ISSN 1806-9312  
Quarta, 3 de Julho de 2024
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292 - Vol. 3 / Edição 4 / Período: Julho - Agosto de 1935
Seção: Progressos da O. R. L. Páginas: 366 a 372
XV º Congresso Anual da Sociedade dos Medicos Oto-rinolaringologiotas Alemães, reunido em Bad Reichenhall, nos dias 6, 7 e 8 de Junho de 1985
Autor(es):
M. O. R.

MARX (Würzburg) - SEPTICEMIA OTOGENICA (1)
(Continuação)

Operação do bulbo da jugular - Tambem aqui a opinião dos autores está muito dividida. Foi Grunert que, ha trinta anos, estabeleceu o metodo operatorio do bulbo da jugular. A indicação operatoria não existe, de nenhum modo, para todos os casos de trombose do bulbo. A operação primaria, isto é, a que fôr feita ao mesmo tempo que a intervenção sobre o seio, praticou-se muito raramente e isto só nos casos "em que a extensão da molestia do osso alcançava o foramen jugular e aconselhava, assim, a imediata exposição do bulbo". A intervenção secundaria, ele achava indicada quando, após a extirpação do trombo infeccioso do sinus e da ligadura da jugular, permanecesse febre elevada, calefrios ou mesmo quando reaparecessem, mais tardiamente, estes sintomas, após uma melhora do estado geral.

Depois de Grunert varios autores apresentaram outros metodos operatorios sobre o bulbo da jugular.

Marx relata, resumidamente, o importante de cada processo operatorio.

Grunert, após a operação sobre o sinus com resecção da ponta da apofise mastoide e ligadura da jugular, penetra fundo na base do craneo até alcançar o osso, envolvendo o foramen jugular. Com a pinça de Zange retira a ponte ossea existente entre a extremidade mais inferior do sinus exposto e o foramen, tornando, assim, acessivel o bulbo. Como diz o proprio autor, este modo de agir, póde, facilmente, causar uma lesão do facial na zona do foramen estilomastoidéo. Em muitos casos o processo transverso do atlas se encontra no caminho e, devendo ser removido, poderá ser causa de uma lesão da arteria vertebral.

Piffl aconselha penetrar no bulbo, pela remoção das paredes inferior e anterior do conduto auditivo externo até o recesso hipotimpanico. Eventualmente, afim de obter maior espaço, remove tambem o processo estiloide. Ainda maior exposição poderá ser conseguida com a remoção com pinça ossea, ou fraise, do revestimento externo e, por vezes, de uma parte do tecto do recesso da jugular e da parede interna do cavum timpanico. Piffl faz, antes, a operação radical da mastoide, pois que a antrotomia não é suficiente.

Tandler aconselha, tambem, a penetração por baixo. Ele considera que assim, os acidentes topograficos serão observados, em melhores condições e evitarão a lesão do facial e do acessorio. A mastoide será exenterada, o esterno-cleido será rebatido para traz, depois da exposição do seu bordo anterior e o acessório que aí se distribue, será procurado e exposto. Então o bordo anterior da ferida com a parotida, após destacar esta glandula do esterno cleido, será puxado para deante. Pela penetração, com o dedo, ao longo do bordo anterior do esterno-cleido, chega-se no espaço entre o processo mastoidêo e o processo estiloidêo, ponto de saída do facial. Este nervo será exposto de fórma que durante a operação esteja bem visivel. No fundo da ferida aparece, então, o ventre posterior do digastrico e em seu bordo inferior, o acessorius. O musculo será deslocado da fossa digastrica e reclinado, com as partes moles restantes, para deante. A arteria ocipital que corre abaixo do ventre do diagastrico, será ligada e cortada e então será retirado o musculo rectus capitis lateralis. Desta fôrma o bordo lateral do foramen jugular ficará exposto e póde-se, partindo da primitiva exposição do sinus, retirar-se o osso até o bulbo.

