ISSN 1806-9312  
Segunda, 22 de Julho de 2024
Listagem dos arquivos selecionados para impressão:
Imprimir:
2909 - Vol. 40 / Edição 2 / Período: Maio - Dezembro de 1974
Seção: Artigos Originais Páginas: 139 a 141
Phycomicose dos Seios Paranasais
Autor(es):
Adelmar Cadar e
Roberto Eustáquio Guimarães*

Sob o nome de phycomicose, entende-se uma doença provocada por fungos pertencentes à classe Phycomicetes. Classifica-se segundo o órgão ou órgãos comprometidos: gastro-intestinal, pulmonar, orbito-rino-cerebral, sub-cutanea e septicemia. Inicialmente, foi denominada mucormicose, por serem os primeiros casos causados por fungos da ordem Mucorales, quase sempre dos generos Rhizopus, Mucor e Absidia. Larribaud & Cols. propõem uma divisão em dois grupos:

1. ° - Mucormicoses - forma orbito-ripo-cerebral, pulmonar e gastro-intestinal. Esse grupo se desenvolve em pacientes com resistência diminuída por vários fatores: subnutrição, doenças do sistema retículo-endotelial, uso abusivo de antibióticos, hiperdosagem de corticoides, medicação anti-neoplasica, radioterapia prolongada e em mais de 50% dos casos, complicando o diabetes mellitus descompensado, em cetacidose.

2.° - Basidiobolomicoses - causadas pelos gêneros Entomophthora e Basidiobolas, mais comuns sob a forma sub-cutanea e nasal. Esses fungos são normalmente saprófitas, termofílicos, comumente encontrados em terra, esterco, frutas, compotas, crescendo bem em ambiente rico de açucar e nitrogênio. No homem, são isolados no trato respiratório alto e fezes de pessoas normais. São chamados "fungos oportunistas", porque a sua atividade patogênica está intimamente ligada à baixa de resistência do hospedeiro. Quando patogênicos, criam processo inflamatório agudo, piogênico, de evolução rápida, provocando necrose, vasculites e tromboses. Nos tecidos, são organismos grandes, com micelios longos, ramificados e não septados (4 a 50 micra de espessura até 200 micra de comprimento.) Nos casos de comprometimentos de seios paranasais, sempre a porta de entrada é o nariz, de vez que os fungos vivem aí saprofíticamente. Nos casos de baixa de resistência, mais comum na diabete descompensada, entram em atividade, e diretamente propagam-se para os seios paranasais, podendo depois invadir a órbita o sistema nervoso central. O comprometimento orbitário traduz-se por oftalmoplegia e celulite retro-bulbar, explicada pela miosite e neurite necrotisante característica do processo. A freqüência de cetasidose deabetica e a raridade da phycomicose fala a favor de que existam outros elementos capazes de desencadear o aparecimento da doença. O diagnóstico etiológico das diferentes espécies só pode ser estabelecido por meio da cultura. Observação de um caso de Phycomicose: Paciente E. C. R., 21 anos, natural de Divinópolis, Minas Gerais, sexo feminino, doméstica, solteira, branca. Antecedentes familiares - Sem importância.

Antecedentes pessoais - Diabética desde os 19 anos e já esteve internada para tratamento por 4 vezes: julho de 1971, dezembro de 1971, novembro de 1972 e abril de 1974. A paciente apresentou-se para consulta em 23-05-74, enviada pelo clínico Dr. Eduardo Costa Ferreira, relatando que há cerca de 20 dias, estava internada para tratamento de descompensação diabética, quando surgiu repentinamente edema da região infra-orbitaria direita, ptose palpebral e oftalmoplegia. Não queixava-se, de dores e nem apresentava rinorréa. A não ser o edema da região infra-orbitaria, o exame otorrinolaringológico era normal. Hipoestesia da hemiface direita. Radiografia dos seios anterióres da face mostrava opacificação dos seios maxilar e etmoidal direito. Punção diameática branca. A taxa de glicose era de 240 mg%. Uma propedêutica neurológica completa foi realizada, pensando-se num possível comprometimento do Sistema Nervoso Central, devido a alterações no 3.°, 5.° e 6.° pares craneanos, mas ela resultou inteiramente normal. O liquor apresentou Weinberg positivo. Tendo em vista o aspecto radiológico, foi indicada a cirurgia sinusal. Esta foi realizada em 2006-74, quando a paciente apresentou condições clínicas satisfatórias e glicemia normal. Sob anestesia local, foi feita abertura do seio maxilar direito, que apresentava secreção purulenta, mucosa espessada e degenerada, com seqüestro ósseo da parede posterior do seio maxilar. Atrás do seqüestro, foi retirada uma massa esbranquiçada com aspecto de colesteatoma. A cirurgia prosseguiu com abertura do etmoide anterior, posterior e esfenoide, que foram cuidadosamente curetados, apresentando mucosa do mesmo aspecto do seio maxilar. Pareceu-nos haver considerável comprometimento do 5.° par, devido à extrema tolerância à larga cirurgia realizada e a relativamente pouca quantidade de anestésico empregada. O material foi enviado para anatomia patológica com o seguinte resultado: "Macroscopia - Diversos fragmentos irregulares macios, de cor vinhosa, medindo 2 cms. o maior. Microscopia: Phycomicose. Granulomas abcedados apresentando fungos, com hifas espessas e não septadas." Os cortes foram corados pela HE e pelo PAS. a) Hamilton leite Soares. Post-operatório - Correu bem e 24 horas após, desapareceu a ptose palpebral e permaneceu apenas paralisia do reto externo, que regrediu totalmente após 20 dias, bem como a hipoestesia. O edema da região infra-orbitária foi desaparecendo lentamente e, atualemte, digo, atualmente a paciente apresenta-se bem. 30 dias após a cirurgia, fizemos lavagem do seio maxilar, colhendo material e enviando para o laboratório, com o seguinte resultado: "Cultura para fungos - positiva. Fungo isolado: Rhizopus Sp." a) Dr. Benedito A. Rodrigues. 2607-74. N.° do exame: 3.245. 2 dias antes, havia sido feito exame da secreção nasal, com o mesmo resultado. Em vista desse resultado, ficamos em dúvida quanto ao tratamento da micose. Como este teria de ser feito com Anfotericina B, de vez que não existe tratamento específico, e esse antibiótico é tóxico, principalmente pelas condições da doente, aguardamos mais 30 dias. As melhoras foram sempre acentuadas, tanto do lado cirúrgico, como as condições clínicas. Novo material foi colhido do seio maxilar em 17-08-74, com resultado negativo. Por isto, resolvemos dar alta à doente e como ela mora próximo à Belo Horizonte, poderemos controlá-la periodicamente.

