ISSN 1806-9312  
Segunda, 29 de Abril de 2024
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2754 - Vol. 67 / Edição 2 / Período: Março - Abril de 2001
Seção: Artigos Originais Páginas: 213 a 218
O Registro das Emissões acústicas Evocadas - Produto de Distorção em Pacientes com Perda Auditivia Induzida pelo Ruído.
Autor(es):
Gilberto Gattaz*,
Silvia R. G. Wazen**.

Palavras-chave: produto de distorção, perda auditiva induzida pelo ruído

Keywords: distortion products, noise induced hearing loss

Resumo: Introdução: O ruído é um dos mais freqüentes problemas identificados no ambiente de trabalho industrial. Ruído em forte intensidade ou exposição por tempo prolongado em áreas ruidosas causam redução definitiva da sensibilidade auditiva, devido à lesão dos órgãos sensoriais do ouvido interno. Na área da Saúde Ocupacional, o procedimento utilizado para o diagnóstico da perda auditiva é a audiometria tonal liminar. Entretanto, o diagnóstico da perda auditiva induzida por ruído só pode ser estabelecido por meio de um conjunto de procedimentos envolvendo anamnese clínica, história ocupacional, exame físico, avaliação audiológica admissional e monitoramento da audição do indivíduo ao longo de sua vida profissional. Havendo necessidade, deve se utilizar testes complementares, como imitanciometria, testes psicoacústicos de fala e emissões otoacústicas evocadas (EOAE). Considerando que os testes de EOAE e audiometria tonal possuem padrões metodológicos distintos e que EOAE não quantifica a perda auditiva, o objetivo do presente trabalho é analisar os resultados obtidos na audiometria tonal e nas EOAE - produto de distorção (EOAPD), estabelecendo parâmetros de comparação entre os dois exames em sujeitos expostos ao ruído ocupacional. Forma de estudo: Clínico prospectivo. Material e método: Foram estudados 31 sujeitos do sexo masculino, com idade entre 31 e 63 anos, com histórico de um tempo de exposição ao ruído maior que 10 anos. Destes, 59 orelhas foram avaliadas por meio da audiometria tonal, logoaudiometria, imitanciometria e EOAPD. Resultados: Resultados indicam que houve uma correlação significativa entre a audiometria e EOAPD, principalmente nas altas freqüências.

Abstract: Introduction: Noise is one of the most frequent problems spotted out in industrial workplaces. High-intensity noise or long-term exposition to noisy areas cause definite reduction of the hearing sensitivity due to the damage in the internal ear sensorial organs. Concerning the occupational health field, the most used procedure in the diagnosis of hearing loss in the pure tonal audiometry. Nevertheles, the diagnosis of noise-induced hearing loss can only be established by means of a series of procedures involving clinic anamneses, occupational background, physical exam, hearing admission evaluation, as well as monitoring the individual's hearing throughout his professional life. Other complementary tests such as impedance measurements, speech psycho-acoustic tests together with evoked otoacoustic emissions (EOAE) should be used, if needed. Considering that the EOAE as well as the pure tone audiometry tests do have distinct methodological patterns and that the EOAE does not really quantify the hearing loss, the purpose of the present paper is to analyse the results obtained in the pure tone audiometry, as well as in the EOAE by distortion product (EOAPD), thus setting comparison parameters between the two exams on individuals exposed to occupational noise. Study design: Clinical prospective. Material and method: 31 people have been analysed, all of them belonging to the male sex and aging between 31 to 63, who Nave been exposed to noise for a period longer than 10 years. Out of these, 59 ears have been evaluated by means of pure tone audiometry, impedance measurements and EOAPD. Results: The results show that there was a significant correlation between audiometry and EOAPD, mainly in the high frequencies.

