca de uma solução para o paciente. A etiologia naso-sinusal, ou cefaléia rinogênica, é uma conhecida causa de dor. As estruturas nasais e paranasais ocupam um vasto território na face e expõem sua ampla superfície mucosa a alterações do meio ambiente. Sinusites agudas, tumores intra-nasais, hematoma ou abscesso septal, rinite alérgica e cefaléia por contato septal são consideradas causas de cefaléia rinogênica4. Não há dúvida de que uma sinusite aguda ou a pressão gerada por um tumor possam causar dor, assim como a cefaléia ser freqüentemente associada a crises de rinite alérgica. No entanto, a relação entre uma deformidade do septo nasal e dores craniofaciais é um assunto que pode ser muito explorado.

Tanto as variações anatômicas nasais, como o sintoma de cefaléia e dor craniofacial são muito freqüentes, e passou-se a considerar a existência de uma relação causal entre eles, surgindo síndromes clínicas e propostas de tratamento cirúrgico simples.

Grande ênfase é dada aos aspectos anatômicos da cavidade nasal, que apresentam freqüentemente variações incluindo desvios de septo, formando ou não esporões, hipertrofia, pneumatização ou outras alterações de conchas, e ainda variações de estruturas da parede lateral da cavidade nasal. Essas variações promovem a aproximação de estruturas e até o seu contato. Muitos autores vêem nisto uma causa de dor craniofacial, sendo descrita a presença de pressão entre estas estruturas3-4,6,8-11.

Um comentário pertinente se faz necessário a respeito da pressão exercida por uma concha média pneumatizada. A pneumatização da concha é proveniente de células etmoidais de acordo com a presença de espaço na cavidade nasal17. Sob este ponto de vista é difícil imaginar uma concha média pneumatizada exercendo pressão sobre o septo, já que a mesma, ao ocupar um espaço, tem cessado seu estímulo para continuar se expandindo, portanto não exerceria pressão. Entretanto, é interessante observar que a concha média do lado estenosado provavelmente não encontraria espaço suficiente para se pneumatizar, e mesmo assim observamos por vezes a presença de extensas pneumatizações bilaterais de conchas médias, mesmo sem deformidades do septo nasal, sugerindo que poderiam ser primárias e patológicas, sendo escassa as explicações na literatura para este fato.

Observa-se que o aspecto anatômico, gerando estímulo mecânico, é considerado o principal fator fisiopatológico, e quando alguns autores definem síndromes clínicas, conceituam a necessidade de exclusão de processo naso-sinusais6,14. As observações experimentais foram as principais evidências que deram base a este conceito8,12. Afinal, ao se estimular a mucosa nasal, seja com corrente farádica, substâncias químicas ou pressão, provoca-se o aparecimento de dor nas regiões de distribuição dos nervos oftálmico e maxilar. A porção da concha média e área correspondente do septo nasal estariam especialmente implicadas, e variações acometendo esta região, principalmente desvios de septo e hipertrofias ou pneumatizações da concha média, são muito valorizadas como causa de dor. Tal região tem sua inervação pelo nervo etmoidal anterior, ramo do nervo oftálmico30. Este nervo tem um trajeto superficial, atravessa canais ósseos e termina como nervo nasal externo, de distribuição cutânea. Tais características deixariam estes ramos expostos a processos patológicos.

Outra evidência do papel anatômico, por estímulo mecânico e em especial da região citada, é a constatação do alívio da dor ao aplicar-se neste local uma substância anestésica ou vasoconstritora3,8,10,13.

O estímulo mecânico intra-nasal provoca sintomas à distância, acometendo áreas de distribuição dos nervos oftálmico e maxilar pelo mecanismo de dor referida, ou seja, fibras aferentes provenientes da mucosa nasal desembocam em áreas centrais próximas às provenientes de regiões cutâneas, podendo o córtex interpretar o estímulo como vindo destas regiões5.

