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3094 - Vol. 70 / Edição 5 / Período: setembro-outubro de 2004
Seção: Artigo Original Páginas: 612 a 621
Endoscopia do meato acústico interno pelo acesso retrolabiríntico
Autor(es):
Rafael B. Cahali1,
Michel B. Cahali2,
Rubens V. B. Neto2,
Ricardo F. Bento3,
Guilherme C. Ribas4

Palavras-chave: ouvido interno, endoscopia, microscopia.

Keywords: internal auditory canal, retrolabyrinthine approach, endoscopy.

Resumo: Introdução: O acesso direto à região do ângulo pontocerebelar pela via retrolabiríntica é seguro, entretanto, não permite a visão direta de todo o meato acústico interno (MAI) pela otomicroscopia. Os endoscópios podem ser utilizados na exploração do MAI por esta via. Nosso objetivo é avaliar a capacidade de inspeção do MAI com endoscópios de diferentes angulações. Métodos: Estudamos 40 ossos temporais humanos nos quais realizamos acessos retrolabirínticos. Nestes ossos, medimos as distâncias ocultas do MAI, em seus quatro quadrantes, utilizando o microscópio cirúrgico e os endoscópios de 0°, 30° e 70°. Resultados: Observamos que as distâncias ocultas medidas foram diminuindo, com significância estatística, conforme o instrumento utilizado, nesta seqüência: microscópio, endoscópio de 0°, 30° e 70°. Somente o endoscópio de 70° permitiu a visão do fundo do MAI em todos os quadrantes, o que ocorreu em 27,5% dos casos. A visão parcial do fundo do MAI foi obtida em 67,5% dos ossos com o endoscópio de 70° e em 12,5% com o endoscópio de 30°, não tendo sido obtida em nenhum caso com o uso do endoscópio de 0° ou do microscópio. As médias de distâncias ocultas no quadrante ântero-superior, medidas com o microscópio e endoscópios de 0°, 30° e 70° foram respectivamente: 10,4mm, 7,3mm, 4,3mm e 1,1mm. Conclusões: O endoscópio de 70° demonstrou ser significativamente superior aos demais instrumentos na inspeção do MAI e sugerimos que ele seja considerado o instrumento de escolha na inspeção do MAI nos acessos retrolabirínticos.

Abstract: Introduction: The retrolabyrinthine approach is a safe route to the cerebellopontine angle, which allows preservation of hearing and facial nerve function. However, it doesn't allow a straight view of the whole internal auditory canal (IAC) with the operating microscope. The endoscopes may be used to assess the IAC during retrolabyrinthine approaches. The objective of this study is to evaluate the capabilities of different angled endoscopes in assessing the IAC. Methods: We performed the retrolabyrinthine approach in 40 temporal bones and then we measured the hidden distance in every quadrant as seen with the microscope and the 0°, 30° and 70° endoscope. Results: We observed that the hidden distances decreased, statistically, according to the optic used, in the following sequence: microscope, 0°, 30° and 70° endoscope. Only the 70° endoscope allowed a full view of the fundus of the IAC, which occurred in 27.5% of the cases. Partial view of the fundus of the IAC was possible in 67.5% of the bones with the 70° endoscope and in 12.5% with the 30° endoscope, whereas neither the 0° endoscope nor the microscope allowed any view of the fundus. The mean hidden distances at the superior-anterior quadrant measured with the microscope and the 0°, 30° and 70° endoscopes were, respectively: 10.4mm, 7.3mm, 4.3mm and 1.1mm. The 70° endoscope was significantly better than the others in the evaluation of the IAC and it should be considered the optic of choice in the assessment of the IAC during retrolabyrinthine approaches.

