ISSN 1806-9312  
Sábado, 27 de Abril de 2024
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2806 - Vol. 47 / Edição 1 / Período: Janeiro - Abril de 1981
Seção: Artigos Originais Páginas: 1 a 6
SCHWANOMA DE BASE DE LINGUA - Considerações sobre um caso*
Autor(es):
Dr. Nelson Eichstaedt**
Dr. Marus G. L. Sallum**
Dr. Apio C. Medrado**
Dr. Pedro E. de Lima***

Resumo: Os autores apresentam um caso de schwanoma de base de língua, em uma paciente jovem - 20 anos -, e explicam a técnica cirúrgica usada para exérese deste tumor. O diagnóstico definitivo só foi estabelecido pelo exame histopatológico da peça extirpada cirurgicamente.

O schwanoma é um tumor relativamente raro, principalmente na faixa etária de 20 anos. Os autores tecem considerações sobre a patologia destes tumores, relatando um caso de localização na base da língua no qual para a sua exérese foi empregada a técnica cirúrgica de Bocca, ou via supra hioídea.

Observação

R.C.C.S., registro no Hospital dos Servidores do Estado-R.J., sob o n° 733.575, 20 anos, estudante, procurou o Serviço de Otorrínolaringologia daquele Hospital, em janeiro de 1980, com as seguintes queixas: distúrbios na mastigação e deglutição, sensação de corpo estranho na garganta e discreta modificação da voz.

Os antecedentes familiares da paciente não apresentaram particularidades relacionadas com a patologia.

A história da paciente põe em evidência os distúrbios da mastigação e deglutição, que iniciaram há aproximadamente 4 meses, discretos no início e que foram piorando progressivamente. Uma tumoração na base da língua que também crescia lentamente, acompanhado de uma modificação discreta da voz.

No exame clínico constatou-se á inspeção e palpação um abaulamento arredondado na região supra-hioídea, do tamanho de uma noz, de mais ou menos 4 cm de diâmetro, elástica, indolor e relativamente móvel.

A orofaringoscopia pos em evidência a presença de uma massa, arredondada, do tamanho de uma noz, coberta por uma mucosa de coloração normal, com presença de algumas estrias vasculares, localizado na base da língua e aderente à mesma.

Os movimentos de deglutição se faziam com certa dificuldade, a respiração e a fonação estavam ligeiramente modificados.

A rinoscopia posterior não mostrou alterações.

A laringoscopia indireta, mostrou a tumoração, com as características já descritas, estendendo-se aproximadamente até 1 cm acima das valéculas, não acometendo a epiglote, tampouco a laringe.

O exame clínico geral e os exames de laboratório não mostraram alterações. A cintilografia para detectar tecido tiroidiano, também foi negativa.

A tomografia do laringe foi normal, o Rx mostrou um aumento de partes moles na base da língua, podendo ser a presença da tumoração.

A paciente não apresentou alterações da gustação, motilidade da língua ou paralisia de outros pares crânicos.

As características do tumor, sua localização, levaram-nos a suspeitar de uma série de afecções tumorais como:

Hemangioma, quisto, papiloma, fibroma, etc.

A exérese do tumor foi realizado através da região supra-hioidea, pela técnica cirúrgica de Ettore Bocca3, (1971), para o acesso à região da nasofaringe, que é a seguinte.

O paciente é colocado em decúbito dorsal com o pescoço em hiperestenção. 0 autor recomenda a traqueotomia, o que não foi feito em nosso caso, por acharmos desnecessária. A incisão da pele e platisma é feita no sentido transverso, acompanhando a borda superior do osso hioide, podendo se estender até as bordas anteriores do músculo este mocleidomastoideo. Na divulsão dos planos superficiais deve-se ter cuidado com os pedículos laríngeos superiores, bem como as veias da região. Os músculos supra hioideos anteriores são desinseridos do osso hioide o que facilita posteriormente a sua reconstituição. A musculatura intrínseca da língua é igualmente divulcionada em seu plano mediano e toda a massa muscular é separada por afastadores. Nesta altura atingimos a base da língua, ponto de implantação do tumor. Bocca, para atingir a região do nasofaringe, secciona a mucosa da faringe, passa pela região supra epiglótica e atinge o cavum.

Para melhor campo cirúrgico, usamos como afastador um espéculo vaginal, pequeno, de virgem, como aliás recomenda o autor. Com manobras bimanuais, pela incisão supra hioidea e pela cavidade bucal, faz-se a exérese da massa tumoral.

As suturas do orofaringe e dos planos musculares são facilmente feitas, reconstituindo-se os planos anatómicos integralmente. Convém ressaltar que na execussão desta via, em seus planos anatómicos, não encontramos qualquer elemento vascular ou nervoso que nos mereça atenção. Dai a facilidade com que
as manobras cirúrgicas são executadas. (Fig. 1).



Fig. 1 - Representação esquemática do acesso transfaríngeo em secção sagital. A - Representação esquemática da linha de incisão, acima do osso hióide. B - Vista da nasofaringe e do tumor. 0 bordo livre da epiglote é visível inferiormente, a base da língua e o palato mole foram elevados pelo retrator.