Pode-se observar nessa pesquisa que há outros fatores envolvidos quando temos uma variação anatômica nasal que cause contato entre estruturas e/ou estreitamento da cavidade nasal, que podem estar relacionados ao surgimento de dor. Entre eles a disfunção muco-ciliar, com acúmulo de muco, criando um ambiente propício para o desenvolvimento de um processo infeccioso11,15 e, logicamente com a liberação de mediadores inflamatórios capazes de gerar o sintoma doloroso.

A presença de variações anatômicas também podem causar obstrução de óstios de drenagem dos seios paranasais, que por hipoventilação e hipóxia, também podem causar dor5,10,15,22. Estes dois fatores demonstram que o aspecto infeccioso não pode ser desconsiderado, e uma sinusopatia é provável, visto que temos os ingredientes necessários, como disfunção muco-ciliar em áreas críticas e a obstrução de óstios. Pode-se considerar que ao contrário de fenômenos excludentes, os fatores anatômicos e infecciosos são interligados.

Poder-se-ia também especular que a exclusão de sinusites para o diagnóstico de cefaléias causadas por variações anatômicas nasais ocorreria na verdade por falta de diagnóstico adequado. Na década de 60, quando já se coletavam trabalhos sobre o assunto6, alguns autores defendiam este conceito em um período em que a sensibilidade dos métodos diagnósticos seria bem menor do que mais recentemente. Mesmo assim este conceito arraigou-se, sendo provável que sinusites acometendo células etmoidais, ou pequenos espessamentos de mucosa dos seios frontais ou maxilares passassem despercebidos e o paciente teria o diagnóstico de cefaléia por causa anatômica, sendo excluída causa sinusal infecciosa. Hoje, tais pacientes poderiam ter diagnóstico de sinusite através da tomografia computadorizada. Por outro lado, uma análise de cortes coronais de tomografias computadorizadas de pacientes com e sem história de sinusite levou à observação que este exame poderia apresentar diagnóstico falso positivo, uma vez que encontrou pequenas alterações mucosas em pacientes assintomáticos, concluindo que o diagnóstico deve se basear em avaliação individual de cada caso18. Entretanto, outros autores enumeraram algumas destas variações anatômicas encontradas em tomografia computadorizada considerando-as fatores predisponentes significativos tanto a cefaléias como a sinusopatias5.

Alterações climáticas de umidade e temperatura, estímulos químicos, alérgicos e hormonais são citadas como causadores de edema da mucosa nasal, principalmente em regiões estreitas, podendo causar o contato entre estruturas10,22. Poder-se-ia especular, portanto, que o processo inflamatório nasal pode surgir muitas vezes independentemente de uma variação anatômica ou contato entre mucosas, podendo ser então agravados por ele.

A participação do edema neurogênico, através da ação de mediadores liberados por fibras nervosas sensitivas, por exemplo a substância P, também deve ser comentada. Os estímulos para sua deflagração são vários, além do mecânico, químico, infeccioso e calórico5.

A abrangência deste assunto é ampliada quando variações anatômicas nasais são consideradas desencadeantes para diversas formas de enxaqueca10. A correlação de enxaquecas ou migrâneas com etiologia relacionada a estruturas nasais e paranasais torna-se muito interessante quando considera-se o sistema trigeminovascular, constituído pela presença de fibras trigeminais em torno de importantes vasos do sistema nervoso central que, quando estimuladas, produziriam alterações inflamatórias nestes vasos, mediadas por peptídeo relacionado ao gene de calcitonina (GGRP) e substância P, gerando crises de enxaqueca29. Ora, fibras trigeminais distribuem-se amplamente em estruturas nasais e paranasais via ramos oftálmicos e maxilar, expondo-se portanto a estímulos diversos. A malha de fibras trigeminais tem capacidade de ao ser estimulada em um ponto, liberar mediadores a distância, via reflexo axonal ou impulso antidrômico, como citado. Constata-se, portanto, no sistema trigeminovascular, uma interessante explicação fisiopatológica das observações que relacionam estruturas nasais às enxaquecas. Tal correlação é observada de outra maneira no relato de dois casos com diagnósticos clínicos de cefaléia em salva considerados causados por sinusopatias ipsilaterais28. A estimulação trigeminal poderia ser deflagradora de reflexos parassimpáticos responsáveis pelo sintomatologia.