INTRODUÇÃO

O meato acústico interno (MAI) e a região do ângulo pontocerebelar (APC) constituem uma das regiões de mais difícil acesso no osso temporal. A evolução da semiologia nos permite hoje diagnosticar num paciente, algumas vezes muito pouco sintomático, uma lesão tumoral ainda pequena no APC ou confinada ao MAI. Dentre os diferentes acessos ao APC, a via retrolabiríntica pré-sigmóidea apresenta-se como uma craniotomia muito próxima à região e que tem a vantagem de utilizar mínima retração do tecido cerebral e preservar a cápsula óptica, porém ela fornece um campo cirúrgico inadequado para a inspeção do MAI, não sendo indicada, assim, para a completa remoção de tumores desta região1. Para contornar esta desvantagem da otomicroscopia, Prott2 descreve a utilização de endoscópios rígidos introduzidos pela via retrolabiríntica para a inspeção do MAI através do poro acústico interno. Desde então, alguns autores têm utilizado esta via para a remoção de tumores desta região, introduzindo endoscópios no campo operatório para melhorar a visão sobre o MAI3-5.

Darrouzet et al.5 descrevem o acesso retrolabiríntico ampliado, no qual realizam ampla fresagem da cortical óssea retrosigmóidea e seccionam o ducto endolinfático, permitindo maior retração do seio sigmóideo e da dura-máter da fossa posterior e ampliando a exposição da região do APC. Entretanto, notam que o terço lateral do MAI ainda permanece oculto à otomicroscopia neste acesso.

A angulação dos endoscópios utilizados nos acessos retrolabirínticos é variável na literatura, havendo os que utilizam ópticas de 0°6, 30°7 e 70°8. Segundo o nosso conhecimento, não há estudos avaliando o campo de visão do MAI obtido com ópticas de diferentes angulações. Nosso objetivo é comparar a capacidade de inspeção do MAI do microscópio cirúrgico e dos endoscópios rígidos de 0°, 30° e 70° na craniotomia retrolabiríntica pré-sigmóidea, quantificando a porção oculta do MAI em cada quadrante e avaliando a possibilidade de visão do fundo do MAI.

MATERIAL E MÉTODO

MATERIAL

O estudo foi realizado em 40 ossos temporais humanos obtidos em necropsias realizadas no Serviço de Verificação de Óbitos da Capital, da Universidade de São Paulo, após ser aprovado pela comissão de ética da nossa instituição.

Incluímos somente as peças que apresentavam as seguintes estruturas anatômicas preservadas: seio sigmóideo, dura-máter das fossas média e posterior, seio petroso superior e as estruturas do interior do MAI. Incluímos inicialmente no estudo 48 ossos de indivíduos adultos, de ambos os sexos, vítimas de morte não-violenta. Conservamos os ossos em solução de aldeído fórmico a 10% até a sua manipulação. No entanto, excluímos os ossos temporais em que, durante a fresagem para exposição do MAI, houve brocagem inadvertida do labirinto ósseo (vestíbulo ou canal semicircular posterior ou anterior), tendo sido este o principal motivo de exclusão de oito ossos em nosso estudo. Também excluímos peças com alterações anatômicas, tais como: perfuração ou retração da membrana timpânica, tumor, sinal de manipulação cirúrgica prévia e presença de traço de fratura.

Os ossos temporais foram obtidos de 23 cadáveres do sexo masculino e 17 do sexo feminino. Em relação à raça, 32 eram brancos, seis pardos e dois negros. A idade média do grupo avaliado foi de 62,8 ± 13,3 anos (variando entre 25 e 93 anos). Em relação ao lado, estudamos 20 ossos de cada lado.

MÉTODO

Todo o conteúdo do MAI foi removido usando um microscópio cirúrgico antes de iniciar a brocagem da mastóide. O osso temporal foi então posicionado num suporte na posição cirúrgica para a via retrolabiríntica. Realizou-se uma ampla mastoidectomia com retirada de cortical óssea até 3cm posteriores ao seio sigmóideo, sendo este exposto desde o bulbo jugular até o seio petroso superior. Todos os três canais semicirculares eram esqueletizados e, após a secção do ducto endolinfático e retração da dura-máter da fossa posterior e do seio sigmóideo, brocou-se a parede óssea posterior do MAI, objetivando expôr 180° do seu interior.