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento da sociedade tem contribuído para a produção de ruído em níveis cada vez mais altos. O ruído é uma vibração mecânica que se propaga no ar e, conforme atinge o ouvido, produz a sensação auditiva. O ruído é um dos mais freqüentes problemas identificados no ambiente de trabalho industrial (Nepomuceno, 1979).

O ruído acarreta muitos efeitos sobre pessoas que trabalham na indústria, como irritabilidade, diminuição da eficácia no trabalho, alterações fisiológicas no ritmo cardíaco e na pressão sangüínea, e distúrbios psicológicos.

Tendo em vista que ruído afeta o homem física, psicológica e socialmente, e pode ainda provocar: cansaço, dano auditivo e interferência na comunicação.
Ruído em forte intensidade ou exposição por tempo prolongado em áreas ruidosas causam redução definitiva da sensibilidade auditiva, devido à lesão dos órgãos sensoriais do ouvido interno.

Seligman (1997) relata que por meio da ênfase na categoria que descreve a mudança permanente do limiar, podemos dividir a sintomatologia da perda auditiva induzida pelo ruído em dois grandes grupos: os sintomas auditivos (perda auditiva, zumbidos, dificuldade na compreensão da fala e outros) e os não auditivos (transtornos da comunicação, alterações do sono, transtornos neurológicos, vestibulares, digestivos e comportamentais).

Na área da Saúde Ocupacional, o procedimento utilizado que para o diagnóstico da perda auditiva é a audiometria tonal liminar. A audiometria tonal para pesquisa dos limiares auditivos nas diversas freqüências, desde que obedecendo a certos princípios técnicos de qualidade, é o que melhor preenche, no seu conjunto, o rastreamento eficaz da perda auditiva induzida por ruído (PAIR).

A importância da audiometria para o rastreamento da PAIR é grande; porém, não pode ser supervalorizada a ponto de ser usada como único instrumento de diagnóstico. Além das imprecisões próprias da subjetividade do método, em razão da motivação do indivíduo, inteligência, nível de linguagem, educação, disponibilidade de cooperar e concentração (Price, 1978), este não revela problemas importantes da patologia, que surgem antes da perda tonal e por vezes independem dela, como o recrutamento e o tinnitus (Costa apud Michael e Bienvenue, 1976). É um teste passível de erros, por necessitar de um conhecimento prévio em anátomo-fisiologia, conceitos de geração e transmissão do som, e depender de equipamentos.

O diagnóstico da PAIR só pode ser estabelecido por meio de um conjunto de procedimentos envolvendo anamnese clínica, história ocupacional, exame físico, avaliação audiológica admissional, monitoramento da audição do indivíduo ao longo de sua vida profissional. Havendo necessidade, devem ser utilizados testes complementares, como imitanciometria, testes psicoacústicos de fala e emissões otoacústicas evocadas (EOAE).

Considerando que EOAE e audiometria tonal são testes som padrões de medidas distintas e que EOAE não quantifica a perda auditiva, o objetivo do presente trabalho é analisar os resultados obtidos na audiometria tonal e nas EOAPD, estabelecendo parâmetros de comparação entre os dois exames em sujeitos expostos a ruído ocupacional.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

A. Emissões otoacústicas

As emissões otoacústicas foram primeiramente observadas pelo inglês David Kemp, em 1978, que as definiu como liberação de energia sonora originada na cóclea, que se propaga pela orelha média, até alcançar o conduto auditivo externo, Kemp pôde demonstrar que as EOAE estão presentes em todos os ouvidos funcionalmente normais e deixam de ser detectadas quando os limiares tonais estiverem acima de 20-30 dB.

Carnicelli apud Hood e colaboradores, 1996, citam que a origem das emissões otoacústicas está relacionada à movimentação mecânica ou eletromotilidade das células ciliadas externas, controlada pelas vias eferentes auditivas através do sistema olivococlear.