Independentemente da presença de variações anatômicas nasais, pouco se discute o aspecto funcional, ou seja, a relação entre obstrução nasal propriamente dita e cefaléia. Vimos que muitos autores encontram a cefaléia como sintoma associado a obstrução nasal com freqüência, sendo a queixa secundária mais comum apresentada por estes pacientes15,22-24. Independentemente da variação anatômica que cause a obstrução, a má ventilação nasal e conseqüentemente respiração bucal de suplência levam a outros mecanismos fisiopatológicos, como ausência do reflexo naso-pulmonar, com repercussão ventilatória na expansão pulmonar, além de alterações posturais, atingindo portanto áreas que fogem da atenção do otorrinolaringologista. Constata-se, no entanto, correlação entre melhora da obstrução nasal e melhora da cefaléia em pacientes submetidos a tratamento cirúrgico nasal como septoplastias e turbinectomias15,22,24. Qual a importância de cada mecanismo no alívio dos sintomas? Os otorrinolaringologistas tendem a localizar as explicações nas alterações cirúrgicas das estruturas nasais, pouco citando mecanismos sistêmicos.

Uma questão importante não esclarecida advém do fato da observação muito freqüente na prática diária de variações grosseiras das cavidades nasais, incluindo desvios e hipertrofias de conchas, causando áreas de contato entre estruturas e estreitamentos nasais em pacientes totalmente assintomáticos do ponto de vista de dor facial ou cefaléia. Isso nos leva a pensar que os mecanismos que citamos ¬- infecciosos, efeito das alterações climáticas, edema neurogênico e correlação com migrâneas -, têm efeitos que variam individualmente em cada caso. É razoável imaginar-se que estes mecanismos ocorram também na ausência de variações anatômicas, sendo estas agravantes. A representação clínica destes fenômenos deve, portanto, variar de indivíduo para indivíduo. Isso dificulta muito em definir a etiologia nasal. Não podemos responsabilizar isoladamente uma variação anatômica nem, por outro lado, excluí-la da etiologia em um paciente com cavidades nasais normais. A patogenicidade de diversas alterações ósseas (células do agger nasi, células de Haller e concha bolhosa) encontradas em uma revisão de cortes de tomografia computadorizada é questionada, pois são freqüentes tais achados em pacientes assintomáticos18.

Constata-se, portanto, muitos fatores relacionados à produção de dor com etiologia nasal. O argumento de que a anestesia das cavidades nasais comprovaria o papel fisiopatológico mecânico das alterações anatômicas desconsidera estes múltiplos fatores. Pode-se especular que a aplicação de um anestésico em regiões das cavidades nasais, causando alívio do sintoma doloroso, comprova principalmente o papel da inervação sensitiva da mucosa nasal, mas não define claramente qual mecanismo fisiopatológico é o mais importante. É oportuno comentar que existem relatos que utilizaram vasoconstritor no teste, e ao retrair a mucosa, afastaria as estruturas eliminando o contato, e conseqüentemente o estímulo mecânico para dor9. Este teste é mais específico para as alterações anatômicas que aquelas que utiliza anestésico, mas também causa alterações fisiológicas que não permite considerá-lo muito objetivo. Não se sabe também até que ponto o alívio causado com a desobstrução nasal ao se aplicar um vasoconstritor tem impacto em uma sensação subjetiva que é a dor.

Em relação à validade desse teste, poder-se-ia propor sua realização em indivíduos com cefaléia não-rinogênica, a fim de se estimar sua especificidade às causas nasais.

