ISSN 1806-9312  
Terça, 30 de Abril de 2024
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2729 - Vol. 67 / Edição 1 / Período: Janeiro - Fevereiro de 2001
Seção: Artigos Originais Páginas: 78 a 82
Implante de Gordura no Espaço de Reinke para Correção de Alterações Histoestruturais das Pregas Vocais.
Autor(es):
André C. Duprat*,
Henrique O. Costa**,
Claudia A. Eckley***,
Daniela B. Pupo****,
Heloísa H. Z. Rossi****.

Palavras-chave: laringe, cirurgia, implante, gordura

Keywords: larynx, surgery, fat, implant

Resumo: Introdução: Sulcos, cistos abertos e lesões iatrogênicas das pregas vocais (PPW) são lesões histoestruturais, caracterizadas por aderência da mucosa ao ligamento vocal, atrofia da mucosa e diminuição da massa vibrátil da prega vocal. Essas afecções são de difícil tratamento, sendo diversas as técnicas fonocirúrgicas descritas para auxiliar na abordagem dos pacientes. Sataloff e colaboradores (1997) descrevem a técnica de inserção de gordura em bloco na prega vocal, nos casos de cicatriz após microcirurgia de laringe, com bons resultados. Objetivo: A partir destes dados, propomos o implante de gordura em bloco na correção de sulcos, cistos abertos e atrofias iatrogênicas. O bloco de gordura tem as seguintes funções: corrigir a atrofia com o aumento do volume das PPW; recriar uma camada entre a mucosa e o ligamento vocal, e impedir nova aderência mucoligamentar. Material e método: Analisamos neste trabalho 11 indivíduos submetidos a implante de gordura autóloga, em bloco. Os pacientes foram avaliados um mês e seis meses após a cirurgia, destacando-se três aspectos: análise perceptiva, videolaringoestroboscopia e opinião do paciente. Resultados: Antes da cirurgia, em relação à qualidade vocal, 11 pacientes apresentavam aspereza; 10, soprosidade; e sete, quebras de sonoridade. Após seis meses, houve diminuição da aspereza em oito pacientes (72,72%), diminuição da soprosidade em seis (60%) e diminuição das quebras em quatro (57,14%). Nenhum dos indivíduos apresentou piora do padrão vocal em relação ao pré-cirúrgico. Dez pacientes referiram diminuição da fadiga vocal; e oito (72,72%), melhora da qualidade vocal. Em relação à videolaringoestroboscopia, sete pacientes apresentavam rigidez da prega vocal acometida (63,63%); após seis meses, três (27,27%) persistiam com aumento da rigidez. Conclusão: O implante de gordura autóloga em bloco é uma alternativa importante no tratamento dos sulcos, cistos e atrofias iatrogênicas, em pacientes que não apresentam melhora com o tratamento fonoterápico. A técnica permite a correção da área atrófica e da aderência e cria um espaço entre o ligamento vocal e a mucosa, melhorando a qualidade de vibração das pregas vocais.

Abstract: Introduction: Sulcus, open cysts and iatrogenic lesions of the vocal folds are characterized by adherences of the mucosa to the vocal ligament, mucosal atrophy and reduced thickness of the vibratory tissue. Several techniques of speech therapy and surgical have been described. Sataloff proposed the implantation, of a block of fat into the vocal fold obtaining good result with iatrogenic lesions. Objectives: Based on the concepts above the authors present the use of fat implantation to treat sulcus, open cysts and iatrogenic lesions of the vocal folds. The block of fat would play a role in the vibration of the vocal fold, repairing the atrophy of the vocal fold, creating a layer between the mucosa and the vocal ligament and avoiding the adherence of the mucosa to the vocal ligament. Material and method: Eleven patients were studied for six months following this procedure. Results were analyzed based on laryngeal videostroboscopy, perceptive voice analysis and the patients' opinion about his/her voice one month and six months after surgery. Results: Before surgery, all patients presented hoarseness, ten had breathy voice and seven had breaks. After six months decrease in hoarseness was noticed in eight patients (72,72%), a decrease in breathiness occurred in six (60%), and a decrease in breaks in four patients (57,14%). No patient presented decrease vocal quality. Ten patients improved vocal comfort and fatigue, and eight improved the vocal quality (72,72%). As for the laryngostroboscopy, seven patients presented stiffness of the sick vocal fold before surgery (63,63%), and, after six months, only three of them remained the same (27,27%). Conclusion: Autologous fat implantation is an important option in the treatment of patients with open cysts, sulcus and iatrogenic lesion of the vocal fold, who nave not improved their vocal quality with the speech therapy. This technique repairs the atrophic area, corrects the adherence and creates a new layer between the vocal ligament and the mucosa, increasing the vibration quality of the vocal fold.

