ISSN 1806-9312  
Quarta, 27 de Novembro de 2024
Listagem dos arquivos selecionados para impressão:
Imprimir:
3214 - Vol. 71 / Edição 2 / Período: Março - Abril de 2005
Seção: Artigo Original Páginas: 202 a 207
Potencial cognitivo P300 em indivíduos com diabetes mellitus
Autor(es):
Kátia de Freitas Alvarenga1, Josilene Luciene Duarte2, Daniela Polo Camargo da Silva3, Raquel Sampaio Agostinho-Pesse4, Carlos Antonio Negrato5, Orozimbo Alves Costa6

Palavras-chave: diabetes mellitus, perda auditiva, potencial evocado P300, audiometria.

Keywords: diabetes mellitus, hearing loss, event-related potentials, p300, audiometry.

Resumo: Diabetes Mellitus pode acarretar complicações nos olhos, rins, nervos cranianos, nervos periféricos, ouvidos, etc. A função cognitiva também parece estar prejudicada em indivíduos portadores de Diabetes Mellitus, visto que as estruturas corticais e subcorticais responsáveis por esta função estão prejudicadas em alguns pacientes dependentes de insulina. O potencial cognitivo P300 tem sido usado como um procedimento objetivo para avaliar a função cognitiva cerebral. Objetivo: Analisar a sensibilidade do potencial cognitivo P300 para detectar alterações no córtex auditivo decorrentes do Diabetes Mellitus. Forma de estudo: coorte transversal. Material e Método: Participaram deste estudo 16 indivíduos diabéticos de ambos os sexos, com idade variando de 7 a 71 anos, e 17 indivíduos não-diabéticos equiparados quanto ao sexo, idade e limiar auditivo. Os procedimentos de avaliação foram: Audiometria Tonal Liminar (ATL) e potencial cognitivo P300. No grupo diabético foi realizada a medida do valor glicêmico antes da realização do P300. Resultados: Os resultados obtidos na ATL não mostraram diferença estatisticamente significante. Foi observado diferença estatisticamente significante entre os grupos, quando analisado a latência do componente P3, medido em Fz. Houve correlação entre a glicemia e a latência e amplitude do P300. Conclusão: A pesquisa do potencial cognitivo P300 é um importante procedimento para prevenir e diagnosticar precocemente de alterações neurológicas em indivíduos com Diabetes Mellitus.

Abstract: Diabetes Mellitus may lead to alterations in the eyes, kidneys, cranial nerves, peripheral nerves, ears etc. The cognitive function, also, seems to be compromised in subjects presented with Diabetes Mellitus, since the cortical and subcortical structures responsible for this function are hindered in some insulin-dependent patients. The cognitive potential P300 has been used as an objective procedure to assess cerebral cognitive functions. Objective: Analyze the sensitivity of P300 cognitive potential for the detection of alterations on the auditory cortex secondary to Diabetes Mellitus. Study design: transversal cohort. Material and Method: Sixteen diabetic subjects of both genders aged 7 to 71 years, and seventeen non-diabetic individuals at the same age range participated in this study. the evaluation procedures were pure tone audiometry (PTA) and P300 cognitive potential. Glycemia of the group presented with Diabetes was assessed prior to applying the P300. Results: No statistically significant difference was shown for the PTA results. A statically significant difference was observed between groups when analyzing the latency of the P300 component measured in Fz. there was a correlation between glycemia and the latency and amplitude of P300. Conclusion: The investigation of the cognitive potential of P300 is an important procedure for the prevention and early diagnosis of neurological changes in individuals presented with Diabetes Mellitus.

INTRODUÇÃO

O Diabetes Mellitus é uma condição crônica que surge quando o pâncreas não produz insulina em quantidade suficiente ou quando o organismo não consegue utilizar de modo eficaz a insulina produzida. Alterações na secreção e/ou ação da insulina podem levar a hiperglicemia. A prevalência de Diabetes varia muito entre as diversas regiões do mundo, e dentro da mesma região, esperando-se que até o ano de 2025 a população de diabéticos do mundo duplicará quando comparado ao número de diabéticos existentes em 2000 (150 milhões para 300 milhões). O Diabetes Mellitus se constitui numa das doenças crônico-degenerativas mais prevalentes nos dias de hoje.