O quadro clínico desenhado pelas alterações nasais correspondem basicamente à dor, com variações de suas características, dependendo do autor, associada à observação de alguma alteração anatômica ao exame físico das cavidades nasais, que possam causar suspeita de relação causal. A principal diferença na descrição do quadro clínico consiste em um grupo de autores que excluem as características das cefaléias vasculares, considerando-as diagnósticos diferenciais3,8-9,11,14-15,22, e outros que as incluem10.

O diagnóstico de um quadro de dor craniofacial relacionado a variações anatômicas nasais é feito com base na suspeita clínica fundamentalmente, ou seja, história e exame físico. As alterações ao exame físico podem ser sutis, sendo necessária a avaliação por endoscopia naso-sinusal e tomografia computadorizada3-5,8,10-11,22. O teste com anestésicos é muito valorizado no diagnóstico4,5,8,11, mas há autores que enxergam limitações no teste, como dificuldades prática de aplicá-lo na vigência da dor e o fato de não ser aplicado com bases científicas. Conforme comentado, o teste demonstraria implicação neuronal, ou seja, da inervação sensitiva, não comprovando o papel principal mecânico.

Outro aspecto muito importante a ser considerado é o tratamento sugerido pelos autores quando definida a etiologia anatômica nasal. O tratamento clínico é citado, porém com resultados insatisfatórios3,13. O tratamento cirúrgico é enfatizado, pois como se viu, o papel anatômico é muito valorizado na fisiopatologia. Sua indicação baseia-se na falha do tratamento clínico3,5 e na realização do teste com anestésico, que preveria o resultado cirúrgico5,8,10. Entretanto, a utilização de placebo no lugar da droga anestésica é descrita e, havendo abolição da dor, a cirurgia estaria contra-indicada4.

Os procedimentos realizados enfocam principalmente o septo nasal e a concha média: septoplastias, ressecções sub-mucosas, turbinectomias parciais ou totais, e também rinoplastias. Curiosamente, alguns autores citam também etmoidectomias e esfenoidectomias como tratamento3,10,14, porém não esclarecem de forma convincente os critérios para tais indicações, o que nos parece conflitante com o próprio conceito defendido por alguns destes autores3, de que as sinusopatias constituem diagnóstico diferencial, devendo ser excluída para que se defina a etiologia nasal devido a alterações anatômicas.

Independentemente dos procedimentos empregados, todos os autores obtiveram bons resultados em suas amostras, com alívio total ou melhora significativa da dor na maioria dos pacientes operados: 63,6%15 a 100%3,13 até o instante que foram acompanhados. O período de seguimento variou de 12 meses22,14 a 46 meses em média10 dentro dos dez trabalhos que mostraram este números. Os fatores relacionados à melhora clínica pós-cirúrgica são estudados em um interessante levantamento, dentre eles, o tempo de acompanhamento menor que um ano relaciona-se a bons resultados, observando-se uma incidência maior de recidivas após este período15. Esta observação nos leva a pensar no mecanismo de alívio sintomático gerado pelos procedimentos cirúrgicos. Estes, de alguma forma, causam lesões nos ramos nervosos implicados na fisiopatologia, ou seja, ramos do nervo oftálmico e maxilar que distribuem na mucosa nasal, sendo estas lesões de difícil quantificação, mas certamente com repercussão na condução dos estímulos sensoriais desta região. Este fato poderia teoricamente auxiliar na minimização dos sintomas dolorosos após o tratamento cirúrgico. O acompanhamento tardio é considerado fundamental na conclusão da eficácia do tratamento cirúrgico por autores em nosso meio26 que, acompanhando casos por até 4 anos, consideraram o tratamento cirúrgico eficaz.

O papel da lesão nervosa no alívio sintomático pode ser exemplificada historicamente na indicação de secção do nervo etmoidal anterior via trans-orbital e também por avulsão dos nervos etmoidais anterior e posterior para abolição do quadro álgico em casos de difícil tratamento7.

