ISSN 1806-9312  
Sábado, 23 de Novembro de 2024
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2709 - Vol. 58 / Edição 4 / Período: Outubro - Dezembro de 1992
Seção: Artigos Originais Páginas: 257 a 259
Conclusões e recomendações da lá conferência internacional de neuroma do acústico.
Autor(es):
Osvaldo Gomes de Souza*,
José Maurício Siqueira**

Palavras-chave: neurinoma, surdez sensorioneural

Keywords: neurinoma, sensorioneural deafness

Resumo: Os autores relatam as principais conclusões e recomendações da 1ª Conferência Internacional de Neuroma do Acústico realizada em Copenhagen em Agosto de 1991. Vários tópicos são abordados tais como história do neuroma,epidemologia,exames complementares, classificação, biologia tumoral e várias técnicas cirúrgicas. No final são tecidos comentários pessoais a respeito da utilização das recomendações em nosso meio.

Abstract: The authors describe the conclusions and recommendations from the First International Conference on Acoustic Neuroma that took place in Copenhagen in August of 1991. Several topics were discussed as follow: the history of neuroma, epideutology, diagnosis, classifications, tumor behaviour and surgical approaches. At the end the authors make personal comments about the recommendations that are of importance in treating neuromas in Brazil.

INTRODUÇÃO

O neuroma do acústico é o tumor mais comum no ângulo ponto-cerebelar. A maioria ocorre unilateralmente e não tem caráter hereditário. Aproximadamente 5% desses tumores ocorrem bilateralmente e tem caráter hereditário.

Apesar de existir extensa literatura sobre essa patologia ainda existem vários aspectos indefinidos e discordantes nos dias de hoje.

O objetivo desse trabalho é registrar as principais conclusões e recomendações da 1ª Conferência Internacional sobre Neuroma do Acústico realizada em Agosto de 1991 em Copenhagen.

TÓPICOS DE INTERESSE E CONCLUSÕES

HISTÓRIA

A história da cirurgia do neuroma do acústico é dividida entre neurocirurgiões e otoneurocirurgiões:

"Era de Cushing" (1900-1917) - a cronologia dos sintomas foi definida e a ressccção intracapsular advogada.

"Era de Dandy" (1917-1961) - a abordagem unilateral suboccipital se tornou a técnica de excelência, as complicações e mortalidade operatória dinminuiram, as ressecções tumorais eram totais mas a paralisia facial ocorria em 100% dos casos.
"Williatn House" (a partir de 1961) - iniciou a era moderna da cirurgia do neuroma. Introduziu-se o microscópio cirúrgico, passando a fazer a remoção total do tumor com alta taxa de preservação do nervo facial através da via translabirúltica e preservação da audição através da fossa média. Além disso, sistematizou-se e difundiu-se novas técnicas audiológicas e os estudos contrastados da cisterna do ângulo ponto-cerebelar (iodocisternografia).

Na década de 70 a Tomografia Computadorizada e o Estudo dos Potenciais Evocados Auditivos do Tronco Cerebral revolucionaram a propedêutica e aumentaram em muito em muito o acerto no diagnóstico.

Na década de 80 passou-se a discutir mais sobre a Radiocírurgia, a Ressonância Magnética veio diagnosticar lesões pequenas e surgiu o grande intersese na cirurgia do neuroma com preservação da audição.

EPIDEMIOLOGIA

No período de 1976 a 1983 Mirko Tos avaliou a incidência do neuroma do acústico na Dinamarca, que é um país de população pequena (5.1 milhões de habitantes), obtendo-se cadastro de todos os pacientes operados nos diversos departamentos neurocirúrgicos, otoneurocirúrgicos e dos pacientes não operados. Foram encontrados 278 casos. Isto corresponde a 39.7 neuromas por ano. A incidência é pois de 7.8 pacientes por milhão de habitantes por ano.

EXAMES COMPLEMENTARES

Após várias discussões e indicação dos exames complementares se dividiu em 2 grupos:

1°) O grupo dos países ricos onde atualmente no propedêutica do neuroma 2 exames são os fundamentais: potencial evocado (BERA) e a ressonância magnética;

2°) O grupo dos países mais pobres que ainda acham que a tomografia computadorizada tem seu lugar e nos tumores pequenos é indicado a TC com injeção de ar (cisternografia).