O registro das emissões otoacústicas evocadas é o mais novo método para detecção de alterações auditivas de origem coclear. Consiste em um método objetivo, relativamente simples, rápido, não invasivo, que dispensa o uso de eletrodos sendo que a captação se dá no canal auditivo por um microfone, podendo ser realizado em qualquer faixa etária (Kemp e colaboradores, 1990).

Gattaz apud Koller e colaboradores (1991) relatam que o estudo das EOAE oferece uma nova possibilidade de serem pesquisadas a fadiga e as alterações auditivas precoces, evidenciando-se uma redução de suas amplitudes ou mesmo a ausência de suas respostas, conforme a duração e a intensidade da exposição ao ruído.

Foi descrito que emissões otoacústicas também podem ser aplicadas em programas de conservação auditiva com a proposta de detecção precoce do prejuízo auditivo causado por exposições ocupacionais (Hotz e colaboradores, 1993; Engdahl e colaboradores, 1996).

Uma das importâncias das EOA é a possibilidade de estudar os aspectos mecânicos da função coclear de forma não invasiva e objetiva, e que independe do potencial de ação neural. Desta maneira, informações objetivas podem ser obtidas, clinicamente, sobre os elementos neurais da cóclea. A maioria das deficiências auditivas, como as induzidas pelo ruído, as de caráter hereditário, têm sua origem nestes elementos. Os demais métodos objetivos, atualmente utilizados na avaliação audiológica clínica, não permitem medir diretamente as respostas destes elementos.

Tem sido mostrado que exposições curtas ao ruído resultam num decréscimo das amplitudes das EOAE, numa alteração de sua composição de freqüências e no aumento de seus limiares (Rossi e colaboradores, 1991; Avan e colaboradores, 1993).

Segundo Probst e colaboradores, (1993), EOAPD é considerada pelos autores como ideal para monitorar as alterações cocleares induzidas pelo ruído, devido à sua especificidade de freqüências e a possibilidade de testar freqüências de 4 kHz a 8 kHz.

B. Perda auditiva induzida por ruído (PAIR)

Skellett apud Saunders e colaboradores (1985, 1991), descrevem que exposição a sons induz a mudanças na estrutura e função das vias auditivas. Estas mudanças dependem da duração, intensidade e padrão temporal da exposição. As alterações na função auditiva depois de níveis de sons muito intensos podem ser atribuídas às mudanças mecânicas na estrutura coclear.

Estudos realizados em campo sobre a perda auditiva em ambientes industriais, assim como de pesquisas laboratoriais identificaram quatro fatores importantes, que contribuem para o perigo em potencial do ruído com relação à audição. São eles: (a) nível sonoro total, medido em dB; (b) distribuição espectral (distribuição da energia sonora por freqüência); (c) duração e distribuição do ruído (exposição sonora durante um dia típico de trabalho); e (d) exposição cumulativa ao ruído em dias, semanas ou anos (American Academy of Otolaryngology - Head and Neck Surgery, 1988).

O risco do dano auditivo é maior com a elevação do nível de ruído ou com o aumento do tempo de exposição ao ruído, mas também depende das características do som. Além disso, a sensibilidade ao ruído é exclusivamente dependente do indivíduo.

Os exames audiométricos são a única maneira disponível para detectar a suscetibilidade de um indivíduo ao ruído. Através da comparação dos resultados de exames periódicos, pode se fazer uma estimativa de como o funcionário está sendo afetado pelo ambiente de trabalho ruidoso.

Das alterações que compõem o quadro clínico desta doença profissional, elevações dos limiares auditivos são detectados na audiometria, os traçados apresentam características relativamente constantes e bem definidas, e permitem, em alguns casos, o diagnóstico diferencial com outras patologias auditivas.