Existem quatro tipos principais de Diabetes: 1) Tipo 1 - ocorre a destruição autoimune das células beta do pâncreas que leva à inabilidade em produzir insulina, sendo necessário injeções de insulina para a sobrevivência do indivíduo); 2) tipo 2 - é caracterizado por desordens na ação ou na secreção de insulina, podendo haver predomínio de uma das situações, estando geralmente ambas presentes. O controle metabólico é geralmente obtido com dieta, realização de exercícios físicos e/ou uso concomitante de agentes hipoglicemiantes orais, podendo ser utilizada a insulina no tratamento.); 3) Diabetes Secundário (tipos de Diabetes onde o fator causal é conhecido, tais como certos defeitos genéticos que levam a alterações da função da célula beta ou na ação da insulina, algumas doença pancreáticas, endócrinas ou causadas por uso de certa drogas.); e, 4) Diabetes Gestacional (é primeiramente diagnosticado durante a gravidez e poderá ou não desaparecer ao término da gestação).

Nas complicações crônicas do Diabetes Mellitus podem estar incluídas alterações nos olhos, rins, nervos cranianos, nervos periféricos, ouvidos, etc. Especificamente no sistema auditivo, podem ocorrer atrofia do gânglio espiral, degeneração da bainha de mielina do oitavo nervo, diminuição do número de fibras nervosas na lâmina espiral, ou espessamento das paredes capilares da estria vascular e das pequenas artérias dentro do canal auditivo1. Em exame histológico, lesões do ouvido interno são encontradas em 50% das pessoas com diagnóstico Diabetes Mellitus 2.

A perda auditiva observada em indivíduos com Diabetes Mellitus é caracterizada como sendo neurossensorial, bilateral, simétrica e com grau mais elevado na região das freqüências altas3,4. No entanto, foi observado que no Diabetes tipo 1, a ocorrência de perda auditiva está associada a fatores como idade, duração da doença e presença de Neuropatia5,6.

A função cognitiva também parece estar prejudicada em indivíduos portadores de Diabetes Mellitus, visto que as estruturas corticais e subcorticais responsáveis por esta função estão prejudicadas em alguns pacientes dependentes de insulina 7.

O potencial cognitivo P300 tem sido usado como um procedimento objetivo para avaliar a função cognitiva cerebral, e parece ser uma ferramenta apropriada para averiguar seqüelas causadas pela hipoglicemia na região do hipocampo8,9. Caracteristicamente, observa-se latência aumentada do potencial cognitivo P300, tanto em indivíduos com Diabetes Mellitus tipo 1 quanto tipo 210,11, sendo que no Diabetes Mellitus tipo 2 este achado pode ocorrer mesmo quando ainda não há sinais clínicos de danos ao sistema nervoso12. O potencial cognitivo P300 é discutido como o procedimento mais sensível para se detectar os efeitos subclínicos da hipoglicemia aguda, quando comparado aos testes psicométricos e o eletroencefalograma 13.

Estudo demonstrou significante correlação entre a latência do potencial cognitivo P300 e a duração do Diabetes Mellitus, sendo que o mesmo não foi observado quando analisado a quantidade de episódios de coma hipoglicêmico. Este indica que na evolução do comprometimento glicêmico as anormalidades metabólicas de longa duração são mais relevantes do que eventos isolados de hipoglicemia14. A hipoglicemia por tempo prolongado pode causar danos permanentes na região cognitiva do cérebro, principalmente em crianças diabéticas dependentes de insulina 15.

Desta forma, o objetivo desta pesquisa foi analisar a sensibilidade do potencial cognitivo P300 para detectar alterações na função cognitiva do indivíduo com diagnóstico de Diabetes Mellitus.

MATERIAL E MÉTODO

Este estudo foi realizado no Centro de Pesquisas Audiológicas (CPA) do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais e Clínica de Fonoaudiologia da Faculdade de Odontologia de Bauru, ambos da Universidade de São Paulo, campus Bauru - SP.

Seleção da Casuística

Os indivíduos foram encaminhados pelo médico endocrinologista da Associação de Diabéticos da cidade de Bauru/São Paulo. O critério para a inclusão no grupo experimental foi o diagnóstico prévio de Diabetes Mellitus. O grupo controle foi equiparado quanto ao sexo, idade e grau de perda auditiva para excluir estas variáveis na análise do exame. Para os dois grupos foram excluídos os indivíduos com:

· histórico de outros fatores de risco para a deficiência auditiva e/ou que na avaliação convencional apresentaram perda auditiva condutiva, confirmada no teste de medida da imitância acústica;
· presença de distúrbios não-auditivos associados que poderiam alterar os potenciais de longa latência, como doenças neurológicas e síndromes.