A evolução pós-operatória da paciente foi boa. Com quase um ano de pósoperatório, a paciente está bem, sem qualquer queixa.

O exame anátomo patológico do tumor forneceu os seguintes dados: Macroscopicamente: Tumor encapsulado, de dimensão de uma noz, de mais ou menos 4 cm de diâmetro, de consistência renitente, apresentando locais de zonas de aspecto cístico. Pela cápsula translúcida em volta, uma neoformação tenue, de cor rocho violácea.



Fig. 2 - Aspecto microscópico (Aumento médio), mostrando tumoração constituída por células fibrilares alongadas, entrecruzadas, sem dismorfias nucleares.



Do ponto de vista microscópico: Células alongadas, às vezes fusiformes, realizando uma disposição em "palissada", parecendo ser zonas "em turbilhão". (Fig. 2 3).



Fig. 3 - Aspecto microscópico (Aumento maior), observa-se o mesmo aspecto anterior, com áreas claras de permeio e núcleos com disposição em "palissada", característico dos schwanomas.



Considerações:

O termo schwanoma tem sido usado englobando numerosos tumores dos nervos periféricos; da( a confusão reinante. Como sinônimos mais comuns temos o de neurinoma, glioma periférico, mioschwanoma que refletem uma concepção histológica antiga.



Fig. 4- Tabela mostrando a incidência dos schwanomas por ordem de freqüênria, segundo Pietrantoni e Leonardelli.



Hoje sabemos que sua origem se dá nas células de Schwann dos nervos e daí o seu termo correto de schwanoma.

Com os estudos histológicos posteriores, os autores, como Pietrantoni (1950, reservam a denominação de schwanoma somente aos tumores benignos, específicos dos troncos nervosos, autônomos do ponto de vista nasológico, encapsulados, derivados da proliferação e do desvio tumoral, dos elementos da bainha de Schwann e aqueles que a maior parte dos autores, atribuem uma origem ectodermica.

As mais freqüentes localizações extra-cranio dos schwanomas são do domímnio da otorrinolaringologia, segundo os autores L. Pietrantoni e G. B. Leonardelli (1950, a localização por ordem de freqüência é a seguinte: Faringe, língua, laringe, fossas nasais e cavidades acessórias, glândulas salivares e pescoço. (Fig. 4).

Outros autores como D. Cinca, M. Suciu, L. Sbenghe Tetu e D. Mincu5 descrevem outra ordem de freqüência, na ocorrência dos schwanomas. Por ordem de freqüência ocorreriam na faringe, ouvido, língua, laringe, glândulas salivares, região látero cervical, região parotideana e pirâmide nasal.

Todos autores, porém, estão de comum acordo de que os schwanomas da faringe são os mais freqüentes.

O fato de que as regiões periféricas, apresentarem uma inervação muito rica, é difícil a localização do ponto de origem de um schwanoma.

O diagnóstico definitivo é possível dar somente por intermédio do exame histopatológico.

A idade do aparecimento dos schwanomas é muito variável, mas, são muito mais freqüentes acima dos 30 anos, como mostram os estudos de Pietrantoni e Leonardelli8. Estes mesmos autores no seu trabalho sobre "Os schwanomas extracranianos da extremidade cefálica (1958), apresentam 16 casos de schwanomas, sendo apenas 2 de língua, sendo um em uma mulher de 58 anos e outro em um homem com 79 anos de idade.

Dados de todos os casos dos autores, se limitam ao tratamento cirúrgico. A radioterapia se apresenta inefíciente.

O prognóstico dos schwanomas é bom, do ponto de vista da estrutura, mas, pode-se tornar maligno por um desenvolvimento exuberante que venha a invadir os tecidos vizinhos.

No nosso caso o tumor não mostrou características de invasão das áreas vizinhas.

Summary.

The autoors presented a case of schwannoma of tongue basis in a young pacient - 20 years - and presented the surgical technique used for excised the tumor. Diagnosis was only possible after histopathological examination of the specimen after surgical ablation.

BIBLIOGRAFIA

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3. BOCCA, E.: Transpharyngeal approach to Nasopharyngeal Fibroma. Ann. Otol. Rhin. e Laryng, 1972, 80, 171-176.

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5. CINCA, D. "et alii".: Observations on a case of Latero-cervical Schwannoma. Ann. Oto-Laryng (Paris), 1973,90 307-310.

6. COULE, J:: Maiìgnant Schwannoma of Tip of Nose. Arch. Otolaryng., 1955, 62, 638-640.

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* Trabalho realizado no Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital dos Servidores do Estado, INAMPS - R.J. Trabalho apresentado no XXV Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia. Gramado - Rio G. do Sul. 1980.
** Médicos Residentes seniors do Serviço de ORL do Hospital dos Servidores do Estado - Rio de Janeiro.
*** Prof. Titular de Anatomia e Livre Docente de ORL da Univ. Fed. do Rio de Janeiro. Inst. Brasileiro de Otorrinolaringologia - I. B.R.O. - R.J.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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