CLASSIFICAÇÃO DOS TUMORES

Para se poder avaliar melhor os resultados de cada um é importante que todos falem a mesma linguagem, definindo portanto o tamanho dos tumores tratados. Necessário também definir porção intrameatal e extrameatal. Uma classificação foi proposta:

Intrameatal

Tumor pequeno: diâmetro extrameatal de 1 a 10 milímetros.

Tumor médio: diâmetro extrameatal de 11 a 25 milímetros

Tumor grande: diâmetro extrameatal de 26 a 40 milímetros

Tumor gigante: diâmetro extrameatal maior de 40 milímetros.

BIOLOGIA DO TUMOR

É sabiamente conhecido que alguns neuromas crescem rapidamente e outros lentamente.

Não se tem um parâmetro para se adivinharem que ritmo de crescimento determinado tumor irá se desenvolver. Necessário portanto manter os pacientes em observação rigorosa quando se fizer a opção por não operá-los. Indicado pela menos uma tomografia computorizada ou ressonância magnética anualmente.

De acordo com o ritmo de crescimento dos tumores foi proposto uma classificação:

Crescimento rápido: tumores que dobram de tamanho em 8 meses.

Crescimento moderado: dobram de tamanho em 18 meses.

Crescimento lento: dobram de tamanho em 3 anos.

Crescimento muito lento: dobram de tamanho em mais de 3 anos.

O rítmo de crescimento dos neuromas varia em média de 1.4 a 3 milímetros por ano (média de crescimento mínimo de 0 mm e máximo de 7mm).

A CIRURGIA DO NEUROMA DO ACÚSTICO

1. Experiência do cirurgião. Dentre todos os fatores, incluindo a monitorização, a experiência do cirurgião é fator preponderante na aquisição de bons resultados.

2. A moderna cirurgia do neuroma visa não deixar nenhum tipo de seqüela. É imperativo preservar o nervo facial e reabilitar todos os casos de paralisia facial, evitar déficits centrais e preservar a audição dentro de um esquema protocolar.

3. Os casos operados em centros de referência com maior volume cirúrgico tem tido resultados muito melhores que aqueles operados isoladamente. Há uma grande tendência mundial em organizar equipes multidisciplinares, onde os pacientes seriam avaliados por vários profissionais e a técnica cirúrgica escolhida de acordo com as peculiaridades de cada paciente.

4. Quem tem acima de 200 casos operados usando uma determinada técnica, independente qual seja, os resultados se equivalem e não se cogita a mudança da mesma. Já tem experiência suficiente para superar uma eventual desvantagem da técnica que usa. O problema é diferente para aqueles que estão iniciando e para aqueles que irão formar uma equipe muitidisciplinar.

5. As complicações centrais são muito menos freqüentes quanto mais lateral é a abordagem cirúrgica.

6. A via translabiríntica (TL) é ainda a mais usada, para qualquer tipo ou tamanho de tumor e surpreendentemente sobretudo nos tumores grandes. Muito defendida e recomendada por aqueles que a usam (House, Sterkers, Tos e outros).

7. A via subocciptal (SO) tem como o seu maior defensor o professor Samii com excelentes resultados. Opera na posição assentada, não tem equipe multidisciplinar, faz mais de 90% das cirurgias sozinho (não há divisão de trabalho e nem de responsabilidade). Na posição assentada é mais fácil bloquear e remover a parte intracanalicular do tumor.

8. Na Europa onde o professor titular é o "head" do serviço com posição muito marcante, a filosofia decorre muito da sua origem, isto é, da cadeira (cátedra). Se iniciou na neurocirurgia a tendência é SO. Se na otorrino a tendência é TL. O entrosamento entre a disciplinas é formal.

9. Nos Estados Unidos por não existir a figura tão marcante do professor, o entrosamento é riais espontâneo.

10. Com relação a monitorização pér-operatória dos nervos facial e vestíbulo-coclear chegou-se à conclusão que ela é benéfica quando o cirurgião é menos experiente e não mandatória para quem tem experiência. Após ter inúmeros casos operados a possibilidade de preservação dos referidos nervos é maior, conseqüentemente menos paralisia facial e maior percentagem de preservação da audição.