INTRODUÇÃO

Sulcos, cistos abertos e lesões iatrogênicas das PPVV são caracterizados por aderência da mucosa no ligamento vocal, atrofia da mucosa e diminuição da massa vibratória da prega vocal, sendo afecções de difícil tratamento. Diversas técnicas em fonoterapia e cirurgia vêm sendo descritas para auxiliar na abordagem destes pacientes. A fonoterapia é fundamental como facilitador da emissão vocal, seja como tratamento exclusivo ou como complemento do tratamento cirúrgico. Duprat e colaboradores (1995) utilizam o agravamento vocal, através do relaxamento do músculo cricotireóideo (CT) e o rebaixamento da laringe, a fim de aumentar a massa vibrante da prega vocal facilitando sua coaptação.

Em relação ao tratamento cirúrgico, diversas técnicas vêm sendo descritas. Bouchayer e colaboradores (1985) preconizam a incisão da mucosa na superficie superior da prega vocal, seguida do descolamento da aderência. Pontes e Behlau (1993) descrevem o descolamento associado ao franjeamento da mucosa, quebrando as linhas de fibrose. Isshiki e colaboradores (1996) descrevem cirurgias do arcabouço da laringe, tireoplastia tipo I, como uma solução efetiva na correção de incompetência glótica por atrofia. Técnicas de injeção e implantes vêm ganhando espaço em nosso meio para a correção dessas afecções, com a utilização de materiais sintéticos ou biológicos. Teflon foi muito utilizado inicialmente, como um material inerte; no entanto, reações teciduais restringiram seu uso (Nakayama e colaboradores 1993), ganhando espaço a injeção de gordura ou colágeno. Sataloff e colaboradores (1997) propõem, posteriormente, o implante de gordura em bloco no interior da prega vocal, com bons resultados nos casos de atrofia após microcirurgia de laringe. Mais recentemente, Tsunoda e colaboradores (1999) passam a utilizar o implante de fáscia autóloga para aumentar o volume da área de atrofia das PPVV.

A partir destes trabalhos, propomos o implante de gordura autóloga, retirada do lóbulo da orelha, nos casos de sulcos, cistos abertos e atrofias após cirurgia, que não apresentam melhora com o tratamento conservador. O objetivo deste trabalho é apresentar nossa experiência com esta técnica. Relatamos os achados pré-cirúrgicos de 11 pacientes, e comparamos com os resultados após um mês, e seis meses da cirurgia, utilizando a videolaringoestroboscopia, análise perceptiva da voz e a opinião do paciente.

MATERIAL E MÉTODO

Vinte e um pacientes foram submetidos a implante autólogo de gordura no setor de laringologia do Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de São Paulo, no período de março de 1994 a março de 99. Foram selecionados pacientes que apresentavam aderência da mucosa ao ligamento vocal, com comprometimento da lâmina própria, sendo incluídos, portanto, os portadores de sulco, cisto aberto e atrofia iatrogênica da prega vocal.



QUADRO 1 - Relação do diagnóstico intra-operatório dos 11 pacientes submetidos ao implante de gordura no espaço de Reinke.