Não foram excluídos os indivíduos com perda auditiva, visto que os potenciais evocados auditivos relacionados a evento sofrem maior influência de fatores como motivação do indivíduo em realizar o teste, atenção para o estímulo e o grau de diferença entre os estímulos apresentados.

Casuística

Participaram deste estudo 33 indivíduos, sendo 16 com diagnóstico de Diabetes Mellitus, de ambos os sexos e idade variando de sete a 71 anos (grupo diabético), e 17 indivíduos não-diabéticos equiparados quanto ao sexo, idade e grau da perda auditiva (grupo controle). Todos receberam uma carta de informação e assinaram um termo de concordância a respeito da participação no presente estudo.

Processo de Avaliação

Audiometria tonal liminar

A audiometria tonal liminar (ATL) foi realizada em cabina acústica, utilizando-se o audiômetro Madsen, modelo Midmate 622 com fones TDH-39, calibrado no padrão ANSI-69. Foram pesquisados os limiares tonais nas freqüências de 0,5 a 8 kHz por via aérea, sendo considerado normal, limiar auditivo £ 25 dBNA.

Potencial cognitivo P300

Os potenciais evocados auditivos referem-se a mudança na atividade elétrica que ocorre no sistema auditivo periférico e central em reposta a um estímulo acústico ou elétrico. O potencial evocado que ocorre no cérebro em resposta a um evento interno, como a percepção ou cognição, é denominado potencial relacionado a evento, também considerado potencial endógeno. Nesta classe temos o potencial cognitivo P300.

O potencial cognitivo P300 ocorre quando o indivíduo conscientemente reconhece a presença de uma mudança no estímulo acústico apresentado: tone burst ou fala. Assim, para o registro do potencial cognitivo P300 é utilizado o "oddball paradigm", que caracteriza-se pela apresentação aleatória de um estímulo, considerado como raro, durante a apresentação de um outro estímulo freqüente. No caso da utilização do tone burst os estímulos se diferenciam quanto a freqüência, intensidade ou duração.

Neste estudo, a pesquisa do potencial cognitivo P300 foi realizada em sala silenciosa com o uso de fones de inserção 3A. Foram utilizados eletrodos descartáveis para ECG AG/AGCL com gel e fio com garras tipo pinça, a fim de possibilitar o uso deste tipo de eletrodo. Para iniciar a avaliação eletrofisiológica, foi necessário que os eletrodos apresentassem impedância individual menor que 5KW e impedância entre eles menor que 2KW. O exame foi realizado com o indivíduo deitado confortavelmente e de olhos fechados (eliminação do artefato causado pela movimentação ocular). Os eletrodos ativos foram colocados em Cz e Fz e conectados na entrada 1 dos canais 1 e 2, respectivamente, do pré-amplificador. Os eletrodos de referência foram posicionados nas mastóides direita e esquerda e conectados na entrada 2 dos canais 1 e 2, do pré-amplificador e o eletrodo terra foi colocado na posição Fpz.

Foi utilizado estímulo tone burst na freqüência de 2 KHz para o estímulo raro, apresentado randômicamente na probabilidade de 20%, mesclado ao estímulo tone burst freqüente na freqüência de 1kHz apresentado na probabilidade de 80%, com rise de 25 ms e plateau de 50 ms, intensidade moderada de 70dB, velocidade de 1 estímulo por segundo e com a utilização de filtro passa-banda de 1 a 125Hz. O registro inicial foi filtrado por um filtro digital passa-baixo com freqüência de corte de 25Hz. Foi solicitado que o indivíduo identificasse o estímulo raro, contando-o em voz alta.

Para a pesquisa do potencial cognitivo P300, foi utilizado o equipamento Biologic's Evoked Potential System (EP).

O nível glicêmico foi medido em todos os diabéticos, após a colocação dos eletrodos e fone no indivíduo para a realização do potencial cognitivo P300. Para tanto foi utilizado o aparelho Advantage, na Accu-chek Product, Roche, com fita Advantage, glucose.

Parâmetros de análise dos resultados

Dos achados obtidos, interessaram especificamente à proposta do presente estudo os limiares tonais da orelha direita e orelha esquerda medidos nas freqüências de 0,5 a 8 kHz por via aérea e, no potencial cognitivo P300, a latência absoluta dos componentes N2 e P300 e amplitude (amp) do P300, registrados em Fz e Cz. Foi considerada presença da onda P300 quando a mesma foi registrada simultaneamente em Fz e Cz.