Se este mecanismo fosse considerado como predominante na obtenção do resultado cirúrgico, assumir-se-ia um potencial de recidiva maior, dependente da regeneração das fibras lesadas, o que seria condizente com o trabalho citado que correlaciona melhores resultados com tempo curto de acompanhamento15. Vale a ilustração do paciente submetido à rinoplastia, que com o decorrer do tempo, recupera gradualmente a sensibilidade da pele. Não se deve ainda desconsiderar o eleito placebo que os procedimentos cirúrgicos exercem nos pacientes, o que também poderia ajudar a explicar as recidivas em longo prazo. A quantificação deste efeito é difícil, uma vez que se trata de procedimentos cirúrgicos, não sendo realizados estudos duplo-cegos. Este aspecto é citado em um trabalho, porém o autor não considera que o efeito placebo possa durar mais de um ano, e, como encontra bons resultados além deste período, acredita no tratamento cirúrgico24.


Tabela 1. Tempo de acompanhamento após tratamento cirúrgico para observação dos resultados.


Tabela 2. Porcentagem de pacientes considerados curados ou com melhora significativa após tratamento cirúrgico de acordo com o estudo de alguns autores.


Figura 1. Reflexo axonal demonstrando efeitos da substância P na mucosa nasal, através do impulso antidrômico5. (1-extravasamento de plasma, 2- vasodilatação, 3-contração de musc. lisa, 4-secreção)


COMENTÁRIOS FINAIS

A relação entre cefaléia e dor craniofacial com aspectos anatômicos nasais, do ponto de vista fisiopatológico, baseia-se no mecanismo de dor referida que incluem os territórios dos ramos oftálmico e maxilar do nervo trigêmeo. Os estímulos desencadeantes, entretanto, devem levar em conta o fator mecânico que está intimamente relacionado a fatores inflamatórios e infecciosos. Mecanismo complexos como inflamação neurogênica, correlação com migrâneas e obstrução nasal estão envolvidos. O tratamento cirúrgico, além da correção anatômica, pode influenciar a sensibilidade da mucosa nasal e sua eficácia depende de longo tempo de acompanhamento, além do que o efeito placebo pode estar envolvido.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Friedman AP. Headache. In: Merrit H.H. Textbook of Neurology. 8th ed. Philadelphia PA: Lea, Febiger; 1989. p.44-8.

2. Adams RD, Victor M. Headache and other craniofacial pains. In _________ principles of neurology. 3rd ed. New York: Mcgraw Hill Book Company; 1985. p.129-48.

3. Goldsmith AJ, Zahtz GD, Stegnjajic A, Shikowitz M. Middle turbinate headache syndrome. Am J Rhinol 1993; 7: 17-30.

4. Ryan RE, Ryan JR RE. Headache of nasal origin. Headache 1979; 19: 173-9.

5. Stammberger H, Wolf G. Headaches and sinus disease: the endoscopic approach. Ann Otol Rhinol Laryngol Suppl 1998; 134(97): 3-23.

6. Shalom AS. The anterior ethmoid nerve syndrome. Journal of Laryngology and Othology 1963; 77: 315-25. (sluder 1922 apud Shalom 1963)

7. Littell JJ. Disturbances of the ethmoid branches of the ophthalmic nerve. Arch Otolaryngol 1946; 43: 481-99.

8. Morgestein KM, Krieger MK. Experiences in middle turbinectomy. Laringoscope 1980; 90:1596-603.

9. Gerbe RW, Fry TL, Fischer ND. Headache of nasal spur origin: an easily diagnosed and surgically correctable cause of facial pain. Headache 1984; 24: 329-30.

10. Novak VJ, Marek M. Pathogenesis and surgical treatment of migraine and neurovascular headaches with rhinogenic trigger. Head Neck 1992; 14(6): 467-72.