Pacientes com cistos fechados, com paralisia de prega vocal ou fixação de aritenóide foram excluídos, assim como os pacientes com intervalo de seguimento menor do que seis meses. Todos os pacientes avaliados estavam em seguimento fonoterápico no momento da indicação da cirurgia, e não apresentavam sucesso com a técnica de agravamento. No total, foram estudados 11 pacientes, submetidos à colocação de gordura por sulco, cisto aberto ou lesões iatrogênicas causada por microcirurgia de laringe. Nove pacientes eram do sexo feminino; e dois, do sexo masculino. A idade média dos pacientes era de 32,9 anos, variando entre 15 e 52 anos.

Seis pacientes eram portadores de sulco de prega vocal, sendo dois bilaterais e dois associados à lesão iatrogênica da prega vocal contralateral pós-microcirurgia de laringe para exérese de lesão benigna. Quatro pacientes apresentavam cisto aberto, sendo dois bilaterais. Um paciente era portador de lesão iatrogênica pós-microcirurgia de laringe para exérese de lesão benigna. Os pacientes com lesões bilaterais foram abordados bilateralmente, no mesmo ato cirúrgico (Quadro 1).

A cirurgia foi realizada sob anestesia geral. Primeiramente é feita a exérese de bloco de gordura da face posterior do lóbulo da orelha, através de uma incisão de 1 cm. O bloco apresenta de 2 a 4 mm de diâmetro, e é mantido em solução fisiológica de cloreto de sódio a 0,9% em temperatura ambiente, durante a abordagem da laringe. Através de laringoscopia direta com microscopia, é realizada incisão linear na borda superior da prega vocal, lateralmente à região acometida. A aderência mucoligamentar é descolada, de maneira que o tamanho da incisão corresponda a dois terços da extensão do descolamento, criando, desta forma, uma bolsa na prega vocal para recepção do enxerto. O bloco de gordura é colocado nesta bolsa, levando a um aumento imediato do volume da prega vocal. Procura se colocar uma quantidade maior de gordura, contado-se com uma absorção da parcial do bloco.

Os pacientes receberam no pós-operatório corticóide de depósito intramuscular (10 mg de dipropionato de betametasona e 4 mg de fosfato dissódico de betametasona) e amoxacilina, via oral, por uma semana (500 mg a cada oito horas). Foi orientado repouso vocal relativo, evitando voz sussurrada e abusos. Todos iniciaram terapia vocal após uma semana de cirurgia. Avaliação dos resultados foi feita através de: 1. análise perceptiva da voz, avaliando-se soprosidade, aspereza e quebra de sonoridade; 2. videolaringoestroboscopia, definindo a coaptação das pregas vocais e características da onda mucosa; 3. opinião do paciente em relação à sua qualidade vocal (piora, manutenção ou melhora) e a sensação de esforço vocal.

Os indivíduos foram examinados no pré-operatório e após um mês, e seis meses da cirurgia.

RESULTADOS

Na avaliação pré-operatória, a análise perceptiva da voz revelou soprosidade em 10 pacientes (90,90%), sendo leve em quatro pacientes (36,36%) e moderada nos demais (54,54%). Aspereza foi observada em todos os indivíduos (100%), sendo sete de grau moderado (63,63%); e quatro, leve (36,36%). As quebras de sonoridade foram identificadas em sete pacientes (63,63%) (Gráfico 1).

A videolaringoestroboscopia mostrou fenda fusiforme em cinco pacientes; triangular médio-posterior, em dois; em forma de ampulheta, em dois; paralela, em um; e triangular posterior, em um. Sete pacientes apresentavam interferência da lesão estrutural na onda mucosa (63,63%). Todos os pacientes estavam insatisfeitos com a voz, tanto pela sua qualidade quanto pelo grau de esforço exigido.