O Comitê Nacional de Ruído e Conservação Auditiva (1994) define que a perda auditiva induzida pelo ruído relacionada ao trabalho, diferentemente do trauma acústico, é uma diminuição gradual da acuidade auditiva, decorrente da exposição continuada em níveis elevados de ruído. Apresenta como características principais ser sempre neurossensorial, em razão do dano causado às células do órgão de Corti. O processo de perda auditiva induzida por ruído envolve não somente as células sensoriais, mas também as células de suporte, fibras do nervo e suprimento vascular (Henderson e Hamernik, 1995).

Uma vez instalada, a PAIR é irreversível e quase sempre similar bilateralmente. A perda auditiva raramente progride a profunda, pois, geralmente, não ultrapassa os 40 dBNA nas baixas freqüências e os 75 dBNA nas freqüências altas.

Inicial e predominantemente, manifesta-se nas freqüências de 6, 4 ou 3 kHz e, com o agravamento da lesão, estendese às freqüências de 8, 2, 1, 0,5 e 0,25 kHz, as quais levam mais tempo para serem comprometidas. Geralmente, atinge o nível máximo para as freqüências de 3, 4 e 6 kHz nos primeiros 10 a 15 anos de exposição, sob condições estáveis de ruído. Uma vez interrompida a exposição ao ruído intenso, não deverá haver progressão da perda.

Infelizmente, perda auditiva induzida, por ruído é acompanhada por uma ampla constelação de deficits auditivos como o recrutamento de loudness (Henderson e Salvi apud Hickling, 1967), tinnitus (Loeb e Smith, 1967), pobre seletividade de freqüência, processamento temporal e pobre percepção de fala (Leshowitz e Lindstrom, 1977; Wightman e colaboradores, 1977).

Melnick (1978) enfatiza que "as variedades nos graus desse tipo de perda podem ser atribuídas tanto às diferenças de suscetibilidade entre os indivíduos (sexo, exposição concomitante a outros agentes, perda auditiva pré-existente, idade, etc...) quanto a determinadas características físicas do ruído (espectro de freqüências, intensidade etc...)".

Pesquisas sugerem que a PAIR pode ser agravada por exposição simultânea do trabalhador a ruídos intensos e outros agentes, tais como produtos químicos e vibrações. Da mesma forma, o trabalhador que ingere ototóxicos ou é portador de algumas doenças pode ter a suscetibilidade ao ruído aumentada (Comitê Nacional de Ruído e Conservação Auditiva, 1994).

MATERIAL E MÉTODO

O estudo incluiu a análise dos exames audiológicos de 31 indivíduos do sexo masculino, com idade entre 31 e 63 anos, com histórico de exposição ao ruído maior que 10 anos. Destes, 59 orelhas foram avaliadas por meio de audiometria tonal, logoaudiometria, imitância acústica e EOAPD, sendo que todos os procedimentos descritos acima foram realizados com repouso auditivo. Foram excluídos indivíduos com distúrbios condutivos ou com seqüelas de otite média por exame otoscópico, timpanometria e medidas dos limiares do reflexo estapediano. Em contrapartida, não foram excluídos os exames que apresentavam outras causas de perdas auditivas associadas.



Figura 1.



Figura 2.



É importante salientar que mesmo audiometrias com respostas inconsistentes e incompatíveis com a logoaudiometria foram consideradas neste estudo.

O espectro de freqüências estudado, tanto na audiometria tonal quanto na EOAPD, compreendeu as freqüências de 1k, 2k, 3k, 4k, 6k e 8 kHz. As freqüências de 0,25 e 0,5 kHz não foram incluídas, neste estudo, visto que as mesmas excepcionalmente são acometidas na PAIR e para evitar possíveis dificuldades na captação de suas respostas de produto de distorção.

Os equipamentos utilizados para a realização da audiometria tonal e imitanciometria foram o Kamplex AD 27 e Kamplex AZSR, respectivamente. Para as EOAPD foi utilizado o Madsen - Celesta 503 em cabine acústica. Todos esses equipamentos pertencem ao Instituto de Otorrinolaringologia de São Paulo - Hospital dos Defeitos da Face.