Ao passo que os metodos descritos partem da base do craneo, inicia o proposto por Voss, que na opinião de Marx é o de caminho mais curto na mastoide, utilisando-se da via sinusal. Principiando na parte inferior da abertura existente no sinus, Voga, cuidadosamente, retira, em pequenas laminas, a parede ossea lateral para baixo e chega, seguindo sempre o sinus, passando da direcção vertical a uma mais horizontal, ao fundo no qual ele segue ao longo da periferia inferior do curso do sinus. Produz-se, então, a exposição do bulbo, em primeiro lugar, de sua parede posterior na qual a parte ossea espessa, colocada acima da mais profunda parte do sinus exposto, será cuidadosamente retirada a goiva e malho. Com alguns cuidados, o metodo de Voss evitará a lesão do facial. Para cima o cuidado deverá ser ainda maior, devido ao canal semi-circular posterior. Assim aparecerá, de inicio, a parede posterior do bulbo que será exposta largamente. Outras modificações destes metodos, e que não devem ser descritas, foram feitas por Panse, Neamann, Kramm, etc.

A tecnica operatoria destes diferentes metodos será facil quando da bôa conservação das relações anatomicas; casos ha, porém, em que a operação tornar-se-á grandemente dificultada e lesões de orgãos importantes serão possiveis. Conforme disse Koerner, estes diferentes metodos não são aplicaveis a todos os casos. Não é, pois, aconselhavel seguir-se, cegamente, um determinado metodo, mas modificá-lo, segundo as circunstancias.

Seguramente deve-se procurar conseguir a maior exposição possivel do bulbo, não pensando, no entanto, em fazê-la tão ampla quanto a exposição do sinus, pois que isto seria impossivel, dadas as estreitas relações anatomicas. Ha mesmo quem pergunte se haverá vantagem em praticar-se uma operação tipica do bulbo da jugular, dada a complicação e dificuldade da operação e a incerteza de seus resultados. Da literatura não se póde tirar clareza alguma sobre este assunto. O fato é que autores que, antigamente, praticavam esta intervenção, não a fazem hoje com o mesmo entusiasmo e que aquelas que não a praticam, ou pelo menos a "fazem rarissimamente, não têm peiores resultados que os obtidos pelos primeiros". Entre estes, cita Alexander que muito embora tenha sido um energico operador da trombose do seio, não praticou, senão muito raramente, a operação do bulbo da jugular.

Segundo uma comunicação de Koerner, este autor só praticou três vezes a operação do bulbo da jugular, em 300 casos de tromboses do bulbo. Destes três casos operados, um apresentava, além da trombose do bulbo, uma periflebite supurada e uma osteite purulenta da fossa jugular. Com outro caso havia, ainda, um carcinoma supurado. Tambem Kümmel não pratica mais a operação típica do bulbo, e o autor já ha anos que não a realiza.

Marx pensa que é necessario combater-se o quanto possivel uma trombose putrida do bulbo jugular, e crê que isto seja, também possivel sem a pratica esquematica de uma operação do bulbo.

Como ficou dito, a indicação para uma ligadura da jugular, só existe quando o trombo do sinus não puder ser alcançado, devido a sua situação muito inferior, especialmente quando se puder determinar a existencia de uma trombose do bulbo da jugular, acompanhado de sintomas gerais máus. Nestes casos, não se deve combater sómente com a ligadura da jugular; mas atacar, tambem, a trombose do bulbo. O A. emprega, para isto, um processo que não é novo, pois que a idéa da lavagem do bulbo já foi aplicada, ha dezenas de anos por Zaufal, Jansen e outros, mas que consiste em procurar alcançar, operatoriamente, o bulbo o mais possivel de cima e de baixo. Trata-se de uma operação atipica e incompleta do bulbo com lavagem do mesmo, procurando, ainda, remediar a flebite bulbo-jugular.

A tecnica operatoria de Marx é a seguinte: incisão da pele, em seguimento a incisão retro-auricular, em direção do bordo anterior do esterno-cleido até proximo da fossa jugular. Expôr o bordo anterior do musculo e afastá-lo. Geralmente, no terço médio, a jugular ficará visivel e sua exposição completa, não apreesntará dificuldades. Frequentemente, no entanto, encontram-se maior ou menor numero de ganglios fortemente desenvolvidos e inflamados com periflebite adesiva, que, dificultam bastante a tecnica.

Depois de exposta a veia, esta será explorada cuidadosamente afim de se verificar até onde ela está trombosada. Além da inspecção e palpação póde-se utilisar, nos casos pouco claros, a punção da veia. Caminhe o trombo mais para baixo do terço médio, então a veia deverá ser exposta neste sentido, seccionando o musculo homohiodéo que a atravessa. A ligadura da veia deverá ser praticada, se possivel, abaixo do trombo e em territorio são. Para isto necessita-se, ás vezes, descer ainda mais, já tendo sido citados casos nos quais a trombose chega até atraz da clavicula, de tal fórma que esta já tem sido seccionada por alguns autores, afim de poderem obter melhor campo. Marx, porém, nunca teve necessidade de atuar desta fórma. Na maioria dos casos o trombo localisa-se sómente na parte superior da jugular e servirá de regra ligá-la acima da veia facial comum. Si a ligadura tiver que ser praticada muito abaixo, então se ligará tambem a facial comum e todas as veias que nela venham desaguar, tal como a tireoidéa superior, etc.