Análise estatística

Os resultados da audiometria tonal limiar foram analisados por meio da análise descritiva para calcular média e desvio padrão, teste c2 para comparar os grupos controle e diabéticos, análise de variância com medidas repetidas considerando os lados direito e esquerdo e os grupos controle e diabéticos. Os resultados do potencial cognitivo P300 também foram analisados por meio da análise descritiva para calcular média e desvio padrão; teste t Student para comparar a latência absoluta dos componentes N2 e P300 e a amplitude do P300, medidos em Cz e Fz, para os grupos controle e diabéticos e Correlação de Pearson para verificar a correlação entre o nível glicêmico e a latência absoluta dos componentes N2 e P300 e a amplitude do P300, medidos em Cz e Fz respectivamente.

RESULTADOS

Na Tabela 1 observa-se a ocorrência de perda auditiva constatada na audiometria tonal liminar, e o resultado do teste c2 comparando os grupos controle e diabéticos, demonstrando não haver diferença estatisticamente significante entre os mesmos.

Na Tabela 2 encontram-se os resultados da análise estatística ao comparar os grupos controle e diabéticos por meio do teste de Análise de Variância com medidas repetidas, cujos fatores foram orelha testada e grupo analisado, quanto aos limiares auditivos obtidos na ATL para cada freqüência testada.

A distribuição dos indivíduos do grupo controle e grupo diabético, de acordo com o grau da perda auditiva constatada na audiometria tonal liminar, considerando a média dos limiares auditivos em 0,5, 1 e 2 kHz encontra-se na Tabela 3. Na mesma tabela encontra-se o resultado do teste c2 comparando o grupo controle e diabéticos.

A Tabela 4 apresenta a análise estatística descritiva do potencial cognitivo P300, quanto as latências absolutas dos componentes N2 e P300, em ms, e a amplitude do P300, para o registro em Fz e Cz.

A Tabela 5 apresenta os resultados da análise estatística ao comparar os grupos controle e diabéticos por meio do teste t Student, quanto às latências absolutas dos componentes N2 e P300, em ms, e a amplitude do P300, para o registro em Fz e Cz, respectivamente.

A correlação entre o nível glicêmico coletado anteriormente à pesquisa do potencial cognitivo P300 e os componentes N2Cz, N2Fz, P300Cz e P300Fz, P300Cz amp, P300Fz amp, por meio do teste da Correlação de Pearson, está descrita na Tabela 6.

Os Gráficos 1, 2 e 3 mostram a correlação existente entre o componente FzP300, considerando a latência e amplitude com o nível glicêmico, respectivamente.


Tabela 1. Distribuição dos indivíduos do grupo controle e grupo
diabético, de acordo com a presença ou ausência de perda auditiva constatada na audiometria tonal liminar. Resultado do teste c2 comparando o grupo controle e diabético.


Tabela 2. Análise estatística para comparar os grupos controle e diabético, por meio do teste Análise de variância (medidas repetidas com fator de repetição lado e um fator de repetição grupo), quanto aos limiares auditivos obtidos na audiometria tonal liminar para cada freqüência testada.


Tabela 3. Distribuição dos indivíduos do grupo controle e grupo diabético, de acordo com a presença ou ausência de perda auditiva, constatada na audiometria tonal liminar, considerando a média dos limiares auditivos em 0,5, 1 e 2 kHz. Resultado do teste c2 comparando o grupo controle e diabético.


Tabela 4. A análise estatística descritiva do potencial cognitivo P300, quanto as latências absolutas dos componentes N2 e P300, em ms, e a amplitude do P300, para o registro em Fz e Cz.


Tabela 5. Análise estática ao comparar os grupos controle e diabético por meio do teste t Student, quanto às latências absolutas dos componentes N2 e P300, em ms, e a amplitude do P300, para o registro em Fz e Cz, respectivamente.


Tabela 6. Correlação entre o nível glicêmico coletado no grupo diabético anteriormente a pesquisa do potencial cognitivo P300 e os componentes N2Cz, N2Fz, P300Cz e P300Fz, P300Cz amp, P300Fz amp, por meio do teste de Correlação de Pearson.


Gráfico 1. Correlação existente entre a latência do FZN2 (ms) e o nível glicêmico (mg/dl).


Gráfico 2. Correlação existente entre a latência do CZP3 (ms) e o nível glicêmico (mg/dl).


Gráfico 3. Correlação existente entre a amplitude do FZP300 (¼v) e o nível glicêmico (mg/dl).