No primeiro mês de pós-operatório, no que se refere à análise perceptiva da voz, observamos soprosidade em nove pacientes (81,81%), sendo leve em oito pacientes (72,72%) e moderada em um (9,09%). Aspereza estava presente em 10 indivíduos (90,90%), sendo leve em oito (72,72%) e moderada em dois (18,18%). Quatro indivíduos (36,36%) apresentavam quebras de sonoridade (Gráfico 1). A videolaringoestroboscopia demonstrou fenda fusiforme em cinco pacientes e coaptação efetiva durante a fonação em três. Os demais pacientes apresentaram fenda triangular médio-posterior, ampulheta e triangular-posterior. Em relação à vibração das pregas vocais, cinco pacientes (45,45%) apresentam rigidez na área manipulada, interferindo na onda mucosa.



Figura 1. Análise perceptiva da voz, pré-cirúrgico, primeiro mês e sexto mês de pós-operatório. A) aspereza, B) soprosidade, C) quebras de sonoridade.



Oito pacientes (72,72%) referiram melhora da qualidade vocal, sendo que três referiam melhora acentuada (27,27%), com normalização do padrão vocal. Dez relatavam diminuição da fadiga vocal e nenhum paciente referia piora da qualidade vocal.

No sexto mês de pós-operatório, em relação à análise perceptiva da voz, observamos soprosidade em cinco pacientes (45,45%), sendo leve em todos os casos. Aspereza estava presente em nove indivíduos (81,81%), sendo leve em oito (72,72%) e moderada em um (9,09%). Três indivíduos (27,27%) apresentavam quebras de sonoridade (Figura 1). A videolaringoestroboscopia mostrou fenda fusiforme em três pacientes e coaptação efetiva durante a fonação em cinco, dois indivíduos com fenda médio-posterior e um em ampulheta. Em relação à vibração das pregas vocais, três pacientes (27,27%) apresentavam rigidez no local da manipulação, interferindo na onda mucosa. Oito pacientes referiram melhora da qualidade vocal (72,72%) e 10 relatavam diminuição da fadiga vocal. Nenhum paciente apresentou piora da qualidade vocal. Cinco pacientes (45,45%) referiam melhora efetiva da qualidade vocal, com normalização do padrão fonatório.

DISCUSSÃO

A abordagem dos pacientes com sulco, cistos abertos e atrofias exige atuação conjugada do otorrinolaringologista e o fonoaudióloga. Os pacientes iniciaram terapia fonoaudiológica, cerca de uma semana após a cirurgia, com o objetivo de melhorar a qualidade de vibração destas pregas, a coaptação glótica e diminuir o esforço vocal, além de corrigir outras inadequações fonatórias que possam estar associadas. Tem sido observado que a grande maioria dos pacientes, com cistos, sulcos ou atrofia cicatricial tendem a aumentar a atividade do CT, estirando as PPVV e deixando-as mais delgadas. Portanto o pitch torna-se ainda mais elevado e a coaptação glótica menos efetiva. Em nosso Serviço, temos utilizado a técnica de agravamento vocal, na qual o relaxamento do CT aumenta a massa das PPW e, portanto, melhora a coaptação e a vibração. Metade dos pacientes em nosso Serviço têm apresentado uma redução da aspereza, das quebras e da soprosidade com o tratamento fonoterápico exclusivo, sendo selecionados para o presente trabalho somente aqueles que não tiveram melhora com a terapia (Duprat e colaboradores, 1995). Portanto, há um número de pacientes que necessitam de abordagem cirúrgica, sendo este o tema principal desta discussão. A qualidade vocal depende da integridade da camada superficial da lâmina própria (espaço de Reinke), tecido frouxo com viscosidade baixa, deslizando suas lamelas sobre o ligamento vocal (Duprat 2001). O papel da gordura é recriar o espaço de Reinke, melhorando o deslizamento da mucosa sobre o ligamento vocal e permitindo boa qualidade de vibração durante a fonação. A gordura impediria nova aderência da mucosa com o ligamento vocal e aumentaria o volume da prega vocal, corrigindo o arqueamento e a atrofia comuns nestas afecções. O implante de gordura aumenta a amplitude de vibração, a intensidade fonatória e a eficiência vocal, e diminui o limiar de fonação (Wexler e colaboradores, 1989).