11. Blaugrund SM. The nasal septum and concha bullosa. Otolaryngol Clin N Am 1989; 22: 291-306.

12. Mcauliffe GW, Goodell H, Wolff HG. Experimetnal studies on headache: painfron the nasal anda paranasal structures. Research Publication of the Association for Research into Nervous anda Mental Disease 1943; 23: 185-218.

13. Kamal SA. Experience witch xylocaine teste as prognostic aid dor surgery in Sluder´s Neuralgia. J. Laryngol Otol 1995; 109: 193-5.

14. Clerico DM, Fieldman R. Referred headache of rhinogenic origin in the absence of sinusitis. Headache 1994; 34: 226-9.

15. Low WK, Willatt DJ. Headaches associated with nasal obstruction due to deviated nasal septum. Headache 1995; 35(7): 404-6.

16. Anselmo-Lima WT, Oliveira JAA, Speciali JG, Bordini C, Santos AC, Rocha KV, Pereira ES. Middle turbinate headache syndrome. Headache 1997; 37(2): 102-6.

17. Navarro JAC. Anatomia do nariz seios paranasais e estruturas correlatas. In: Stamm A. Microcirurgia naso-sinusal. 1º ed. Revinter; 1995. p.15-31.

18. Bolger SM. The nasal septum and concha bullosa. Otolaryngol Clin N AM 1989; 22:291-306.

19. Sessle BJ. Neural mechanisms of oral an facial pain. Otolaryngology Clinics of North America 1989; 22: 1059-72.

20. Pernow B. Substance P. Pharmacol Reviews 1983; 35(2): 85-141.

21. Lundblad L, Lundberg JM, Brodin E, Ängaard A. Origin and distribution of capsaicin-sensitive nerves in the nasal mucosa. Acta Otolaryngol 1983; 96(56): 485-93.

22. Shonsted-Madsen U, Stoksted P, Christensen PH, Koch-HenriksenN. Chronic headache related to nasal obstruction. J Laryngol Otol 1986; 100: 165-70.

23. Peacock. MR. Sub-mucous resection of the nasal septum. J Laryngol Otol 1981; 95:341-56.

24. Koch-Henriksen N; Gammelgaard N. Hvidegaard T; Stoksted P. Chronic headache: the role of deformity of the nasal septum. British Medical Journal 1984; 288: 434-5.

25. Wilkmann C, Lessa MM, Santoro PP, Imamura R, Voegels RL, Butugan O. Cefaléia por contato entre mucosas nasais: resultados cirúrgicos em 21 pacientes. Rborl 2000; 66 ed. 6.

26. Pereira Fabiana C, Sanches Andréia, Lima Wilma TA. A turbinectomia média parcial e seus efeitos tardios em pacientes com síndrome da cefáleia do corneto médio. Rborl 2000; 66. ed. 4.

27. Sulman FG. Migraine and headache due to weather and allied causes and its specific treatment. Upsala J Med Sci 1980; Suppl. 31:41-4.

28. Takeshima T; Nishikawa SL Takahashi K. Cluster headache like symptoms due to sinusitis: evidence of neuronal pathogenesis of cluster syndrom. Hradache 1988; 28: 207-8.

29. Buzzi MG, Moskowitz MA. The trigeminovascular system and migraine. Pathol Biol 1992; 40(4): 313-7.

30. Busoloti Filho I, Dolci JEL, Lopes Filho O. Anatomifisiologia clínica das Fossas nasais e seios paranasais. In: Lopes Filho O, Campos CAH. Tratado de Otorrinolaringologia. 1º ed. São Paulo: Roca; 1994. p. 242-4.

1 Mestre, médico.
2 Doutor em Otorrinolaringologia pela UNIFESP.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 11/3/2005 e foi aprovado em 24/5/2005.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


Imprimir:
Todos os direitos reservados 1933 / 2024 © Revista Brasileira de Otorrinolaringologia