DISCUSSÃO

O fato de não haver diferença estatisticamente significante entre os grupos controle e diabéticos quanto à ocorrência de perda auditiva (Tabela 1), pode ser justificada pela faixa etária dos grupos estudados, sete a 72 anos no grupo controle e sete a 71 anos no grupo de diabéticos, havendo assim a influência do fator envelhecimento em ambos os grupos 1. Importante ressaltar que todos os indivíduos com perda auditiva, tanto no grupo controle quanto diabético, apresentavam idade superior a 35 anos.

A análise comparativa dos limiares auditivos obtidos em cada freqüência testada na audiometria tonal liminar não demonstrou diferença estatisticamente significante entre os grupos (Tabela 2). Foi possível constatar semelhança na configuração da curva audiométrica dos indivíduos do grupo controle e indivíduos diabéticos, sendo que as freqüências graves apresentaram limiares auditivos mais preservados do que as freqüências agudas, caracterizando curva audiométrica descendente para os dois grupos. Este tipo de configuração é comum tanto na perda auditiva decorrente do envelhecimento quanto do Diabetes Mellitus, devido à alteração inicial na base da cóclea, região responsável pelas freqüências agudas. Nossos achados estão condizentes com estudos anteriores2-5.. Resultado semelhante foi observado quando considerado a classificação do grau de perda auditiva de acordo com a média das freqüências 0,5, 1 e 2 kHz. Nossos achados estão condizentes com estudos anteriores4,5.

Com relação ao potencial cognitivo P300, foram registrados os componentes N2 e P300 em todos os indivíduos dos grupos controle e diabético.

Na pesquisa do potencial cognitivo P300, foi observado aumento da latência do P300, com o registro em Cz, apresentando valor de 324,55 ± 37,47 ms no grupo controle e 355,07± 41,31 ms no grupo diabético, com diferença estatisticamente significante (Tabelas 4 e 5). Não foi observada diferença estatisticamente significante entre os grupos quando analisado o componente N2 registrado em Cz e Fz. Estes resultados sugerem aumento da latência do P300 em indivíduos diabéticos, refletindo possíveis alterações nos processos de atenção, discriminação auditiva, memória e perspectiva semântica nestes indivíduos. Na literatura alguns estudos com potenciais evocados auditivos demonstraram a alteração do P300 em indivíduos diabéticos6,7; entretanto, outros não encontraram qualquer alteração8.

De acordo com o teste de correlação de Person, houve correlação estatisticamente significante entre as latências dos componentes FZN2 (p=0,027) e CZP3 (p=0,043) e a amplitude do componente FZP3 amp (p=0,009) com o nível de glicemia sanguínea. Entretanto, não foi observado o mesmo para os componentes FZP3 (p=0,141), CZN2 (p=0,083) e CZP3 amp (p=0,283) (Tabela 6 e Gráficos 1, 2 e 3).

Os resultados demonstraram que a diminuição no nível glicêmico no indivíduo diabético leva a um aumento da latência e diminuição da amplitude do componente P300, sugerindo uma disfunção no sistema auditivo central. Considerando que o tecido nervoso é glicose dependente, ou seja, depende de um nível estável de glicose em situações ideais, quadros de hipoglicemia por longos períodos podem levar o indivíduo a alterações neurológicas importantes9.

Desta forma, a pesquisa do potencial cognitivo P300 pode ser um importante procedimento para a prevenção e diagnóstico precoce de alterações neurológicas em indivíduos com Diabetes Mellitus10,11.

É importante salientar que geralmente os estudos são realizados com indivíduos portadores de Diabetes tipo 1, ao contrário do presente estudo, onde a população maior era composta por indivíduos portadores de Diabetes tipo 2, demonstrando que a alteração auditiva pode ocorrer nos dois tipos de Diabetes Mellitus.

CONCLUSÃO

Os resultados obtidos permitiram concluir que a pesquisa do potencial cognitivo P300 é um importante procedimento para prevenir e diagnosticar precocemente alterações neurológicas em indivíduos com Diabetes Mellitus tipos 1 e 2.

AGRADECIMENTO

Trabalho financiado pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Jerger S, Jerger J. Diabetes Mellitus. In: Jerger S, Jerger J. Alterações auditivas: Um manual para avaliação clínica. Ed. Atheneu, 1998. pp. 35-9.