Bouchayer e colaboradores (1985) preconizam, no tratamento do sulco, a incisão da mucosa na superfície superior da prega vocal, e posterior descolamento da aderência; a mucosa é reposicionada com auxílio de cola biológica. Essa técnica não permite a correção do volume e não garante que não ocorra nova aderência na área manipulada. Pontes e Behlau (1993) propõem o descolamento, seguido de franjeamento da mucosa, a fim de quebrar o feixe de tensão formado pelo sulco ao longo da prega vocal; porém, não preserva a mucosa na sua integridade. A técnica proposta neste trabalho, além de preservar a mucosa, fator determinante no sucesso da fonocirurgia (Bouchayer e Cornut, 1985), permite correção da atrofia ao aumentar o volume da prega vocal.

A atrofia e o arqueamento impedem a coaptação efetiva. Algumas técnicas vêm sendo descritas para aumentar o seu volume. Isshiki e colaboradores (1996) descrevem a tireoplastia tipo I como uma alternativa, a fim de medializar a área atrófica favorecendo a coaptação das PPW, e apresentam 31 casos, submetidos a esta técnica, que apresentam melhora da qualidade vocal e diminuição do esforço fonatório. Porém, em pacientes com atrofia devida à cicatriz ou ao sulco de prega vocal, não obtiveram resultados satisfatórios. Há uma melhora da soprosidade, devida à medialização da prega; porém, como a aderência persiste, a vibração continua comprometida, permanecendo as quebras e a aspereza da voz, além de se criar uma cicatriz cervical. No nosso ver, técnicas que permitam a correção da aderência simultaneamente à correção do volume das pregas vocais potencialmente teriam melhores condições de melhorar o padrão vocal.

A injeção de materiais como Teflon também foi descrita, na tentativa de aumentar o volume e corrigir a área atrófica. Os resultados inicialmente foram satisfatórios; no entanto, o processo inflamatório, com formação de granulomas, gerado por essa substância, desestimulou sua utilização (Flint e colaboradores, 1997). A injeção de colágeno bovino foi uma alternativa na correção de pequenas insuficiências glóticas. Ford e colaboradores (1992) comentam sobre a menor reabsorção quando o colágeno é injetado na camada superficial, apresentando melhores resultados, quanto menor a fenda a ser corrigida; porém; por tratar-se de um material animal, seu emprego encontra algumas limitações. O uso de materiais autólogos, como a gordura, tem maior aceitação, por sua baixa imunogenicidade e mutagenicidade, além de seu baixo custo. Brandenburg e colaboradores (1992) descrevem a injeção de gordura retirada por sucção da parede abdominal, com bons resultados nos casos de cicatriz e paralisia da prega vocal, não relatando casos de sulco ou cisto aberto. Shaw e colaboradores (1997) referem melhora do padrão vocal, com a injeção de gordura, após um ano da cirurgia, em pacientes com atrofia cicatricial; porém, sem melhora das características da onda mucosa. Em nossos casos, observamos melhora na onda mucosa. Antes da cirurgia, sete pacientes apresentavam rigidez, passando para cinco, no primeiro mês após a cirurgia, e três, após seis meses. São dados similares aos de Sataloff e colaboradores (1997), que mostram melhora da qualidade vocal e da onda mucosa em pacientes com atrofia.

O implante de gordura em bloco vem mostrando melhores resultados em relação à injeção, sugerindo que o bloco teria uma menor reabsorção, quando em comparação com a injeção.



Figura 2. Aderência mucoligamentar corrigida com gordura mostrando o processo inflamatório com depósito de colágeno. A gordura impede a readerência mucoligamentar.



O implante em bloco preserva os adipócitos na sua integridade, e a liposucção e a injeção podem agredir as células gordurosas aumentando a porcentagem de absorção (Sataloff e colaboradores, 1997). Os adipócitos, ao serem agredidos, liberam ácidos graxos que geram um processo inflamatório maior. As diferentes formas de abordagem da gordura a ser implantada justifica os diferentes resultados encontrados na literatura.

