A correção cirúrgica da obstrução respiratória representada pela paralisia definitiva das cordas vocais constitui ainda problema atual desde que, das muitas técnicas preconizadas, todas apresentam resultados incertos e variáveis, sejam fonatórios, sejam respiratórios(4,5).
Nas últimas décadas, tem sido referida com maior freqüência a técnica de Woodman ou sua variante endoscópica, de Thornell; todavia o número de insucessos ainda é grande, o que tem sido mencionado por diversos especialistas(1,2,3).
Como observação pessoal após acompanharmos algumas intervenções clássicas, que embora tecnicamente bem executadas, não alcançaram seus objetivas, decidimos em 1969, efetuar ressecção de uma das cordas vocais de paciente já submetida a aritenopexia, na qual o fator respiratório era de fundamental importância; satisfeitos com os resultados obtidos, realizamos a intervenção em mais 3 pacientes com a mesma afecção.
A finalidade do presente trabalho é a de apresentar a técnica e os resultados de cordectomia parcial sub-mucosa, realizadas de 1969 a 1972.
MaterialForam submetidos à referida intervenção, em colaboração com Pedro Paulo A. Sodré, 4 pacientes portadores de paralisia de laringe em adução das cordas vocais, por lesão bilateral dos nervos recurrentes laríngeos. O tempo decorrido entre o evento mórbido e a cirurgia corretiva variou de 10 meses a 5 anos e o seguimento pós-operatório, de 6 meses a 3 anos (quadro I). Quanto à causa da lesão neurológica bilateral irreversível, em 2 pacientes foi devida à re-operação de bócio, em um tireoidectomia total por neoplasia maligna e em outro por traumatismo cervical corto-contuso.
Todos os 4 casos eram portadores de traqueostomia, descanulizados apresentaram obstrução respiratória alta imediata e intensa, necessitando cânula traqueal aberta permanentemente. O espaço glótico, avaliado à laringoscopia indireta, achava-se reduzido à largura de 1 mm ou menos; a mobilidade das cordas vocais, ausente.
Em relação à voz, 2 pacientes apresentavam fonação razoável e os outros 2, fonação considerada insuficiente; do ponto de vista psicológico, todos optavam pelo risco de redução fonatória, frente à possibilidade de correção definitiva da obstrução respiratória.
MétodoEm todos os pacientes da série foi realizada laringofissura mediana sob anestesia geral; exposta a endolaringe, efetuamos secção da mucosa de uma das cordas vocais em direção longitudinal no sentido anteroposterior, interessando seus têrços médios e posterior, extendendo-se à região da aritenóide correspondente ( fig. 1 e 2).
Figura 1
Após descolamento superior e inferior dos retalhos mucosos foram expostas a musculatura da corda e a cartilagem aritenóide, as quais foram ressecadas, a musculatura na espessura de cerca de 3 mm e a cartilagem após desarticulação (fig. 2).
Figura 2
Executada hemostasia rigorosa, foi efetuada sutura da mucosa laríngea com pontos separados de fio absorvível atraumático (fig. 3) e a seguir, fechamento da cartilagem tireóide, aproximação dos planos musculares e sutura da pele. Os cuidados pós-operatórios imediatos foram os comuns à qualquer laringofissura.
Figura 3
ResultadosDo ponto de vista funcional, quanto à parte respiratória, os resultados foram plenamente satisfatórios em todos os casos, cuja descanulização definitiva pode ser realizada no prazo de 20 a 30 dias com retorno às atividades normais. Em relação à fonação, notamos que em 2 casos esta permaneceu inalterada, em um houve melhora nítida e em outro discreta piora em relação à situação pré-operatória (quadro I).
Quadro I
Em exames laringológicos subseqüentes notamos ter havido aumento da fenda glótica em sua metade posterior, variando de 3 a 4 mm de largura.
Os pacientes, todos seguidos até o momento atual, não apresentaram em nenhuma ocasião crises de dispnéia, mesmo a esforços intensos ou na vigência de infecções respiratórias comuns. Não observamos também qualquer perturbação pós-operatória da deglutição.
ComentáriosA técnica descrita foi instituída com a finalidade precípua de tão somente remover a obstrução respiratória laríngea e como conseqüência a traqueostomia da qual eram portadores os pacientes independente das alterações fonatórias que poderiam ocorrer.
Todavia, os resultados quanto à fonação foram além do esperado, não ocorrendo exceto e parcialmente em um dos casos maior perda funcional. Tal poderia ter sido devido ao fato de evitarmos lesar o têrço anterior da corda vocal operada.
Acreditamos que o valor da técnica esteja contido na possibilidade de seu uso mais difundido, sem envolver minúcias dependentes de habilidade pessoal.
ResumoOs autores apresentam detalhes da técnica e os resultados de cordectomia parcial sub-mucosa, via laringofissura, em 4 casos com paralisia bilateral da laringe.
Os resultados, considerados bons do ponto de vista respiratório e suficientes do ponto de vista fonatório, foram avaliados subjetiva e objetivamente.
SummaryThe authors present technic details and partial submucosal cordectomy results, in four cases with bilateral larynx paralysis.
The results were considered advisable at the respiratory point of view and sufficient at the phonatory point of view. They were appreciated subjectively and objectively.
Bibliografia1. 1.Alonso, J. M. - Tratado de Oto-rino-laringologia y Bronco-esofagologia. 2a. ed. - Ed. Paz Montalvo, Madrid, 1964.
2. 2.Berendes, J., Link, R. e Zollner, F. - Tratado de Otorrinolaringologia. Ed. Cient.-Méd., Barcelona, 1970, pp. 1162-93.
3. 3.Botelho, J. A. A. - Nova técnica para a correção de dispnéia causada pela paralisia
4. bilateral das cordas vocais. Rev. Bras. Oto-Rino-Laring., 37: 110-2, 1971.
5. 4.Jackson, C. & Jackson, C. L. - Diseases of the nose, throat and ear. W. B. Saunders Co., Philadelphia, 1959.
6. 5.Thompson, 5. & Negus, V. E. - Diseases of the nose and throat. 4a. ed. D. Appleton-Century Co. New York - London, 1937.
* Instrutor de ensino da Fac. Cien. Med. Santa Casa de São Paulo.
** Assistente do Serviço de Endoscopia da Santa Casa de Santos.
*** Quintanista da Fac. Cien. Med. de Santos.