2. Huang Y. Study on the hearing impairment in diabetic patients. Zhonghua Er Bi Yan Hou Ke Za Zhi 1990; 25 (6): 354-6.

3. Huang YM, Pan CY, Gu R, Cai XH, Yu LM, Qiu CY. Hearing impairment in diabetcs. Chin Med J Engl 1992; 105 (1): 44-8.

4. Goldsher M, Pratt H, Hassan A, Shenhav R, Eliachar I, Kanter Y. Auditory brainstem evoked potentials in insulin-dependent diabetes with and without peripheral neuropathy. Acta Otolaryngol 1986; 102 (3-4): 204-8.

5. Lisowska G, Namyslowski G, Morawski K, Strojek K. Early identification of hearing impairment in patients with type 1 diabetes mellitus. Otol Neurotol 2001; 22 (3): 316-20.

6. Kurita A, Mochio S, Isogai Y. Changes in auditory P300 event-related potentials and brainstem evoked potentials in diabetes mellitus. Acta Neurol Scand 1995; 92 (4): 319-23.

7. Jorgensen M, Buch N. Studies on inner ear function and cranial nerves in diabetics. Acta Otolaryngol 1991; 53: 350.

8. Di Leo MA, Di Nardo W, Cercones S, Ciervo A, Lo Monaco M, Greco AV, et al. Cochlear dysfunction in IDDM patients with subclinical peripheral neuropathy. Diabetes Care 1997; 20 (11): 1800-3.

9. Northam EA, Anderson PJ, Werther GA, Warne GL, Adler RG, Andrewes D. Neuropsychological complications of IDDM in children 2 years after disease onset. Diabetes Care 1998; 21: 379-84.

10. Picton T W. The P300 wave of the human event-related potential. J Clin Neurophysiol 1992; 9: 456-79.

11. Auer RN, Siesjo BK. Hypoglycaemia: brain neurochemistry and neuropathology. Baillieres Clin Endocrinol Metab 1993; 7: 611-25.

12. Pozzesssere G, Valle E, De Crignis S, Cordischi VM, Fattapposta F, Rizzo PA, et al. Abnormalities of cognitive functions in IDDM revealed by P300 event-related potential analysis. Diabetes 1991; 40: 952-58.

13. Tandon OP, Verma A, Ram BK. Cognitive dysfunction in NIDDM: P3 event related evoked potential study. Indian J Physiol Pharmacol 1999; 43 ( 3): 383-8.

14. Hissa MN, D'Almeida JA, Cremasco F, De Bruin VM. Event related P300 potential in NIDDM patients without cognitive impairment and its relationship with previous hypoglycemic episodes. Neuroendocrinol Lett 2002; 23 (3): 226-30.

15. De Feo P, Gallai V, Mazzotta G, Crispino G, Torlone E, Perriello G, et al. Modest decrement in plasma glucose concentration causes early impairment in cognitive function and later activation of glucose counterregulation in the absence of hypoglycemic symptoms in normal man. J Clin Invest 1988; 82: 436-44.

16. Brownlee M, Cerami A, Vlassara H. Advanced glycosylation end products in tissue and the biochemical basis of diabetic complication. N Engl J Med 1988; 318: 1315-21.

1 Fonoaudióloga - Professora Doutora do Curso de Fonoaudiologia da FOB/USP.
2 Fonoaudióloga - Especialista em Audiologia pela FOB/USP.
3 Fonoaudióloga - Aprimoranda pela Faculdade de Medicina da Unesp de Botucatu.
4 Fonoaudióloga - Mestranda em Pediatria pela Faculdade de Medicina da Unesp de Botucatu.
5 Médico Endocrinologista - Doutorando em Ginecologia Obstetrícia pela Faculdade de Medicina da Unesp de Botucatu.
6 Otorrinolaringologista - Livre-Docente do Curso de Fonoaudiologia da FOB-USP e vice-coordenador do CPA do HRAC-USP.
Instituição: Departamento de Fonoaudiologia da Faculdade de Odontologia de Bauru - USP.
Endereço para correspondência: Departamento de Fonoaudiologia/ Profa. Dra. Kátia de Freitas Alvarenga -
Alameda Doutor Otávio Pinheiro Brizola, 9-75, Vila Universitária Bauru SP 17012-901.
Tel (0xx14) 235-8332 - E-mail: katialv@fob.usp.br
Artigo recebido em 06 de julho de 2004. Artigo aceito em 21 de março de 2005.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


Imprimir:
Todos os direitos reservados 1933 / 2024 © Revista Brasileira de Otorrinolaringologia