Para as medidas no MAI, introduzimos um medidor de profundidade, angulado, graduado em milímetros, com 15mm de comprimento útil (modelo PUNC 15, G. Hartzell & Son, CA, EUA). Apesar da graduação ser em milímetros, a magnificação da imagem do medidor com o microscópio cirúrgico ou com os endoscópios permitiu estabelecermos, segundo uma avaliação visual, os eventuais décimos de milímetro em cada medida. Introduzimos o medidor no MAI, segundo o seu maior eixo, mantendo-o paralelo às paredes deste meato, em quatro diferentes posições: ântero-superior, ântero-inferior, póstero-superior e póstero-inferior (Figura 1). Esta introdução ocorria até tocarmos a região central do fundo de cada quadrante do MAI. Anotamos, então, sob o melhor ângulo de visão possível pela via retrolabiríntica, o ponto mais distal do medidor visível em cada um dos quadrantes avaliados, inicialmente com o microscópio cirúrgico (com aumento de 25 vezes) e em seguida com os endoscópios rígidos (diâmetro externo de 4mm e comprimento de trabalho de 18cm, Karl Storz, Alemanha) com angulações de 0° (modelo 7210AA), 30° (modelo 7210BA) e 70° (modelo 7210CA) (Figuras 2 e 3). Desta maneira, medimos a distância não visível até o fundo do MAI em cada um de seus quadrantes com estes diferentes instrumentos ópticos. Anotamos, também, o número de peças em que pudemos ver o fundo do MAI em pelo menos um dos quadrantes, com cada uma das ópticas. Também medimos a menor distância, em milímetros, entre o seio sigmóideo e o canal semicircular posterior (SS CSCP).

As variáveis analisadas neste estudo apresentaram distribuição normal e, por isso, os dados foram submetidos a testes estatísticos paramétricos.

Comparamos os cadáveres de ambos os sexos em relação a todas as medidas que realizamos nos ossos temporais utilizando o teste t de Student controlado pelo teste de Levene para igualdade de variâncias. Usamos este mesmo teste para comparar as medidas das peças do lado direito com as do lado esquerdo. Para a avaliação da influência da idade sobre as medidas realizadas e, também, para verificar a correlação entre a distância do seio sigmóideo ao canal semicircular posterior com as medidas do MAI, calculamos o coeficiente de correlação de Pearson. Comparamos, também, cada instrumento com o outro segundo as médias das medidas realizadas no MAI, em cada quadrante, através do teste t de Student para dados pareados. Utilizamos este mesmo teste para comparar quadrante com quadrante segundo as medidas obtidas com um mesmo instrumento óptico.

Para avaliarmos as possíveis diferenças entre a capacidade de visão do fundo do MAI demonstrada pelos diferentes instrumentos, aplicamos a análise de variância, controlada pelo teste de Dunnett. Adotamos como nível de significância o valor inferior a 0,050.

RESULTADOS

Verificamos que, em relação ao sexo, não houve diferença estatisticamente significante em nenhuma das medidas realizadas nos ossos temporais, com exceção da média da distância não visível do MAI no quadrante póstero-inferior com o endoscópio de 70°, que foi maior no sexo feminino (média de 3,1 ± 1,8mm no sexo feminino e de 1,4 ± 1,8mm no sexo masculino; p=0,007). Em relação ao lado da peça anatômica, observamos que, em sua maioria, as medidas feitas nos MAIs dos ossos do lado direito foram significantemente maiores do que as do lado esquerdo. Já a distância SS-CSCP não apresentou diferença significante entre os lados (média de 6,4 ± 2,9mm nas do lado direito e de 6,3 ± 1,7mm nas do lado esquerdo; p=0,947).

Não notamos correlação entre a idade e as medidas realizadas no MAI, com todos os instrumentos ópticos. Houve correlação positiva entre a idade e a distância SS-CSCP (r=0,405; p=0,010). Esta mesma distância também se correlacionou, positiva e significantemente, com a distância não visível do MAI medida nos dois quadrantes superiores com o microscópio cirúrgico; correlação esta que não observamos nas avaliações feitas com os endoscópios.