11. M.Sanna apresentou um resumo de todos os trabalhos publicados nos últimos 10 anos sobre preservação da audição na cirurgia do neuroma. Muitos termos foram usados designando a acuidade auditiva, mas sem definições precisas. Designações tais como: NORMAL, EXCELLENT, GOOD, NEAR NORMAL, SERVICEABLE, USEFUL, POOR, MEASURABLE, foram usadas em inúmeros trabalhos, mas sem definir os parâmetros auditivos. O que é uma audição USEFUL? E o mesmo que SERVICEABLE? POOR e MEASURABLE tem diferenças? EXCELLENT e NEAR NORMAL são a mesma coisa? O autor ainda relata que em muitos trabalhos não existiam a audiometria pré e pós-operatória. M.Sanna conclui que é necessário estabelecer um comitê internacional para decidir um sistema aceito universalmente para que os resultados quanto a preservação da audição possam ser comparados.

12. Avaliando todos os trabalhos apresentados na conferência parece-nos que vale a pena investir na preservação da audição quando se tem uma perda auditiva < 50 db, uma discriminação maior que 80% e o tumor tenha dimensões de até 1.0 cm extrameatal.

RECOMENDAÇÕES

1. A cirurgia do neuroma deve ser realizada em centros de referência com infraestrutura capaz de enfrentar todos os problemas comuns a essa patologia diminuindo portanto a morbidade e colocando a mortalidade próxima de zero.

2. Na propedêutica complementar que se possa ter uma tomografia computadorizada de alta resolução, uma audiometria bem feita, um estudo dos potenciais evocados auditivos do tronco cerebral (BERA) e se possível uma ressonância magnética.

3. A preservação do nervo facial deve ser encarada como um desafio a ser conseguido a todo custo. Nos casos onde houver lesão per-operatória deve-se proceder sua imediata reabilitação usando os métodos mais apropriados para aquele caso: anastomose término-terminal, enxertia de nervo periférico, anastomose hipoglosso-facial e por último as técnicas de cirurgia plástica.

4. Ao relatar a função do nervo facial pré e pós-operatória usar o sistema de graduação de House-Brackmann que define 6 (seis) diferentes graus de função. Grau I- função normal; grau II - leve disfunção; grau III - moderada disfunção; grau IV - moderada a severa disfunção; grau V - severa disfunção e grau VI - paralisia total.

5. A preservação da audição deve ter um protocolo a ser seguido baseando-se na avaliação audiológica pré-operatória e no tamanho do tumor.

6. Sempre que possível tentar a formação de equipe inultidisciplinar trabalhando com o mesmo sentido filosófico. A equipe deverá ter um protocolo muito claro a respeito das técnicas cirúrgicas, vantagens e desvantagens de cada um, ter condições de fazer técnicas associadas e dar oportunidade para que o paciente também participe da decisão de qual o método mais apropriado para seu caso.

COMENTÁRIOS PESSOAIS

1. Qualquer uma das áreas otoneurocirúrgica ou neurocirírgica que se dispuser a trabalhar isoladamente não terá resultados competitivos com os grandes centros de referência mundial, independente da técnica que usa; quer dizer: ressecção total, mortalidade próxima de zero, alta taxa de preservação do nervo facial e ela audição. Em nosso caso pessoal foram nítidas as vantagens e a melhoria de resultados após a formação de nossa Equipe de cirurgia da Base de Crânio do Hospital Felício Rocho há 3 anos atrás. Os nossos resultados embora em número menor são comparados aos maiores centros mundiais de cirurgia do neuroma do acústico.

2. Diante do que a conferência propôs não se justificam intervenções aleatórias que são colocadas ao paciente sobre pressão, cujos resultados tem sido desastrosos. Afinal, trata-se de uma patologia benigna. Somente sua remoção refinada se justifica.

REFERÊNCIAS

TOS, M: Abstracts from the first international conference on acoustic neuroma. Copenhagen, August 25 - 29, 1991.




* Médico Otorrinolaringologista.
** Médico Neurocirurgião.

Hospital Felício Rocho - Av do Contorno, 9530- 30110- Belo Horizonte, MG - Brasil.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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