Então liberta-se, por completo, até a base do craneo, a veia jugular. O autor segue a risca as determinações de Tandler, afim de evitar uma lesão do acessorius e do facial. Neste caso a apofise transversa do atlas póde perturbar o caminho, mas Marx nunca teve necessidade de seccioná-la. Os ganglios infartados poderão, tambem, perturbar a marcha da intervenção, mas o conhecimento exáto das relacões anatomicas facilitarão a tecnica operatoria. Um ponto especial será a separação da parotida do esterno-cleido e sua retração para frente, afim de se ter bôa orientação sobre o facial. O autor deixa intacto o bordo do foramen jugular. Então inicia-se a marcha do sinus para o bulbo, segundo indica Voss. Terminando este ponto, a jugular será completamente aberta até o bulbo, acima da ligadura, naturalmente tendo-se cuidado sobre o acessorius e sobre um possivel curso anormal do hipoglosso. Em seus ultimos casos, Marx retirou, por completo, a parede da veia jugular.

Uma hemorragia das veias, que venham desaguar na jugular, nunca foi observada por Marx, quando da abertura do vaso; só uma trombose incomposta do bulbo poderá produzi-la pela via retrogada dos vasos venosos, que a ele venham têr.

Depois que se tenha obtido, de cima e de baixo, uma bôa aproximação do bulbo, lavámo-lo em seguida. Com vantagem hemorragia, porém, será facilmente estancavel pelo tampamento, emprega-se para isto uma simples seringa de Pravaz, a qual se ligará uma sonda de Hartmann , para lavagem do cavum timpanico. Como liquido de lavagem utilisá-se sôro fisiologico e, em seguida, glicerina iodoformada. A sonda poderá ser introduzida por cima ou por baixo; em regra geral a lavagem se fará mais facilmente pela veia jugular. Na maioria dos casos a massa trombosante se deixará eliminar facilmente e a glicerina iodoformada escorrerá pela outra abertura; após o fim da lavagem uma certa quantidade de medicamento refluirá para o bulbo, o que será uma vantagem do metodo. Finalmente, se introduzirá uma mecha de gaze, profundamente, por cima e por baixo, menos para drenar, que para manter o caminho aberto. Como curativo repete-se, durante algum tempo, o emprego da glicerina iodoformada, enquanto o bulbo estivér permeavel.

Como prognóstico, afirma Marx, pelo estudo que faz de diversas estatisticas, inclusive a sua, que no tratamento operatorio da sinustrombose, em geral, curam-se, mais ou menos, dois terços e morre, aproximadamente, um terço dos doentes.