As médias das medidas realizadas nos MAIs encontram-se na Rabela 1. Pudemos observar que a média de distância oculta do MAI, em cada um dos quatro quadrantes, foi significantemente maior quando realizada com o microscópio cirúrgico em relação à obtida com os endoscópios. Da mesma forma, as médias destas distâncias foram significantemente maiores quando obtidas com o endoscópio de 0° em relação ao de 30°, o qual, por sua vez, mostrou médias significantemente maiores do que as obtidas com o endoscópio de 70°. No Gráfico 1, observamos a redução da distância oculta do quadrante ântero-superior do MAI com a utilização das ópticas nesta seqüência: microscópio, endoscópio de 0°, de 30° e de 70°. Este padrão de observação repetiu-se em todos os quadrantes.



Figura 1. A: inserção do medidor (seta) e do endoscópio (*) no osso temporal esquerdo. B: visão direta do meato acústico interno (MAI) com o medidor em seu interior e o endoscópio inserido pela via retrolabiríntica (seta larga preta: borda posterior do MAI; seta larga branca: borda anterior do MAI).



Figura 2. A: Visão do quadrante ântero-inferior com o medidor sob microscópio. B: Visão do quadrante ântero-inferior com o medidor com o endoscópio de 0°.



Figura 3. A: Visão do quadrante ântero-inferior com o medidor com o endoscópio de 30°. B: Visão do quadrante ântero-inferior com o medidor com o endoscópio de 70°. Seta indicando a crista transvera.


Tabela 1. Média da distância não visível dos meatos acústicos internos segundo o instrumento óptico utilizado, em cada quadrante (1)

(1)Dados expressos em milímetros.
*p<0,001 na comparação com o instrumento da coluna imediatamente à direita.


Tabela 2. Número de peças nas quais o fundo do meato acústico interno foi visível, segundo o quadrante

1 Peças nas quais o fundo do MAI foi visível em pelo menos um dos quadrantes.
2 Peças nas quais o fundo do MAI foi visível em todos os quadrantes.
* p<0,001 na comparação com os demais instrumetos.
**p=0,003 na comparação com os demais instrumetos.



O número de peças nas quais o fundo do MAI foi visível, nos diferentes quadrantes, com cada instrumento óptico, encontra-se na Tabela 2. Apenas o endoscópio de 70° permitiu a visão do fundo em todos os quadrantes do MAI de um mesmo osso temporal, o que ocorreu em 11 ossos (27,5%). Este mesmo endoscópio permitiu a visão do fundo em pelo menos um dos quadrantes do MAI em 27 ossos (67,5%). O número de peças onde o fundo do MAI foi visível com o endoscópio de 70° é estatisticamente superior ao número de peças onde o fundo foi visível com outras ópticas (p<0,005).

O endoscópio de 30° permitiu a visão do fundo somente nos dois quadrantes anteriores do MAI, em apenas cinco peças (12,5%), o que não representou diferença estatisticamente significante em relação ao microscópio cirúrgico e ao endoscópio de 0° que não permitiram a visão do fundo de nenhum quadrante do MAI em nenhuma das peças dissecadas.

As medidas realizadas com o microscópio cirúrgico mostraram que a média de distância oculta do MAI foi significantemente maior no quadrante ântero-superior em relação ao quadrante ântero-inferior (p=0,007), sendo esta última significantemente maior que a do quadrante póstero-superior (p=0,022) e esta última, por sua vez, foi significantemente maior do que a do quadrante póstero-inferior (p=0,001) (Tabela 1). As medidas com o endoscópio de 0° mostraram que a média de distância oculta do MAI foi estatisticamente maior no quadrante ântero-superior em relação aos demais (p<0,005 nas três comparações), e a média de distância oculta do MAI foi estatisticamente maior no quadrante póstero-superior em relação ao póstero-inferior (p=0,007), não tendo havido diferenças estatisticamente significantes nas comparações dois a dois entre os demais quadrantes.

Contrariamente ao microscópio cirúrgico e ao endoscópio de 0°, os endoscópios de 30° e 70° permitiram uma visão mais próxima do fundo do MAI nos quadrantes anteriores. Assim, com o endoscópio de 30°, a média de distância oculta do MAI foi significantemente maior no quadrante póstero-superior do que nos dois quadrantes anteriores (p<0,050 nas duas comparações), esta distância foi maior no quadrante póstero-inferior que no quadrante ântero-inferior (p<0,001), e também maior no quadrante ântero-superior que no quadrante ântero-inferior (p=0,009), não tendo ocorrido diferenças estatisticamente significantes nas comparações dois a dois entre os demais quadrantes.