Tsunoda e colaboradores (1999) relatam o implante de fáscia temporalis em um paciente com sulco, com resultado satisfatório em seis meses de seguimento, e comentam as vantagens da fáscia sobre a gordura como sendo um material passível de menor absorção, permitindo um resultado mais duradouro. Estudos com um universo maior de indivíduos e trabalhos experimentais comparando as duas técnicas serão importantes para definir a melhor solução. Os dois procedimentos utilizam materiais autólogos, mas a gordura tem características viscoelásticas mais próximas da camada superficial da lâmina própria, podendo reconstituir de maneira mais efetiva o espaço de Reinke (Chan e Titze, 1998).

Nossos achados mostram que após seis meses ocorre melhora do padrão vocal, com melhora das características da onda mucosa. Não há dúvida de que ocorre reabsorção parcial da gordura, com diminuição do volume da prega vocal; no entanto, o bloco pode interferir na readerência mucoligamentar, resultando em uma onda mucosa mais uniforme e permitindo um resultado permanente (Figuras 2 e 3). A gordura pode restituir a estabilidade e a periodicidade da emissão, além de diminuir o limiar de fonação. A gordura estabelece a simetria e as propriedades viscoelásticas da prega vocal (Jiang e colaboradores, 1994).

Dos 11 pacientes avaliados, 10 (90,90%) relataram melhora do padrão vocal, sendo que cinco (45,45%) referiram normalização. Dez pacientes (90,90%) relataram diminuição da fadiga vocal. A soprosidade foi a alteração vocal, que mostrou maior modificação inicialmente; seis (54,54%) apresentavam soprosidade moderada; e quatro (36,36%), leve. No sexto mês, apenas cinco (45,45%) apresentavam soprosidade leve. A diminuição da soprosidade significa uma melhor coaptação, que, associada à diminuição da rigidez da prega vocal, leva a uma diminuição da fadiga vocal.



Figura 3. Aderência mucoligamentar corrigida sem gordura. O depósito de colágeno forma pontes entre a mucosa e o ligamento levando a readerência mucoligamentar.



A aspereza passou de moderada em sete (63,63%) e leve em quatro (36,36%), para moderada em um (9,09%) e leve em oito (72,72%). A redução da aspereza revela uma diminuição do atrito entre as pregas vocais, às custas de uma maleabilidade da mucosa. As quebras de sonoridade estavam presentes em sete (63,63%), caindo para quatro (36,36%), demonstrando menor rigidez da prega com menor interferência na onda mucosa. Nenhum dos pacientes apresentou piora do padrão vocal após a cirurgia, tanto na análise perceptiva quanto na opinião do paciente.

A injeção de gordura é uma técnica segura; porém, com absorção variável, trabalhos são necessários para detectar os fatores que possam contribuir para uma menor absorção do tecido implantado, determinando resultados ainda melhores.

CONCLUSÃO

Nosso estudo evidencia que a gordura reconstitui o espaço de Reinke, formando uma camada entre a mucosa e o ligamento vocal, permitindo uma vibração mais uniforme e diminuindo as quebras e a aspereza. Ao aumentar o volume da área atrófica, permite, também, uma diminuição da soprosidade. Assim, o implante de gordura mostra-se uma alternativa segura e eficaz para a correção de alterações histoestruturais da prega vocal, devendo ser considerado como uma alternativa terapêutica nos pacientes com atrofias, sulcos e cistos abertos.

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* Professor Instrutor do Departamento de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Doutorando, pelo mesmo Serviço.
** Professor Adjunto do Departamento de otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Professor Assistente, Doutor do Programa de Fonoaudiologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
*** Professora Assistente do Departamento de Otorrinolaringologia da Faculdade e Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Doutoranda, pelo mesmo Serviço.
**** Mestranda pelo Departamento de Otorrinolaringologia Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Endereço para correspondência: Rua Professor Arthur Ramos 96, cjto. 72 - 01454-010 São Paulo/ SP.
Artigo recebido em 13 de abril. Artigo aprovado em 15 de janeiro de 2001.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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