As amplitudes das EOAPD foram medidas por várias combinações de f1 e f2. A razão f1/f2 foi mantida constante em 1,22. Os dois tons foram aplicados simultaneamente de intensidades iguais a 70 dB SPL.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Inicialmente, devemos salientar que a interpretação dos resultados seguiu um padrão de normatização, de acordo com os parâmetros fornecidos pelo programa do equipamento.

O espectro de freqüências considerado, tanto na audiometria tonal quanto na EOAPD, compreendeu as freqüências de 11. 2k, 3k, 4k, 6k e 8 kHz. As freqüências de 0,25 K e 0,5 kHz não foram incluídas neste estudo, já que as mesmas raramente são acometidas na PAIR, além de possíveis dificuldades ao se captar as respostas de produto de distorção.

Foi comparada a porcentagem de respostas alteradas em ambos os exames nas respectivas freqüências, considerando-se limiares tonais maiores que 25 dB NA, na audiometria tonal, e respostas abaixo do padrão de normalidade do produto de distorção (Figura 1).

Foi observada uma boa correlação entre as respostas fornecidas em ambos os testes. Foram registrados os maiores índices percentuais nas freqüências de 4 e 6 kHz, ou seja, 91,1% e 97,3%, respectivamente, evidenciando-se em particular o que é característico na PAIR, estando de acordo com o Comitê Nacional de Ruído e Conservação Auditiva (1994).

Comparando-se isoladamente a porcentagem de respostas alteradas nas respectivas freqüências, mediante limiares tonais maiores que 25 dB NA na audiometria tonal, e respostas abaixo da faixa do padrão de normalidade do produto de distorção, foram observados os maiores índices percentuais de limiares tonais alterados em 4 e 6 kHz (4K-AUD e 6KAUD) e de registros de EOAPD alterados em 3 e 4 kHz (3KDP e 4K-DP), indicando a presença de um rebaixamento nesta faixa de freqüências, o qual é evidente na PAIR (Figura 2).

Com relação aos dois testes realizados, deve se considerar que não há uma exata coincidência de rebaixamento em uma mesma freqüência, já que são dois métodos com diferenças fisiológicas inerentes. Na audiometria, a resposta fornecida é subjetiva, comportamental, frente a um estímulo sonoro tonal, e que depende de todo o processamento auditivo. As emissões otoacústicas são um fenômeno fisiológico exclusivamente coclear, de natureza pré-sinóptica, e o produto de distorção é registrado em uma freqüência (2f1-f2), diferente das freqüências dos estímulos que o gerou (fl e f2). Por exemplo: ao analisarmos a EOAPD na freqüência de 3 kHz, as freqüências dos estímulos f1 e f2 serão respectivamente: f1 = 2734 Hz e f2 = 3348 Hz, e o produto de distorção será registrado em (2f1-f2) = 2126 Hz).




Figura 3. Comparação do desvio padrão na audiometria normal e alterada.



A Figura 3 relaciona resultados normais obtidos por meio da audiometria tonal com resultados alterados obtidos por meio das EOAPD. Nota-se uma incidência menor que 30% em todas as freqüências consideradas no estudo.

Suckfull e colaboradores (1996) relatam que um dos fatores envolvido na variação das amplitudes das EOAPD é o estado da orelha média. Mesmo pequenas diferenças de pressão da orelha média afetam a transmissão das EOAPD e conduzem a uma significante diminuição das EOAPD.

Devemos salientar aqui que toda a população estudada apresentou otoscopia e teste imitanciométrico dentro dos padrões normais.

Weinstein apud Etholm e Belal (1974 e Covell (1952) levantam a questão da idade nos indivíduos. Embora as alterações no sistema auditivo associadas à idade sejam mais pronunciadas na orelha interna e nas vias auditivas centrais, também são suscetíveis à alteração as estruturas das orelhas externa e média. A membrana timpânica sofre um enrijecimento, as articulações dos ossículos sofrem um processo de calcificação progressiva e os músculos tensor do tímpano e estapédio atrofiam com a idade, o que poderia estar interferindo no registro do exame das EOAPD. Estes achados poderiam eventualmente justificar os resultados acima mencionados, ou seja: audiometria normal e EOAPD alterada.