Gráfico 1. Média e desvio padrão da distância não visível no quadrante ântero-superior dos meatos acústicos internos, segundo o instrumento óptico utilizado



Já com o endoscópio de 70°, esta média foi significantemente maior nos dois quadrantes posteriores em relação aos dois anteriores (p<0.001 nestas quatro comparações) sem outras diferenças significantes nas demais comparações.

DISCUSSÃO

O MAI em humanos apresenta um elevado grau de simetria bilateral9, sem diferença no seu comprimento quanto ao sexo, e sem correlação entre suas dimensões e a idade10. Nós não verificamos as dimensões dos MAIs pré-fresagem em nosso estudo; entretanto, possivelmente estas dimensões explicariam o fato de termos encontrado porções ocultas maiores nos ossos do lado direito em relação aos do lado esquerdo. Não observamos nenhuma correlação entre nossas medidas no MAI e a idade dos cadáveres, porém a distância SS-CSCP se correlacionou positivamente com a idade, sem que tenhamos uma explicação para este fato. Não verificamos diferenças em nenhuma medida em relação ao sexo, com exceção da medida feita no quadrante póstero-inferior do MAI com o endoscópio de 70°, a qual apresentou uma média da distância oculta maior no sexo feminino. Como este foi o único de um total de 16 parâmetros a apresentar diferença entre os sexos, acreditamos poder ser um fato simplesmente casual.

Por princípio, quanto mais próximo de uma lesão intracraniana for realizada a craniotomia, melhor será a sua manipulação cirúrgica. A craniotomia retrolabiríntica oferece um acesso direto à região do APC, entretanto a visão linear do MAI é prejudicada nesta via. A menor distância oculta que obtivemos com a otomicroscopia foi de 5,0mm, sendo esta distância de, em média, 10,4mm no quadrante ântero-superior. Tendo em vista a inspeção do MAI devido à presença de tumores residuais, a otomicroscopia mostrou ser inadequada.

Uma das possibilidades para melhorar o ângulo de visão linear sobre o MAI é através da craniotomia retrosigmóidea11,12, a qual não expõe, à otomicroscopia, de 3 a 4mm da porção lateral do MAI13-15. Já nos acessos suboccipitais, esta parte obscura varia de 2mm16,17 até zero18,19, conforme a via de acesso aproxima-se da linha sagital mediana do crânio. Entretanto, requer-se uma progressiva retração do cerebelo e cérebro nestes acessos.

Tecnicamente, pode-se estender a craniotomia retrolabiríntica anteriormente20,21,22, e contar com a possibilidade de preservação da audição, como com a exérese do canal semicircular posterior23. Mesmo com esta ampliação, neste acesso pode-se inspecionar apenas 61% da parte medial do MAI com o microscópio cirúrgico24. Devemos ressaltar a dificuldade de fresagem do MAI com a preservação do labirinto ósseo na via retrolabiríntica. Devido a este fato, oito de 48 ossos estudados (16,7%) foram descartados. A falta de parâmetros anatômicos confiáveis para identificar os limites de fresagem do MAI nesta via constituiu nossa maior dificuldade na realização deste estudo.

Convém ressaltar que alguns autores consideram a via retrolabiríntica muito exígua para a exérese de lesões tumorais da região do MAI1,11,25, enfatizando que a extensão tumoral dentro do MAI pode ser subestimada em exames de ressonância magnética26.

Além da retração do seio sigmóideo, realizamos também a secção do ducto endolinfático em nossas peças, pois isto permite ampliar a fresagem da parede posterior do MAI sem causar danos à audição ou à função vestibular5,6,7. No nosso estudo, a distância SS-CSCP não se correlacionou com as medidas avaliadas com os endoscópios, uma vez que estes, durante a inspeção do MAI, ultrapassam o estreitamento provocado pelo seio sigmóideo; porém, com o microscópio cirúrgico, observamos uma correlação positiva entre distâncias ocultas nos dois quadrantes superiores do MAI com a distância SS CSCP, indicando que o ângulo de visão do MAI tornou-se mais favorável nas peças com seios sigmóideos mais próximos ao canal semicircular posterior.