Quanto ao tratamento geral da septicemia otogenica, que só deverá ser empregado ao lado do tratamento cirurgico e nunca sem este, deve-se ter em mente que não existe um tratamento conservativo exclusivo. Os casos apresentados, como curas por este metodo, devem ser considerados como erros de diagnosticos, pois que tornar um fóco septico inocuo pela terapeutica conservadora, nunca poderá ser realizado e, uma espera longa, como já ficou dito, oferece um perigo para o paciente. Como para toda molestia grave, a conservação e o aumento da resistencia do organismo do paciente é da maior importancia. Cuidados meticulosos e alimentação util são necessarios, si possivel, para os doentes com temperatura elevada; deve-se fornecer o numero de calorias necessarias, ao gasto excessivo a que estão sujeitos, isto é, 30 a 40 calorias por quilo. O alcool, que se considerava como quasi especifico contra a septicemía e era dado em grande quantidade, não é indicado. Marx o dá aos pacientes habituados ao seu uso, como meio excitante. Quando exista dificuldade de alimentação pela boca, póde-se utilisar os clistéres e desta fórma fazer penetrar, no organismo, uma grande quantidade de liquidos. Schottmüller aconselha, nestes casos, o metodo dos clistéres em gotas na fórma de solução de 5 a 10%, de assucar de uva. Os tratamentos sintomaticos devem visar o combate, sobretudo da manutenção dó tonus cardiaco e da fraqueza vasomotora tipica das septicemias, que gozam um papel na produção dos calefrios. Cafeina, preparados canforados, cardiazol, entre muitos, serão indicados. Quando de colapso acentuado da circulação sanguinea, deve-se empregar, as injeções endovenosas de estrofantina (1/2 a 1 mgr.), como aconselha Schottmüller, cujo efeito, em regra, já se processa em poucos minutos. Nas fraquezas cardiacas de longa duração. o emprego metodico da digitalis, é indicado, mas nos casos agúdos seu uso não póde ser feito pois que atúa lentamente. As injeções endovenosas de adrenalina prestam grandes serviços nos colapsos cardiacos de gravidade, si bem que sua ação seja passageira. O emprego dos anti-pireticos não deve ser aconselhado, pois que a baixa artificial da temperatura, sobretudo quando esta se produz repentinamente, poderá produzir sintomas alarmantes. Além disto não ha nenhuma utilidade em se abaixar a temperatura, em si, pois que este fato poderá despistar a molestia, permitindo tirar-se conclusões falsas sobre ela. Muitos preparados têm sido aconselhados como especificos contra a septicemía, mas o fato de aparecer sempre um novo medicamento contra ela, já mostra que um meio de cura real, até agora, ainda não foi descoberto. Uma desinfecção interna, a dita "sterilisatio magna" ainda não foi conseguida por nenhum meio. Todos os que conhecem a septicemia são muito septicos sobre a ação destes meios medicamentosos. No entanto, nunca deixamos de experimentá-los sempre na certeza, porém, de que pouco auxilio proporcionarão.

Entre os meios da terapeutica clinica, estão, em primeiro logar, as combinações metalicas, entre estas, usados ha muito tempo, o Collargol, o eletralgol, o aurocollargol, o dispargeno e outros. Estes preparados podem ser, tambem, empregados en clisteres.

Ha, ainda, os preparados de Quinino Morgenroth, cuja ação bactericida é demonstrada in vitro, em grandes diluições. Particularmente, o Vuzin teve, por muito tempo, grande predominancia.. Assim tambem a eucupina e optochina que atuam, particularmente, sobre os pneumococus.

Finalmente, ha a mencionar a imuneterapia sobre a qual deposita-se muita esperança. Sobretudo da serumterapía muito se esperou, muito embora Schottmüller não tenha obtido grandes resultados com o seu emprego da maioria de sôros, pois atuam, em primeira linha, sómente como anti-bactericidas, ao passo que nas septicemias é necessario a ação destruidora sobre as toxinas bacterianas que, para a maioria dos soros, e pequena devido ao fraco quociente ánti-toxico dos sôros em geral. Ultimamente, Schottmüller emprega nas septicemías a estreptococus, o sôro imunisante contra a escarlatina, fazendo nos primeiros dias, 80 a 100 cc. Da vacinoterapia, pelos conhecimentos modernos, nada se deve esperar no tratamento das septicemías. Como ficou dito, estas molestias não estão ligadas ao aumento das bacterias no sangue, como se pensava outróra, pois estas são destruidas pelo organismo. Encontra-se tambem, em consequencia da especie do processo patologico uma grande auto-inoculação e, serão por isto sem resultados as aplicações de novas vacinas no sangue. Finalmente, deve-se citar, ainda, a terapeutica inespecifica que, nos ultimos anos tem sido empregada especialmente pelos preparados de leite, tais com o Caseosan Yatren e outros. Todos estes preparados não resistiram á critica das pesquizas terapeuticas de SchottmiilIer, Bingold e outros.

A transfusão sanguinea atúa, sómente, nos casos de anemías secundarias; como meio curativo real nos processos septicos, a transfusão de sangue são, não dá resultados praticos. Tambem a injeção de sangue reativado do doador não apresentou nenhum resultado serio (Bingold).

Sobre o tratamento geral das septicemias deve-se dizer que nenhum meio, até agora, nos forneceu resultados seguros. Ao contrario destes, os obtidos pelos tratamentos cirurgicos, como vimos, são muito animadores, e o pratico deverá ter sempre em vista que a unica terapeutica racional contra a septicemia otogenica, é a operação praticada a tempo.

M. O. R.


(1) In Zeitschrift f. Hals-, Nasen- etc. - Vol. 38, caderno 1 (1935).
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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