Por outro lado, pode se ainda argumentar que esta alteração nas EOAPD em indivíduos com audiometria tonal normal pode ser um sinal de alguma disfunção ou prejuízo coclear, isto é, tendo se obtido anormalidades nas EOAEs e considerando que este é um teste com uma alta sensibilidade, pode-se supor que esta seja uma indicação de um estágio precoce de disfunção auditiva induzida por ruído (Hall apud Desai e colaboradores, 1999).

Ao comparar os resultados alterados na audiometria com os resultados normais nas EOAPD (Figura 3), foi observado um índice de 64,3%, 54,5% e 35% nas freqüências de 4, 6 e 8 kHz, respectivamente. Esses resultados podem ser explicados considerando que não raramente ocorreram respostas inconsistentes na obtenção de limiares tonais audiométricos, em função de serem pacientes não colaboradores para a realização do teste, ou mesmo, por se tratar de uma suspeita de simulação.

CONCLUSÕES

Diante dos resultados obtidos no presente trabalho, pode se concluir que EOAPD mostraram correlações significativas quando comparadas com a audiometria tonal, principalmente nas altas freqüências.

Desta forma, por suas propriedades e características únicas e graças à sua alta especificidade de freqüência, EOAPD surge como um instrumento adicional no diagnóstico das perdas auditivas induzidas por ruído e na identificação de mínimas alterações funcionais do sistema auditivo periférico, antes mesmo da perda tonal, podendo detectar precocemente prejuízos auditivos causados por exposições ocupacionais.

Atualmente, a audiometria é considerada um procedimento importante no que diz respeito ao rastreamento da PAIR. Entretanto, com o número crescente de perícias judiciais, é grande a responsabilidade que recai em especial sobre o profissional fonoaudiólogo ou médico perito ao interpretar os resultados do exame audiométrico.

Os profissionais muitas vezes se confrontam com dificuldades durante a realização da audiometria, visto tratar-se de um exame subjetivo, permeado por aspectos sociais, culturais, ambientais e biológicos, que muitas vezes exige dó indivíduo uma considerável capacidade de atenção e concentração.

Perante possíveis variações nos resultados audiométricos, ou mesmo obtenção de limiares tonais mediante respostas inconsistentes em sujeitos não colaboradores ou na tentativa de simulação, é sempre desejável a aplicação de testes objetivos, a fim de se monitorarem alterações cocleares induzidas pelo ruído com a finalidade de auxiliar principalmente os profissionais que atuam na área de saúde ocupacional.

Deve se acrescentar ainda que mais estudos serão necessários para uma padronização da aplicação do registro do produto de distorção, com o objetivo de se monitorar o estado do epitélio coclear em indivíduos expostos ao ruído ocupacional.

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* Otorrinolaringologista. Professor Assistente-Doutor da Faculdade de Fonoaudiologia - PUC/SP.
** Fonoaudióloga Mestranda do Curso de Pós-Graduação em Distúrbios da Comunicação da PUC/SP.

Trabalho realizado no Instituto de Otorrinolaringologia de São Paulo - Setor de Otorrinolaringologia - Hospital dos Defeitos da Face
Endereço para correspondência: Dr. Gilberto Gattaz - Rua Cincinato Braga, 59 - 5° andar, cjto. D-1 - 01333-011 São Paulo/SP.
Telefone: (0xx11) 288-4186 - Fax: (0xx11) 3887-9913 - E-mail: sgattaz@ibm.net
Artigo recebido em 18 de outubro de 2000. Artigo aceito em 15 de janeiro de 2001.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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