Alguns autores têm utilizado endoscópios rígidos para a observação do interior do MAI nos acessos retrolabirínticos, utilizando ópticas de 0° 6, 30° 7 ou 70° 8. Outros os utilizam para inspecionar o MAI27 após exérese de tumores em acessos retrosigmóideos3,28 ou suboccipitais29. Segundo o nosso conhecimento, nosso estudo é o primeiro a medir as distâncias ocultas do MAI sob visão de endoscópios de diferentes angulações.

O endoscópio de 0°, apesar de ser estatisticamente melhor do que o microscópio na inspeção do MAI, ainda deixa, em média, mais do que 6mm ocultos em todos os quadrantes no acesso retrolabiríntico. Ele revelou-se, portanto, uma óptica de baixa capacidade na verificação de lesões no MAI, as quais poderiam ser confundidas com nervos vestibulares seccionados30.

O endoscópio de 30° foi estatisticamente superior na inspeção do MAI do que o endoscópio de 0° e o microscópio. A sua vantagem em relação ao endoscópio de 70° é a facilidade do seu manuseio, já que ele ainda permite uma visão linear que torna sua introdução no crânio, presumivelmente, mais segura. Entretanto, o endoscópio de 30° não foi estatisticamente melhor do que o endoscópio de 0° ou o microscópio na capacidade de visão do fundo do MAI. Considerando que o endoscópio de 30° deixou, em média, mais do que 4mm ocultos em todos os quadrantes do MAI, nós também o consideramos um instrumento de baixa capacidade na inspeção desta estrutura no acesso retrolabiríntico.

Verificamos que o endoscópio de 70° revelou as menores distâncias ocultas no nosso estudo, em todos os quadrantes. Esta óptica pôde demonstrar o fundo do MAI em 67,5% dos ossos estudados. Em média, a maior distância oculta medida com este instrumento foi de 2,1mm, nos quadrantes posteriores do MAI, alcançando 1,0 e 1,1mm nos quadrantes ântero-inferior e ântero-superior, respectivamente. Considerando-se a indicação da via retrolabiríntica em schwanomas vestibulares com pequena extensão intracanalicular4, avaliamos o endoscópio de 70° como sendo suficiente para uma adequada inspeção do interior do MAI nos acessos retrolabirínticos. Apesar de ser um instrumento de manipulação mais difícil do que os outros que estudamos - por não fornecer uma visão linear -, a prática de usá-lo em dissecções anatômicas do MAI por esta via pode vir a torná-lo útil na rotina cirúrgica.

CONCLUSÃO

A capacidade de inspeção do MAI com diferentes instrumentos ópticos pela via retrolabiríntica demonstrou que as distâncias ocultas observadas em cada quadrante foram, progressiva e significantemente, menores segundo esta seqüência de instrumentos: microscópio cirúrgico, endoscópio de 0°, endoscópio de 30° e endoscópio de 70°. O endoscópio de 70° demonstrou ser significantemente superior aos demais instrumentos na visão do fundo do MAI.

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1 Doutorando do Departamento de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo - São Paulo.
2 Doutor em Otorrinolaringologia pela Universidade de São Paulo - São Paulo.
3 Professor Doutor em Otorrinolaringologia pela Universidade de São Paulo - São Paulo.
4 Doutor em Neurologia pela Universidade de São Paulo - São Paulo.
Instituição: Departamento de Otorrinolaringologia do HCFMUSP.
Endereço para correspondência: Rafael B. Cahali - Rua Macau 232 São Paulo SP 04032-020.
Tel (0xx11) 5579-1299 - Fax: (0xx11) 5579-1299 - E-mail: rafaelcahali@terra.com.br
Artigo recebido em 06 de julho de 2004. Artigo aceito em 01 de setembro de 2004.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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