Summary

The authors present here a case of Phycomicose of the paranasal antrum which was operated on In Santa Casa de Misericórdia, a hospital in Belo Horizonte, Brazil. Phycomicose is a disease caused by fungus belonging to the class of Phycomycetons; of Mucolares hind and almost always belonging to the Rhizopus. Mucor and Absidia sorts. There are various forms of location and the most common ones are cerebralorbit-rhino, pulmonary, intestinal-gastro and subcutaneous. These are saprophytos fungos that start their pathogenic work when the patient is under bad organic conditions, specially in the mellitus diabetes with cetacidose arrhvthmia, responsible for fifty per cent of the cases. That's why they're called "opportunistic fungus". The case here presented is of a feminine patient, white, 21 years old, diabetic. All of a sudden she presented a facial edema, palpebral ptosis and ophthalmolopical plegia. She was operated on after the compensation of diabetes, having the maxlllary antrum etmoids and the right sphenoidal being widly opened. The result of the anatomical-pathological exam was of Phycomicose. On the nevt day of the surgery, the patient got better, and the paralysis of the commum ocular motor disappeared; only the paralysis of the outer ocular motor remained, but even that one totally disappeored in twenty days. The result of the culture brought out the presence of Rhizopus Sp.; this material had been picked up by washing of the maxillary antrum after the surgery. There wasn't any need for treatment because the patient presented increasing improvement. A new culture was made thirthy days after the first one and it turned out negative. The patient is still under periodical control.

Referências Bibliográficas

1. Andrade Z. et al - Nasal Granuloma caused by Entomophthora Coronata. The American Journal of Tropical Medicine and Hygiene, 16 (1): 31-33, 1967.
2. franco M. et al - Ficomicose orbito-rinocerebral associada à cetacidose diabética. Registro de um caso. Rev. Inst. Med. Trop. São Paulo. 12 (5): 354-363, 1970.
3. Georgiadés, A. A. et al - Mucormycose nasoorbito-celulaire (a propos d'une observation typique). Ann. d'Oculist (Paris) 205 (6): 721-734, 1972.
4. Lacaz C. da S. - Compendio de Micologia Médica. São Paulo, Sarvier e Editora da Universidade de São Paulo, 1967.
5. McBride, R. A. - Mucormycosis - Two cases of disseminated disease with cultural identificatìon of Rhizopus; review of literature. American Journal of Medicine, May 1960:832-844.
6. Restrepo M. A. et al - Subcutaneous phyco- micosis: report of the first case observed in Colombia, South America. The American Journal of tropical medicine and Hygiene, 16 (1): 34-39, 1967.
7. Stevens, K. M. et al - Mucormycosis in a patient receiving azathiprine. Archives Otolaringology, 96:250, 1972.
8. Stephan T. et al - Rhinocerebral phycomicosis (mucormycosis). The Laryncospe.
9. Wittig E. et al - Meningoencefalite a mucormicose. Arquivo Neuro-Psiquiátrico (São Paulo), 31 (2): 151, 1973.




* Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e da Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


Imprimir:
Todos os direitos reservados 1933 / 2024 © Revista Brasileira de Otorrinolaringologia